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Fundamentos de quimica medicinal, Notas de estudo de Bioquímica

Primeiro Cap. Fundamentos de quimica medicinal

Tipologia: Notas de estudo

2017
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Baixe Fundamentos de quimica medicinal e outras Notas de estudo em PDF para Bioquímica, somente na Docsity! ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 1 FASE FARMACODINÂMICA: INTERAÇÕES ENTRE MICRO E BIOMACROMOLÉCULAS As interações de um fármaco com o seu sítio de ação no sistema biológico ocorrem du- rante a chamada fase farmacodinâmica e são determinadas pela resultante entre forças intermoleculares atrativas e repulsivas, isto é, interações hidrofóbicas, eletrostáticas e estéricas.1,2 Considerando os possíveis modos de interação entre o fármaco e a biofase, necessários para se promover uma determinada resposta biológica, pode-se classificá- -los, de maneira genérica, em dois grandes grupos: fármacos estruturalmente inespecí- ficos e específicos.3 Os fármacos ditos estruturalmente inespecíficos são aqueles que dependem única e exclusivamente de suas propriedades físico-químicas, por exemplo, coeficiente de parti- ção (P) e pKa, para promoverem o efeito farmacológico evidenciado. Como esta classe de fármacos em geral apresenta baixa potência, seus efeitos são dependentes do uso de doses elevadas ou da acumulação da substância no tecido-alvo. Os anestésicos gerais são um exemplo clássico de substâncias que pertencem a esta classe de fármacos, uma vez que seu mecanismo de ação envolve a depressão inespecífica de biomembranas, ele- vando o limiar de excitabilidade celular ou a interação inespecífica com sítios hidrofóbi- cos de proteínas do sistema nervoso central, provocando perda de consciência.4-6 Nesse caso, em que a complexação do fármaco com macromoléculas da biofase ocorre predo- minantemente por meio de interações de van der Waals, a lipossolubilidade do fármaco está diretamente relacionada à sua potência, como exemplificado comparativamente na Figura 1.1, para os anestésicos halotano (1.1), isoflurano (1.2) e sevoflurano (1.3).5-7 E m alguns casos, a alteração das propriedades físico-químicas em função de mo- dificações estruturais de um fármaco pode alterar seu mecanismo de interação com a biofase. Um clássico exemplo diz respeito à classe dos anticonvulsivantes, como o pentobarbital (1.4), cuja simples alteração de um átomo de oxigênio por um átomo de enxofre, com maior polarizabilidade, confere um incremento de lipossolubilidade que altera o perfil de atividade estruturalmente específico de 1.4 sobre o complexo receptor GABA ionóforo, para uma ação anestésica inespecífica evidenciada para o tiopental (1.5) (Figura 1.2).6,8 Barreiro_01.indd 1 05/08/14 16:52 2 QUÍMICA MEDICINAL Por outro lado, durante o desenvolvimento de uma família de antagonistas de recep- tores de adenosina A1, foi possível identificar o protótipo imidazo[4,5-b]piridínico (1.6), o qual, embora apresentasse a eficácia desejada nos ensaios clínicos como cardiotônico, promovia em alguns dos pacientes o aparecimento de flashes brilhantes resultantes de suas ações inespecíficas no sistema nervoso central.9 Modificações estruturais visando à redução de sua permeabilidade pela barreira hematencefálica resultaram na descoberta da sulmazola (1.7), análogo com o grupo sulfinila que, por apresentar reduzido valor de co- eficiente de partição (Log P), não apresenta os efeitos centrais indesejáveis (Figura 1.3).10 FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE ESPECÍFICOS Os fármacos estruturalmente específicos exercem seu efeito biológico pela interação se- letiva com uma determinada biomacromolécula-alvo que, na maior parte dos casos, são enzimas, receptores metabotrópicos (acoplados a proteína G), receptores ionotrópicos (acoplados a canais iônicos), receptores ligados a quinases, receptores nucleares e, ain- da, ácidos nucleicos. O reconhecimento molecular do fármaco (micromolécula) pela biomacromolécula é dependente do arranjo espacial dos grupamentos funcionais e das propriedades estrutu- rais da micromolécula, que devem ser complementares ao sítio de ligação localizado na biomacromolécula, ou seja, o sítio receptor. FIGURA 1.1 x CORRELAÇÃO ENTRE AS PROPRIEDADES FISICO-QUÍMICAS E A ATIVIDADE ANESTÉSICA DOS FÁRMACOS ESTRUTURALMENTE INESPECÍFICOS (1.1), (1.2) E (1.3). FIGURA 1.2 x INFLUÊNCIA DA MODIFICAÇÃO MOLECULAR NO MECANISMO DE AÇÃO DOS BARBITURATOS (1.4) E (1.5). Br ClF3C F OF3C CHF2 (1.1) (1.2) Coeficiente de Partição óleo:gás = 224 Coeficiente de Partição cérebro:plasma = 1,94 MAC 50 = 0,7 % de 1 atm MAC50 = Concentração alveolar mínima necessária para provocar imobilidade em 50% dos pacientes Coeficiente de Partição óleo:gás = 90,8 Coeficiente de Partição cérebro:plasma = 1,57 MAC 50 = 1,15 % de 1 atm F OF3C (1.3) Coeficiente de Partição óleo:gás = 47,2 Coeficiente de Partição cérebro:plasma = 1,70 MAC 50 = 2,1 % de 1 atm F N N N N O O H H O H3C CH3H3C O O H H S H3C CH3H3C (1.4) (1.5) Barreiro_01.indd 2 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 5 compreendem forças eletrostáticas, tais como ligações de hidrogênio, dipolo-dipolo, íon-dipolo, ligações covalentes; e interações hidrofóbicas. FORÇAS ELETROSTÁTICAS As forças de atração eletrostáticas são aquelas resultantes da interação entre dipolos e/ou íons de cargas opostas, cuja magnitude depende diretamente da constante dielétri- ca do meio e da distância entre as cargas. A água apresenta elevada constante dielétrica (« 5 80), devido ao seu momento de dipolo permanente, podendo diminuir as forças de atração e repulsão entre dois gru- pos carregados, solvatados. Dessa forma, na maior parte dos casos, a interação iônica é precedida pela dessolvatação dos íons, processo que envolve perdas entálpicas e é favorecido pelo ganho entrópico resultante da formação de uma “rede” de interações entre as moléculas de água livres (Figura 1.5). A força da ligação iônica, ,5 kcal/mol, é dependente da diferença de energia da interação íon-íon versus a energia dos íons solvatados (Figura 1.5). No pH fisiológico, alguns aminoácidos presentes nos biorreceptores se encontram ionizados (p. ex., aminoácidos básicos – arginina, lisina, histidina – e aminoácidos com caráter ácido – ácido glutâmico, ácido aspártico), podendo interagir com fármacos que apresentem grupos carregados negativa ou positivamente. O flurbiprofeno (1.12), anti- -inflamatório não esteroide que atua inibindo a enzima cicloxigenase (COX),8 é reco- nhecido molecularmente por meio de interações com resíduos de aminoácidos do sítio receptor, dentre as quais se destaca a interação do grupamento carboxilato da forma io- nizada de 1.12 especificamente com o resíduo de arginina na posição 120 da sequência primária da isoforma 1 da COX (Figura 1.6).15,16 Cabe destacar que uma ligação iônica reforçada por uma ligação de hidrogênio, como neste caso, pode resultar em expressivo incremento da força de interação, isto é, ,10 kcal/mol. Adicionalmente, as forças de atração eletrostáticas podem incluir dois tipos de inte- rações, que variam energeticamente entre 1 e 7 kcal/mol: a) íon-dipolo, força resultante da interação de um íon e uma espécie neutra polarizável, com carga oposta àquela do íon (Figura 1.7); b) dipolo-dipolo, interação entre dois grupamentos com polarizações de cargas opostas (Figura 1.7). Essa polarização, decorrente da diferença de eletronegatividade entre um heteroátomo (p. ex., oxigênio, nitrogênio ou halogênio) e um átomo de carbono, produz espécies que apresentam aumento da densidade eletrônica do heteroátomo e redução da densidade eletrônica sobre o átomo de carbono, como ilustrado na Figura 1.7, para o grupamento carbonila. FIGURA 1.5 x INTERAÇÕES IÔNICAS E O RECONHECIMENTO FÁRMACO-RECEPTOR. fármaco ionizado solvatado REC= receptor receptor ionizado solvatado interação iônica LIGANTE N H H H H O H H O H REC O O H O H H O H H O H HO H HO H + REC O O N LIGANTE H H H H O H + Barreiro_01.indd 5 05/08/14 16:52 6 QUÍMICA MEDICINAL A interação do substrato natural da enzima ferro-heme dependente tromboxana sintase (TXS),17 isto é, endoperóxido cíclico de prostaglandina H2 (PGH2, 1.13), envolve a formação de uma interação íon-dipolo regiosseletiva entre o átomo de ferro do gru- pamento heme e o átomo de oxigênio em C-11 da função ambidente endoperóxido, polarizada adequadamente (Figura 1.8A). Esse reconhecimento molecular é responsável pelo rearranjo que permite a transformação da PGH2 (1.13) no autacoide trombogêni- co e vasoconstritor tromboxana A2 (TXA2). Essas evidências do mecanismo catalítico da enzima auxiliaram o desenvolvimento de fármacos antitrombóticos capazes de atuar como inibidores de TXS (TXSi), explorando a interação de sistemas heterocíclicos apre- sentando átomo de nitrogênio básico como o íon Fe11 do grupamento protético heme (Figura 1.8B), como o ozagrel18 (1.14). FIGURA 1.6 x RECONHECIMENTO MOLECULAR DO FLURBIPROFENO (1.12) PELO RESÍDUO ARG120 DO SÍTIO ATIVO DA COX-1 (PDB ID 3N8Z), VIA INTERAÇÃO IÔNICA. (A) VISÃO BIDIMENSIONAL; (B) VISÃO TRIDIMENSIONAL. CH3 O OH A) B) F flurbiprofeno (1.12) CH3 O O F HN NH N H H HN O O COX-1 Arg120 Tyr355 Tyr385 Ser530 biofase Arg120 FIGURA 1.7 x INTERAÇÕES ÍON-DIPOLO (A e B); DIPOLO-DIPOLO (C) E O RECONHECIMENTO FÁRMACO-RECEPTOR. interações íon-dipolo interações dipolo-dipolo LIGANTE O CH3 LIGANTE O CH3 R2 O LIGANTE H3C O LIGANTE H3C O LIGANTE CH3 O RECREC O ONREC A) B) C) d1 d2 H H H REC = receptor d2 d1 d1 d2 d2 d2 d1 d1 Barreiro_01.indd 6 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 7 Adicionalmente, anéis aromáticos e heteroaromáticos que estão presentes na gran- de maioria dos fármacos e também na estrutura dos aminoácidos naturais fenilalanina (1.15), tirosina (1.16), histidina (1.17) e triptofano (1.18) podem participar do proces- so de reconhecimento molecular de um ligante pelo seu biorreceptor-alvo por meio de interações eletrostáticas do tipo dipolo-dipolo conhecidas como empilhamento-p, empilhamento-T, ou alternativamente interações íon-dipolo denominadas de cátion-p. As interações de empilhamento, que apresentam magnitudes variadas dependendo da orientação e variação dos momentos dipolo dos sistemas aromáticos,19 são decorrentes da aproximação paralela (empilhamento-p) ou ortogonal (empilhamento-T) de dois sis- temas aromáticos que apresentam densidades eletrônicas opostas, como ilustrado na Figura 1.9. Por sua vez, as interações cátion-p são resultado da aproximação espacial de um sistema aromático rico em elétrons e uma espécie catiônica, normalmente resultante da ionização de uma amina primária, secundária ou terciária (Figura 1.9). Essas interações dipolares têm grande relevância no reconhecimento molecular do fármaco antiAlzheimer, tacrina (THA) (1.19), pelo sítio ativo da enzima acetilcolinesterase (AChE), como ilustrado pela interação de empilhamento-p entre seu anel quinolínico e os resíduos de aminoácidos triptofano e fenilalanina nas posições 84 (Trp84) e 330 (Phe330),20 respectivamente (Figura 1.10A). Ademais, os estudos de Zhong e colaborado- res21 demonstraram que as interações cátion-p são importantes para o reconhecimento molecular da acetilcolina (1.20) pelos receptores nicotínicos (nAChR), resultando na sua ativação, e que variações eletrônicas no anel indólico do resíduo de triptofano localizado na posição 149 da subunidade a do biorreceptor (Trp149) são capazes de afetar a energia da interação com o grupo trimetilamônio do neurotransmissor (Figura 1.10B). FIGURA 1.8 x RECONHECIMENTO MOLECULAR DA PGH2 (1.13) (A) E DO OZAGREL (1.14) (B) PELO RESÍDUO Fe-HEME DO SÍTIO ATIVO DA TROMBOXANA SINTASE, VIA INTERAÇÕES ÍON-DIPOLO. tromboxana sintase tromboxana sintase ozagrel (1.14) PGH2 (1.13) A B O O O O O O O O HO CH3 H N N N N N O OH N N N N S N S Fe Fe 10 1111 11 9 1 12 8 9 9 d2 d1 +2 +2 Barreiro_01.indd 7 05/08/14 16:52 10 QUÍMICA MEDICINAL FORÇAS DE DISPERSÃO Estas forças atrativas, conhecidas como forças de dispersão de London, tipo de interação de van der Waals, caracterizam-se pela aproximação de moléculas apolares apresen- tando dipolos induzidos. Estes dipolos são resultado de uma flutuação local transiente (1026 s) de densidade eletrônica entre grupos apolares adjacentes, que não apresentam momento de dipolo permanente. Normalmente, essas interações de fraca energia, isto é, 0,5 a 1,0 kcal/mol, ocorrem em função da polarização transiente de ligações carbono- -hidrogênio ou carbono-carbono (Figura 1.13). Apesar de envolverem fracas energias de interação, as forças de dispersão são de extrema importância para o processo de reconhecimento molecular do fármaco pelo sítio receptor, uma vez que, normalmente, se caracterizam por interações múltiplas que, somadas, acarretam contribuições energéticas significativas. A losartana (1.23), fármaco anti-hipertensivo que atua como antagonista de receptores de angiotensina II do subtipo 1 (AT1R), faz importantes interações de van der Waals entre suas subunidades n-butila e bifenila com os resíduos de aminoácidos hidrofóbicos localizados na bolsa lipofílica L1 (Phe182, Phe171 e Ala163) e com o resíduo de valina em posição 108 (Val108), respec- tivamente25,26 (Figura 1.14). INTERAÇÕES HIDROFÓBICAS Como as forças de dispersão, as interações hidrofóbicas são individualmente fracas (cer- ca de 1 kcal/mol) e ocorrem em função da interação entre cadeias ou subunidades apo- lares. Normalmente, as cadeias ou subunidades hidrofóbicas, presentes tanto no sítio receptor como no ligante, se encontram organizadamente solvatadas por camadas de moléculas de água. A aproximação das superfícies hidrofóbicas promove o colapso da estrutura organizada da água, permitindo a interação ligante-receptor à custa do ganho entrópico associado à desorganização do sistema. Em vista do grande número de subu- nidades hidrofóbicas presentes nas estruturas de peptídeos e fármacos, essa interação pode ser considerada importante para o reconhecimento da micromolécula pela bioma- cromolécula, como exemplificado na Figura 1.15, para a interação do fator de ativação plaquetária (PAF, 1.24) com o seu biorreceptor, por meio do reconhecimento da cadeia alquílica C-16 por uma bolsa lipofílica presente na estrutura da proteína receptora.27,28 FIGURA 1.13 x INTERAÇÕES DIPOLO-DIPOLO PELA POLARIZAÇÃO TRANSIENTE DE LIGAÇÕES CARBONO-HIDROGÊNIO (A) OU CARBONO-CARBONO (B). H R H R d1 d2 d2 d1 H R1 H R1 H R d1 d2 d2 d1 HR1 H3C R H3C R d1 d2 d2 d1 H3C R1 H3C R1 H3C R d1 d2 d2 d1 H3C R1 interações de van der Waals A B Barreiro_01.indd 10 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 11 FIGURA 1.14 x RECONHECIMENTO MOLECULAR DA CADEIA LATERAL E SUBUNIDADE BIFENILA DA LOSARTANA (1.23) POR MEIO DE INTERAÇÕES DE VAN DER WAALS COM RESÍDUOS DE AMINOÁCIDOS HIDROFÓBICOS DO RECEPTOR DE ANGIOTENSINA II DO SUBTIPO AT1. NHN N N N N Cl OH H3C Ala163 Phe171 Phe182 Ser109 Val108 losartana (1.23) Bolsa L1 AT1R FIGURA 1.15 x RECONHECIMENTO MOLECULAR DO PAF (1.24) VIA INTERAÇÕES HIDROFÓBICAS COM A BOLSA LIPOFÍLICA DE SEU BIORRECEPTOR. Bolsa Lipofílica do Receptor do PAF Interação do PAF com Biorreceptor do PAF O H H OH H OH H OH H OH H OH H OH H O H3C OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H O H H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H O H H O H H OH OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H H OH H OH H OH H OH H O H3C O H H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H O H H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H OH H O H HO H H AcO O P O O O (H3C)3N AcO O P O O O (H3C)3N PAF (1.24) Barreiro_01.indd 11 05/08/14 16:52 12 QUÍMICA MEDICINAL LIGAÇÃO DE HIDROGÊNIO (LIGAÇÃO-H) As ligações de hidrogênio (ligação-H) são as mais importantes interações não covalentes existentes nos sistemas biológicos, sendo responsáveis pela manutenção das conforma- ções bioativas de macromoléculas nobres, essenciais à vida: a-hélices e folhas b das pro- teínas (Figura 1.16) e das bases purinas-pirimidinas dos ácidos nucleicos (Figura 1.17). Essas interações são formadas entre heteroátomos eletronegativos, como oxigênio, nitrogênio, flúor, e o átomo de hidrogênio de ligações O-H, N-H e F-H, como resultado de suas polarizações (Figura 1.18). Cabe destacar que, apesar de normalmente a ligação C-H não apresentar polarização suficiente para favorecer a formação de ligações de hidrogênio, o forte efeito indutivo promovido pela introdução de dois átomos de flúor pode compensar este comportamento, tornando o grupo diflurometila (F2C-H) um bom doador de ligações de hidrogênio29 (Figura 1.18). Inúmeros exemplos de fármacos que são reconhecidos molecularmente por meio de ligações de hidrogênio podem ser citados: dentre eles, pode-se destacar ilustrativamente a interação do antiviral saquinavir (1.25) com o sítio ativo da protease do vírus HIV-1 (Figura 1.19).30,31 O reconhecimento desse inibidor enzimático (1.25) envolve a partici- pação de ligações de hidrogênio com resíduos de aminoácidos do sítio ativo, diretas ou intermediadas por moléculas de água (Figura 1.19). LIGAÇÃO COVALENTE As interações intermoleculares envolvendo a formação de ligações covalentes são de elevada energia, ou seja, 77 a 88 kcal/mol. Considerando-se que, na temperatura co- mum dos sistemas biológicos (30 a 40 °C), ligações mais fortes do que 10 kcal/mol são dificilmente rompidas em processos não enzimáticos, os complexos fármaco-receptores envolvendo ligações covalentes são raramente desfeitos, culminando em inibição enzi- mática irreversível ou inativação do sítio receptor. Essa interação, envolvendo a formação de uma ligação sigma entre dois átomos que contribuem cada qual com um elétron, eventualmente, ocorre com fármacos que apre- sentam grupamentos com acentuado caráter eletrofílico e bionucleófilos orgânicos. O ácido acetilsalicílico (AAS, 1.26) e a benzilpenicilina (1.27) são dois exemplos de fárma- FIGURA 1.16 x LIGAÇÕES DE HIDROGÊNIO E A MANUTENÇÃO DA ESTRUTURA TERCIÁRIA DE PROTEÍNAS (P. EX., RECEPTOR DO INOSITOL TRIFOSFATO COMPLEXADO COM IP3, PDB ID 1N4K). a-HÉLICE a-HÉLICES FOLHA b FOLHA b LIGAÇÕES DE HIDROGÊNIO Estrutura tridimensional do receptor de inositol trifosfato (IP3) Barreiro_01.indd 12 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 15 FATORES ESTEREOQUÍMICOS E CONFORMACIONAIS ENVOLVIDOS NO RECONHECIMENTO MOLECULAR LIGANTE-SÍTIO RECEPTOR Apesar do modelo chave-fechadura ser útil na compreensão dos eventos envolvidos no reconhecimento molecular ligante-receptor, caracteriza-se como uma representação parcial da realidade, uma vez que as interações entre a biomacromolécula (receptor) e a micromolécula (fármaco) apresentam características tridimensionais dinâmicas. Dessa forma, o volume molecular do ligante, as distâncias interatômicas e o arranjo espacial entre os grupamentos farmacofóricos compõem aspectos fundamentais na compreen- são das diferenças na interação fármaco-receptor. A Figura 1.22, que descreve o com- plexo entre a enzima HMG-CoA redutase pelo inibidor atorvastatina (1.28), ilustra a FIGURA 1.20 x MECANISMO DE INIBIÇÃO IRREVERSÍVEL DA PGHS PELO ÁCIDO ACETILSALICÍLICO (AAS, 1.26), VIA FORMAÇÃO DE LIGAÇÃO COVALENTE. A) MECANISMO HIPOTÉTICO DA REAÇÃO; B) REPRESENTAÇÃO TRIDIMENSIONAL DO SÍTIO ATIVO DA PGHS INIBIDA PELA ACETILAÇÃO DO RESÍDUO DE SERINA 530 (SER530) (PDB ID 1PTH). Ser530 acetilada AAS (1.26) Ser530 Tyr385 Barreiro_01.indd 15 05/08/14 16:52 16 QUÍMICA MEDICINAL FIGURA 1.21 x ESTRUTURA GERAL DA PAREDE CELULAR BACTERIANA E O MECANISMO DE INIBIÇÃO IRREVERSÍVEL DA CARBOXIPEPTIDASE PELA BENZILPENICILINA (1.27), VIA FORMAÇÃO DE LIGAÇÃO COVALENTE. À ESQUERDA, MAPA DE POTENCIAL ELETROSTÁTICO DE 1.27. Representação da estrutura da parede celular Monômero da peptideoglicana ligação peptídica cruzada cadeia lateral tetrapeptídica carboidratos L-alanina D-glutamina L-lisina D-alanina D-alanina Pentapeptídeo D-Ala-D-Ala-COOH carboxipeptidase + peptidogliana carboxipeptidase carboxipeptidase (1.27) peptideoglicana-NH2 Ala-peptideoglicana + D-Ala-COOH Ala-peptideoglicana + carboxipeptidase C O C O H N ESCALA (KJ/mol) 300 200 100 -100 -200 -300 0 carboxipeptidase-Ser-OH carboxipeptidase-Ser-O ligação covalente C-O Barreiro_01.indd 16 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 17 FIGURA 1.22 x REPRESENTAÇÃO TRIDIMENSIONAL DO COMPLEXO DA HIDROXIMETILGLUTARIL-COENZIMA A (HMG-CoA) REDUTASE COM O INIBIDOR ATORVASTATINA (1.28, CARBONOS NA COR AZUL) (PDB ID 1HWK), COM DESTAQUE PARA OS RESÍDUOS DE AMINOÁCIDOS QUE COMPÕEM O SÍTIO RECEPTOR (LARANJA). atorvastatina (1.28) natureza tridimensional do complexo biomacromolécula-micromolécula, com destaque para o arranjo espacial dos aminoácidos que constituem o sítio ativo e participam do reconhecimento molecular do fármaco.35 FLEXIBILIDADE CONFORMACIONAL DE PROTEÍNAS E LIGANTES: TEORIA DO ENCAIXE INDUZIDO As características de complementaridade rígida do modelo chave-fechadura de Fisher limitam, por vezes, a compreensão e a avaliação do perfil de afinidade de determinados ligantes por seu sítio molecular de interação, podendo induzir a erros no planejamento estrutural de novos candidatos a fármacos.36 Nesse contexto, Koshland introduziu os aspectos dinâmicos que governam o reconhecimento molecular de uma micromolécula por uma biomacromolécula, na sua teoria do encaixe induzido,37 propondo que o aco- modamento conformacional recíproco no sítio de interação, até que se atinja os meno- res valores de energia do complexo, constitui aspecto fundamental na compreensão de diferenças na interação fármaco-receptor (Figura 1.23).38 Essa interpretação pode ser ilustrativamente empregada na compreensão dos dife- rentes modos de interação de inibidores da enzima acetilcolinesterase (1.29) e (1.30), planejados molecularmente como análogos estruturais da tacrina39 (1.19), primeiro fár- maco aprovado para o tratamento da doença de Alzheimer. Cabe destacar que, a des- peito da presença da subunidade farmacofórica tetraidro-4-aminoquinolina, comum aos três inibidores, suas orientações e consequentemente seus modos de reconhecimento molecular pelo sítio ativo da enzima são parcialmente distintos (Figura 1.24), compro- metendo análises de relação estrutura-atividade que considerem apenas a similaridade Barreiro_01.indd 17 05/08/14 16:52 20 QUÍMICA MEDICINAL do subtipo H3. 47 . Entretanto, a falta de correlação siste- mática entre o perfil termodinânico e atividade intrínseca de ligantes de alguns biorreceptores, como os receptores de histamina do subtipo H1, 48 leva a crer que estudos ter- modinâmicos adicionais com maior número de ligantes torna-se necessário para caracterizar a discriminação de agonistas, agonistas parciais e antagonistas.49 CONFIGURAÇÃO ABSOLUTA E ATIVIDADE BIOLÓGICA Um dos primeiros relatos da literatura que indicava a rele- vância da estereoquímica, mais particularmente da confi- guração absoluta na atividade biológica, deve-se a Piutti em 1886,50 que descreveu o isolamento e as diferentes propriedades gustativas dos enantiômeros do aminoáci- do asparagina (1.33) (Figura 1.26). Essas diferenças de propriedades organolépticas expressavam modos diferen- ciados de reconhecimento molecular do ligante pelo sítio receptor, nesse caso, localizado nas papilas gustativas, traduzindo sensações distintas.51 Entretanto, a importância da configuração absoluta na atividade biológica52-55 per- maneceu obscura até a década de 60, quando, infelizmente, ocorreu a tragédia da tali- domida56 (1.34), decorrente do uso de sua forma racêmica, indicada para a redução do desconforto matinal em gestantes, resultando no nascimento de cerca de 12.000 crian- ças com malformações congênitas. Posteriormente, o estudo do metabolismo de 1.34 permitiu evidenciar que o enantiômero (S) era seletivamente oxidado, levando à forma- ção de espécies eletrofílicas reativas do tipo areno-óxido, que reagem com nucleófilos bio-orgânicos, induzindo teratogenicidade,57 enquanto o antípoda (R) era responsável pelas propriedades hipnótico-sedativas (Figura 1.27). Esse episódio foi o marco de nova era no desenvolvimento de novos fármacos. Nes- se momento, a quiralidade passou a ter destaque e a investigação cuidadosa do com- portamento de fármacos quirais58,59 ou homoquirais60,61 frente a processos capazes de FIGURA 1.26 x PALADAR DOS ESTEREOISÔMEROS DA ASPARAGINA (1.33). asparagina (1.33) PALADAR DOCE SEM PALADAR (R) (S) FIGURA 1.27 x PROPRIEDADES FARMACOLÓGICAS DOS ESTEREOISÔMEROS DA TALIDOMIDA (1.34). talidomida (1.34) Hipnótico/ Sedativo Teratogênico (R) (S) Barreiro_01.indd 20 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 21 influenciar tanto a fase farmacocinética, isto é, absorção, distribuição, metabolismo e eliminação, quanto à fase farmacodinâmica, ou seja, interação fármaco-receptor, passou a ser fundamental antes de sua liberação para uso clínico. O diferente perfil farmacológico de substâncias quirais foi pioneiramente racionaliza- do por Easson e Stedman.62 Esses autores propuseram que o reconhecimento molecular de um ligante com um único centro assimétrico pelo biorreceptor envolveria a participação de, ao menos, três pontos. Nesse caso, o reconhecimento do antípoda correspondente pelo mesmo sítio receptor não seria tão eficaz devido à perda de um ou mais pontos de interação complementar ou a novas interações repulsivas com resíduos de aminoácidos do receptor-alvo.63 Esses autores inspiraram o modelo de três pontos ilustrado na Figura 1.28, que considera o mecanismo de reconhecimento estereoespecífico do propranolol (1.35) pelos receptores b-adrenérgicos.64 O enantiômero (S)-(1.35) é reconhecido por esses re- ceptores por meio de três principais pontos de interação:65 a) sítio de interação hidrofóbi- ca, que reconhece o grupamento lipofílico naftila de 1.35; b) sítio aceptor de ligação de hidrogênio, que reconhece o átomo de hidrogênio da hidroxila da cadeia lateral de 1.35; e c) sítio de alta densidade eletrônica, que reconhece o grupamento amina da cadeia lateral (ionizado em pH fisiológico), por meio de interações do tipo íon-dipolo. Nesse caso par- ticular, o enantiômero (R)-(1.35) apresenta-se praticamente destituído das propriedades b-bloqueadoras terapeuticamente úteis, devido à menor afinidade decorrente da perda do ponto de interação (b), apresentando, por sua vez, propriedades indesejadas relacionadas à inibição da conversão do hormônio da tireoide tiroxina à tri-iodotironina (Figura 1.29B). Assim, de acordo com as regras de nomenclatura recomendadas pela IUPAC (Inter- national Union of Pure and Applied Chemistry), o enantiômero terapeuticamente útil de um fármaco, que apresenta maior afinidade e potência pelos receptores-alvo, é denomi- nado de eutômero, enquanto seu antípoda, ligante de menor afinidade pelo biorrecep- tor, denomina-se distômero.66 FIGURA 1.28 x RECONHECIMENTO MOLECULAR DOS GRUPAMENTOS FARMACOFÓRICOS DOS ENANTIÔMEROS DO PROPRANOLOL (1.35) PELOS RECEPTORES b1- E b2-ADRENÉRGICOS. (A) RECONHECIMENTO DO ENANTIÔMERO S ENVOLVENDO 3 PONTOS DE INTERAÇÃO; (B) ANTÍPODA R ENVOLVENDO 2 PONTOS DE INTERAÇÃO COM O BIORRECEPTOR. propranolol (1.35) Interações hidrofóbicas Interações hidrofóbicas Aspartato (S) (R) Aspartato Asparagina Asparagina A) B) Barreiro_01.indd 21 05/08/14 16:52 22 QUÍMICA MEDICINAL As diferenças de atividade intrínseca de fármacos enantioméricos, possuindo as mesmas propriedades fisico-químicas, excetuando-se o desvio do plano da luz polari- zada, é função da natureza quiral dos aminoácidos, que constituem a grande maioria de biomacromoléculas receptoras e que se caracterizam como alvos terapêuticos “oti- camente ativos”. Dessa forma, a interação entre os antípodas do fármaco quiral com receptores quirais, leva à formação de complexos fármaco-receptores diastereoisoméri- cos que apresentam propriedades físico-químicas e energias diferentes, podendo, assim, promover respostas biológicas distintas. CONFIGURAÇÃO RELATIVA E ATIVIDADE BIOLÓGICA* De forma análoga, alterações da configuração relativa dos grupamentos farmacofóricos de um ligante alicíclico ou olefínico também podem repercutir diretamente no seu reco- nhecimento pelo biorreceptor, uma vez que as diferenças de arranjo espacial dos grupos envolvidos nas interações com o sítio receptor implicam em perda de complementaridade e consequente redução de sua afinidade e atividade intrínseca, como ilustra a Figura 1.29. Um exemplo clássico que ilustra a importância da isomeria geométrica (cis-trans, E-Z) na atividade biológica de um fármaco diz respeito ao desenvolvimento do estrogê- nio sintético, E-dietilestilbestrol (1.36), cuja configuração relativa dos grupamentos para- -hidroxifenila mimetiza o arranjo molecular do ligante natural, isto é, hormônio estradiol (1.37), necessário ao seu reconhecimento pelos receptores de estrogênio intracelulares, como ilustra a Figura 1.30.67 O estereoisômero Z do dietilestilbestrol (1.38) possui distân- cia entre estes grupamentos farmacofóricos (7,7 Å) inferior àquela necessária ao reco- nhecimento pelo biorreceptor e, consequentemente, apresenta atividade estrogênica 14 vezes menor do que o isômero E correspondente (1.36) (Figura 1.31). * O Capítulo 7 ilustra aspectos particulares da importância da con- figuração relativa na atividade far- macológica dos fármacos. FIGURA 1.29 x CONFIGURAÇÃO RELATIVA E RECONHECIMENTO MOLECULAR LIGANTE-RECEPTOR. Isômeros de posição: Alicíclicos Isômeros geométricos Grupos A e B / A e C (TRANS) Grupos B e C (CIS) Grupos A e D /B e C (CIS) Grupos A e C / B e D (TRANS) Grupos A e B / C e D (CIS) Grupos A e C / B e D (TRANS) Grupos A e B (CIS) Grupos A e C / B e C (TRANS) Barreiro_01.indd 22 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 25 F IG U R A 1 .3 2 x V A R IA Ç Õ E S C O N F O R M A C IO N A IS D A A C E T IL C O L IN A ( 1 .3 9 ) E O R E C O N H E C IM E N T O M O L E C U L A R S E L E T IV O D O S G R U P A M E N T O S F A R M A C O F Ó R IC O S P E L O S R E C E P T O R E S M U S C A R ÍN IC O S E N IC O T ÍN IC O S . H 3C O O N C H 3 C H 3 C H 3 H H (H 3C ) 3 N H H O C H 3 O ac et ilc ol in a (1 .3 9) co nf ôr m er o an tip er ip la na r co nf ôr m er o si nc lin al H O HH N (C H 3) 3 H H (H 3C ) 3 N H H H O C H 3 O O H H H H N (C H 3) 3 O H 3C H 3C O 3, 74 Å 3, 31 Å O C H 3 H O N H 3C C H 3 C H 3 N HC H 3 m us ca rin a (1 .4 0) ni co tin a (1 .4 1) lig an te s el et iv o do s re ce pt or es m us ca rín ic os lig an te s el et iv o do s re ce pt or es n ic ot ín ic os 3, 74 Å 3, 31 Å N H re ce pt or es n ic ot ín ic os re ce pt or es m us ca rín ic os Barreiro_01.indd 25 05/08/14 16:52 26 QUÍMICA MEDICINAL ao correspondente antípoda ótico em preparações de córtex cerebral de ratos.75 Esta re- lação atropoisomérica é resultante do efeito-orto do grupo metila ligado ao anel tiofenila de 1.44 sobre a cadeia lateral que contém o grupo metilpiperazina, introduzindo uma barreira energética de 35 kcal/mol para a interconversão das conformações “borboleta” classicamente evidenciadas em sistemas tricíclicos dessa natureza (Figura 1.35). FIGURA 1.33 x ATROPOISOMERISMO DA BIFENILA ORTO-FUNCIONALIZADA (1.42). aS-(1.42) O2N NO2 CO2H HO2C NO2 HO2C O2N CO2H aR-(1.42) X NO2 CH2O2H HO2C NO2 NO2 CH2O2H O2N CO2H 1 2 34 1 2 43 FIGURA 1.34 x ANTIBIÓTICO ATROPOISOMÉRICO VANCOMICINA (1.43) COMPLEXADO À SUBUNIDADE D-ALA-D-ALA DO PEPTIDEOGLICANO BACTERIANO. N H H N N HO O O O O A DCl O N NH2 O OH O E Cl N H O NH2Me Me Me OH OH HO N O O2C B C O H H N H O CH3 N O CH3 O O D-Ala D-Ala H O OH HO OH OO Me H2N Me HO H vancomicina (1.43) Barreiro_01.indd 26 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 27 PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E A ATIVIDADE BIOLÓGICA Como mencionado, as propriedades físico-químicas de determinados grupamentos fun- cionais são de fundamental importância na fase farmacodinâmica da ação dos fármacos, etapa de reconhecimento molecular, uma vez que a afinidade de um fármaco pelo seu biorreceptor é dependente do somatório das forças de interação dos grupamentos far- macofóricos com sítios complementares da biomacromolécula. Entretanto, se considerarmos que a grande maioria dos fármacos é desenvolvida de forma a permitir sua administração pela via oral, a qual traz grandes vantagens quanto à adesão do paciente ao tratamento, a fase farmacocinética passa a ter grande im- portância para sua adequada eficácia terapêutica e é uma das principais causas para a descontinuidade da investigação de novos candidatos a fármacos nas etapas iniciais de triagem clínica.76 A fase farmacocinética, que engloba os processos de absorção, distri- buição, metabolização e excreção*, repercutindo diretamente na biodisponibilidade e no tempo de meia-vida do fármaco na biofase, também pode ser drasticamente afetada pela variação das propriedades fisico-químicas de um fármaco. Adicionalmente, deve-se considerar que as etapas da fase farmacocinética são precedidas, no caso de fármacos de uso oral administrados em formas farmacêuticas sólidas, das etapas de desintegra- ção, desagregação e dissolução que compõem a fase farmacêutica e são dependentes do perfil de hidrossolubilidade do princípio ativo (Figura 1.36). As principais propriedades fisico-químicas de uma micromolécula capazes de alterar seu perfil farmacoterapêutico são o coeficiente de partição, que expressa a relação entre o seu perfil de hidro e lipossolubilidade, e o coeficiente de ionização, expresso pelo pKa, que traduz o grau de contribuição relativa das espécies neutra e ionizada. Considerando-se que a grande maioria dos fármacos ativos por via oral é absorvida passivamente, tendo que transpor a bicamada lipídica que constitui o ambiente hidrofó- bico das membranas biológicas (Figura 1.37), destaca-se a importância das propriedades fisico-químicas, isto é, lipofilicidade e pKa, para que o fármaco atinja concentrações plasmáticas capazes de reproduzirem o efeito biológico evidenciado em experimentos * A fase farmacocinética é referi- da em livros de língua inglesa com ADME (A 5 absorção; D 5 distri- buição; M 5 metabolismo [ver Ca- pítulo 2]; E 5 excreção). FIGURA 1.35 x BARREIRA ENERGÉTICA DE INTERCONVERSÃO DE ATROPOISÔMEROS DA TELENZEPINA (1.44). N H N S O O N N H3C H3C telenzepina (1.44) Barreira de racemização 35 kcal/mol Barreiro_01.indd 27 05/08/14 16:52 30 QUÍMICA MEDICINAL E, então, o logaritmo do coeficiente de partição (Log PX) de um derivado funcionaliza- do com um substituinte X apresentado pode ser calculado empregando-se a Equação 1.2: Equação 1.2 Log Px 5 Log PH 1 px Acrescenta-se o valor da contribuição da constante hidrofóbica do substituinte X tabulada (ver anexos)* ao logaritmo do coeficiente de partição do derivado não substi- tuído (Log PH). Pode-se exemplificar o emprego dessa equação no cálculo do logaritmo do coefi- ciente de partição do analgésico paracetamol (1.47) a partir de valores experimental- mente obtidos para o fenol (1.48), a acetanilida (1.49) e o benzeno (1.50), como ilustra a Figura 1.40. Deve-se destacar que, face ao caráter aditivo do parâmetro lipofilicidade em derivados congêneres, qualquer das rotas utilizadas na predição do Log P do paracetamol (1.47) leva a valores bem próximos daquele obtido experimentalmente, ou seja, 0,46. A limitação do emprego desse método de predição do coeficiente de partição está relacionada à impossibilidade de extrapolação dos valores da contribuição hidrofóbi- ca de radicais monovalentes (p. ex., 2CH3) para radicais divalentes (p. ex., 2CH22) ou trivalentes. Nesses casos, os valores preditos empregando-se as constantes px são normalmente menores do que os valores experimentais correspondentes, fato que pode ser contornado pelo emprego das constantes fragmentais (f) de Mannhold e Rekker.84 Durante o estudo de uma série congênere de substâncias bioativas, o uso dos valo- res das constantes de hidrofobicidade de Hansch (pX) e mesmo das constantes de contri- buição eletrônica de Hammett85 (sX) permite orientar a introdução de grupos funcionais de acordo com a natureza da propriedade física que se deseja potencializar, visando mo- dificações no perfil farmacocinético ou farmacodinâmico. O diagrama de Craig86 agrupa em quadrantes os grupos funcionais que apresentam características similares em relação às contribuições hidrofóbicas e aos efeitos eletrônicos, isto é, p1/p2, grupos que incre- mentam e reduzem a lipofilicidade, respectivamente; s 1/s2, grupos elétron-retiradores e elétron-doadores, respectivamente (Figura 1.41). Ademais, é possível prever os valores do Log P teórico de derivados desta série congênere apresentando diferentes substituin- tes, com relativa acurácia, tendo como base apenas o valor do coeficiente de partição experimental do derivado não substituído correspondente. * Estão incluídos, nos Anexos, da- dos tabulados das constantes frag- mentais. FIGURA 1.39 x MODELO BILINEAR USADO PARA DESCREVER AS CORRELAÇÕES ENTRE A ATIVIDADE BIOLÓGICA E A LIPOFILICIDADE DE UMA SÉRIE DE FÁRMACOS CONGÊNERES. B io d is p o n ib ili d ad e o ra l Faixa ideal de Log P Log P 1 0,5 -2 -1 0 1 2 3 4 5 0,25 Barreiro_01.indd 30 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 31 FIGURA 1.40 x USO DA EQUAÇÃO DE HANSCH NA PREDIÇÃO DO LOG P DO PARACETAMOL (1.47) A PARTIR DE DIFERENTES PRECURSORES NÃO SUBSTITUÍDOS. OH H H N H H H CH3 O OH N H CH3 O fenol (1.48) Log P 5 1,45 (Exp.) (octanol-água) acetanilida (1.49) Log P 5 1,16 (Exp.) (octanol-água) benzeno (1.50) Log P 5 2,13 (Exp.) (octanol-água) paracetamol (1.47) Log Px 5 0,46 (Exp.) (octanol-água) 1pNHCOCH3 (20,97) 1pOH (20,67) Log Px (calc.) 5 0,49 1pNHCOCH3 (20,97) 1pOH (20,67) Log Px (calc.) 5 0,48 Log Px (calc.) 5 0,49 FIGURA 1.41 x DIAGRAMA DE CRAIG – CORRELAÇÃO DOS VALORES DA CONSTANTE DE HIDROFOBICIDADE (p) VERSUS A CONTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA (p) DE GRUPOS FUNCIONAIS. +σ -σ +π-π SO2NH2 H3CSO2 H3CCO H3CCONH NMe2 Me Et t-butila NH2 OCH3 OH CF3SO2NO2 CF3 F CI Br I SF5 OCF3 CN CONH2 CO2H -2,0 -1,6 -1,2 -0,8 -0,4 0,4 1,0 0,75 0,50 0,25 -0,25 -0,50 -0,75 -1,0 0,8 1,2 1,6 2,0 +σ -π +σ +π +σ -π -σ +π Barreiro_01.indd 31 05/08/14 16:52 32 QUÍMICA MEDICINAL pKa A maior parte dos fármacos é ácida ou base fraca. Na biofase, fármacos de natureza ácida (HA) podem perder o próton, levando à formação da espécie aniônica correspon- dente (A2), enquanto fármacos de natureza básica (B) podem ser protonados, levando à formação da espécie catiônica (BH1), como ilustra a Figura 1.42. A constante de ionização de um fármaco é capaz de expressar, dependendo de sua natureza química e do pH do meio, a contribuição percentual relativa das espécies ioniza- das (A2 ou BH1) e não ionizadas correspondentes (HA ou B) (Figura 1.42). Essa proprieda- de é de fundamental importância na fase farmacocinética, uma vez que o grau de ioniza- ção é inversamente proporcional à lipofilicidade, de forma que as espécies não ionizadas, por serem mais lipofílicas, conseguem mais facilmente atravessar as biomembranas por transporte passivo; já as espécies carregadas são polares e normalmente se encontram solvatadas por moléculas de água, dificultando o processo de absorção passiva (permea- bilidade), mas, por outro lado, favorecendo a etapa de dissolução do princípio ativo nos fluidos do trato gastrintestinal que precede a etapa de absorção (Figura 1.42). Adicionalmente, essa propriedade físico-química é de fundamental importância na fase farmacodinâmica, devido à formação de espécies ionizadas que podem interagir complementarmente com resíduos de aminoácidos do sítio ativo da biomacromolécula receptora por ligação iônica ou interações do tipo íon-dipolo, como discutido no Item Forças eletrostáticas deste capítulo. A equação de Henderson-Hasselbach,87 que permite o cálculo do percentual de ionização de ácidos fracos, deriva da Equação 1.3: Ka Equação 1.3 HA 1 H2O ÷ H3O 1 1 A 2 Em que a constante de ionização Ka pode ser expressa pela relação das concentrações das espécies ionizadas, sobre as espécies não ionizadas, como ilustra a Equação 1.4: Equação 1.4 Ka 5 [H30 1 ] [A 2 ] [HA] Então, se considerarmos que: Equações 1.5 e 1.6 pKa 5 2Log Ka e pH 5 2log [H3O 1 ] FIGURA 1.42 x GRAU DE IONIZAÇÃO E ABSORÇÃO PASSIVA DE ÁCIDOS OU BASES FRACAS. (Fármaco ácido) (meio extracelular) (meio intracelular) (Fármaco básico) Barreiro_01.indd 32 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 35 De forma geral, a otimização do perfil de absorção gastrintestinal por difusão passi- va após administração oral de um protótipo candidato a fármaco pode ser alcançada por meio do balanço de seu perfil de permeabilidade e hidrossolubilidade. Como descrito anteriormente, a faixa de valores de Log P ou Log D7,4 ótima está geralmente compreen- dida entre 1 e 3 (Figura 1.39), e valores extremos traduzem um desbalanço nos perfis de permeabilidade e hidrossolubilidade capazes de impactar o perfil de biodisponibilidade oral, como ilustra o Quadro 1.3.90 O fármaco antimalárico artemisinina91 (1.59) é uma sesquiterpeno lactona obtida da planta de origem asiática Artemisia annua, que, por apresentar excelente perfil de ativi- dade antiplasmodial in vitro, resultante do estresse oxidativo promovido no parasita pela FIGURA 1.44 x VARIAÇÃO DO pKa EM ANÁLOGOS ESTRUTURAIS DO PIROXICAM (1.51). S N CH3 H N O N OO OH S N CH3 H N O OO OH piroxicam (1.51) pKa 5 6,3 (1.55) pKa 5 7,3 S N CH3 CH3 N O OO OH (1.56) pKa 5 9,8 O OH N H CH3 CH3 OCH3 O OH N H CH3 CH3 NH2 O metoprolol (1.57) pKa 5 9,7 Log P 5 1,88 (octanol-água) atenolol (1.58) pKa 5 9,6 Log P 5 0,16 (octanol-água) FIGURA 1.45 x PERFIL COMPARATIVO DAS PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS DO METOPROLOL (1.57) E DO ATENOLOL (1.58). Barreiro_01.indd 35 05/08/14 16:52 36 QUÍMICA MEDICINAL cissão oxidativa da ponte endoperóxido de 1.59, tem grandes limitações de aplicação terapêutica pela via oral em função de seu baixo perfil de hidro e lipossolubilidade (Figu- ra 1.46A). Nesse contexto, visando contornar essa limitação das propriedades estruturais do produto natural (1.59), uma série de análogos foi sintetizada com o objetivo de se potencializar seu perfil de lipo ou hidrossolubilidade. Entre eles, merece destaque o arte- sunato de sódio92 (1.60), derivado hidrossolúvel obtido pela inserção de uma subunidade succinila, que apresenta biodisponibilidade oral de 82% da dose administrada, aproxi- madamente 10 vezes superior à da artemisinina (1.59) (Figura 1.46A). Outro exemplo que ressalta a importância da adequação do perfil de lipo/hidrosso- lubilidade de candidatos a fármacos, diz respeito à otimização das propriedades farma- cocinéticas do protótipo antiviral L-685,434 (1.61), inativo por via oral em função do bai- xo perfil de hidrossolubilidade.93 A inserção de uma cadeia lateral básica ionizável, que resultou na gênese do inibidor de HIV protease indinavir (1.62), promoveu o incremento do perfil de hidrossolubilidade e o consequente aumento da biodisponibilidade oral para 60% da dose administrada (Figura 1.46B). À luz desse panorama, Amidon e colaboradores94 desenvolveram o Sistema de Clas- sificação Biofarmacêutica, no qual, em função do seu perfil de solubilidade em água e permeabilidade por difusão passiva, os fármacos podem ser classificados em uma de quatro classes (I a IV), como ilustra a Figura 1.47. Esse sistema é uma das ferramentas de prognóstico mais importantes para se facilitar a descoberta e o desenvolvimento de fármacos para uso oral nos últimos anos,95 tendo sido vastamente empregado por agên- cias regulatórias como o Food and Drug Administration (FDA), a Agência Europeia de Medicamentos (EMEA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) para a normatização de padrões de biodisponibilidade/bioequivalência usados na aprovação de fármacos ati- vos por via oral. O Quadro 1.4 ilustra exemplos de fármacos que pertencem a diferentes classes do sistema de classificação biofarmacêutica. Adicionalmente, vários grupos de pesquisa, especialmente associados a diferentes indústrias farmacêuticas, vêm tentando identificar, pela análise sistemática de bancos de dados de fármacos oralmente ativos, propriedades estruturais que possam balizar a identificação de compostos oralmente ativos, nos estágios iniciais do processo de de- senvolvimento de fármacos. Entre esses estudos, merece destaque aquele realizado por Lipinski e colaboradores,96 os quais, após análise do World Drug Index, propuseram a chamada Regra dos Cinco, um conjunto de regras que traduziam características estrutu- rais comuns dos fármacos oralmente ativos deste banco de dados, a saber: • peso molecular , 500 Da; • presença de número # 5 grupos doadores de ligação de hidrogênio; • presença de número # 10 grupos aceptores de ligação de hidrogênio; • Log P calculado # 5. QUADRO 1.3 x RESULTADO DA VARIAÇÃO DA LIPOFILICIDADE (LOG D7,4) NO PERFIL DE ABSORÇÃO ORAL DE SUBSTÂNCIAS BIOATIVAS Log D7,4 , 1,0 Substâncias apresentam boa hidrossolubilidade, mas baixa taxa de absorção passiva, devido à baixa permeabilidade. Compostos tendem a ter alta taxa de excreção renal. 1,0 . Log D7,4 , 3,0 É a faixa ótima para uma boa absorção intestinal, devido ao adequado equilíbrio entre a hidrossolubilidade e a taxa de permeabilidade por difusão passiva. 3,0 . Log D7,4 , 5,0 Compostos apresentam alta permeabilidade, mas a absor- ção é reduzida devido ao baixo perfil de hidrossolubilidade. Log D7,4 . 5,0 Substâncias tendem a ter baixa absorção e biodisponibili- dade oral, devido à baixíssima hidrossolubilidade e ao au- mento da taxa de metabolização. Fonte: Adaptado de Kerns e Di.90 Barreiro_01.indd 36 05/08/14 16:52 CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS 37 O H O O O H H3C CH3 CH3 O O O H3C CH3 CH3 O O ONa O artesunato de sódio (1.60) Boa hidrossolubilidade Biodisponibilidade oral (%) 5 82 artemisinina (1.59) Baixa hidrossolubilidade Baixa lipossolubilidade Biodisponibilidade oral (%) 5 8-10 A) B) H N OH O H N OH OH3C CH3 H3C O L-685,434 (1.61) Baixa solubilidade em H2O Biodisponibilidade oral (%) 5 0 OH O H N OH N N N N H O CH3 CH3 CH3 indinavir (1.62) Mais solúvel em H2O (pH dependente) Biodisponibilidade oral (%) 5 60 sítio ionizável FIGURA 1.46 x OTIMIZAÇÃO DAS PROPRIEDADES FARMACOCINÉTICAS DO FÁRMACO ANTIMALÁRICO ARTEMISININA (1.59) (A) E DO PROTÓTIPO ANTIVIRAL L-685-434 (1.61) (B). Barreiro_01.indd 37 05/08/14 16:52 40 QUÍMICA MEDICINAL 10. Kutter E, Austel V. Application of the theory of sets to drug design. Development of a new cardiotonic drug AR-L 115 BS. Arzneimittelforschung. 1981;31(1a):135-41. 11. 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Diversos programas comerciais para predição do metabolismo in silico foram desenvolvidos, e exemplos de programas gratuitos serão comentados ao longo deste capítulo. Independentemente da opção do método empregado no estudo do metabolismo de fármacos (in vivo, in vitro ou in silico), o conhecimento prévio sobre a reatividade química de um determinado substrato (i.e., fármaco), frente às diferentes enzimas me- tabólicas, consiste em condição sine qua non para o sucesso do estudo. Não raramente, os metabólitos, para serem adequadamente isolados e terem suas estruturas elucidadas, precisam ser teoricamente previstos, em termos estruturais, antecipando informações sobre suas propriedades físico-químicas. Tais dados permitem racionalizar a escolha do método de isolamento (quali e quantitativamente) e de elucidação estrutural inequí- voca.8 Do mesmo modo, tais informações permitem antecipar dados sobre a provável estabilidade do metabólito frente ao método de isolamento escolhido, garantindo sua e- ficiência em termos quantitativos e evitando falsos-positivos. A predição da estrutura do metabólito, com base em dados de reatividade química, é igualmente útil na análise dos resultados obtidos a partir de estudos do metabolismo in silico, permitindo uma análise crítica dos dados gerados e a detecção precoce de eventuais erros. Em termos moleculares, as reações metabólicas de fase 1 e fase 2 têm como princi- pal objetivo transformar fármacos lipofílicos (↑ Log P; Log D7,4 . 0; ↓ PSA) em metabó- litos hidrofílicos (↓ Log P; Log D7,4 , 0; ↑ PSA), favorecendo a eliminação por via renal. 9 QUADRO 2.1 x COMPLEXOS ENZIMÁTICOS ENVOLVIDOS COM O METABOLISMO DE FASE 1 E FASE 2 E SUA PRINCIPAL LOCALIZAÇÃO SUBCELULAR METABOLISMO DE FASE 1 COMPLEXO ENZIMÁTICO LOCALIZAÇÃO SUBCELULAR PRINCIPAL Citocromo P450 monoxigenases Retículo endoplasmático Flavina monoxigenase Retículo endoplasmático Aldeído desidrogenase Citosol Álcool desidrogenase Citosol Monoaminoxidase Mitocôndria Xantina oxidase Citosol Azo ou nitroredutases Citosol Aldocetoredutases Citosol Oxidoredutase Citosol Epóxido hidrolase Retículo endoplasmático Hidrolases (esterases, amidases, lipases) Citosol METABOLISMO DE FASE 2 COMPLEXO ENZIMÁTICO LOCALIZAÇÃO SUBCELULAR PRINCIPAL Glicuroniltransferase Retículo endoplasmático Glutationatransferase Citosol Sulfotransferase Citosol Metiltransferases não específicas Citosol Catecol o-metiltransferase Citosol Acetiltransferase Citosol Barreiro_02.indd 45 05/08/14 17:07 46 QUÍMICA MEDICINAL CONSEQUÊNCIAS DO METABOLISMO DE FÁRMACOS As transformações químicas, metabolismo-dependentes, promovidas na estrutura dos fár- macos podem acarretar profundas alterações na resposta biológica, uma vez que modifi- cações moleculares, ainda que singelas, podem alterar significativamente o farmacóforo e/ ou os grupos auxofóricos, dificultando ou impedindo a interação com o biorreceptor origi- nal (p. ex., celecoxibe, 2.1; Figura 2.3). Desta forma, um fármaco originalmente ativo pode gerar metabólitos inativos, em um processo conhecido por bioinativação (Quadro 2.2).10 Em outras circunstâncias, as modificações introduzidas com as reações metabólicas de fase 1 (majoritariamente) ou de fase 2 (minoritariamente) podem gerar metabólitos ativos, em um processo conhecido por bioativação. Este processo pode aumentar a afi- nidade do metabólito pelo biorreceptor do fármaco original (p. ex., tamoxifeno, 2.2; Figura 2.3)11 ou favorecer o reconhecimento por biomacromoléculas receptoras distintas do alvo molecular inicial, acarretando distintos efeitos biológicos, algumas vezes respon- sáveis pelos efeitos adversos e/ou tóxicos, metabolismo-dependente, de alguns fármacos (p. ex., paracetamol, 2.3; Figura 2.3).12 O processo metabólico de bioativação é a base fundamental do desenvolvimento de pró-fármacos, no qual uma substância desprovida de atividade (i.e., inativa) é convertida em metabólito ativo, responsável pelo efeito far- macológico desejado (Quadro 2.2). Por estas razões, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que o estudo do metabolismo de fármacos seja parte integrante obrigatória de todos os programas de avaliação pré-clínica e clínica de quaisquer novos medicamentos. Por meio desses estudos – e em conjunto com dados sobre o volume de distribui- ção, clearance e absorção – é possível determinar a meia-vida e a biodisponibilidade oral de um determinado fármaco, prevendo o melhor esquema posológico (dose e fre- quência de administração). Esses estudos permitem, ainda, identificar a presença de metabólitos ativos, os quais obrigatoriamente deverão ser estudados quanto a seu perfil de atividade e segurança. De forma sumária, o estudo do metabolismo de fármacos permite: a) determinar a estabilidade metabólica; b) estabelecer a cinética de formação e as estruturas químicas dos metabólitos; c) determinar os níveis de concentração e depósito, plasmático e tissular, tanto do fármaco como de seus metabólitos, permitindo estabelecer sua meia vida na biofase; d) determinar a principal via de eliminação; e) determinar os sítios moleculares metabolicamente vulneráveis (i.e., lábeis) e correlacioná-los com grupos farmacofóricos e auxofóricos do fármaco original; FIGURA 2.3 x ESTRUTURAS DO CELECOXIBE (2.1), TAMOXIFENO (2.2) E PARACETAMOL (2.3). HN O CH3 OH N N CF3 H3C S H2N O O CH3 O N CH3 H3C celecoxibe (2.1) paracetamol (2.3) tamoxifeno (2.2) Barreiro_02.indd 46 05/08/14 17:07 CAPÍTULO 2 FUNDAMENTOS DO METABOLISMO DE FÁRMACOS 47 f) estabelecer a eventual capacidade indutora ou inibidora do fármaco e seus metabólitos sobre enzimas do metabolismo, antecipando eventuais problemas de interações medicamentosas; g) determinar a atividade e a toxicidade dos metabólitos e correlacioná-los com a estrutura química; h) fornecer bases racionais para o desenho e novos protótipos de fármacos; i) fornecer bases racionais para a otimização das propriedades farmacocinéticas de fármacos e compostos-protótipos. METABOLISMO DE FASE 1 OU BIOTRANSFORMAÇÃO Os fármacos, assim como outros xenobióticos (p. ex., solventes industriais, pesticidas, co- rantes, flavorizantes, aromatizantes, poluentes atmosféricos, etc.), são metabolizados por distintos sistemas enzimáticos, visando assegurar seu processo de inativação e eliminação. As reações metabólicas de fase 1 ou biotransformação caracterizam-se por envolver reações de oxidação, redução e hidrólise, as quais frequentemente resultam na obtenção de metabólitos hidroxilados. As desalquilações, por sua vez, constituem um tipo especial de reação oxidativa e contribuem para a formação de metabólitos com a inclusão de radicais OH, NH2 e SH. Embora as transformações metabólicas de fase 1 conduzam à geração de metabólitos de maior polaridade em comparação aos fármacos originais, frequentemente elas são insuficientes para assegurar o aumento da hidrofilia e a conse- quente eliminação pela via renal. Por esta razão, em linha gerais, o metabolismo de fase 1 tem como objetivo funcionalizar a estrutura do fármaco, de modo a torná-lo substrato para as reações metabólicas de fase 2. No entanto, dependendo da funcionalização prévia da estrutura do fármaco, essa situação ideal (fase 1 → fase 2) não será observada, sendo o fármaco um substrato direto das reações metabólicas de fase 2, que serão co- mentadas posteriormente (Figura 2.2). CITOCROMO P450 (CYP540) A análise da natureza dos complexos enzimáticos envolvidos no metabolismo de fase 1 (Quadro 2.1) revela o predomínio de enzimas oxidativas, entre as quais o citrocromo P450 (CYP450 ou CYP) tem lugar de destaque, dado seu papel fundamental no metabo- lismo hepático de fármacos das mais diversas classes terapêuticas. CYP450 é o nome genérico dado a uma superfamília de hemeproteínas encontradas em células procariontes (p. ex., bactérias) e eucariontes (animais, plantas, fungos, insetos). Quando associadas a uma flavoproteína redutase (i.e., NADPH-citocromo-P450 redutase), formam o sistema oxidase de função mista (MFO, do inglês mixed function oxidase). Do ponto de vista bioquímico, são monoxigenases que promovem oxidação a partir da inser- ção de um átomo de oxigênio em um substrato orgânico (RH), a exemplo da estrutura do fármaco, enquanto o outro átomo de oxigênio é reduzido à água (Quadro 2.3).13,14 QUADRO 2.2 x METABOLISMO DE FÁRMACOS Fármaco ativo Metabólito inativo (Bioinativação) Fármaco ativo Metabólito ativo (Bioativação ou Toxificação) Fármaco inativo (Pró-fármaco) Metabólito ativo (Bioativação) QUADRO 2.3 x EXEMPLO ESQUEMÁTICO DE REAÇÃO CATALISADA POR MONOXIGENASES RH + O2 + NADPH + 2H+ NAD(P)+ + R-OH + H2O Barreiro_02.indd 47 05/08/14 17:07 50 QUÍMICA MEDICINAL tipo de hemeproteína. A mioglobina, por exemplo, é caracterizada pelo ferro em estado de oxidação 12 e pela coordenação com o nitrogênio imidazólico de resíduos de histidina, enquanto o CYP450 distingue-se pela coordenação com o átomo de enxofre do resíduo de aminoácido cisteína e pela presença do ferro em estado de oxidação 13 (Figura 2.8). Em condição de inatividade (i.e., estado de repouso), o grupo heme das enzimas da superfamília CYP450 apresenta, além das cinco coordenações características (4 nitro- gênios pirrólicos e o enxofre da cisteína), um sexto ligante axial, representado por uma molécula de água (A, Figura 2.9). No estágio de hexacoordenação, o complexo assume geometria octaédrica e estado de baixo spin (S 5 ½). A entrada do substrato (p. ex., fármaco) no sítio ativo dispara modificações conformacionais, que resultam no desloca- QUADRO 2.5 x CARACTERÍSTICAS DAS SEIS PRINCIPAIS ISOENZIMAS DE CYP ENVOLVIDAS COM O METABOLISMO DE FÁRMACOS CYP 1A2 CYP 2C9 CYP 2C19 Preferência por substratos planares lipofílicos, neutros ou básicos. Substrato: fenacetina (2.4) e cafeína (2.5) Inibidor: teofilina (2.6) Preferência por substratos que con- tenham grupo doador de ligação hi- drogênio (comumente de natureza aniônica) próximo à região lipofílica lábil. Substrato: tolbutamida (2.7), napro- xeno (2.8), varfarina (2.9) Inibidor: sulfafenazol (2.10) Preferência por substratos lipofílicos, neutro e de tamanho intermediário. Substrato: diazepam (2.11), imiprami- na (2.12) Inibidor: ticlopidina (2.13) CYP 2D6 CYP 2E1 CYP 3A4 Preferência por substratos arilal- quilaminas com sítio de oxidação lo- calizado a 5-7Å do N-básico. Substrato: fluoxetina (2.14), meto- prolol (2.15) Inibidor: quinidina (2.16) Preferência por substratos lipofíli- cos cíclicos ou lineares pequenos (PM # 200 Da). Substrato: paracetamol (2.3), halo- tano (2.17) Inibidor: disulfiram (2.18) Preferência por substratos lipofílicos, neutros, básicos ou ácidos. Oxidação dependente da reatividade química do substrato. Substrato: terfenadina (2.19), diltia- zem (2.20) Inibidor: cetoconazol (2.21) Fonte: Adaptada de Smith. 16 FIGURA 2.6 x REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO COMPLEXO CYP MICROSSOMAL/ NADPH-CYP450 REDUTASE E SEU DOMÍNIO DE ANCORAMENTO À MEMBRANA DO RETÍCULO ENDOPLASMÁTICO. Domínio de ancoramento à membrana Membrana do retículo endoplasmático substrato - dipolo + redutase substrato CYP450 2 e- NADP+ NADPH O2 FAD FMN OH - - - + + + NADPH- CYP450 Barreiro_02.indd 50 05/08/14 17:07 CAPÍTULO 2 FUNDAMENTOS DO METABOLISMO DE FÁRMACOS 51 N N Ph Cl H3C O diazepam (2.11) N imipramina (2.12) N H3C CH3 Cl N S ticlopidina (2.13) fluoxetina (2.14) F3C O H N CH3 O H N CH3 CH3 OH metoprolol (2.15)O H3C quinidina (2.16) N HO H3CO N CH2 F3C Br Cl halotano (2.17) N S S S S N CH3 CH3 CH3 H3C dissulfiram (2.18) N (CH2)3 HO CH3 CH3 CH3 Ph Ph HO terfenadina (2.19) O O Cl Cl N N O H N N O H3C cetoconazol 2.21) R= OH paracetamol (2.3) R= OCH2CH3 fenacetina HN O CH3 R N N N N O O H3C CH3 CH3 cafeína (2.5) N N N H N O O H3C CH3teofilina (2.6) S NH O O O NH CH3 tolbutamida (2.7) CH3 sulfafenazol (2.10) H2N S O O H N N N Ph naproxeno (2.8) H3CO CH3 CO2H O O OH varfarina (2.9) Ph O CH3 S N OAc O OCH3 NH3C CH3 diltiazem (2.20) Barreiro_02.indd 51 05/08/14 17:07 52 QUÍMICA MEDICINAL FIGURA 2.8 x ESTRUTURA DO GRUPO HEME DO CYP450. mento da molécula de água, culminando na obtenção de um complexo pentacoordenado com geometria bi- piramidal trigonal e/ou bipiramidal quadrada e alto spin (S5 5/2) (B, Figura 2.9). Neste estágio de coordenação, o complexo encontra-se apto a receber um elétron doado pela NADPH-CYP450 redutase, promovendo a redução do Fe13 em Fe12. O complexo reduzido (C, Fi- gura 2.9) reage com oxigênio molecular formando o radical D (Figura 2.9), que é novamente reduzido para gerar o ânion Fe(III)-peróxido (E, Figura 2.9), que sofre protonação conduzindo à espécie Fe(III)-hidroperóxido (F, Figura 2.9). Este complexo de característica nucle- ofílica é rapidamente protonado, conduzindo à perda de uma molécula de água com consequente geração de espécie eletrofílica, altamente reativa, com o ferro em estado de oxidação 14 (G, Figura 2.9). Finalmente, esta espécie reage com o substrato (fármaco) promo- vendo a cisão homolítica da ligação carbono-hidrogê- nio (C-H), resultando na formação de um intermediário radicalar (R∙), que sofre, posteriormente, a adição do grupo hidroxila (OH), regenerando a enzima em seu es- tado inicial de repouso (Figura 2.9).18 Desta forma, uma maior ou menor reatividade de um substrato frente às reações oxidativas catalisadas pelas diferentes CYP depende do reconhecimento da proteína (CYP) pelo substrato, da energia necessária para dissociar a ligação C-H (Quadro 2.6) e consequente estabilização do intermediário radicalar formado. As enzimas da superfamília de CYP microssomais são encontradas em altas concen- trações no retículo endoplasmático de órgãos como fígado, rins, vias nasais, cérebro, pele e intestino. As seis isoenzimas identificadas como essenciais ao metabolismo de fármacos (Figura 2.4) catalisam uma série de reações oxidativas, características do metabolismo de fase 1, incluindo hidroxilações (p. ex., aromáticas, alílicas, benzílicas, alquílicas e a-hete- roátomo); oxidação de heteroátomos; epoxidações e desalquilações. Tais reações ocorrem majoritariamente em nível hepático, com exceção da CYP3A4, que, em face de sua abun- dância no intestino, catalisa o metabolismo oxidativo hepático e intestinal de xenobióticos. HIDROXILAÇÕES As hidroxilações constituem um tipo clássico de reação metabólica oxidativa catalisada pelas CYPs. De acordo com a natureza do carbono oxidado, elas são classificadas em: aromática; benzílica; alílica; a-heteroátomo e alifática (Quadro 2.7). HIDROXILAÇÃO AROMÁTICA A hidroxilação aromática constitui uma das transforma- ções metabólicas mais comuns de fase 1, haja vista a presença de no mínimo um anel aromático na estrutura dos fármacos disponíveis na terapêutica. O mecanismo de hidroxilação aromática, ilustrado na Figura 2.10, inicia-se pela formação de complexo-p entre a nuvem eletrônica do anel aromático e o CYP450, em sua forma reativa (G, Figura 2.9), ocorrendo a transferência de um elétron e a formação de complexo-s (etapa A’) ou complexo-s radica- lar (etapa A) (Figura 2.10). Ambos os complexos originam o intermediário óxido de areno (etapas C e C’) e posterior FIGURA 2.7 x ESTRUTURA CRISTALOGRÁFICA DO CYP3A4 (PDB 4K9W). UNIDADE PROSTÉTICA REPRESENTADA PELO GRUPO HEME (EM MAGENTA), PARTE PROTEICA REPRESENTADA PELAS ALFA-HÉLICES (EM VERMELHO), FOLHAS BETA (EM AMARELO) E ALÇAS (EM VERDE). Barreiro_02.indd 52 05/08/14 17:07 CAPÍTULO 2 FUNDAMENTOS DO METABOLISMO DE FÁRMACOS 55 a maior estabilidade comparativa do radical formado na posição 6 do anel cromeno, permi- tindo prever a formação preferencial do metabólito-6-hidroxi-varfarina (2.22) (Figura 2.12). O metabolismo oxidativo do diclofenaco (2.30) frente a diferentes CYP recombi- nantes de humanos é um exemplo clássico de como a regiosseletividade do processo de hidroxilação aromática pode depender preferencialmente da interação enzima-subs- trato. Do ponto de vista eletrônico, a hidroxilação da posição C5 é preferencial a C4’, permitindo prever a formação do metabólito 5-hidroxi-diclofenaco (2.31) – formado pela ação catalítica do CYP3A4 e de outras isoenzimas recombinantes, à exceção da CYP2C9. Sob catálise da CYP2C9, o metabólito formado é o 4’-hidroxi-diclofenaco (2.32). Foi demonstrado que a oxidação da posição C4’ depende da interação realizada entre o carboxilato e os resíduos básicos do sítio ativo enzimático, orientando o anel fenila di- clorado para o grupo heme. A redução do ácido carboxílico gera o derivado 2.33, que perde a interação com os resíduos de aminoácidos básicos e, portanto, ao contrário do diclofenaco, é oxidado pela CYP2C9 na posição eletronicamente mais favorável (C5), gerando o metabólito 2.34 (Figura 2.13).20 FIGURA 2.10 x PROPOSTA DE MECANISMO DE HIDROXILAÇÃO AROMÁTICA CATALISADA PELAS ENZIMAS DA SUPERFAMÍLIA CYP450. Fe+4 N N S NN Cys O Fe+3 N N S NN Cys O H H complexo-π complexo-σ radicalar CYP450(Fe+3) O óxido de areno Fe+3 N N S NN Cys O H H complexo-σ NIH shift CYP450(Fe+3) O H H HO A A' C C' D E Barreiro_02.indd 55 05/08/14 17:07 56 QUÍMICA MEDICINAL FIGURA 2.11 x EXEMPLOS DE FÁRMACOS METABOLIZADOS POR HIDROXILAÇÃO AROMÁTICA: VARFARINA (2.9); FENITOÍNA (2.23); BUSPIRONA (2.26) E ANFETAMINA (2.28). S,R-varfarina (2.9) (2.22) fenitoína (2.23) (2.24) (2.25) buspirona (2.26) anfetamina (2.28) (2.27) (2.29) O O OH O CH3 O O OH O CH3 HO CYP2C9 6 NH H N NH H N HO O O O O (S) NH H N O O (R) HO CYP2C19 (1:1 R/S) CYP2C9 (1:40 R/S) N N N N N O O N N N N N O O HO CYP3A4 NH2 CH3 NH2 CH3 CYP2D6 HO FIGURA 2.12 x VARFARINA (2.9) E SEU METABÓLITO 6-HIDROXIVARFARINA (2.22) E A ENERGIA COMPARATIVA DOS RADICAIS FORMADOS NAS POSIÇÕES C6, C7 E C8 DO ANEL CROMENO. (S,R)-varfarina (2.9) (2.22) Barreiro_02.indd 56 05/08/14 17:07 CAPÍTULO 2 FUNDAMENTOS DO METABOLISMO DE FÁRMACOS 57 HIDROXILAÇÃO BENZÍLICA A presença de metila(s) ou carbono(s) benzílico(s) na estrutura de fármacos frequente- mente resulta em labilidade metabólica, por meio de reação oxidativa conhecida por hidroxilação benzílica. A hidroxilação benzílica é comandada por efeitos eletrônicos de estabilização do radical benzílico formado durante o processo de oxidação com a espécie oxidante eletrofílica (G) ilustrada na Figura 2.9. Embora o processo oxidativo conduza inicialmente ao álcool benzílico (2.35, Figura 2.14), raramente este metabólito é isolado, haja vista sua rápida metabolização ao ácido carboxílico correspondente, por ação das enzimas CYPs ou álcool desidrogenase (ADH). Celecoxibe (2.1), zolpidem (2.37), tolaza- mida (2.40), indacaterol (2.42) e losartana (2.44) são exemplos de fármacos substratos de hidroxilação benzílica catalisada por diferentes isoenzimas do CYP450 (Figura 2.14). HIDROXILAÇÃO ALÍLICA Semelhante às posições benzílicas, a presença de carbonos alílicos confere à estrutura do substrato susceptibilidade oxidativa. A cisão homolítica da ligação C-H de uma subuni- dade alílica, decorrente da ação oxidativa do CYP450, resulta na formação de radical es- tabilizado, viabilizando sua hidroxilação. Quinina (2.46) e naloxona (2.48) são exemplos de fármacos substratos de hidroxilação alílica CYP catalisada (Figura 2.15). HIDROXILAÇÃO ALIFÁTICA A hidroxilação alifática, embora eletronicamente menos favorável que as hidroxilações benzílica e alílica, é comum em substratos contendo subunidades isopropila (2.50 e FIGURA 2.13 x DICLOFENACO (2.30) E SEUS METABÓLITOS (2.21 E 2.22) E O PAPEL DA SUBUNIDADE ÁCIDO-CARBOXÍLICO NA REGIOSSELETIVIDADE DA HIDROXILAÇÃO, CATALISADA PELA CYP2C9 E EVIDENCIADA ATRAVÉS DO METABOLISMO DO ANÁLOGO 2.23. O OH N H ClCl 1' 4' 1 2 3 4 5 6 O OH N H ClCl 1' 4' 1 2 3 4 5 6 OH O OH N H ClCl 1' 4' 1 2 3 4 5 6 CYP2C9 CYP3A4 diclofenaco (2.30) HO (2.31) (2.32) OH N H ClCl 1' 4' 1 2 3 4 5 6 CYP2C9 CYP3A4 OH N H ClCl 1' 4' 1 2 3 4 5 6 HO (2.33) (2.34) Barreiro_02.indd 57 05/08/14 17:07
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