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Estatuto da Crianca e do Adolescente -Doutrina e Jurisprudência- Valter Kenji Ishida - 2015, Notas de estudo de Direito

Proteção da criança e do adolescente

Tipologia: Notas de estudo

2017
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Baixe Estatuto da Crianca e do Adolescente -Doutrina e Jurisprudência- Valter Kenji Ishida - 2015 e outras Notas de estudo em PDF para Direito, somente na Docsity! 16a EDIÇÃO ATUALIZADA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA Inclui comentários à Resolução no 163, de 13 de março de 2014, do Conanda (abusividade do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente), à Lei no 12.962, de 8 de abril de 2014 (direito à convivência da criança e do adolescente com os pais privados de liberdade), à Lei no 12.695, de 23 de abril de 2014, à Lei no 13.010, de 26 de junho de 2014 (Lei da Palmada), e à Portaria MJ no 368, de 11 de fevereiro de 2014 (classificação indicativa de obras audiovisuais) VÁLTER KENJI ISHIDA ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 2a Prova Estatuto da Criança e do Adolescente 2a Prova 2a Prova © 1998 by Editora Atlas S.A. 1. ed. 1998; 2. ed. 2000; 3. ed. 2001; 4. ed. 2003; 5. ed. 2004; 6. ed. 2005; 7. ed. 2006; 8. ed. 2006; 9. ed. 2008; 10. ed. 2009; 11. ed. 2010; 12. ed. 2010; 13. ed. 2011; 14. ed. 2012; 15. ed. 2014; 16. ed. 2015 Capa: Zenário A. de Oliveira Composição: Lino-Jato Editoração Gráfica Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Ishida, Válter Kenji Estatuto da criança e do adolescente : doutrina e jurisprudência / Válter Kenji Ishida. – 16. ed. – São Paulo : Atlas, 2015. Bibliografia. ISBN 978-85-224-9345-6 ISBN 978-85-224-9346-3 (PDF) 1. Menores – Jurisprudência – Brasil 2. Menores – Leis e legislação – Brasil I. Título. 98-2237 CDU-347.157.1(81)(094) Índices para catálogo sistemático: 1. Brasil : Estatuto da Criança e do Adolescente 347.157.1(81)(094) 2. Estatuto da Criança e do Adolescente : Brasil 347.157.1(81)(094) TODOS OS DIREITOS RESERVADOS – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos de autor (Lei nº 9.610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal. Editora Atlas S.A. Rua Conselheiro Nébias, 1384 Campos Elísios 01203 904 São Paulo SP 011 3357 9144 atlas.com.br 2a Prova À minha esposa, Rose, pela inspiração e apoio pelos vários dias dedicados a este trabalho; espero que você compreenda a minha paixão pela profissão de escritor. Aos meus filhos Eric e Luísa, que me perdoem pelos vários dias de trabalho na biblioteca; que vivam e sigam seus propósitos de vida (darma). 2a Prova 2a Prova Sumário ix 2a Prova Título VI – Do Acesso à Justiça (arts. 141 – 224), 354 Capítulo I – Disposições gerais (arts. 141 – 144), 354 Capítulo II – Da justiça da infância e da juventude (arts. 145 – 151), 359 Seção I – Disposições gerais (art. 145), 359 Seção II – Do juiz (arts. 146 – 149), 360 Seção III – Dos serviços auxiliares (arts. 150 – 151), 397 Capítulo III – Dos procedimentos (arts. 152 – 197), 399 Seção I – Disposições gerais (arts. 152 – 154), 399 Seção II – Da perda e da suspensão do poder familiar (arts. 155 – 163), 408 Seção III – Da destituição da tutela (art. 164), 427 Seção IV – Da colocação em família substituta (arts. 165 – 170), 429 Seção V – Da apuração de ato infracional atribuído a adolescente (arts. 171 – 190), 440 Seção VI – Da apuração de irregularidades em entidade de atendimento (arts. 191 – 193), 504 Seção VII – Da apuração de infração administrativa às normas de proteção à criança e ao adolescente (arts. 194 – 107), 509 Seção VIII – Da habilitação de pretendentes à adoção (arts. 197-A – 197-E), 517 Capítulo IV – Dos recursos (arts. 198 – 199), 520 Capítulo V – Do Ministério Público (arts. 200 – 205), 540 Capítulo VI – Do advogado (arts. 206 – 207), 557 Capítulo VII – Da proteção judicial dos interesses individuais, difusos e coletivos (arts. 208 – 224), 561 Título VII – Dos Crimes e das Infrações Administrativas (arts. 225 – 258), 593 Capítulo I – Dos crimes (arts. 225 – 244), 593 Seção I – Disposições gerais (arts. 225 – 227), 593 Seção II – Dos crimes em espécie (arts. 228 – 244-B), 596 Capítulo II – Das infrações administrativas (arts. 245 – 258), 656 Disposições Finais e Transitórias (arts. 259 – 267), 703 Anexo I, 714 Anexo II, 724 Bibliografia, 769 2a Prova 2a Prova 2a Prova Abreviaturas Acív: Apelação Cível AI: Agravo de Instrumento Ap. Cív.: Apelação Cível CC: Código Civil C. Esp.: Câmara Especial CF: Constituição Federal CLT: Consolidação das Leis do Trabalho Conf. Comp.: Conflito de Competência CPC: Código de Processo Civil CM: Código de Menores CT: Conselho Tutelar Des.: Desembargador ECA: Estatuto da Criança e do Adolescente FOPEJISP: Fórum Permanente de Estudos dos Juízes da Infância e Juventude do Estado de São Paulo Jurisp.: Jurisprudência LTE: Lei Tutelar Educativa (direito penal juvenil português) MP: Ministério Público 1º TACivSP: Primeiro Tribunal de Alçada Cível do Estado de São Paulo (extinto) Rel.: Relator REsp: Recurso Especial RSTJ: Revista do Superior Tribunal de Justiça ST: Setor Técnico xiv Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova Todavia, entre a letra fria da lei, de um lado, e sua efetiva implementação e interpretação, com vista na solução dos graves conflitos que o mencionado esta- tuto tem como objeto de tutela, há uma grande distância. Daí a importância do testemunho de uma vivência prática, como a retratada neste imprescindível compêndio, trazido a lume pelo jovem e dedicado Promotor de Justiça Válter Kenji Ishida. Com efeito, a referida obra, um verdadeiro manual ora oferecido a todos quantos se dedicam ao tema enfocado, traz desde as lições doutrinárias dos in- térpretes do Estatuto da Criança e do Adolescente, até o repositório mais recente de jurisprudência, passando até mesmo por formulários e outros instrumentos de atuação pragmática, tudo como reflexo daquela vivência. Dessa forma, há uma conjugação perfeita entre a thesis e a praxis, instrumen- tos fundamentais para análise e encaminhamento efetivo e eficaz das soluções para as questões práticas que se venham a apresentar nos juizados de infância e juventude. O mercado livreiro, portanto, carecia de uma obra dessa envergadura, so- bretudo em face dos aspectos focados, e certamente ela servirá como manual de constante consulta aos operadores do direito menorista. JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO Procurador de Justiça 2a Prova Nota à 16ª Edição Nesta 16ª edição, realizamos algumas modificações na obra. Incluímos comentários sobre caso decidido pelo STJ em que se vedava auto- rização manuscrita para viagem de genitor para que o outro genitor viajasse com o menor. Nesse sentido, tecemos comentário crítico a essa decisão. Também atualizamos as constantes modificações sobre a admissão da altera- ção da competência por lei estadual para julgamento dos crimes contra criança ou adolescente. Nesse universo de alterações das decisões menoristas, também estudamos a restrição do julgamento antecipado da lide no caso de destituição do poder familiar. Isso na hipótese de genitor que esteja em local certo e no caso de estar recolhido em estabelecimento carcerário. Em tema de direito de família, analisamos a crescente aceitação da paterni- dade socioafetiva por nossos tribunais. Igualmente citamos decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da vedação do tratamento mais gravoso ao adolescente infrator no confronto com o maior imputável (HC nº 119.160/SP, rel. Min. Roberto Barroso, j. 9.4.2014). Sobre a matéria infracional, destacamos a necessidade de alteração da rotulação de ato com violência ou grave ameaça para ato revestido de gravidade. A respeito das infrações administrativas pertinentes, atualizamos a referência à Portaria do Ministério da Justiça (atualmente a de nº 368, de 11 de fevereiro de 2014), que cuida da classificação indicativa. Também nessa tema, rediscutimos a questão da fixação da multa. Por fim, inserimos a Lei nº 13.010, de 26 de junho de 2014 (Lei de Palmada), incluindo a responsabilidade dos pais, responsáveis, professores sobre castigos físicos e tratamento cruel ou desumano impostos a crianças e adolescentes, ve- dando essa forma de correção. xvi Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova Agradecemos a acolhida desta obra, o que nos permite a intensa pesquisa e atualização desse dinâmico “Direito da Infância e da Juventude”. Acrescentamos que também estamos lançando a segunda edição do nosso Infração administrati- va no Estatuto da Criança e do Adolescente, um estudo mais aprofundado sobre as infrações do ECA. O Autor O Trabalho dos Profissionais na Área da Infância e Juventude xix 2a Prova maneira como foi provocado, porque procurou dar prevalência à proteção da infân- cia e ao interesse da criança ou adolescente. ............................ A função primordial do Juiz da Infância e da Juventude é a correção dos desvios detectados entre a realidade e as normas constantes da Lei nº 8.069/90 e da CF. A ação do Juiz pode ser direcionada contra o causador dos desvios e não apenas em favor (ou contra) da criança e do adolescente.” É este o desafio dos operadores do direito: adaptar os princípios constitu- cionais introduzidos no ECA, mantendo-se o rápido e fácil acesso da sociedade à tutela jurisdicional. 2a Prova 2a Prova 2a Prova O Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990 Dispõe sobre o ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCEN- TE, e dá outras providências. O Presidente da República Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: 1 Razão da expressão Estatuto A Lei nº 8.069 preferiu o termo estatuto em razão deste expressar direitos. O termo código foi preterido em razão de vincular ao aspecto punitivo, tal qual o Código Penal (Paulo Lúcio Nogueira, Estatuto da Criança e do Adolescente comen- tado, p. 7). Na verdade, a escolha estaria mais correta porque código represen- taria um conjunto de leis, o que implicaria em um ordenamento jurídico muito maior que o ECA. Já estatuto exprime a ideia de lei, de decreto, regulamento, sendo um termo mais apropriado. 4 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova criança e do adolescente. Devem-se superar vetustas desculpas de falta de verba orçamentária, de luta pela não intromissão do Judiciário no Executivo e trocá-las por outras atitudes mais proativas. O Executivo não deve ser visto pelo político como um local para enriquecimento próprio e dos afins, mas sim de um local de atendimento das prioridades sociais, no caso específico da infância e da juventu- de; (4) orientação à família: a família natural ou extensa devem sempre sopesar os interesses e as ideias da criança e do adolescente. O entendimento (às vezes arcaico) dos pais às vezes não é o melhor para aplicação à criança e ao adolescen- te. Nesse sentido, possuem os pais importância destacável na criação e educação de seus filhos, não podendo unicamente pensar em velhos chavões como: “o que foi bom para mim, será bom para meu filho”. 1.2 Organização didática dos princípios protetivos da criança e adolescente Rossato e outros (Estatuto da criança e do adolescente comentado, p. 85) che- gam a esquematizar os princípios. A intenção é boa porque permite um melhor entendimento, embora aqui pode-se não compreender porque o interesse superior seria um postulado (nível mais elevado) e a proteção integral, um metaprincípio. Ou ainda porque um procedimento (oitiva obrigatória) seja elevado a princípio. De qualquer forma, segundo referidos autores, a organização seria essa: (1) Postulado: interesse superior da criança e do adolescente; (2) Metaprincípios: proteção integral e prioridade absoluta; (3) Princípios: criança e adolescente como sujeitos de direitos; responsabilidade primária e solidária do poder públi- co; privacidade; intervenção precoce; intervenção mínima; proporcionalidade e atualidade; responsabilidade parental; prevalência da família; obrigatoriedade da informação; oitiva obrigatória e participação. 2 Convenção sobre os direitos da criança Foi uma convenção internacional de 1924, o primeiro documento relativo à criança e ao adolescente. Antes havia menção na Constituição alemã e na Consti- tuição mexicana. Aprovada pela ONU (20-11-89), assinada pelo Brasil em 26-1- 90 e aprovada pelo Decreto Legislativo nº 28, de 14-9-90. o ECA está conforme a Convenção da ONU (Elias, 1994:2). A Doutrina da Proteção Integral, originada através da referida Convenção orienta atendimento à criança e ao adolescente. Dessa forma, há necessidade de um conjunto articulado de ações por parte do Estado e da sociedade que vão desde a concepção de políticas públicas até a realização de programas locais de atendimento implementados por entidades governamentais ou não governamentais. Nesse contexto, crianças e adolescentes são sujeitos de direitos. Art. 1º 5 2a Prova 2.1 A introdução do art. 227 do ECA Antes do advento do ECA, houve uma luta de vários grupos para inserção de direitos da criança e do adolescente no texto constitucional. Já em 1986, a Unicef patrocinou uma reunião com diversas pessoas ligadas ao tema. Teve grande parti- cipação um italiano fundador do Projeto Axé na Bahia de nome Cessare La Rocca. 3 Histórico sobre a criação do ECA Havia uma intenção após a colocação do art. 227 na CF de se reformar a legis- lação menorista. Nos Códigos anteriores, não havia explicitamente uma previsão da intervenção do MP nos procedimentos menoristas. Foi em São Paulo, na gestão do Procurador-geral Paulo Frontini, que foram criadas as curadorias e as coor- denadorias da infância e juventude. Munir Cury dirigia as curadorias. À época, a estrutura menorista era bastante frágil. Praticamente, as curadorias só existiam em São Paulo (cf. www.promenino.org.br). Na vigência do Código de Menores, não havia a distinção entre criança e adolescente (havia apenas a denominação “menor”) e não havia obediência aos direitos fundamentais, admitindo-se, p. ex., a apreensão fora da hipótese de flagrante ou de busca e apreensão. Esse panora- ma inicialmente se modificou com a CF e posteriormente com o ECA. Houve tam- bém uma grande influência da pastoral de menores. Havia um grupo de juízes, incluindo Alípio Cavalieri, que auxiliou na construção das chamadas diretrizes gerais. Cavalieri era o criador do anterior Código de Menores (1979). Houve a colaboração de grupos e naturalmente surgiram ideias, advindo daí o grupo de formação do ECA. A primeira versão surgiu e realizou-se um grande evento em São Paulo, buscando a expressão da sociedade civil. Esse grande evento surgiu a partir do Fórum de Defesa da Criança e do Adolescente. Nessa ocasião, Garrido, Marçura e Munir haviam elaborado as chamadas “Normas Gerais de Proteção à Infância e Juventude”. As reuniões para a redação eram feitas na Coordenadoria e a digitação era feita por Garrido e Marçura. O Fórum aprovou o encaminha- mento ao Congresso que foi feito de duas maneiras para garantir a precedência. O deputado Nelson Aguiar (PDT-ES) apresenta-o na Câmara e o Senador Ronan Tito (PMDB-MG) apresenta-o no Senado. Como o texto das “Normas Gerais” con- tinha equívocos, formou-se uma comissão redatora no Fórum DCA para corrigir e aperfeiçoar o texto, advindo daí o substituto ao projeto preliminar de Normas Gerais de Proteção. Esse substituto se tornou o ECA. Esta Comissão era integrada pelo Desembargador do TJSC, Antonio Fernando do Amaral e Silva, Munir Cury, Marçura, Jurandir Marçura etc. Houve uma grande resistência de alguns setores. Pensava-se, p. ex., em abri- gar em uma parte geral o ECA e em uma parte especial, o Código de Menores. Houve muita galhardia (nobreza de alma) para a concretização do ECA. Sancio- nado, após tal procedimento, passou a ser um dos diplomas legais mais modernos 6 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova do mundo. A edição do ECA representava o estabelecimento de garantias, de instituição do contraditório, de supressão do denominado “entulho autoritário”. Tratou-se de uma reação à desigualdade. O ECA é uma criação coletiva. É fruto de um grande movimento, de várias categorias. Por exemplo, do Movimento dos Meninos e Meninas de Ruas. Ele nasce da capacidade da indignação da socieda- de. Havia uma crítica ao excesso de poder do magistrado no anterior Código de Menores. Todas as contribuições se referiam aos direitos humanos. Costuma-se mencionar que foi a prática que fundamentou a lei menorista. O ECA, pelos seus mecanismos, possibilitou essa cobrança, p. ex., na área da saúde. É a luta pela efetivação dos direitos sociais no Brasil. Outra grande con- quista é o combate à falta de vagas no ensino fundamental, já inexistindo esse problema no Estado de São Paulo. A educação foi a bandeira mais importante do MP-SP. Atualmente, um dos grandes problemas é o uso de drogas entre crianças e adolescentes. 3.1 Esqueleto do estatuto da criança e do adolescente A Lei nº 8.069/90 foi um marco em termos de legislação em geral. Como o Código de Defesa de Consumidor tornou-se um exemplo de modelo a ser seguido. Tanto é que o Estatuto do Idoso foi praticamente uma cópia do ECA. A divisão em parte geral e parte especial seguiu o modelo tradicional que aparece, p. ex. no Có- digo Civil e no Código Penal. Todavia, no seu conteúdo, o ECA foi original na sua apresentação. O Título I e Título II foram influenciados pela legislação da ONU e principalmente pela Constituição Federal, tratando dos direitos fundamentais. As regras de Beijing influenciaram também o próprio procedimento infracional. O próprio termo Justiça da Infância e da Juventude (item 5) é mencionado nestas regras. Segundo relato do Desembargador Amaral, o anterior Código de Menores permitia muitas decisões injustas (entrevista no site www.promenino.org.br) e as normas que a comissão redatora do ECA propunha já era prevista na OIT e na recomendação das Nações Unidas. Alguns itens, como a autorização para viajar, praticamente não sofreram alteração e foram transplantados do antigo Código de Menores de 1979 (p. ex., a autorização de viagem foi extraída do art. 62 do CM). 4 Direito da criança e do adolescente Modernamente fala-se em um direito da criança e do adolescente. Adeildo Nunes (Da execução penal, p. 38) fornece os critérios para aferição da autonomia. Isso é de extrema importância visto que conceitos são extraídos de bases comple- tamente diferentes. Por isso, a estipulação de critérios é extremamente salutar. Para referido autor, a autonomia depende da existência de uma legislação especí- fica e autônoma disciplinando a matéria, da constitucionalização desse ramo do Art. 2º 9 2a Prova nascimento com vida; (3) teoria concepcionista: o nascituro seria sujeito de di- reitos e obrigações desde a concepção (Victor Santos Queiroz, A personalidade do nascituro à luz do estatuto da criança e do adolescente). O autor desta obra foi influenciado pela segunda teoria aprendida nos bancos da faculdade, mas diante da evolução do direito menorista não pode deixar de adotar a terceira corrente. A doutrina da proteção integral e do melhor interesse acaba necessariamente ter de incluir o nascituro dentro da proteção. E mencionado por Queiroz, melhor exemplo é a proteção ou obrigação da gestante a certos cuidados. Por exemplo, encontrando-se drogada ou portadora de HIV, como é possível obrigá-la a um tratamento se não for baseado no interesse do nascituro? É certo que existem limitações, vedando-se, p. ex., a adoção de nascituro, mas também é certo que a interpretação sistemática do ECA leva à inclusão do nascituro como incluso na expressão de criança. O Projeto de Lei nº 487/2007 estabelece o Estatuto do Nas- cituro, dispondo no art. 2º, o seu conceito: “Nascituro é o ser humano concebido, mas ainda não nascido.” 1.1 Convenção sobre os direitos da criança, de 20-11-89 O ECA assemelha-se com o art. 1º da referida Convenção: “Para efeito da presente Convenção, considera-se como criança todo ser humano com menos de dezoito anos de idade, a não ser que, em conformidade com a lei apli- cável à criança, a maioridade seja alcançada antes.” 1.2 Jovem Introdução. A Emenda Constitucional nº 65, de 13 de julho de 2010, in- troduziu no art. 227 do texto constitucional a expressão jovem, junto com as expressões criança e adolescente. Previu, além disso, a criação de um estatuto do jovem, ratificando a tendência jurídica de se criarem microssistemas a amparar as chamadas faixas etárias vulneráveis, merecedoras de uma tutela maior da so- ciedade e do próprio Estado. Essa previsão se materializou na Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013. Definição de jovem. O primeiro trabalho é de se buscar o conceito jurídi- co da expressão jovem. A questão é de saber qual é o conceito de jovem que o legislador constitucional preferiu não enfrentar. Pode-se, nesse sentido, citar o critério adotado pela Assembleia Geral da ONU quando da criação do ano internacional da juventude (1985): definiu jovem como a pessoa entre 15 anos e 24 anos. Por outro lado, a Lei nº 12.852/2013 define jovem no art. 1º como a pessoa entre 15 e 29 anos de idade, possuindo uma amplitude maior que o próprio texto da ONU. O texto legal adotou uma interpretação ampla, atingindo a faixa até 29 anos de idade. Até porque a PEC 394/2005, que deu origem à re- ferida emenda constitucional, previu, na sua justificativa, a referida idade entre 10 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova 15 e 29 de idade. Trata-se, portanto, de verdadeira interpretação doutrinária mencionada na proposta de emenda constitucional. Definida a idade entre 15 e 29 anos de idade, cabe aqui indagar se haveria necessidade de exclusão da faixa etária dos adolescentes. O art. 2º da lei menorista define criança como a pessoa com até 12 anos e adolescente aquela entre 12 e 18 anos. Aqui nos pronuncia- mos pela manutenção dos adolescentes, pois, como mencionado pela própria justificativa do projeto do estatuto do jovem, haveria uma proteção suplemen- tar deste estatuto. Significa dizer que primeiro se aplica com primazia o ECA ao adolescente entre 15 e 18 anos, e depois subsidiariamente aplicar-se-ia o estatuto do jovem. Dessa forma, pode-se conceituar jovem como a pessoa entre 15 e 29 anos de idade. Em síntese, o Estatuto prevê princípios, como o da au- tonomia e da emancipação dos jovens (art. 2º, I); prevê ainda diretrizes gerais, incluindo o desenvolvimento da intersetorialidade das políticas estruturais (art. 3º, I); relata direitos como o direito à Cidadania (arts. 4º a 6º), à Educação (art. 7º); o direito à Saúde (art. 19), à Cultura, destacando-se nesse, o direito à meia entrada (art. 23, caput), desde que regularmente matriculados (art. 23, § 1º); direito à Segurança Pública e ao Acesso à Justiça (arts. 37 e 38). No Estatuto, cria-se o Sistema Nacional de Juventude (art. 39 e seguintes), com a função de formular e coordenar a execução da Política Nacional da Juventude por parte da União (art. 41, I). São criados os conselhos da juventude, órgãos permanen- tes e autônomos não jurisdicionais encarregados de tratar das políticas públicas de juventude e da garantia do exercício dos direitos dos joventus (art. 45), com conceitos semelhantes do Conselho Tutelar do ECA. A vacatio legis do Estatuto da Juventude é de 180 dias (art. 48). Conclusões. Assim, salutar que se discipline uma legislação específica para essa faixa da população: a juventude. Embora a maioridade civil cesse aos 18 anos, é notório que a maturidade da pessoa humana não ocorre, na maioria das vezes, nessa idade. Milhões de brasileiros ainda não se casaram e nem obtiveram a independência econômica aos 18 anos, hipótese essa que ocorrerá com fre- quência somente depois dos 30 anos, havendo, nesse caso, a necessidade de um ordenamento jurídico protetivo do jovem. Dessa forma, ao invés do ECA, de na- tureza essencialmente protetiva, o estatuto do jovem deverá priorizar outras di- retrizes como a criação de oportunidade e orientação profissional, sexual etc. ao jovem. Essa faixa etária, p. ex., é uma das mais afetadas pelo contágio de doen- ças sexualmente transmissíveis (Jorge Barrientos-Parra, O estatuto da juventude, instrumento para o desenvolvimento integral dos jovens, “in” Revista de Informação Legislativa, ano 41, nº 163, p. 6), muito em parte pela falta de experiência. Assim, deverá ser disciplinada na futura lei uma gama variada de direitos como o da vida, da saúde, da educação etc., dando-se ênfase à proteção do jovem portador de algum tipo de deficiência. Da mesma forma como ocorreu com a criança e com o adolescente, além de um microssistema legislativo, deverá existir também um plano nacional da juventude, criando mecanismos de fortalecimento dessa faixa etária que em 2010 atingiu quase a faixa de 50 milhões de pessoas. Art. 2º 11 2a Prova 2 Exceções do parágrafo único Esta denominação implica na prática em questões de se definir a competên- cia da Vara da Infância e Juventude em relação a outra Vara, como a da Família. Isto significa analisar qual o alcance do parágrafo único. A referência do parágrafo único às pessoas entre 18 anos e 21 anos de idade se relaciona claramente à hipótese da maioridade civil. À época da entrada em vigor do ECA, estava vigente o antigo Código Civil (Lei nº 3.071/16), que previa em seu art. 9º: “Aos 21 (vinte e um) anos completos acaba a menoridade, ficando habilitado o indivíduo para todos os atos da vida civil.” Ocorre que o novo Código Civil (Lei nº 10.406/02) alterou a maioridade civil, diminuindo-a para 18 (dezoi- to) anos (art. 5º, caput). 2.1 Denegação da emancipação Definiu o TJSP quando a mesma deve ser indeferida: “Deve a emancipação ser denegada quando o emancipado não possuir o neces- sário discernimento para reger sua pessoa ou administrar seus bens e se ignora ele os fatos essenciais sobre os seus haveres, como a qualidade e a quantidade.” (TJSP, RT, 282:279.) 2.2 A questão da internação e de qualquer outra medida socioeducativa O ECA expressamente permite a internação do maior de 18 anos: v. § 5º do art. 121, não sofrendo alteração mesmo com a entrada em vigor do CC de 2002. Para Roberto João Elias (1994:3), a exceção do parágrafo refere-se somente a internação. Todavia, com total acerto, tem prevalecido o entendimento de que cabe em tese, a aplicação de qualquer medida socioeducativa, levando-se em con- sideração a idade do menor ao tempo do fato (STJ, HC nº 108.356/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJE 3.11.2008). Assim, é possível em tese, o cumprimento da medida por maior de dezoito, ressaltando-se tão somente as exceções legais como a hipótese de cumprimento de pena privativa de liberdade (art. 46, III, da Lei nº 12.594/2012) ou na hipótese da pessoa estiver respondendo a processo- -crime (art. 46, § 1º, da referida Lei). 2.3 A questão da adoção Na questão da adoção, deve-se fazer uma ressalva: o parágrafo único do art. 2º cuida da aplicabilidade do ECA e não da competência da VIJ. Assim, na hipó- 14 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova primazia, destaque em todas as esferas de interesse, incluindo a esfera judicial, extrajudicial ou administrativa. Assim, a título de exemplo, entre o interesse da criança ou adolescente ou do idoso, deve prevalecer o primeiro, porque é de ordem constitucional e há menção da “absoluta prioridade” no art. 227 (Amin, Curso de direito da criança e do adolescente, p. 22), ao passo que o idoso, apesar de dispor da tutela constitucional (art. 230), não possui essa ênfase da Carta Magna fornecida ao menor de dezoito anos. Desta forma, o artigo do ECA, em consonância com a regra da prioridade absoluta atualizada pelo texto constitucional, em tela relata os direitos básicos da criança e do adolescente no que concerne à vida, à saúde, à alimentação, à educa- ção, ao esporte, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liber- dade e à convivência, mencionando, em suas alíneas, os direitos e as preferências dos mesmos. (1) Primazia na proteção e socorro. Existindo situação de perigo, que pode envolver concretamente um atendimento médico, a criança ou adolescente deve ser socorrido em primeiro lugar. (2) Precedência no atendimento nos serviços públicos ou de relevância. O serviço público é aquele prestado diretamente pelo ente público ou através de delegação. Já o conceito de relevância pública encontra resposta conceitual quando atende a uma necessidade essencial, mesmo que essa necessidade seja suprida por um particular. Assim, um caso recente foi em 2012, a distribuição de combustíveis, que pela necessidade do país, reveste-se de rele- vância. Existem atualmente algumas formas de atendimento a essa prioridade, como a fila para mulheres com filhos até dois anos. A precedência ou prioridade visa atender de um modo confortável uma criança que acompanha v. g. a sua genitora. (3) Atenção na formulação e execução de políticas públicas. Essa atuação atinge tanto o Poder Legislativo como o Executivo. (4) Destinação privilegiada de recursos públicos. Inclui esse “privilégio” desde a elaboração e votação da lei orçamentária. Como adverte Dallari, “Os responsáveis pelo órgão público ques- tionado deverão comprovar que, na destinação dos recursos disponíveis, ainda que poucos, foi observada a prioridade exigida...” (ob. cit., p. 47). Solidariedade humana. A família, a comunidade, a sociedade e o Poder Pú- blico possuem a obrigação de garantir os direitos da criança e do adolescente. Esses entes alicerçam a forma básica de convivência humana. A Comunidade é uma espécie de agrupamento mais estreita (Dalmo de Abreu Dalari, Estatuto da criança e do adolescente: comentários jurídicos e sociais, p. 41). Responsabilidade do ente público. A previsão orçamentária de verbas para essa área é um dos grandes problemas que se enfrentam. Isto porque a destinação de verba (alínea d) não implica a aplicação efetiva pelos governantes. O Decreto nº 1.056, de 11-2-94, estabelece a forma de atuação dos órgãos do Poder Executivo para a execução do Programa Nacional de Atenção à Criança e ao Adolescente. O TJSP entendeu sobre a necessidade de se garantir o art. 4º do ECA com relação à destinação de menores abandonados aos albergues da Municipalidade, Art. 4º 15 2a Prova não se tratando de indevida ingerência do Poder Judiciário sobre atividade típica do Poder Executivo: “Ora, o art. 227, caput, da Constituição Federal, secundado pelo art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao assegurar prioridade absoluta à proteção dos direitos da criança e do adolescente, como dever da família, da sociedade e do Estado, respalda a sentença impugnada que impôs à Municipalidade o acolhimento, em três de seus albergues, de menores abandonados. Nem se vislumbra, in casu, indevida ingerência ao Poder Judiciário nas típicas atividades do Executivo, pois a absoluta prioridade na asseguração dos direitos da criança e do adolescente é ditada por normas, constitucional e legal, que a impõem ao administrador públi- co como dever, não faculdade. Ressalte-se, a propósito, que não impôs a sentença impugnada ao Poder Executivo Municipal a construção de albergues ou a locação de prédios para tal fim mas, apenas, a destinação de três dos abrigos já mantidos pela Administração também às crianças e adolescentes abandonados. Finalmente, a Municipalidade não terá, certamente, dificuldade em destinar a tais locais servido- res especializados que viabilizarão o acolhimento dos menores abandonados, como assistentes sociais, educadores, psicólogos e, quiçá, policiais que zelarão pela ordem nesses recintos.” (TJSP – Apelação Civil nº 37.609-0/5 – Comarca de São Paulo – Estado de São Paulo – v. u. – Rel. Luís de Macedo – j. 31-7-1997.) A necessidade de atuação do Poder Público foi secundada pelo Ministro Celso de Mello, contrariando anterior decisão do TJSC que entendia que deveria preva- lecer o princípio da separação de poderes: “É preciso assinalar, neste ponto, por relevante, que a proteção aos direitos da criança e do adolescente (CF, art. 227, ‘caput’) – qualifica-se como um dos direitos sociais mais expressivos, subsumin- do-se à noção dos direitos de segunda geração (RTJ 164/158-161), cujo adimple- mento impõe, ao Poder Público, a satisfação de um dever de prestação positiva, consistente num ‘facere’, pois o Estado dele só se desincumbirá criando condições objetivas que viabilizem, em favor dessas mesmas crianças e adolescentes, ‘[...] com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão’ (CF, art. 227, ‘caput’ – grifei) [...] Ao contrário do que se afirmou no v. acórdão re- corrido, as normas programáticas vinculam e obrigam os seus destinatários, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu imposter- gável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. [...] Isso significa, portanto, que a ineficiência administrativa, o descaso governamental com direitos básicos da pessoa, a incapacidade de gerir os recursos públicos, a falta de visão política na justa percepção, pelo administrador, do enorme significado social de que se reveste a proteção à criança e ao adolescente, a inoperância funcional dos ges- tores públicos na concretização das imposições constitucionais não podem nem 16 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova devem representar obstáculos à execução, pelo Poder Público, da norma inscrita no art. 227, ‘caput’, da Constituição da República, que traduz e impõe, ao Esta- do, um dever inafastável, sob pena de a ilegitimidade dessa inaceitável omissão governamental importar em grave vulneração a um direito fundamental e que é, no contexto ora examinado, a proteção integral da criança e do adolescente. Sendo assim, em face das razões expostas e considerando, ainda, anterior decisão que proferi sobre o mesmo tema (AI 583.264/SC, Rel. Min. CELSO DE MELLO), conheço do presente recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, para dar-lhe provimento (CPC, art. 557, § 1º-A), em ordem a restabelecer a sentença proferida pelo magistrado local de primeira instância” (RE 482611/SC, j. 23 de março de 2010). 2 Questões processuais 2.1 A autorização judicial para a transfusão de sangue de menor Pode o Juiz autorizar a transfusão de sangue em hospital no caso de oposição dos genitores ou do responsável legal? Literalmente, dispensa-se a autorização do Juiz com a regra do § 3º, inciso I do art. 146 do CP, in verbis: “Não se compreendem na disposição deste artigo... a intervenção médica ou cirúr- gica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida.” Assim, nesta inclinação, o TJRS, para quem faltaria ao hospital, interesse processual em obter alvará, já que “o profissional de saúde tem o dever de, ha- vendo iminente perigo de vida, empreender todas as diligências necessárias ao tratamento da paciente, independentemente do consentimento dela ou de seus familiares” (Apelação Cível nº 70020868162, Quinta Câmara Cível, Rel. Umberto Guaspari Sudbrack, j. 22-8-2007). Todavia, há tese em contrário de que, no caso, o médico violaria os incisos II (“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em vir- tude de lei”) e VI (“é inviolável a liberdade de consciência e de crença”) e ainda o VIII (“ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa”), todos do art. 5º da CF, além da própria inibição do exercício do poder famliar. Esta hi- pótese refere-se às testemunhas de Jeová que recusam a transfusão em razão de crença religiosa. Entendemos que o médico que realiza transfusão de sangue, mesmo sem o consentimento do responsável legal, desde que haja risco de vida iminente, não comete nenhum ilícito. O Código Civil, em seu art. 15, prevê o seguinte, in verbis: Art. 6º 19 2a Prova estudo da referida lei. É nítida a influência da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, especificamente o art. 5º que prevê que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.” Fim social, bem comum e direitos e deveres individuais e coletivos. Fins sociais e bem comum, como foi dito, são expressões extraídas do art. 5º da Lei de Intro- dução às normas do direito brasileiro que enfim obrigam o intéprete a buscar a finalidade geral da lei e da justiça: a paz social. Em relação à esfera menorista, o fim social é o de proteção integral da criança e do adolescente e o bem comum é o que atende aos interesses de toda a sociedade. Para Antônio Carlos Gomes da Costa (Comentários ao art. 6º do ECA, in ECA comentado, Coord. Munir Cury, p. 59), os fins sociais se vinculariam à promoção, defesa e atendimento dos direitos da infância e da juventude. Para Limongi, utilizando-se do raciocínio de Alexan- dre Álvares, inspirar-se nos fins sociais implica seguir a marcha dos fenômenos sociais e receber inspiração do meio ambiente. Já “exigências do bem comum” vincula-se a uma utilidade comum dos cidadãos e da República (Comentários ao art. 6º do ECA, in ECA Comentado, Coordenador Munir Cury, p. 57). O legislador menorista resolveu incluir um terceiro ponto que incide sobre os direitos e deveres individuais e coletivos e que são os elencados no ECA, relativos à criança e ao adolescente. Crianças e adolescentes como pessoas em desenvolvimento. A infância e juven- tude são etapas que devem ser superadas para que se possa atingir com plena conformação física, psíquica, moral e social o estágio adulto da vida. Esse de- senvolvimento deve ser feito de maneira prospectiva, com visão para o futuro da criança e do adolescente. As crianças necessitam de maiores cuidados, ao passo que os adolescentes ganham paulatinamente maior autonomia (cf. Gusta- vo Ferraz de Campos Monaco, ob. cit., p. 158-159). Assim, a “condição peculiar da criança e do adolescente” deve ser o principal parâmetro na aplicação das medidas na Vara da Infância e Juventude. Obedecidos os critérios legais, as auto- ridades devem procurar as medidas mais adequadas à proteção da criança e do adolescente. Na mesma trilha, o TJMS: “Ademais, na interpretação da Lei nº 8.069/90 levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento. (Art. 6º.) Veja-se a lição de Válter Kenji Ishida (10. ed., São Paulo: Atlas, 2009, p. 13): ‘As normas do Estatuto da Criança e do Adolescente tencionam à proteção de direitos fun- damentais da criança e do adolescente, adotando-se a doutrina da proteção integral. O Estatuto da Criança e do Adolescente, nesse ponto, como um micros- sistema jurídico, cria mecanismos de amparo e proteção à criança e ao adolescen- te, garantindo-lhes instrumentos efetivos de defesa’ (MS nº 5.105, j. 23.4.2012).” Interpretação pelo Superior Tribunal de Justiça. Impõe-se citar pela assunção de posição vanguardista, a interpretação assumida pelo STJ principalmente no 20 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova vínculo de parentesco entre pai e filho. Anteriormente, referida corte já ensinava que: “Na linha de precedente desta Corte, a legislação que dispõe sobre a prote- ção à criança e ao adolescente proclama enfaticamente a especial atenção que se deve dar aos seus direitos e interesses e à hermenêutica valorativa e teleológica na sua exegese” (RSTJ 120/341). Nessa linha, altera a coloração processual do paradigma da condição da ação inserta na possibilidade jurídica do pedido. Admissão da investigação de paternidade ou maternidade socioafetiva. Para a Min. Nancy Adrighi, (REsp 1189663/RS, DJE 15-9-2011), é possível a investiga- ção baseada na posse de estado de filho. A investigação de paternidade não se limita ao reconhecimento forçado do vínculo biológico. A verdade sociológica se sobrepõe à verdade biológica. Interessa precisar qual o tipo de método científico a embasar a decisão da relatora. No caso específico, a mesma mencionou a ana- logia. Trata-se verdadeiramente de um método de integração diante da falta de normatização. Não seria uma interpretação porque essa pressupõe a existência da lei em que, p. ex., implicitamente estaria o caso sub judice. 2 Interesse do menor escudado em fins ilegítimos ou imorais Não deve prevalecer. Nesse sentido: José Luiz Mônaco da Silva (1995:22). 3 Interpretação da lei visando à guarda para fins previdenciários Admitiu-se em decisão do TJSP a concessão da guarda para fins do art. 33, § 3º, tendo em vista a necessidade de cuidados urgentes: “Guarda. Recurso: Apelação Cível 15350-0. Origem: Campinas. Órgão: C. Esp. Rel. Lair Loureiro. Data: 5-11-92. Decisão: Lei: ECA, art. 33 – Menor– Guarda – Postulação com vistas a fins previdenciários – art. 33 do ECA – ADM – Menor que necessita de cuidados urgentes para sua sobrevivência – aplicação do art. 6º do ECA –recurso provido. Recomenda o art. 6º que, na interpretação desta lei devem ser le- vados em conta os fins sociais a que ela se dirige e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoa em desenvolvimento.” 4 Adoção à brasileira e interesse da criança O TJSC analisou caso de recém-nascida que foi entregue a um casal pela genitora e registrou diretamente a criança em seu nome. Como a hipótese foi descoberta pela Polícia Judiciária, o casal ingressou com pedido de adoção. O órgão do MP, discordando, ingressou com ação constitutiva negativa cumulada com busca e apreensão. O juiz de primeiro grau acatou o pedido e determinou o abrigamento da menor em entidade. Discordando, o casal agravou, afirmando Art. 6º 21 2a Prova que a menor deveria ficar com o mesmo, tendo em vista as boas condições. A referida corte deu provimento ao agravo, mencionando: “O conjunto probatório evidencia que a menor, em tese, está recebendo dos agravantes todos os cuidados necessários que uma pessoa de tenra idade carece (...) Nesse enfoque, sobreleva-se o interesse da menor, levando-se em consideração o disposto no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil e, em especial no art. 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente, que dispõe: “Na interpretação desta lei, levar- -se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os di- reitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.’ ” Comentando o referido artigo, Válter Kenji Ishida adverte: “O artigo em tela menciona a forma como se deve interpretar o Estatuto. O fim social é o de proteção integral da criança e do adolescente e o bem comum é o que aten- de aos interesses de toda a sociedade. Os direitos e deveres individuais e coletivos são elencados no ECA, relativos à criança e ao adolescente. Entendemos que ‘a condição peculiar da criança e do adolescente’ deve ser o princi- pal parâmetro na aplicação das medidas na Vara da Infância e Juventude. Obedecidos os critérios legais, as autoridades devem procurar as medidas mais adequadas à prote- ção da criança e do adolescente. Em caso específico de procedimento, os genitores pleitearam a busca e apreensão de seu filho que estava sob a guarda de tio do mesmo. O termo de guarda estava expirado, mas o menor estava há mais de dois anos sob os cuidados do tio. Assim, a interpretação literal levaria ao deferimento do pedido dos genitores. Contudo, uma análise à luz da norma levaria a outro entendimento, posto que, sob a vigência do Estatuto, prevalece a avaliação e a situação do menor e, consequentemente, a decisão deve ser balizada sem- pre em seu favor” (Estatuto da criança e do adolescente. São Paulo: Atlas, 1998, p. 28). A razão de ser do dispositivo não deve ser considerada isoladamente, mas sim de forma teleológica, atendendo-se ao real propósito do legislador, que consiste na satisfação dos superiores interesses da criança, de forma a lhe proporcionar bem- -estar moral, material e psicológico.” (TJSC – AI 2004.007632-0 – Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato – j. 29-10-2004.) 24 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova ção da justiça da infância e da juventude (Capítulo II), os procedimentos (Capí- tulo III), o sistema recursal (Capítulo IV), o Ministério Público (Capítulo V), o advogado (Capítulo VI) e a proteção judicial dos interesses individuais, difusos e coletivos. Finalmente, o Título VII prevê os crimes e as infrações administrativas. A lei menorista passou inicialmente por elencar na Parte Geral os direitos fundamentais da criança e do adolescente, introduziu a regra da proteção inte- gral, determinou regras eminentemente administrativas baseadas no poder de polícia e finalmente estabeleceu instrumentos para a garantia da efetivação des- ses direitos fundamentais da criança e do adolescente na Parte Especial. Do pon- to de vista constitucional, o ECA elencou os direitos e depois passou a disciplinar as garantias, ou seja, os instrumentos para efetivação desses direitos. Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendi- mento pré e perinatal. § 1º A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento, segun- do critérios médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de regionalização e hierarquização do Sistema. § 2º A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico que a acompanhou na fase pré-natal. § 3º Incumbe ao Poder Público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele necessitem. § 4º Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal. § 5º A assistência referida no § 4º deste artigo deverá ser também prestada a gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção. 1 Comentários A criança e o adolescente, como sujeitos de direito, desfrutam de direitos fundamentais. Um deles é o próprio direito à saúde. Desde a vida intrauterina, já se inicia o processo de construção de sua personalidade. Esse direito inclui uma fase anterior que é a gestação e o parto, constituindo-se em próprio direito da criança a nascer, o atendimento pré-natal e perinatal, ou seja, antes, durante e depois do nascimento, regra esta prevista no caput do art. 8º. O período pré- -natal vai do momento da fecundação e se estende durante o tempo de gravidez (40 semanas). O período perinatal imediato vai do trabalho de parto até as pri- meiras 48 horas. O § 1º cuida do atendimento à gestante. O § 2º disserta sobre o parto. Trata-se de um verdadeiro direito do nascituro. De modo simplório, o atendimento pré-natal e perinatal colaboram com a diminuição da mortalidade infantil. Cite-se como exemplo o diagnóstico precoce de doenças e a possibilida- de de tratamento. 2a Prova Art. 8º 25 O direito abrange todas as classes econômicas no país e no caso das mais carentes, a universalização desse direito deve ser garantido pelo SUS. Enfim, trata-se de se buscar uma gravidez sadia, garantindo o direito à saúde do nasci- turo. Esse direito é estendido à gestante internada em razão de ato infracional. Em razão da Lei nº 12.594/12, deve haver local adequado para atendimento da gestante adolescente no caso de emergência e impossibilidade de deslocamento ao hospital. Assistência psicológica. A Lei nº 12.010/2009 inseriu o dever de assistência psicológica à gestante e à mãe, no período pré-natal e pós-natal. Um dos motivos é prevenir ou minorar os efeitos do estado puerperal. O CP prevê como elementar do crime do infanticídio (art. 123), o estado puerperal. Esse pode ser definido como a perturbação psíquica sofrida pela mãe decorrente do parto que pode levar a impulsos homicidas (Ishida, Curso de direito penal, p. 229). Deriva do princípio da responsabilidade primária e solidária do poder público. Assistência psicológica para entrega do filho para adoção (§ 5º). A anuência para a adoção do filho deve ser feita com transparência e tranquilidade. Não deve ser feita de modo impulsivo. Assim, mister que nessa fase seja feito um acompanhamento psicológico para que a genitora possa decidir de forma serena. Em 2012, existiu caso de adolescente de origem boliviana que por receio do rigor do seu genitor, abandonou sua filha em estabelecimento comercial. São situações como essa que exigem um acompanhamento psicológico da mãe. 2 Ação de obrigação de fazer contra a gestante Como foi dito acima, o tratamento prenatal e perinatal se constituem em verdadeiro direito do nascituro. Há gestantes em verdadeira situação de risco, ci- tando-se como exemplos o uso de drogas e a pessoa portadora de HIV. Os agentes de saúde acompanham a evolução da gestante e no caso de omissão da mesma, devem comunicar ao Conselho Tutelar. Este órgão realiza o contato e na conti- nuação da omissão no tratamento, deve levar o caso ao órgão ministerial. Nesse ponto, qual é a conduta do membro do Parquet? Alguns promotores da infância e da juventude, como é o caso de Praia Grande (SP), tem ofertado ação de obriga- ção de fazer contra a gestante, sendo essa obrigação a de comparecer ao serviço hospitalar. Deferido o pedido pelo magistrado, incumbe ao oficial de justiça, com toda cautela e conhecimento, levar a gestante ao referido tratamento (v. modelo de ação ao final no anexo). 3 Omissão do governo do estado ao art. 8º do ECA Cabe ação civil pública de obrigação de fazer. Em Proteção integral, da Asso- ciação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e Juventude 26 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova (1996:12), noticiou-se ação cautelar do Ministério Público do Estado do Amazo- nas, visando garantir o atendimento normal das gestantes. Isto porque o socorro às gestantes tornara-se precário em decorrência do repentino corte de pessoal. Requereu o MP que o Estado apresentasse, em 72 horas, plano emergencial, sob pena de, não o fazendo, serem determinadas judicialmente a contratação de pes- soal pelo Regime Especial de Trabalho e a realização do contrato de direito públi- co com maternidade da rede privada para atendimento de todas as parturientes. Deferido o pedido liminar, o governo, no prazo estabelecido, apresentou propos- ta. Esta objetivou regularizar o atendimento por meio da relotação de servidores públicos à rede privada. 4 Princípio da prioridade absoluta e do direito à vida e a permissão do aborto do art. 128 do Código Penal A criança e o adolescente possuem direito à vida, incluindo o direito ao nas- cimento, inclusive como preceito constitucional (art. 227 da CF). Todavia, exis- te norma infraconstitucional (o art. 128 do CP) permitindo em duas hipóteses o aborto. Nessa hipótese, haveria inconstitucionalidade da norma permissiva? Na primeira hipótese, o aborto em decorrência do perigo de vida da gestante, parece-nos que não. Com efeito, o chamado aborto necessário ou terapêutico constitui-se em verdadeiro estado de necessidade. Nessa hipótese, utilizando-se a técnica penal, haveria um conflito de bens jurídicos, a vida da gestante (bem considerado maior) e a vida intrauterina (bem considerado menos relevante), que justificaria a desobediência ao texto constitucional. Nessa hipótese, existirá o próprio direito à vida da gestante garantido pelo art. 5º, caput da Carta Magna. Outrossim, na hipótese do aborto sentimental, não existe propriamente o cha- mado estado de necessidade a justificar a supressão da vida intrauterina. Não existiria uma proporção entre o bem suprimido (vida intrauterina) e o bem so- brevivente (dignidade da gestante). Nesse aspecto, a falta de proporcionalidade levaria ao entendimento da inconstitucionalidade da norma do art. 128, II, do Código Penal. Art. 9º O Poder Público, as instituições e os empregadores propiciarão as condi- ções adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de mães submetidas a medida privativa de liberdade. 1 Comentários O direito de amamentar é garantia constitucional, como se infere do inciso L do art. 50 da CF. A previsão internacional incidiu sobre a Declaração de Innocenti Art. 11 29 2a Prova 4.1 Escopo da declaração Na Apelação 812.615/0; 9ª Câmara; Comarca de Garça; extinto Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo; Apelante: L. K.; Apelado: Ministério Público, men- cionou-se o verdadeiro objetivo do art. 10, IV, do ECA: “Por outro lado, mister se faz ressaltar que a declaração a que se refere o art. 10, inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente, deve ser fornecida à parturiente ou seu responsável, em benefício da criança e não da genitora. Por isso mesmo tal questão está tratada no Estatuto da Criança e do Adolescente e incluída no Capítulo que trata do ‘direito à vida e à saúde’. O legislador entendeu de inserir tal dispositivo, para permitir que os genitores, por mais simples que possam ser, tenham, por escrito, dados de interesse médico, para os acompanhamentos que se fizerem necessários, no desenvolvimento da criança.” 5 O inciso V Finalmente, o inciso V trata da necessidade de alojamento conjunto da geni- tora junto ao neonato, para melhor adaptação deste. Art. 11. É assegurado atendimento integral à saúde à criança e ao adolescente, através do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde. § 1º A criança e o adolescente portadores de deficiência receberão atendimento especializado. § 2º Incumbe ao Poder Público fornecer gratuitamente àqueles que necessita- rem os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilita- ção ou reabilitação. 1 Comentários Contempla o art. 11 o atendimento integral do menor com relação ao SUS, devendo esse dispositivo ser colocado em prática pelas autoridades. O dispositivo cuida no § 1º de proteção da criança e do adolescente portadora de deficiência. O Decreto nº 6.949/2009 promulgou a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência. A Lei nº 11.185, de 7 de outubro de 2005, alterando o caput do art. 11, substitui a expressão atendimento médico por atendimento integral à saúde. Este último conceito é muito mais amplo, não se limitando apenas ao atendimento médico, mas também a todo cuidado atinente à saúde da criança e do adolescen- 30 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova te. Assim, inclui-se o tratamento odontológico. Trata-se de compatibilização com a doutrina da proteção integral (art. 1º) e do direito à saúde (art. 7º), já que a saúde bucal constituiu-se em importamento elemento da saúde em geral. 2 Legitimidade do Ministério Público na defesa do interesse individual homogêneo da saúde da criança e do adolescente A falta de fornecimento adequado de medicamento ou prótese pode ser re- clamada pelo menor ao Promotor de Justiça que poderá entrar em contato com o nosocômio, por exemplo, para que o hospital providencie o remédio ou próte- se. Em última análise, pode gerar ação civil pública pela omissão da autoridade competente. Embora não trate especificamente da saúde infanto-juvenil e sim de uma idosa, o STF, contrariando decisão do TJRS, entendeu que o MP esta- dual possui legitimidade na área da saúde e do direito individual homogêneo em razão do disposto no art. 129 da CF que atribui ao MP a fiscalização do cum- primento dos direitos assegurados na CF (RE 407902, DJ 27-8-2009). Pode ser denominado como um verdadeiro leading case porque diante de tanta polêmica e de confronto com o Poder Executivo, tal decisão serve como um paradigma para as demais decisões. Melhor seria que tal decisão fosse disciplinada através de Súmula Vinculante. 3 Interpretação do § 2º Dispõe o § 2º, o seguinte: “Incumbe ao poder público fornecer gratuitamente àqueles que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação.” Medicamento é substância que, devi- damente manipulada, se aplica ao organismo doente com o fim de o curar. Pró- tese é adição artificial que tem por fim substituir um órgão de que se faz ablação ou amputação parcial ou total. Outro recurso relativo ao tratamento é a chamada interpretação analógica, abrangendo qualquer outro tipo de atividade médica ou odontológica. A necessidade se refere à hipossuficiência, isto é, a carência de recursos financeiros da criança ou adolescente e de seus pais ou responsável. O parágrafo fala da responsabilidade do poder público. Este representa o poder responsável pela administração pública, no caso o Poder Executivo. A letra da lei não faz distinção se a responsabilidade é do poder executivo municipal, estadual ou federal, concluindo-se portanto que há responsabilidade solidária dos três entes. Assim, no caso do SUS, o sistema regionalizado e hierarquizado implica na responsabilidade do ente federal, estadual ou municipal, não havendo porque somente se responsabilizar o Município. Essa questão ficou bastante destacada no Processo 2010.53.01.001553-7 da 10ª Vara Federal do Rio de Janeiro, que decidiu pela responsabilidade da Prefei- Art. 11 31 2a Prova tura, do Estado do Rio de Janeiro e da União para fornecimento de equipamento de oxigenoterapia. No caso em questão, a Advocacia-Geral da União argumentou que não possuía a União essa atribuição e a Procuradoria-Geral do Município do Rio de Janeiro afirmou que devido ao alto custo, competeria ao Gestor Federal e à Secretaria do Estado de Saúde providenciar tal equipamento. A demora no atendimento acabou por levar à morte referido adolescente em 9 de agosto de 2010 (Revista Época, nº 643, 13 de setembro de 2010). Isso demonstra que além de previsão legal do direito fundamental da criança e do adolescente, da previsão legal de instrumento (ação), deve existir efetividade na decisão, de modo que o ente público seja obrigado a cumprir com rapidez a determinação judicial. A obrigação do Poder Público em fornecer o medicamento, prótese e outro recurso relacionado ao tratamento de criança e de adolescente foi apreciada em medida cautelar confirmada pelo TJSC e pelo próprio STF: “Agravo Regimental interposto no Agravo de instrumento nº 96.012721-6, de Araranguá. Rel. Des. Xavier Vieira. Saúde. Distrofia muscular de Duchene. Lesão progressiva das fibras musculares. Patologia incurável. Morte prematura. Expectati- va de vida em torno de vinte anos. Tratamento em clínica especializada nos Estados Unidos. Transplante de células mioblásticas. Controvérsia científica quanto aos re- sultados. Menor impúbere. Família de escassos recursos materiais. Recusa do Estado em custear o tratamento. Constituição da República (arts. 227, caput, 196 e 198). Carta Estadual (art. 153). ECA (arts. 4º, parágrafo único, d, 7º e 11, § 2º). SUS (Lei nº 8.080/90, art. 2º). Recurso Provido. Unânime. ‘Sendo a saúde ‘direito de todos e de- ver do Estado’ (CF, art. 196; CE, art. 153), torna-se o cidadão credor desse benefício, ainda que não haja serviço oficial ou particular no País para tratamento reclamado. A inexistência de previsão orçamentária própria é irrelevante, não servindo tal pre- texto como escusa, uma vez que o Executivo pode socorrer-se de créditos adicionais.’ Referida decisão do TJSC foi mantida pelo Exmo. Sr. Ministro Celso de Mello do STF: ‘Petição nº 1.246-1 – Santa Catarina (Medida Liminar). Rel. Ministro-Presidente – Requerente: Estado de Santa Catarina, Adv.: PGE-SC João Carlos Von Hohen-dorff, Requerido: J. B. G. C.’ Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como di- reito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo – uma vez configurado esse dilema – que razões ético-jurídicas impõem ao julgador uma só e possível opção: o respeito inde- clinável à vida.” 4 Atendimento médico e transplante de medula O TFR da 3ª Região entendeu cabível em apreciação de agravo sobre tutela antecipada a decisão que ordenou a internação no Hospital da Universidade Fe- deral de Curitiba de menor que necessitava de transplante de medula: 34 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova políticas públicas, inclusão de famílias em programas oficiais de auxílio e assistência social (v. g., art. 23, parágrafo único, do ECA), obrigatoriedade de oferta eficiente e regular de serviços públicos obrigatórios, dentre outros.’ (Estatuto da Criança e do Adolescente – 10. ed. – Atlas, 2009, p. 146). E diante da necessidade de providên- cia de medida específica de proteção, se abre, entre outras hipóteses, a requisição de tratamento médico (art. 101, ECA), a qual pode ser dirigida a quaisquer dos entes estatais, não só pela abrangência do termo “Estado”, presente no art. 196, da Constituição Federal, mas também por constar no rol dos serviços públicos e pelo que determina explicitamente o Estatuto da Criança e do Adolescente, verbis: “Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comuni- tários. Parágrafo único. São também princípios que regem a aplicação das medidas [...] III – responsabilidade primária e solidária do poder público: a plena efetivação dos direitos assegurados a crianças e a adolescentes por esta Lei e pela Constituição Federal, salvo nos casos por esta expressamente ressalvados, é de responsabilidade primária e solidária das 3 (três) esferas de governo, sem prejuízo da municipaliza- ção do atendimento e da possibilidade da execução de programas por entidades não governamentais; Dessa maneira, não há que se falar que não seria o Município parte legítima para figurar na presente lide, frente às disposições constitucionais e legais aplicáveis ao caso” (Agravo Regimental em Agravo – Nº 2010.008606-3/0001-00, j. 22.4.2010).” 7 Obrigação de transporte para o tratamento do menor O § 2º estipula o direito da criança ou adolescente portador de deficiência ao tratamento. É entendimento majoritário que tal obrigação cabe ao Município. Em hipótese de menor portador de síndrome de down e que necessitava de transporte para se submeter ao tratamento especializado, o STJ confirmou a obrigação do Poder Executivo Municipal na obrigação em providenciar transporte especializa- do e gratuito (REsp 937.310-SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 9-12-2008). 8 Legitimidade do Ministério Público: ação civil pública e fornecimento de medicamentos O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública obje- tivando o fornecimento de remédio pelo Estado. No RE 407902/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 26-5-2009, o STF assentou que é função institucional do parquet zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pú- blica aos direitos assegurados na Constituição, promovendo medidas necessárias a sua garantia (CF, art. 129, II). Art. 12 35 2a Prova 9 Possibilidade de bloqueio de verba pública para garantia de fornecimento do medicamento Foi ratificada pelo STF, na repercussão geral em RE nº 607.582-RS, tratando- -se de jurisprudência firmada pela referida Corte. Também com fulcro no art. 461, § 5º, do CPC, O STJ admitiu: “O bloqueio de valores na conta-corrente do Esta- do, embora possa parecer mais rigoroso, apresenta-se como medida menos onerosa do que a imposição da multa diária” (REsp 868.038/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 27-5-2008, DJe 12-6-2008). 10 Gasto com filho adolescente com leucemia: hipótese de força maior Analisando embargos de genitor que alegava impossibilidade de cumprir com o pagamento de dívida em razão de doença de filho adolescente que con- traiu leucemia, o TJSP acatou tal entendimento, amoldando-o à hipótese de for- ça, elidindo a mora: “EMENTA: Embargos à execução hipotecária rejeitados liminarmente (art. 739, II, do CPC). Inconformismo dos embargantes firme nas teses de que (1) suportaram cerceamento de defesa, e (2) os gastos com o tratamento médico de seu filho que faleceu em virtude de leucemia ainda na juventude, foi a causa do inadimplemento – Acolhimento – Descaracterização da mora diante de fato que não pode ser imputado aos embargantes – Aplicação do art. 963, do CC/16 – Exclusão da cobrança de juros moratórios e multa contratual no período de junho/02 a outubro/04 – Sucumbên- cia a cargo do embargado – Matéria preliminar rejeitada – Recurso parcialmente provido, com observação. A grave doença de um filho acometido por leucemia e que em virtude dela faleceu é fato que desconcerta a vida financeira de qualquer família e serve para caracterizar o caso fortuito, permitindo o afastamento da mora dos devedores no período da moléstia” (Apelação com revisão nº 991.06.054960-3, j. 30-9-2010). Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. 1 Comentários Dentre os direitos fundamentais da criança e do adolescente, inclui-se o di- reito à saúde, que inclui o direito à internação junto a um dos genitores ou res- ponsável legal. É inegável que a presença da mãe ou do pai traduz em uma maior 36 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova proteção, além da própria fiscalização do atendimento hospital. Nesse sentido, a Lei nº 5.831/2010 do Estado do Rio de Janeiro obriga os hospitais a colocarem na portaria, recepção, pronto-socorro, pediatria e entrada da ala de internação, cartaz com os seguintes dizeres: “De acordo com o artigo 12 da Lei 8.069, de 13 de Julho de 1990 – Estatuto da Criança do Adolescente, é direito do pai, mãe ou responsável permanecer em tempo integral nos casos de internação de sua criança ou adolescente, e dever do hospital proporcionar condições para esta permanência.” Sobre a referida norma, dispõe a Constituição do Estado de São Paulo: “Art. 278 ............................ VII – nos internamentos de crianças com até doze anos nos hospitais vinculados aos órgãos de administração direta ou indireta, é assegurada a permanência da mãe, também nas enfermarias, na forma da lei.” (grifo nosso) 2 A definição técnica de responsável José Luiz Mônaco da Silva (1994:29) define o termo responsável: “é a pessoa que, não sendo pai nem mãe, zela pela criação e educação do menor, suprindo-lhe com regularidade suas necessidades básicas, mesmo que não tenha as- sumido em juízo encargo de tal envergadura.” Nessa ampla interpretação, incluem-se o tutor, o curador e o guardião legal e o de fato. Não se confunde com a noção de representante legal, que é munido do poder familiar e, portanto, somente localizado na figura do pai ou do tutor. Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigato- riamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais. Parágrafo único. As gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente encaminhadas à Justiça da Infância e da Juventude. 1 Comentários A criança e o adolescente possuem direito à preservação da sua integridade física, psíquica e intelectual. A noção de maus-tratos tem sido ampliada, passan- Art. 16 39 2a Prova II – opinião e expressão; III – crença e culto religioso; IV – brincar, praticar esportes e divertir-se; V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; VI – participar da vida política, na forma da lei; VII – buscar refúgio, auxílio e orientação. 1 Comentários A liberdade é a faculdade que uma pessoa possui de fazer ou não fazer algu- ma coisa. Envolve sempre um direito de escolha entre duas ou mais alternativas, de acordo com a vontade própria. Um indivíduo é livre para fazer tudo o que a lei não proíbe. Trata-se na lição de José Afonso da Silva, da chamada “liberdade de ação”, que embora não explicitada no comando do art. 16, é denominada “liber- dade-base”. O conteúdo desse direito não abrange todas as chamadas liberdades objetivas, como a liberdade de iniciativa econômica (Comentário ao art. 16, in ECA comentado, Coord. Munir Cury, p. 87). No caso da criança e do adolescente, há uma compatibilização com a doutri- na da proteção integral, abrangendo os seguintes direitos: (I) direito de ir, vir e estar nos logradouros públicos (espaços ao ar livre para uso público, como as praças). Logradouro público é a denomi- nação genérica de qualquer via, rua, avenida. Já espaço comunitário possui o sentido de utilização institucional. Inclui igrejas, escolas etc. Quanto aos lugares privados, estes dependem do consentimento do titular do bem. Esse direito também não é ilimitado, ficando sujeito à autorização dos pais ou responsável e também no que concerne à dis- ciplina do Poder Público quanto às diversões públicas. Tal liberdade é amparada por habeas corpus (José Afonso da Silva, ob. cit., p. 89-90); (II) o direito à opinião e expressão. A opinião compreende o pensamento e a manifestação do pensamento. Já a expressão abrange a ativida- de intelectual, artística, científica e de comunicação. Abrange ainda este tema a liberdade na expressão da convicção filosófica e política (José Afonso, ob. cit., p. 90); (III) direito a crença e culto. A liberdade de crença compreende o direito de escolha da religião e também o próprio direito de descrença. Já o culto compreende a exteriorização da crença. Cabe aos pais ou responsável, dentro da própria educação, a orientação religiosa dos seus filhos (José Afonso, ob. cit., p. 91). Mas cabe aqui, e essa é uma situação difícil, que os pais ou responsável respeitem outra opção de crença da criança ou do adolescente; 40 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova (IV) direito de brincar, praticar esportes e divertir-se. Brincar faz parte do universo da criança. Cabe aos pais ou responsável dosar a atividade de estudar com a lúdica. Inclui ainda a prática de esporte e também o acesso à diversão; (V) direito à participação da vida familiar e da comunidade. A atual nor- tização do ECA prevê a família natural e extensa. A criança e o ado- lescente também possuem direito à convivência na comunidade sem discriminação; (VI) direito de participar da vida política De uma forma genérica, a crian- ça e o adolescente possuem direito à atuação política, como p. ex. com as associações estudantis. Em sentido estrito, a participação ocorre aos 16 anos com o alistamento eleitoral e a filiação partidária (CF, art. 14, § 1º, II, c e Lei Orgânica dos Partidos Políticos, art. 64, § 3º) (José Afonso, ob. cit., p. 93). (VII) direito ao refúgio, ao auxílio e à orientação. Refúgio significa local seguro. Isso permite que a criança e o adolescente saiam até da sua família em caso de necessidade, como p. ex. a violência física. Já o auxílio e orientação constituem-se em direito de amparo tanto no âmbito familiar, como no da comunidade e da sociedade. Rol do art. 16 do ECA. Para Marçura, Cury e Garrido de Paula (1991:20), a re- lação do art. 16 é apenas exemplificativa, não sendo, portanto, exaustiva, poden- do existir outras formas de expressão do direito à liberdade. No mesmo sentido, José Afonso da Silva (ob. cit., p. 87), para quem o legislador apenas explicitou os aspectos da mais direta pertinência. 2 Direito de visitas da criança e do adolescente aos avós Segundo o entendimento jurisprudencial, os avós também possuem direito de visitar os netos: “MENOR – Visitas – Retirada dos menores, de casa, para visitarem os avós – In- compatibilidade com o pátrio poder (poder familiar) – Inocorrência – Visita dos avós que não subtrai nenhuma das competências previstas no artigo 384 do Código Civil – Privação, dos menores, do convívio com a agravada que ofende a Lei nº 8.069/90 no seu artigo 16, I e V – Recurso não provido. É evidente que os avós têm o direito de se avistarem com os netos, direito, este, que se ancora na solidariedade familiar e nas obrigações do parentesco.” (TJSP – Rel.: Gonzaga Franceschini – Ag. Inst. nº 210.582-1 – Ribeirão Preto – 21-06-94.) Esta decisão possui interesse peculiar porquanto altera o ângulo de observa- ção das crianças e dos adolescentes. De objeto do pedido de guarda (dos pais), passam a ser sujeitos de direito, tendência essa assimilada pela Lei nº 12.010/09. 2a Prova Arts. 17 e 18 41 No caso em testilha, tal decisão refere-se ao direito à liberdade da criança e do adolescente previsto no art. 15 do ECA. O art. 16 do mesmo texto legal prevê o direito à liberdade o direito de ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais (inciso I) e de participar da vida familiar e comunitária, sem discriminações (inciso V). O direito de visita dos avós é simultaneamente um direito à liberdade da criança e do adolescente, subsumido no direito de ir e vir e, ainda, de participar da vida familiar. Este direito, de modo algum, contrapõe-se ao direito ao pátrio poder dos genitores expresso no art. 1.634 do CC. Como já se sabe, ao contrário do conceito romano de poder familiar, o conceito hodierno de poder familiar abrange direitos e deveres dos pais em relação aos filhos, incluindo, no caso, a preservação do direito da criança e do adolescente de se avistarem com os avós. Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da ima- gem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. 1 Comentários Um dos direitos básicos assegurados tanto à pessoa e em especial à criança e ao adolescente é o direito ao respeito, visando à manutenção da integridade física, psíquica e moral. A acepção jurídica de respeito é de tratamento atencioso tendo como destinatário final a criança e o adolescente. Para tanto, são mencio- nados no ECA dispositivos que buscam manter esta integridade. Dessa forma, a preservação da imagem é mantida, por exemplo, na hipótese de proibição de fotografias de adolescentes apreendidos por ato infracional. Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexa- tório ou constrangedor. 1 Comentários Como princípio fundamental do Estado Democrático de Direito, a dignidade da pessoa humana, juntamente com o direito à vida e à liberdade, são garantias individuais asseguradas pela Constituição Federal de 1988 (art. 1º, III) e trans- portadas para o ECA. A dignidade é um atributo da pessoa, no caso específico, da pessoa em desenvolvimento: a criança e o adolescente. O ECA tenta com este 44 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova 1 Comentários A Lei nº 13.010, de 26 de junho de 2014, após disciplinar as pessoas respon- sáveis e também as formas de agressão (física ou mental), passou a estabelecer as medidas cabíveis a estes responsáveis. Ao invés de se remeter ao art. 101 desta lei menorista, preferiu elencar o rol de medidas, incluindo: I – o encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família; II – o encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; II – o encaminhamento a cursos ou programas de orientação; IV – a obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado (deveria ter incluído o adolescente); V – a advertência aos pais e aos demais elencados nos arts. 18-A e 18-B. Prevê o art. 18-B a atribuição admi- nistrativa do Conselho Tutelar para aplicação da referida medida. É lógico que se despida de êxito, deve o Conselho Tutelar encaminhar relatório ao Ministério Público para eventual ação que o parquet entender cabível. Capítulo III DO DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA Seção I DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. § 1º Toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhi- mento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 6 (seis) meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de forma funda- mentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família subs- tituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei. § 2º A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada ne- cessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária. § 3º A manutenção ou reintegração de criança ou adolescente à sua família terá preferência em relação a qualquer outra providência, caso em que será esta incluída em programas de orientação e auxílio, nos termos do parágrafo único do Art. 19 45 2a Prova art. 23, dos incisos I e IV do caput do art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art. 129 desta Lei. § 4º Será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo respon- sável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial.” (NR) 1 Comentários Direito à convivência familiar. Pode ser conceituado atualmente como o direito fundamental da criança e adolescente a viver junto à sua família natural ou subsidiariamente à sua família extensa. Trata-se de uma ampliação do previsto no art. 9º da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989) que prevê o direito da criança em não ser separada dos pais contra a vontade dela. O Título I do ECA abarca os chamados direitos fundamentais da criança e do adolescente. O Capítulo III por sua vez, prevê o direito à convivência familiar e comunitária. A garantia da convivência familiar se perfaz através de dois princípios basilares: o da proteção integral e o da prioridade absoluta. A entidade familiar dispõe de proteção consti- tucional, já que o art. 226 da Carta Magna especifica proteção especial pelo Estado da família. Esta possui um conceito dilatado, abrangendo a união estável (art. 226, § 3º) e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (art. 226, § 4º). A própria Declaração Universal dos Direitos do Homem já dispu- nha em seu art. XVI, 3, que a família é o núcleo natural e fundamental da socieda- de. Finalmente, a Lei nº 12.010/09 elegeu a família natural como prioridade (art. 1º, § 2º), entidade a qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada a absoluta impossibilidade, devendo existir decisão judicial fundamentada. Assim, nos procedimentos da infância e juventude, a preferência é sempre de mantença do menor junto aos genitores biológicos. Na impossibilidade, existe a colocação em acolhimento familiar ou institucional (§ 1º). Somente após acompanhamento técnico-jurídico verificatório da inexistência de condições dos genitores, inicia-se a colocação em lar substituto. As expressões forenses utilizadas são família natural para aquela originada dos genitores biológicos; familia extensa, para aquele grupo maior, formado também por parentes com afinidade e afetividade e família substi- tuta para aquela concretizada pela guarda, tutela ou adoção. A criança ou adolescente tem direito de ser criado em ambiente livre de en- torpecentes, podendo, no caso, ser adotada a medida do art. 130 do ECA (afas- tamento do genitor ou do responsável legal). As atividades de prevenção do uso indevido de drogas relativas à criança e ao adolescente deverão se compatibilizar com as diretrizes do CONANDA (art. 19, parágrafo único da Lei nº 11.343/06). A razão de tal especificidade (p. ex. poder-se-ia dizer apenas ambiente sadio) foi a participação da sociedade na redação do ECA, com pessoas que efetivamente constataram a convivência da criança e do adolescente com usuários de drogas. 46 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova Silvio Rodrigues, anotando que a expressão não constava do projeto original, entende que a menção é supérflua (Comentário ao art. 19 do ECA, in ECA comen- tado, Coord. Munir Cury, p. 108). Direito à convivência com a mãe ou pai privado de liberdade. A Lei nº 12.962, de 13 de julho de 1990, assegurou no § 4º, inserida no direito à convivên- cia familiar, o direito de visita da criança ou do adolescente ao genitor ou geni- tora privado de liberdade. Inclui, nesse caso, a prisão cautelar e o cumprimento, mesmo que provisório, de regime fechado ou semiaberto. Esse direito será viabi- lizado por meio do responsável (não se exigindo cumprimento de formalidade, bastando que seja responsável de “fato”) ou no caso de acolhimento institucional da criança ou do adolescente, através da entidade, dispensando a autorização judicial. O art. 41, X, da LEP prevê com direito a visita, o cônjuge, a companheira, parentes e amigos em dias determinados. Trata-se no caso de um direito líquido e certo da criança ou do adolescente, já que é notório que, em muitos casos, os estabelecimentos penitenciários vedam o acesso de menores de 18 anos. Nesse caso, p. ex., a SAP deverá regulamentar essas visitas. Direito à convivência comunitária. Além do direito à convivência familiar, a criança e o adolescente possuem o direito fundamental de conviver na comuni- dade, ou seja, na coletividade, abrangendo os mais variados locais, como o bairro onde residem, a escola, o clube etc. Isto para o perfeito desenvolvimento deles. A Lei nº 12.010/09 que alterou o ECA no que concerne às diretrizes da con- vivência familiar, teve como marco antecessor o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária (PNCFC). Em dezembro de 2006, o CONANDA e o Conselho Nacio- nal de Assistência Social aprovaram referido Plano de abrangência nacional, após debates e consultas públicas em todas as regiões do país, contemplando em seu conteúdo, propostas que fossem representativas das diferentes realidades viven- ciadas por crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social no Brasil. O Plano prevê ações a serem desenvolvidas pelas três esferas de governo. Muitas ações já estão em curso, devendo se constituir em um instrumento que possibilite a avaliação das políticas, programas e projetos executados, apontando as necessidades e demandas existentes para a implantação de políticas públicas prioritárias de proteção integral a crianças e adolescentes. Fundamenta-se no paradigma da proteção integral, reconhecendo a necessi- dade de preservação da família. Redes. A consecução dos objetivos da Lei nº 12.010/09 depende da criação de um suporte, com apoio de escolas, agentes comunitários etc. Isso para, na prá- tica, possibilitar a recriação de vínculos. Uma das sugestões é contactar pessoas próximas, como tios, padrinhos, vizinhos etc., identificando quais as necessidades dessas pessoas que irão fornecer suporte à criança ou adolescente. Se o tio necessita de subsídio para o transporte, a rede deverá providenciar esse suporte, como, por exemplo, para levar ao tratamento médico. Isso para evitar a eternização da crian- ça ou adolescente no abrigo. A experiência da Comarca de São Caetano do Sul-SP Art. 20 49 2a Prova 1 Comentários O dispositivo em testilha reproduz o previsto no art. 227, § 6º da Carta Mag- na, “e foi repetido no artigo 1.596 do CC” elidindo a odiosa diferenciação ante- riormente prevista, por exemplo, entre filhos legítimos (originados na constância do casamento) e ilegítimos, que acontece no caso de filhos adulterinos. Luiz Carlos de Azevedo Corrêa Júnior (1991:18) menciona a antiga diferen- ciação doutrinária: “Segundo a sistemática adotada desde a formação do direito civil pátrio, a fi- liação pode ser legítima, ilegítima ou civil. Legítimos são os filhos havidos de justas núpcias, ou seja, de homem e mulher casados entre si, ou que vierem a contrair matrimônio após o nascimento da prole (também chamados filhos legitimados pelo casamento posterior). Os filhos ilegítimos são aqueles concebidos por homem e mu- lher não casados. Filhos ilegítimos podem ser naturais ou espúrios. Naturais quando inexistir im- pedimento ao casamento de seus pais; espúrios quando houver tal impedimento. Os espúrios dividem-se em adulterinos – quando não pode haver casamento por ser casado um ou ambos os pais –, e incestuosos – quando o impedimento for motivado por parentesco. O parentesco civil é aquele que resulta de adoção. A classificação antes descrita deve ser analisada apenas no aspecto dogmático, posto que a lei proíbe quaisquer ‘designações discriminatórias relativas à filiação’ (art. 20, in fine, do Estatuto).” A CF, bem como o ECA, conforme entendeu o TJSP, admitiram a hipótese de reconhecimento de filho havido fora do casamento: “Registro civil – Assento de nascimento – Averbação de filiação – Admissibili- dade – Constituição da República/88 e Lei nº 8.069/90 que revogam dispositivos que impediam o reconhecimento de filhos não gerados pelo casamento – Pedido deferido – Recurso parcialmente provido.” (Rel. Luís de Macedo – Apelação Cível nº 205.425-1 – São Paulo – 22-3-94.) 2 Direito sucessório É idêntico ao dos filhos “legítimos, legitimados ou reconhecidos”, não vigo- rando mais os dispositivos dos arts. 368 e 1.605, § 2º do CC (v. José Luiz Mônaco da Silva, 1994:38). Todavia, em decisão da Suprema Corte, decidiu-se que a discriminação é permitida, não se ferindo o princípio da isonomia, se a sucessão ocorreu antes do advento da CF: 50 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova “Direito das sucessões. Filhos adotivos. Pretendida habilitação na qualidade de herdeiros dos de cujus. Indeferimento calculado no fato de a abertura da sucessão haver ocorrido antes do advento da nova carta, que eliminou o tratamento jurídico diferenciado entre filhos legítimos e filhos adotivos, para fins sucessórios. Alegada ofensa ao princípio da isonomia e ao art. 227, § 6º da Constituição. ‘Inconstitucionalidade inexistente. A sucessão regula-se por lei vigente à data de sua abertura, não se aplicando a sucessões verificadas antes do seu advento a norma do art. 227, § 6º, da Carta de 1988, que eliminou a distinção, até então estabelecida pelo Código Civil (art. 1.605 e § 2º), entre filhos legítimos e filhos adotivos, para esse efeito. Discriminação que, de resto, se assentava em situações desiguais, não afetando, portanto, o princípio da isonomia. Recurso não reconhecido.”’ (STF – RE nº 163.167 – Rel. Min. Ilmar Galvão.) Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. 1 Comentários: conceito de poder familiar O legislador definitivamente na Lei nº 12.010/09 decidiu se inclinar para a expressão poder familiar. O escopo da alteração foi a de salientar o exercício con- junto dos pais, mas para a doutrina, na verdade, confundiu pois parece atribuir esse poder à família. Assim, deveria ser denominado poder de proteção, poder parental ou autoridade parental (Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, Poder familiar, p. 75). Para José Luiz Mônaco da Silva (1994:39), poder familiar é “um feixe de direitos e deveres sob os quais os pais criam, educam e assistem moral e mate- rialmente os filhos menores”. Carlos Alberto Bittar Filho (RT 676:80) estipula outro conceito, considerando o exercício isonômico entre os genitores: “Dessarte, concebe-se hoje o pátrio poder – ou poder paternal – como uma mis- são confiada a ambos os pais para a regência da pessoa e dos bens dos filhos, desde a concepção até a idade adulta. É função exercida no interesse dos filhos; é mais um munus legal do que propriamente poder.” Referido autor menciona também em nota de rodapé: “3. Daí o fato de vários autores modernos acolherem a expressão ‘pátrio dever’ ao invés da expressão ‘pátrio poder’.” Art. 21 51 2a Prova Atualizando o conceito, Maciel (ob. cit., p. 76) entende que “pode ser definido como um complexo de direitos e deveres pessoais e patrimoniais com relação ao filho menor, não emancipado, e que deve ser exercido no melhor interesse deste último”. Silvio Rodrigues define como “o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados, tendo em vista a proteção destes” (ob. cit., p. 115). Segundo Josiane Rose Petry Veronese (1999:24) essa evolução ocorreu a par- tir do Código de Menores de 1927, conhecido como Código de Mello Matos. Des- vencilhando-se do conceito arcaico de pátrio poder, José Cândido Albuquerque de Mello Matos concebeu o pátrio poder como bivalente no que se refere a tutela do menor. Dessa forma, o poder do pai sobre o filho passou a ser regulado, e o Estado passou a intervir sobre esta relação. Iniciava-se, a partir daí, um processo de limitação do poder paterno sobre o filho. 1.1 Características do poder familiar Carlos Alberto Bittar Filho (RT 676/80-81) menciona as características do poder familiar : “O pátrio poder apresenta características bem marcantes: a) é um munus públi- co, id est, uma espécie de função correspondente a um cargo privado (direito-função ou poder-dever); b) é irrenunciável: dele os pais não podem abrir mão; c) é inalie- nável: não pode ser transferido pelos pais a outrem, a título gratuito ou oneroso; todavia, os respectivos atributos podem, em casos expressamente contemplados na lei, ser confiados a outra pessoa (verbi gratia, na adoção e na suspensão do poder dos pais); d) é imprescritível: dele não decai o genitor pelo simples fato de deixar de exercê-lo; somente poderá o genitor perdê-lo nos casos previstos em lei; e) é incom- patível com a tutela, o que é bem demonstrado pela norma do parágrafo único do art. 36 do Estatuto da Criança e do Adolescente.” E também o TJSC: “O poder familiar é, antes de tudo, um múnus público irre- nunciável, indelegável e imprescritível e que, em princípio, deverá ser exercitado com o maior denodo possível pelos pais, significando dizer que estes não estão à vontade para dele desistirem ou renunciarem, assim como não lhes é dado o direito de transferi-lo a outra pessoa” (TJSC, AC 172858 SC 2003.017285-8, Rel. Luiz Carlos Freyesleben, j. 8-9-2005). 2 Constituição Federal O dispositivo segue o preceito do art. 226, § 5º da CF. A decisão sobre os fi- lhos segue o princípio da isonomia, sendo exercida conjuntamente tanto pelo pai 54 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova 4 Significado da expressão “criação” e “educação” do art. 1.634, I do CC José Antonio de Paula Santos Neto (1994:108) menciona: “O dever de educar implica no atendimento das necessidades intelectuais e morais do menor, propiciando-lhe a oportunidade de se desenvolver nesses níveis. Enquanto isso, o encargo de criar abarca a obrigação de garantir o bem-estar físico do filho, proporcionando-lhe sustento, resguardando-se a saúde e garantindo-lhe o necessário para a sobrevivência.” Paulo Afonso Garrido de Paula (1995:102), por sua vez, menciona: “Criar é também educar, de sorte que o primeiro seria um dever genérico do qual o segundo seria uma de suas espécies. Educar, por outro lado, em sentido amplo, no propósito de transmitir e possibilitar conhecimentos, despertando valores e habili- tando o filho para enfrentar os desafios do cotidiano. ............................ Por fim, é de assinalar que o descumprimento indesculpável dos deveres relacio- nados à educação dos filhos faz incidir as medidas previstas no art. 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo a mais grave a destituição do pátrio poder.” 5 Ampliação do rol do Art. 1.634 do CC Silvio Rodrigues (2004:363) entende que o art. 22 do ECA ampliou o rol de obrigações, incluindo “a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”. É a hipótese de se obedecer à fixação da guarda e ao direito de visitas, inclusive quanto ao horário, local etc. É lógico que a perda ou suspensão do po- der familiar deve ser consequência de um desrespeito reiterado, não se caracte- rizando o mesmo em hipótese de eventual atraso na entrega de filho para outro genitor que detém a guarda. 6 Alienação parental Visando coibir a chamada alienação parental foi editada a Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010. Síndrome de Alienação Parental (SAP) foi termo proposto por Richard Gard- ner (Parental Alienation Syndrome vs Parental Alienation: Which Diagnosis Should Evaluators Use in Child-Custody Disputes? American Journal of Family Therapy. March 2002;30(2):93-115), no ano de 1985, para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a treinava para romper os laços afetivos com o outro cônjuge, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação ao outro Art. 22 55 2a Prova genitor. Tratava-se de uma referência às ações de guarda nos tribunais america- nos onde claramente se percebia a alienação parental. A situação já é conhecida para quem atuou em vara de família. Com o rom- pimento do casal, e havendo por exemplo algum outro motivo como o conheci- mento de novo parceiro amoroso, o outro cônjuge se mostra ressentido com a dissolução do vínculo (união estável, casamento) e passa a utilizar o filho como instrumento contra o pai ou a mãe. Comumente a situação é da mãe contra o pai, criando a situação do chamado “órfão de pai vivo”, com a mãe apagando do imaginário da criança ou adolescente, o pai. Houve até uma interpretação autêntica, sendo que o próprio legislador pro- curou conceituar o termo alienação parental no art. 2º da lei: “considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou adolescen- te sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”. O sujeito ativo nesse caso é amplo, abrangendo quem possua a autoridade (exercício do poder familiar), a guarda (direito fornecido pelo juiz para se ter a companhia) ou a vigilância (pessoa encarregada de cuidar momentaneamente da criança ou adolescente). É claro que na prática forense, irá recair precipuamente sobre os genitores que normalmente se digladiam em torno da disputa dos filhos. Contexto da alienação parental. A proteção integral da criança ou adoles- cente e a recente Lei nº 12.010/09 fortaleceram o direito fundamental à convivên- cia familiar. No estudo da lei específica que ora tratamos, o direito à convivência familiar se refere ao direito da criança ou adolescente ao convívio com ambos os pais, condenando-se a conduta de alienação parental. Portanto, o próprio direito à convivência familiar inclui o direito de permanecer com vínculos tanto com o pai como com a mãe. Trata-se não só de garantia formal do exercício do poder familiar, mas também o exercício efetivo, prático p. ex. do direito de visita. O próprio art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 12.318/2010 se incumbe de fornecer um rol exemplificativo nos seus incisos (I a VII). A situação é extraída do próprio cotidiano e se expressa na conduta de tentar retirar o outro genitor da vida do filho; interferir no direito de visitas; atacar a relação entre pai e filho e denegrir a imagem do genitor perante o filho. São consequências na criança ou adolescente alienado, um sentimento de raiva e ódio contra o genitor, contendo por vezes impressões ou ideias exageradas do mesmo. As consequências psíqui- cas incluem a facilidade na aquisição de doenças como a depressão, ansiedade, a dificuldade na obtenção de relações estáveis etc. Há estudos que anotam que 80% dos filhos de pais separados já tiveram algum tipo de alienação parental (conforme sítio www.alienacaoparental.com.br). Direito material e ação fundada em direito de convivência familiar. A prática da conduta típica de “ato de alienação parental” além de claramente ferir direito da criança e do adolescente afetando o saudável convívio familiar consti- tui conduta de abuso moral e descumprimento dos deveres inerentes à autorida- 56 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova de parental ou decorrente da tutela ou guarda (art. 3º da lei). Questão interes- sante é a lei preferir mencionar “autoridade parental” e não o poder familiar. Se se entender a autoridade parental como o exercício conjunto do poder familiar pelo pai e pela mãe, é lógico que a lei deveria ser mais técnica e clara e mencionar o descumprimento do poder familiar. De qualquer forma, seria mais um dos moti- vos que exaustivamente analisamos no comentário ao art. 24 do ECA de perda ou suspensão do poder familiar (Estatuto da criança e do adolescente, 12. ed., 2010, p. 38). Pode-se por exemplo argumentar que a alienação poderia ser provocada pela avó materna, com a existência da guarda pela mãe. Mas, nesse caso, não ca- beria logicamente a suspensão da autoridade parental, mas outra medida como a advertência. O poder familiar nesse caso estaria inegavelmente com a genitora e aí é claro que o legislador quis se referir a autoridade parental como a autoridade do pai ou da mãe o que tecnicamente implica em se falar em poder familiar. Na alienação parental distinguem-se duas pessoas. Há a figura do alienador, ou seja, aquele que determina condutas de afastamento do outro genitor, de regra a mãe e, de outro lado, o alienado, que é atingido pela alienação (geral- mente o pai). Há previsão de medida cautelar consoante o próprio art. 4º da lei como assim faz o art. 130 do ECA ou decisão incidental em outro tipo de ação. Assim, cabível decisão desse naipe em procedimento de destituição ou suspensão do poder fa- miliar ou de tutela ou ainda de alteração de guarda. Mais técnico que tal modifi- cação viesse diretamente no ECA. Uma sugestão é que esses novos dispositivos se localizassem após o procedimento de destituição e suspensão do poder familiar e de destituição de tutela, como um possível art. 164-A do ECA, já que é pacífico que os procedimentos da lei menorista aplicam-se tanto para a vara da infância e da juventude como da família. Rito: (1) petição inicial, utilizando-se subsidiariamente a norma do art. 156 e seguintes do ECA; (2) oitiva do MP e decisão sobre concessão de liminar visando à preservação da integridade psicológica da criança ou adolescente (art. 4º, caput, da Lei nº 12.318/2010) e análise da garantia do direito de visita (art. 4º, parágrafo único da referida lei); (3) citação do requerido para resposta em 10 (dez) dias, utilizando-se subsidiariamente o art. 158 do ECA; (4) decisão do juiz decidin- do sobre a realização de perícia psicológica ou biopsicossocial (art. 5º da Lei nº 12.318/2010); (5) laudo em 90 (noventa) dias (art. 5º, § 3º da Lei); (6) audiência de instrução, debates e julgamento com manifestação do requerente, do requerido e do MP; (7) sentença, podendo conter: a declaração de alienação parental e apli- cação de advertência (inciso I do art. 6º); a ampliação da convivência familiar em favor do genitor alienado (inciso II); a estipulação de multa ao alienador (inciso III); a determinação de acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial (inciso IV). Essa recomendação ocorreu na Apelação 994.092.836.029 do TJSP, julgado de 28-4-2010 em que houve confirmação da improcedência da destituição já que o caso abarcava hipótese de genitor que reatara com antiga namorada e que pro- Art. 24 59 2a Prova Tratou-se de um grande avanço. O ECA explicitamente vedou que a pobreza ou falta de recursos seja entendida como abandono pelos pais. 3 Genitora que deixa o menor com os guardiães e depois se recupera economicamente Já decidiu o TJSP, na Apelação Cível nº 19.307.075-SP, Rel. Cesar Moraes, que não é motivo para a perda ou suspensão do poder familiar o fato de a genito- ra deixar filho com terceiro e depois se recuperar economicamente, mencionando na motivação que a genitora “jamais agasalhou o desejo de entregar o filho em caráter definitivo, pelo contrário, esperava melhorar de vida, para reunir a família”. Ainda mais que o espírito da Lei nº 12.010/09 foi a de estabelecer como regra basilar, a permanência da criança e do adolescente no seio de sua família natural. 4 Insuficiência de recursos somada à inaptidão para o exercício das obrigações José Luiz Mônaco da Silva (1995:10) bem assinala que a soma desses fatores leva à perda da guarda do filho e do poder familiar: “A contrario sensu, se os pais forem irresponsáveis, omissos, não cumpridores dos mínimos encargos legais, aí sim perderão não apenas a guarda do filho mas tam- bém o pátrio poder, complexo de direitos e obrigações que recai sobre a pessoa e os bens dos filhos. É que, in casu, à insuficiência de recursos aliou-se uma outra causa: a inaptidão para o exercício das obrigações previstas tanto no Estatuto da Criança e do Adolescente quanto no Código Civil.” Art. 24. A perda e a suspensão do poder familiar serão decretadas judicial- mente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22. 1 Comentários No art. 24, institucionalizou-se o procedimento contraditório na hipótese de destituição ou suspensão dos genitores dos menores. O art. 161, § 1º, define as hipóteses de suspensão e destituição: arts. 1.637 e 1.638 do CC e art. 24 do ECA. A norma em tela obedece ao dispositivo constitucional do art. 5º, LV. O art. 100, 60 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova § 2º (infra) prevê a hipótese de deflagração do procedimento contraditório na hipótese de violência ou abuso sexual. 2 Perda do poder familiar A perda do poder familiar para ser decretada deve estar de acordo com as regras do ECA em combinação com o CC. Assim, incide a decisão de destituição do poder familiar na conduta omissiva do genitor diante de suas obrigações elen- cadas no art. 22 do ECA e no art. 1.634 do CC, infra-assinalado. Mais, deve o genitor amoldar-se a uma ou mais hipóteses do art. 1.638 do CC; “verbis”: “Perderá por ato judicial o poder familiar o pai, ou mãe: I – Que castigar imode- radamente o filho. II – Que o deixar em abandono. III – Que praticar atos contrários à moral e aos bons costumes. IV – Incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.” Motivos para a perda do poder familiar (pátrio poder): a) 1. Castigo imoderado aos filhos (“maus-tratos”). 2. Abandono. 3. Práti- ca pelo genitor de atos contrários à moral e aos bons costumes. Moral se traduz em conceitos de justiça inseridos no seio da sociedade, não necessariamente transformados em norma objetiva. Bons costumes são regras de comportamento de uma sociedade que passam de geração para geração. 4. Abuso reiterado da sua autoridade; b) descumprimento do art. 22 do ECA, do art. 1.634 do CC e incidência do disposto no art. 1.638 do CC; c) cometimento de crime doloso punido com reclusão contra filho, tute- lado ou curatelado: art. 92, II do CP. Nesse caso, na sentença criminal, deve o juiz motivar tal decisão. A reabilitação criminal não restabelece o pátrio poder; Acresce-se que a situação deve aproximar-se das hipóteses do art. 1.638 do CC. Do que se conclui o seguinte: no caso dos itens a e c, a perda do poder fami- liar é inevitável se comprovados os fatos relacionados à mesma. Com relação ao item b, o juiz pode ou não decretar a perda do pátrio poder, ou entender que é caso apenas de suspensão. De modo mais geral, menciona Ana Maria Moreira Marceshan (1995:15) as referidas hipóteses: “Assim, a destituição do pátrio poder só pode ocorrer nos seguintes casos: a) castigos imoderados; b) abandono; c) atos contrários à moral e bons costumes; d) descumprimento injustificado dos deveres e obrigações previstos no art. 22 do ECA (sustento, guarda, educação, cumprir e fazer cumprir determinações judiciais).” Art. 24 61 2a Prova 2.1 Maus-tratos (art. 1.638, I do CC) Maus-tratos são os castigos imoderados do genitor ou do tutor, que levam à perda do poder familiar. José Antonio de Paula Santos Neto (1994:189) refere-se ao parâmetro para se aferir os maus-tratos: “O castigo moderado, como o vimos, está inserido no poder de correção do pai e é aceitável como instrumento de educação e de garantia do respeito e obediência devidos pelo filho. O que não tolera a lei é a falta de moderação, a estupidez, a brutalidade. Para aquilatar o excesso, sopesará o Juiz a faixa etária em que se encontra o menor, bem como suas condições de desenvolvimento físico e psicológico, cotejando tudo isto com a atitude do autor do castigo.” O tema sobre os maus-tratos foi abordado com profundidade em acórdão do extinto TACRIM-SP, demonstrando como ocorrem os mesmos: “Maus-tratos praticados pelo genitor à filha – art. 136 do Código Penal – Ação penal julgada procedente – Aplicação de sanção consistente em prestação de serviços à comunidade – Recurso improvido. [...] Na fase policial, fls. 7v., confessou que teria ficado descontrolado com o choro continuado de sua filha C., que tinha à época dos fatos 3 (três) anos de idade, desferindo-lhe algumas chineladas, sendo que uma a atingiu no rosto. A testemunha S., tia da vítima, afirmou que ele costumava agredir a filha e res- saltou que um ano antes teria, de tanto agredi-la, fraturado o seu fêmur obrigando, inclusive, que a mesma ficasse internada no Hospital São José, por mais de 1 (um) mês (fls. 42).” (extinto TACRIM-SP – Apelação Criminal 815.851/4, 9ª Câmara – Santos – Apelante: L.T.M., Apelado: Ministério Público – recurso não provido – v. u. – Rel. Samuel Junior.) 2.1.1 Maus-tratos do genitor (art. 1.638, I do CC) absolvido no Juízo Criminal Dispõe o art. 66 do CPP que se reporta à ação de ressarcimento, mas também se aplica à questão da influência da coisa julgada civil sobre a criminal, que “não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser propos- ta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato”. Isto implica dizer que toda vez que o juiz criminal absolver o acusado por “falta de prova” (art. 386, II, V e VII do CPP), isto não impedirá que a ação civil seja proposta. Suponha, por exemplo, que o genitor que impinge maus-tratos ao filho seja absolvido no juízo criminal pela inexistência de prova suficiente para a condenação. Isto não impedirá que o mesmo venha a figurar no polo passivo da ação de destituição de poder familiar (pátrio poder) ou que, destituído do poder familiar (pátrio poder), tenha o mesmo restabelecido em razão da coisa julgada criminal. Tal entendimento foi ratificado pelo TJSP: 64 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova A falta de domicílio da genitora, que se traduz na falta de contato com o me- nor, pode caracterizar o abandono da mesma (CC, art. 1.638, II). Por outro lado, sua conduta desregrada, dependendo do que se traduz na prática da mesma, pode levar à caracterização de atos contrários à moral e aos bons costumes (CC, art. 1.638, III). 2.2.4 Prática de conduta delituosa pelo genitor (art. 1.638, II do CC) Configura motivo de perda do poder familiar a prática de ilícito penal pelo genitor se vinculado ao abandono dos menores e inexistência de vínculo afetivo: A Lei nº 12.692/2014, compatibilizando-se com o art. 92, II, do CP, delimita a perda do poder familiar no caso de cometimento de crime doloso, sujeito à pena de reclusão, contra o próprio filho ou filha “Apelação cível. Destituição do pátrio poder (poder familiar). Comprovação sa- tisfatória do descumprimento injustificado dos deveres inerentes ao pátrio poder. Causa à situação de abandono dos filhos. Conduta delitiva do pai que ocasionou a separação e consequente internação em entidade de abrigo das crianças. Perma- nência em situação de absoluto desamparo. Inexistência de vínculo afetivo entre os infantes e o pai. Questões que nada dizem com a situação financeira dos genitores. Improvimento do recurso. .......................... No curso do processo, veio a genitora a demonstrar seu desejo, boa vontade e esforço, no sentido de ter seus dois filhos consigo, para tanto tendo arrumado traba- lho, conseguido começar a pagar uma casa para residirem, além de ter constituído novo lar com um novo companheiro. Tanto lutou que logrou êxito na desinternação das crianças, as quais se mostra- ram muito satisfeitas em poder estarem na companhia da mãe, assim como se deram muito bem com o novo padrasto, pessoa que se mostrou capaz de fazer as vezes do pai verdadeiro. Por outra face, com relação ao ora Recorrente, é certo que os infantes tiveram que vir a ser internados, e assim permaneceram por quase cinco anos, em virtude de ter sido preso pela prática do crime de roubo qualificado, o qual lhe rendeu uma pena superior a seis anos. Impossibilitada a genitora de, sozinha, cuidar das crianças, assim como não tinha a quem recorrer, somente lhe sobrou a opção da internação. Enquanto se encontrava preso o ora Apelante, portanto totalmente ausente, a genitora, a todo tempo, sempre que podia, ia visitar as crianças, levando frutas e algumas roupas. Sem dúvida, ante a conduta criminosa empreendida pelo ora Apelante, foi ele o causador da separação das crianças do convívio com os pais e suas consequentes internações. Como bem salientou o d. Magistrado: Art. 24 65 2a Prova Com efeito, o requerido cumpre pena por prática de grave delito, demonstrando personalidade incompatível com o exercício da paternidade, sendo certo que sua conduta delitiva ocasionou a separação dos filhos e consequente internação deles em entidade de abrigo, sendo certo ainda que não há qualquer vínculo afetivo a unir os infantes e o genitor, os quais de há muito não mantêm contato pessoal com o pai infrator’ – fls. 141. ........................ Deve ser acrescentado ainda, como realçado a fls. 164, que os relatórios técni- cos encartados aos autos evidenciam que a genitora, ao lado de outro companheiro, conseguiu reestruturar sua vida e desinternar os filhos, os quais se encontram muito bem adaptados junto a ambos. O ora Apelante, como provado nos autos, descurou de seus deveres de pai, de molde a acarretar injustificado abandono dos filhos. Por outra face, é certo que, em momento algum, chegou-se à conclusão pela destituição do pátrio poder, com fundamento em questões ligadas à situação finan- ceira dos genitores, aliás o que é vedado pelo art. 23 do ECA. Se assim fosse, a ação teria sucesso, também, com relação à mãe dos menores, já que mantém situação financeira por demais precária. E, não foi o caso.” (Apelação Cível nº 28.006-0/2, da Comarca de São Paulo, apelante C. M. de O., e apelado o Promotor de Justiça da Vara da Infância e da Juventude do Foro Regional do Jabaquara, sendo interessados S. A. dos S. e os menores T. A. dos S. O. e L. F. S. S., v. u., Rel. Prado de Toledo.) 2.2.5 Falta de condições de higiene e condições mínimas de educação (art. 1.638, II, do CC) Outra hipótese elencada na jurisprudência versou sobre a destituição de ge- nitores que não forneceram subsídios básicos aos filhos, descumprindo a obriga- ção formulada no art. 22 supra: “Destituição do Pátrio Poder (poder familiar): Apelação Cível nº 18.037-0/5 – Osasco – Rel. Des. Sabino Neto – 18-11-93 Ementa: Destituição do Pátrio Poder – Abandono – Caracterização [...] De um lado, a avaliação biopsicossocial refere que os genitores não apresen- tam distúrbios psíquicos, mas esclarece que as crianças têm desenvolvimento inferior às respectivas idades, com sequelas psicológicas. Apurou-se, de outra parte, no curso da instrução, que os genitores, embora ti- vessem condições, deixaram de proporcionar aos filhos guarda adequada, sustento necessário e educação. Não aceitavam ajuda de ninguém; tiraram os filhos de uma creche onde eram bem tratados; os menores estavam desnutridos, com verminose e apresentavam sinais de violência; e a menor L. apareceu com sangramento no ânus, resultado de abuso sexual a que foi submetida pelo pai biológico; e o local onde ha- bitavam não respeitava as mínimas condições de higiene. 66 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova Tais fatos levam à conclusão de que pai e mãe dos menores são igualmente responsáveis pelo descumprimento dos deveres impostos pelo art. 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como do art. 384 do Código Civil, sujeitando-os à perda do pátrio poder.” 2.2.6 Omissão dos pais Outra hipótese igualmente elencada na jurisprudência referente ao abando- no explícito dos genitores biológicos, situação mais constante nos casos afetos à Infância e Juventude. A conduta de “abandonar” utilizando conceito penal por analogia implica em habitualidade, ou seja, reiteração de atos. A conduta é tipi- ficada como crime no art. 133 do CP. Explicita tal decisão a desídia frequente dos genitores no sentido de desabrigamento de seus filhos: “Apelação Cível nº 18.099-0/7 – São Paulo – Rel. Des. Lair Loureiro – 4-11-93 Ementa: Destituição de Pátrio Poder – Omissão dos pais – Caracterização [...] O Dr. Promotor de Justiça da Infância e da Juventude ajuizou ação de des- tituição do pátrio poder [...] recorre a genitora pleiteando a inversão do julgado, sustentando, no essencial, que não pode a recorrente, por ser pobre e carente de re- cursos financeiros, ver-se destituída do pátrio poder de seus filhos, fato que contraria o disposto no art. 23 do ECA. A prova produzida não evidencia mera dificuldade econômica da genitora para dar subsistência aos menores, mas de verdadeiro descaso para com as crianças. Porque abandonados e frequentadores assíduos das ruas, os menores foram internados em ins- tituição de abrigo, sem a mínima perspectiva de desinternação por parte dos genitores, que mantêm, segundo estudo social de fls. 7/8, ‘comportamento confuso e negligente em relação aos filhos e a si próprios’.” E ainda o TJMG: “No tocante ao Sr. J. F., genitor do menor L. P. G. F., este nunca prestou qualquer tipo de auxílio a seu filho, sendo que apesar de diversas vezes ter sido acionado pelo Conselho Tutelar, nunca demonstrou interesse e preocupação em relação à criança.” No caso dos autos, o que se constata é que nas provas colhidas os menores encontra- vam completamente abandonados pelos pais biológicos e com referência ao menor L. P. G. F. foi entregue ao casal S. P. S. e M. F. S. encontrando-se completamente adapta- do aos requerentes (fls. 95/97) [...] Válter Kenji Ishida, ‘in’ Estatuto da Criança e do Adolescente: doutrina e jurisprudência, 3. ed., São Paulo: Atlas, 2001, p. 46, leciona: “Este artigo possui fundamental importância para a Justiça da Infância e Juventu- de. A grande maioria dos casos que chegam à vara menorista versa sobre conduta incompatível dos genitores biológicos. Isto em decorrência de descumprimento dos deveres supraelencados, básicos na criação de crianças e adolescentes” (Autos nº 1.0051.05.012375-4/001(1), Rel. Belizário de Lacerda, j. 13-2-2007). Art. 24 69 2a Prova 22 DO ECA. INTERESSES DO MENOR. PREVALÊNCIA. – Caracterizado o abandono efetivo, cancela-se o pátrio poder dos pais biológicos. Inteligência do art. 395, II do Código Bevilacqua, em conjunto com o art. 22 do Estatuto da Criança e do Adoles- cente. Se a mãe abandonou o filho, na própria maternidade, não mais o procurando, ela jamais exerceu o pátrio poder.” (STJ, REsp 275568/RJ, 18-5-2004.) 2.2.12 Filho em situação de mendicância Caracteriza situação de abandono material e moral deixar criança circulando pela via pública em situação de mendicância, sendo cabível a perda do poder familiar: “Ação de destituição do pátrio poder (poder familiar) julgada procedente – Ape- lação do genitor, pleiteando a reforma – Criança em situação de abandono material e moral e que vivia perambulando pelas ruas em situação de mendicância – Mãe que possui dez filhos, sendo que somente dois constam estar sob seus cuidados, sendo que os demais se encontram com terceiros – Família que o deixou em instituição e mudou-se para local incerto e não sabido e nunca o visitou – Infringência aos artigos 22 c.c. 24, ambos do ECA, c.c. art. 395 (1.638), incs. I e II, do Código Civil – Re- curso improvido.” (TJSP – Câmara Especial – Comarca de Cotia – Apelação Cível nº 73.025.0/3-00 – j. 23-10-2000 – Apelante: J.G.D.A. – Apelado: Promotor de Justiça da Vara da Infância e da Juventude de Cotia.) 2.3 Atos contra a moral e os bons costumes Moral significa o que é honesto e virtuoso, segundo os ditames da consciên- cia. Já bons costumes derivam do latim bonimoris, traduzindo o conjunto de princípios fornecidos pela moral, traçando a conduta no seio doméstico e social, sendo, em síntese, o grau de honestidade da família. Portanto, a moral e os bons costumes impõem uma conduta compatível dos genitores, e neste caso não se tra- ta apenas de norma orientadora e sim sancionadora, uma vez que leva à exclusão do poder familiar. José Antonio de Paula Santos Neto (1994:190) analisa a questão: “Os atos referidos não precisam necessariamente ser direcionados contra a pes- soa deste. Basta que ele conviva com pessoas que agem de maneira viciosa ou de- pravada, recebendo as consequentes influências negativas, para que a destituição se torne cabível. Aquele que faz apologia do crime, estimula o filho a praticá-lo ou empurra para uma vida de devassidão, quer diretamente, quer obrigando-o a conviver com ela, deve perder a autoridade paternal.” Na prática, os casos de maior incidência na vara menorista são a utilização de substância entorpecente e o abuso sexual perpetrado pelos genitores (v. Di- reito de família, Carlos Alberto Bittar, p. 250). 70 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova 2.3.1 Genitor multirreincidente em crimes violentos contra o patrimônio Admite a destituição. Entendemos que tal conduta se perfaz, se comprovada, em ato prejudicial ao menor e à moral e aos bons costumes: “Pátrio poder – Destituição – Admissibilidade – Mãe desaparecida, com passa- gens por hospitais psiquiátricos e pai multirreincidente em crimes violentos contra o patrimônio – Menor, ademais, que nunca teve qualquer relacionamento afetivo com seus pais – Recurso não provido.” (TJSP – C. Esp. – Ap. 17.212-0 – Rel. Lair Loureiro – j. 26-8-93.) 2.3.2 Genitora ébria (art. 1.638, III do CC) É motivo para a decretação da perda do poder familiar: “Pátrio poder (poder familiar) – Destituição – Admissibilidade – Mãe viúva que periodicamente embriaga-se, deixando o ambiente familiar em extremo deletério – Ocorrência de abandono completo, descaridoso e de graves riscos físicos e morais para as filhas – Recurso não provido.” (TJSP – C. Esp. – Ap. 17.720-0 – Rel. César de Moraes – j. 7-10-93.) Em igual sentido: “Pátrio poder (poder familiar) – Destituição – Admissibilidade – Abandono con- figurado – Genitores afeitos ao vício do álcool – Exposição do menor a situação vexatória – Violação do art. 22 do ECA – Permanência em lar substituto determina- da – Sentença mantida – Recurso provido – ‘O lar é uma escola, onde se preparam caracteres e forma personalidades. É no lar que os filhos adquirem o sentimento de dignidade pessoal, de honestidade e de correção, que formam a tônica do homem de bem’.” (TJSP – C. Esp. – Ap. 26.598-0 – Rel. Yussef Cahali – j. 21-9-95.) Também no mesmo trilhar: “Menores – Destituição do poder familiar – Genitores com quadro de alcoolis- mo e uso de drogas – Crianças em situação de risco – Ação de destituição do po- der familiar julgada procedente – Recurso pretendendo inversão do julgado – Não comprovação de condições para o efetivo exercício do poder familiar – Sentença mantida – Recurso desprovido” (TJSP – Apelação Cível nº 184.316-0/6, Rel. Martins Pinto – j. 30-1-209, v.u.). 2.3.3 Frequência de pessoas vinculadas ao tráfico de entorpecentes e à prosti- tuição na residência do genitor Conforme já salientamos, a moral e os bons costumes impõem uma conduta compatível dos genitores, no seio familiar e social. A convivência social com pes- soas com condutas moralmente condenáveis, como o tráfico de entorpecentes e a Art. 24 71 2a Prova prostituição, pode levar à supressão do poder familiar, consoante entendimento do TJSP. “Destituição do pátrio poder (poder familiar) – Prática de atos contrários à mo- ral e aos bons costumes – Procedência – Recurso improvido. O genitor cumpre pena por tráfico de entorpecentes e porte de arma e está sen- do processado pela prática de diversos delitos, situação que, aliada à informação de que pessoas ligadas ao tráfico de drogas e à prostituição frequentavam a moradia da família, permite a conclusão quanto à prática de ato contrário à moral e aos bons costumes” (TJSP – C. Esp. – Ap. 80.12-0/8 – Comarca de Valparaíso – Rel. Des. Jesus Lofrano – j. 18-6-2001 – v. u.) 3 Hipóteses previstas no CC de suspensão do poder familiar A norma do art. 1.637 do CC dispõe: “Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles ine- rentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.” Aliás decidiu com acerto o TJSP que a simples condenação criminal não é motivo por si só de perda do poder familiar, devendo ser analisados outros moti- vos relacionados ao caso específico: “Pátrio poder – Destituição – Condenação criminal dos genitores – Fato que, por si só, não autoriza o decreto de perda do pátrio poder – Desconhecimento, entretanto, pela criança de outros pais, senão os da família substituta na qual está acostumada e integrada – Prejudicialidade para a sua formação emocional e inte- lectual a volta tardia em um lar desconhecido – Prevalência do interesse do menor sobre o direito dos pais – Decisão mantida – Recurso não provido. Embora respei- tabilíssimo o direito dos pais de ter os filhos em sua companhia, quando este se chocar com o interesse dos menores devem estes ser mantidos no ambiente em que se acham integrados.” (Apelação Cível nº 22.922-0 – São Paulo – Rel.: Yussef Cahali – C. Esp. – v. u. – 2-3-95.) Cabe a suspensão do poder familiar do genitor até que o mesmo se submeta à medida aplicada de tratamento psiquiátrico (STJ, REsp 776977/RSDJ 2-10-2006, p. 273, RT, v. 856, p. 162). 3.1 O art. 1.637, parágrafo único do CC e a suspensão do poder familiar (pátrio poder) Como supramencionado, prevê a norma em tela a suspensão do poder fami- liar (pátrio poder) diante da condenação criminal com pena superior a 2 (dois) 74 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova ponsabilidade pela simples geração do filho. Assim, a perda do poder familiar, na verdade, limitaria o direito do genitor e não a obrigação de indenizar pelo ato ilícito do filho. Seção II DA FAMÍLIA NATURAL Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes. Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por pa- rentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.” (NR) 1 Evolução do conceito de família Anteriormente, com base no CC de 1916, a família baseava-se na figura do matrimônio. A partir principalmente da CF-88, passou-se a alterar o conceito de família, baseando-se no princípio do pluralismo das entidades familiares, reconhecendo a possibilidade de a família ser formada por diversas estruturas e não apenas pelo modelo clássico de união pelo casamento entre homem e mulher com o objetivo de gerar filhos (Rossato e Lépore, Comentários à lei nacional de adoção, p. 28). Assim, quebrado o paradigma clássico surge o conceito da família monoparental (formada pela presença de apenas um dos pais e tão comum com a presença única da genitora) e mais modernamente a chamada família homoafetiva (decor- rente de casal de pessoas pertencentes ao mesmo sexo). A família natural e mais recentemente a família extensa ou ampliada representam a aceitação legal como forma de inclusão desses novos conceitos de família. 2 Comentários: noção de família natural Abrange a família constituída pelo casamento civil, a originada da relação es- tável (“concubinato”) e a formada por qualquer dos genitores e seus filhos. Inclui também a união homoafetiva, seja a feita através do registro civil ou originário da união estável. V. Marçura, Cury e Garrido de Paula (1991:23). A mesma pos- sui prioridade para manutenção da criança e do adolescente. A menção natural possui o escopo de se contrapor à família substituta (Rossato e Lépore, Comen- tários à lei nacional de adoção, p. 30). Washington de Barros Monteiro, fazendo Art. 25 75 2a Prova uma conceituação conservadora, exclui a comunidade formada por pessoas do mesmo sexo, conceito hoje ultrapassado. Complementa o saudoso autor que o conceito de família natural surgiria a partir da contraposição com a expressão família substituta (Comentário ao art. 25 do ECA, in ECA comentado, Coord. Mu- nir Cury, p. 129). Para nós, quanto à sua origem, o conceito de família natural se aproximaria do conceito de filho natural. O filho natural seria o originário de pessoas não casadas entre si, mas sem impedimentos. Ambas as expressões (filho natural e família natural) possuem uma abrangência maior que as desvinculam do vínculo matrimonial. 3 Família extensa ou ampliada A Lei nº 12.010/09, no escopo de dilatar o conceito de família, criou o con- ceito de família extensa, abrangendo, além dos pais ou filhos, os parentes pró- ximos com os quais a criança ou adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade. Afetividade possui o sentido da relação com sentimento, amor e amizade. Já afinidade não possui o sentido de parentesco entre um cônjuge e os parentes do outro (art. 1.595 do CC), mas sim o sentido comum de proximidade e de interesses convergentes entre criança e adolescente e o parente. É muito co- mum, por exemplo, a criança ser criada pela avó ou tia, sendo estas participantes do conceito de família ampliada. Há um verdadeiro aprimoramento nos mecanis- mos de manutenção da criança e do adolescente no seio familiar. Objetiva-se, nesse caso, uma desmistificação da unidade familiar como sen- do algo idealizado de modo conservador e o reconhecimento da diversidade das organizações familiares (Lélio Ferraz de Siqueira Neto, Convivência familiar e comunitária – direito de crianças e adolescentes/obrigação do sistema de garantias de direitos, p. 36. In: Infância e Cidadania, v. 7. Para Munir Cury (Comentário ao art. 25, parágrafo único do ECA, in ECA comentado, p. 130), o conceito de família extensa é derivado das classes menos favorecidas, onde existe uma sociabilidade maior e uma configuração de auxílio mútuo “em rede”. Ressaltando a importância da afetividade e mantendo a guarda aos avós, o STJ: “Em tais casos, não se tratando de “guarda previdenciária”, o Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser aplicado, tendo em vista mais os princípios protetivos dos interesses da criança, notadamente porque o art. 33 está localizado em seção inti- tulada “Da Família Substituta” e, diante da expansão conceitual que hoje se opera sobre o termo “família”, não se pode afirmar que, no caso, há, verdadeiramente, uma substituição familiar. O que deve balizar o conceito de “família” é, sobretudo, o princípio da afetividade, que fundamenta o direito de família na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia sobre as considerações de caráter patrimonial ou biológico. Isso posto, a Turma não conheceu do recurso do Ministério Público. Precedentes citados: REsp 469.914-RS, DJ 5-5-2003, e REsp 76 Estatuto da Criança e do Adolescente • Ishida 2a Prova 2a Prova 993.458-MA, DJe 23-2-2008. (REsp 945.283-RN, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, jul- gado em 15-9-2009.) 4 Preferência do bisavô por pertencer à família extensa Tendo a criança o direito de permanecer junto à sua família natural e na impossibilidade, junto à família extensa, possui o bisavô o direito à guarda, con- soante decisão do tribunal paulista: “Guarda. Interesse e bem-estar da criança que devem prevalecer. Genitora toxicômana. Bisavô que já detém a guarda de uma irmã do menor, família extensa disposta a auxiliá-lo na criação do bisneto. Criança que tem o direito a ser criada no seio de sua família desde que obedecido o princípio da proteção integral. Decisão acertada. Recurso improvido” (AC nº 994.09.229181-9, j. 29-11-2010). Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamen- to, mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação. Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes. 1 Comentários A criança e o adolescente possuem o direito à filiação, sendo um direito da personalidade. O escopo do art. 26 é de facilitar o reconhecimento de filhos prin- cipalmente pelo pai. Na prática, muitos genitores desistem de reconhecer filhos fruto de relações ocasionais, devido à dificuldade encontrada. 2 A Lei nº 8.560, de 29-1-92 O art. 1º da Lei nº 8.560/92, com o mesmo objetivo, ampliou as formas de reconhecimento: “O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será fei- to: I – no registro de nascimento; II – por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório; III – por testamento, ainda que incidentalmente manifestado; IV – por manifestação expressa e direta perante o Juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.” A hipótese de reconhecimento por meio do cartório de registro civil é admi- tida pelo TJSP:
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