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Guias e Dicas
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Comunicação Publicitária e Marketing, Manuais, Projetos, Pesquisas de Comunicação

Nesse livro, o autor apresenta os instrumentos da comunicação mercadológica (a publicidade, a propaganda, a promoção de vendas, as relações públicas, o 'marketing')

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2014

Compartilhado em 25/04/2014

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Baixe Comunicação Publicitária e Marketing e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Comunicação, somente na Docsity! CETTE CL TIRA ICT ELA ED] Pragmática. Comunicação Publicitária AURA A i i i i i i i i i i i i i i i i Índice Apresentação 1 Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía lingüística en la publicidad del siglo XXI por Ma Milagros del Saz Rubio 5 “O sushi é fish” – análise de publicidades a restaurantes japoneses em Portugal por Rosa Lídia Coimbra & Urbana Pereira Bendiha 27 Imagens da ironia na publicidade por Paulo Serra 43 Práticas e Discursos Estratégicos - da norma à transgressão, da rotina à inovação por Ângela Lacerda Nobre 63 Narrativas de defesa e culpa nos discursos organizacionais por Gisela Gonçalves 85 Modos de dizer da publicidade e do jornalismo para públicos sê- niores, em Portugal: marcas de intertextualidade em duas prá- ticas sóciodiscursivas por Annamaria da Rocha Jatobá Palacios 101 I i i i i i i i i Retórica y publicidad. Hacia un análisis de las estrategias discursivas por Inmaculada Postigo Gómez 121 O idealismo do comércio online na terceira idade: A conceptualiza- ção da interface por Bruno Alexandre do Nascimento Rego 149 Interactividade na publicidade web: potencial subaproveitado por Célia Barreto 171 Evolução Histórica do Conceito de Comunicação em Saúde por Graça Castelo-Branco 189 A Marca como Elemento Publicitário da Embalagem: A sua apreen- são pelos públicos infantis pré-escolares por Madalena Duarte Craveiro Sena 207 II i i i i i i i i Apresentação Os textos que compõem a presente coletânea possuem em comum o mo- vimento de observação e de análise de configurações e estratégias comunica- tivas, empregadas e reconhecidas como estruturadoras dos discursos persua- sivos da esfera mediática, especialmente do publicitário. Em comum também o ineditismo e o fato de terem sido preparados para apresentação, em novembro de 2010, nas IV Jornadas LabCom sobre Prag- mática, Comunicação Publicitária e Marketing, evento anualmente promovi- do pelo Laboratório de Comunicação e Conteúdos Online, LabCom (http: //www.labcom.ubi.pt). A disposição dos textos na coletânea coincide com a ordem de apresenta- ção durante o evento. Formatos textuais originalmente escritos como confe- rências e comunicações foram transformados em artigos e aqui comparecem, para divulgação e compartilhamento. A organização das IV Jornadas foi motivada pela necessidade de se dar atenção, no âmbito acadêmico, a gêneros textuais identificados como persu- asivos e a aspectos relacionados com os processos produtivos destas tipolo- gias. Partiu-se da premissa de que existe uma reconhecida lacuna na produ- ção acadêmico-científica, principalmente em língua portuguesa, comprome- tida com estes enfoques. Levou-se em consideração a oportunidade de se poder reunir pesquisado- res, cujas produções objetivam compreender os mecanismos linguístico-dis- cursivos desenvolvidos por práticas sóciodiscursivas, a exemplo da publici- dade, da comunicação organizacional e do marketing. Interessaram as aborda- gens realizadas à luz de conceitos e noções relacionados com campos teórico- metodológicos aproximados da comunicação, a exemplo da pragmática lin- guístico-discursiva. 1 i i i i i i i i 4 Pragmática: Comunicação Publicitária e Marketing to específicos, segue-se a participação da doutoranda Célia Barreto, na área da interactividade dos anúncios web. Intitulada Interactividade na publici- dade web: potencial subaproveitado, a autora propõe uma nova tipologia de anúncios que serve de base para um estudo empírico, ao mesmo tempo que apresenta os resultados preliminares desse estudo. A análise do panorama da publicidade web, em Portugal, comporta um levantamento quantitativo da pu- blicidade veiculada em sites portugueses, tanto no que diz respeito a formatos, quanto à questão da interatividade. Em Evolução histórica do conceito de comunicação em saúde, a douto- randa Graça Castelo-Branco traça o desenvolvimento histórico desta vertente da comunicação, que cresceu a par de duas áreas da saúde pública – a pro- moção da saúde e a educação para a saúde – assinalando os marcos mais representativos e perspectivando eventuais caminhos para o seu futuro. As campanhas da Liga Portuguesa de Profilaxia Social são apresentadas como exemplos precursores da comunicação em saúde, em Portugal. A finalizar, Madalena Sena apresenta A Marca como elemento publici- tário da embalagem: a sua apreensão pelos públicos infantis pré-escolares. Conforme a autora, a marca, a par da cor e da imagem do produto, faz parte do conjunto de elementos publicitários da embalagem. Todos eles exercem funções comunicativas de importância relevante, principalmente no seio dos públicos infantis pré-escolares. Importa perceber o que é uma marca para um público que não descodifica o código linguístico, de que forma as marcas são percebidas por esse segmento de público, e em que altura e de que forma são assimiladas. Resumem-se, assim, as participações no âmbito das IV Jornadas LabCom sobre Pragmática, Comunicação Publicitária e Marketing. Espera-se que o lançamento desta coletânea possa contribuir para a sua potencialização ao divulgar os conteúdos abordados para públicos mais amplos e interessados, como também fazer valer os recursos, de ordem material e humana, emprega- dos em sua realização. Annamaria Jatobá Palacios e Paulo Serra Organizadores www.livroslabcom.ubi.pt i i i i i i i i Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía lingüística en la publicidad del siglo XXI Ma Milagros del Saz Rubio Universidad Politécnica de Valencia NO CABE DUDA de que los anuncios publicitarios en televisión se encu-entran entre los productos mediáticos más comunes del mundo en que vivimos, al menos en los países desarrollados y en vías de desarrollo. La fi- nalidad de los publicistas es promocionar y vender un producto, y de forma menos obvia crear una atmósfera o ambiente que propicie y facilite una ci- erta disposición mental hacia la compra del producto (cf. Baker, 1994; Cohen Eliya y Hammer, 2004; del Saz-Rubio y Pennock-Speck, 2009). Estas pe- culiaridades del discurso publicitario, donde entran en juego la emisión de un mensaje lingüístico, elementos de carácter extralingüístico, el co-texto, las creencias de los hablantes, sus conocimientos compartidos, o el denominado entorno cognoscitivo (cf. Sperber y Wilson, 1986), y donde normalmente se nos dice ‘algo’ pero realmente se nos exige interpretar ‘algo totalmente dife- rente’, hacen necesario abordar el estudio del discurso publicitario desde una perspectiva pragmalingüística. Es decir, el estudio del discurso publicitario en televisión nos obliga a considerar el anuncio dentro de unas coordenadas es- peciales de emisión y en conjunto con el resto de elementos extra-lingüísticos que lo acompañan, atendiendo a las imágenes, la música o las voces en off que participan en muchos de los anuncios publicitarios analizados. Esto re- sulta de especial importancia si consideramos que la publicidad en TV pasó en los años 50 de una aproximación exclusivamente racional, a la adopción de técnicas de carácter emotivo-sugestivo, con la incorporación de otros modos como las imágenes, o la música, más en consonancia con la finalidad de este medio. Autores como Cohen-Eliya y Hammer (2004, p. 167) consideran que las apelaciones directas a la lógica y al razonamiento del consumidor no se cuentan entre las tácticas más asiduas de los publicistas para alterar el sistema de valores del consumidor, lo cual se consigue de forma indirecta o encubi- erta. Del mismo modo, autores como Pennock-Speck y del Saz-Rubio (2009) han analizado el papel de elementos paralingüísticos como la voz en la trans- misión y recuperación de información a nivel subconsciente en un corpus de Pragmática: Comunicação Publicitária e Marketing , 5–26 i i i i i i i i 6 Ma Milagros del Saz Rubio anuncios. De ahí que únicamente mediante un análisis de carácter multimodal podamos llegar a comprender los métodos invisibles por medio de los cuales los anuncios cambian o modifican nuestros valores. El objetivo de este artículo consiste en ilustrar de qué manera el publicista articula toda una serie de estrategias de cortesía lingüística con la finalidad de convencer o persuadir a un destinatario de la necesidad de comprar o adquirir un producto y/o servicio ofertado con el consiguiente cambio en su comporta- miento. Por ello, comenzaré ofreciendo una definición de qué se entiende por cortesía lingüística dentro del ámbito de la pragmática y de la teoría general de la acción. En segundo lugar, justificaré el valor de este concepto como her- ramienta o recurso estratégico dentro del discurso publicitario en televisión. Después, revisaré brevemente los supuestos teóricos que conforman el mo- delo de cortesía de Brown y Levinson (1978, 1987) (B&L, en adelante), como taxonomía más completa desarrollada hasta el momento. Finalmente, pasaré a examinar cómo los publicistas ponen en marcha estrategias de cortesía po- sitiva, negativa y sin constancia para persuadir de la compra del producto (cf. del Saz, 2000) y así fomentar un clima de camaradería con el interlocutor. Marco teórico: la cortesía lingüística y el discurso pu- blicitario Los estudios de cortesía surgen como resultado del interés por la vertiente social de la comunicación y se agrupan en aquellos que enfatizan su papel como estrategia de prevención y/o minimización de la amenaza o confron- tación, o los que enfatizan su valor como recurso o estrategia para mante- ner las relaciones sociales entre hablantes. La cortesía debe entenderse como un conjunto de estrategias o comportamientos de carácter fundamentalmente lingüístico que nos ayudan a entender y fomentar las relaciones interpersona- les con nuestros interlocutores en intercambios comunicativos concretos, si- empre considerando los riesgos que pudiera entrañar el intercambio tanto para la imagen y el territorio propios, como para la de nuestro(s) interlocutor(e)s. Es decir, como ya apuntaba Haverkate (1994, p. 38) la cortesía representa un comportamiento que viene regido por principios de racionalidad, donde los participantes de la conversación actúan siempre guiados por esos principios i i i i i i i i Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía... 9 Materiales y método de análisis El corpus de anuncios seleccionado para este trabajo forma parte de un corpus más amplio de anuncios publicitarios en inglés y en español dirigi- dos a la venta de productos de higiene íntima femenina (compresas, salva slips, tampones, etc). Todos ellos han sido emitidos en canales públicos de las televisiones británica y española. En total, el corpus está compuesto de 92 anuncios, 46 españoles y 46 en lengua inglesa en sus variedades británica y americana. Para su análisis seguiré las siguientes dimensiones de análisis tomadas de Crook (2004): (i) la dimensión del producto, centrada en ofrecer información sobre el producto mediante el mensaje lingüístico en sus múlti- ples variantes (a través de la voz en off, de los personajes del anuncio, o bien mediante un mensaje superpuesto en la pantalla); y (ii) la dimensión del be- neficio o recompensa, nivel donde se apela o recurre a la parte más emotiva de los oyentes, y donde se prometen beneficios ‘no materiales’ de forma im- plícita y que, en primera instancia, pueden incluso carecer de relación alguna con el producto ofertado. Los modos que se adscriben a esta dimensión son la música, imágenes y otros modos no verbales. Aunque los publicistas pueden poner más o menos énfasis en una u otra dimensión, ambas son necesarias para el estudio de la publicidad (cf. del Saz & Pennock-Speck, 2009). Para el análisis de este corpus, me centraré en el análisis de las estrategias de cortesía lingüística de B&L como integrantes de la primera dimensión, mientras que prestaré también atención a cómo las imágenes y el sonido-música pueden transmitir ciertas asunciones más o menos explícitas-y no siempre relaciona- das con el producto-que apelan a una parte más emotiva y menos analítica del receptor. Análisis y resultados Estrategias de cortesía positiva Este tipo de estrategias lingüísticas son las que los publicistas emplean con más asiduidad para persuadir a la audiencia de la necesaria adquisición del producto: un 89,1% en el corpus en lengua inglesa y un 79% en el es- pañol. Así pues, la cortesía positiva se emplea como mecanismo al servicio de la enfatización: es decir, el publicista o creador del mensaje publicitario i i i i i i i i 10 Ma Milagros del Saz Rubio intenta ante todo acercarse al posible consumidor [2500?] mujeres de diferen- tes edades que utilizan diferentes productos higiénicos para la menstruación. La finalidad es, ante todo, minimizar el conflicto con el interlocutor y hacerlo sentir parte de un grupo o universo de mujeres que comparten ciertas caracte- rísticas. Para ello el publicista se afana en transmitir la idea de que entiende perfectamente cuáles son los sentimientos de la mujer “durante esos días”, pretende manifestar que es una de ellas, pues conoce los síntomas y dificulta- des, pero también los beneficios que reporta la menstruación y que conforman la personalidad de la mujer. De esta manera, se atiende a la imagen posi- tiva del O deseando al interlocutor lo que se desearía para uno mismo (cf. Brown y Gilman, 1989, p. 90). Pero este tipo de cortesía, al mismo tiempo, también desempeña una función de mitigación al servir para reducir la posi- ble merma que la imposición misma del anuncio publicitario conlleva para la imagen negativa del interlocutor. A continuación me centraré en algunas de las estrategias y sub-estrategias genéricas que se emplean con más asiduidad en el corpus analizado4. A. Manifieste la existencia de una “esfera común” entre el Hablante (H) y el Oyente (O): A.1. Atienda al O y téngalo en cuenta, presuponiendo o expresando que tiene puntos en común con él o que comparte sus intereses, deseos, o preo- cupaciones. Esta idea de la existencia de una “esfera” o “espacio común” entre el H y el O es lo que intentan potenciar al máximo los anuncios de productos sanitarios dirigidos a la mujer. Los ejemplos de las marcas Evax y Always Infinity muestran preocupación por la mujer mediante el saludo y la pregunta ¡Hola! ¿Cómo estás hoy? y mediante la expresión del deseo ‘Que tengas una feliz regla’. De esta manera, y aunque la preocupación por el O pueda tildarse de ficticia, se hace creer al O que la marca se preocupa por su estado de salud y bienestar durante la menstruación. Del mismo modo, el publicista amplía esta esfera común entre H y O con 4Estas estrategias se corresponden, aun con cierto grado de modificación, a las estrategias inicialmente desarrolladas por Brown y Levinson (1978, 1987), aunque han sido adaptadas al discurso de la publicidad tomando como punto de partida las de Del Saz-Rubio (2000). i i i i i i i i Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía... 11 muestras genuinas de interés como las que presenta el ejemplo 1 abajo, donde Ausiona manifiesta su deseo de saber en quién confió la espectadora cuando le vino por primera vez la regla. En este anuncio, en el cual diversos tipos de mujeres dan cuenta de cómo fue esta experiencia íntima, Ausonia se presenta ante la audiencia como una amiga preocupada en quien podemos confiar. Es decir, hace suyo un interés por este tema de índole privada para la mujer y que suele considerarse un acontecimiento imporante en su vida. Además, las imágenes proyectadas de mujeres de diversas edades (algunas incluyo todavía no tienen la regla) refuerza este sentimiento de pertenencia a un grupo que comparte intereses, preocupaciones, etc. La no presencia de hombres en sus relatos refuerza que estamos ante un asunto ‘de mujeres’ y para ‘mujeres’: Ex. 1: Ausonia ‘First Period’: ‘ A Ausonia le gustaría saber en quién confiaste la primera vez que tuviste la regla’. (voz en off) En otras ocasiones, el interés por la audiencia pasa por mostrar preocupa- ción y solidaridad ante los problemas o síntomas más comunes causados por la menstruación, como pueden ser el malestar físico a que se ven abocadas algunas mujeres, o el malestar de tipo higiénico (olor corporal, pérdidas, etc.) Los ejemplos 2-5 más abajo dan cuenta de esta sub-estrategia que tiende a ser muy común, puesto que este tipo de anuncios suelen incidir bastante en estas molestias que puede experimentar la mujer, las cuales se verán aliviadas con la compra del producto o en desmitificar creencias relacionadas con la regla y los hábitos diarios de la mujer, en cuanto al empleo de ropa, colores, actividades físicas a realizar, etc: i i i i i i i i 14 Ma Milagros del Saz Rubio en off nos recuerda que “las reglas son geniales”, especialmente en situaciones de este tipo. El siguiente ejemplo 7, es de tampones Tampax y nos presenta a una pareja de amigas, una de las cuales ha decidido contratar a una banda de mariachis para hacer pública su menstruación. El humor surge del com- portamiento, nada convencional, de estas chicas, ya que Tampax nos ayudará a mantener nuestra regla en secreto, [2500?]debido a sus propiedades[2500?] si así lo queremos: Ex. 6. Always: ‘Las reglas son geniales’. Ex. 7. Tampax (Mariachi Band): ‘Comparado con las compresas, Tam- pax te ayuda a mantener tu regla en privado aunque si quieres que la gente se entere, contrata una banda de mariachis. Haz de tu regla algo privado’. Ex. 6 Ex. 7 i i i i i i i i Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía... 15 A.3. Ofrezca y/o prometa beneficios, bienes, comprensión y sea optimista. Es cierto que, la mayoría de los anuncios encubren una promesa más o menos explícita de qué es lo que el producto podrá hacer por el O aunque ésta promesa sea falsa puesto que lo que importa, como han señalado Brown y Levinson (1987, p. 125), es que el H demuestra su buena intención al querer satisfacer la imagen positiva del O. Los beneficios que se prometen son varia- dos, por ejemplo Tampax nos promete ‘mayor confianza en nosotras mismas’, simplemente por usar su producto con falda protectora a través de una voz en off femenina que, tras la pregunta “¿Hasta dónde llega tu confianza?”, afirma que nuestra confianza llegará muy muy alto, con una entonación entusiasta; otros productos como Tampax Pearl nos promete facilidades de uso porque el producto es suave y deslizante. Es común que la promesa de beneficios no sea explícita, sino que esta se logre gracias a la yuxtaposición de frases que de forma lógica invitan al oyente a recuperar una promesa no explícita. Ahora bien, lo importante es recordar que como Leech (1966, p.125) ha apuntado: “[...] all consumer advertisements express a promise of the underlying form ‘If you buy X, Y will be the result’”. Ex. 8 i i i i i i i i 16 Ma Milagros del Saz Rubio Ex. 9 B. Indique o demuestre que H y O colaboran de forma conjunta, “están juntos en esto”. B.1. Inclúyase junto con el oyente en una actividad conjunta mostrando reciprocidad o intente involucrarlo en ella apelando al grupo. Muchos de los anuncios analizados logran este objetivo haciendo referen- cia a un lenguaje compartido entre las mujeres. Es decir, dan a entender que saben ‘de qué están hablando’, otra forma de empatizar con la audiencia. Este es el caso del Ausonia Cambio (Ex. 10), o de Ausonia Primera regla (Ex. 11). Otras marcas, como Always hacen gala del uso de un lenguaje común, y afirman que hablan el lenguaje de nuestro cuerpo en un intento de acercars más al público femenino: Ex. 10. Ausonia Cambio: ‘Cambias, te haces mujer y Ausonia cambia contigo’. Ex. 11. Ausonia ‘Primer Regla: Ausonia, entre nosotras-para nosotras’/ Ex. 12. Always: ‘Always. Talking your body’s language’/‘Always. Hablando el lenguaje de tu cuerpo’ . i i i i i i i i Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía... 19 Ex. 17. Always Cotton-like Ultra: ‘Durante la menstruación tu cuerpo es más sensible y puede que te des cuenta de lo incómodas que son las cosas’ . Ex. 18. Ausonia Días Ligeros: ‘Con la regla el 70% del flujo se pierde durante los primeros días. Después la regla parece menos regla’. Ex. 19. Always Night Pad: “Justo antes y durante la regla la temperatura de tu cuerpo sube como nunca. Esto afecta a cómo duermes y es posible que te muevas más de lo normal en la cama’. Ex. 20. Evax Salvaslip light: ‘Si no te crees que algo así pueda existir, pide muestras en Evax.es y compruébalo. i i i i i i i i 20 Ma Milagros del Saz Rubio C.2. Impersonalice y presente el acto como una regla general. Otra de las estrategias empleadas es la de impersonalizar y presentar el acto como una regla general avalada por figuras de cierta autoridad en el tema (pueden ser famosas o ginecólogas dando cuenta de las propiedades del pro- ducto). De esta manera, tanto el H como el O se distancian de determinadas afirmaciones que se hacen más aceptables si se consideran parte del “saber común” o aceptadas de forma general. El ejemplo 21 de Ausonia Días Li- geros, comienza con la afirmación de toque científico de que “con la regla el 70% del flujo se pierde durante los primeros días”. De esta manera, esta afirmación mediante el uso de una estructura pasiva adopta el estatus de regla general, y se apunta a que este resultado es fruto de alguna investigación más o menos científica. El ejemplo 22 afirma que cuando algo sienta bien, se nota (tanto a tí como a mí), de manera que esta afirmación ayudará al publicista a promocionar su producto, caracterizado por adaptarse al cuerpo para propor- cionar mayor seguridad. En el ejemplo 23, se impersonaliza la afirmación al decir que “hay quien prefiere esconderse”, de manera que el O no se siente personalmente aludido por tales afirmaciones: Ex. 21. Ausonia Días Ligeros: ‘Con la regla el 70% del flujo se pierde durante los primeros días. Después la regla parece menos. Ex. 22. BodyForm: ‘Cuando algo sienta bien, queda mejor, pore so las compresas BodyForm se ajustan a tu cuerpo para mayor seguridad’. Ex. 23. Tampax (moda): ‘Hay quien prefiere esconderse esos días y hay quien usa Tampax para la protección más discreta’ [8 de cada 10 ginecólogas ya los usan]. Estrategias de cortesía sin constancia Aunque B&L establecieron que estas estrategias solían emplearse en aquel- los casos en los que la imposición era muy grande para el O, el funcionami- ento de las mismas dentro del discurso publicitario se explica si tenemos en cuenta que son muchos los anuncios que prescinden del contenido lingüístico típicamente informativo en favor del empleo de otros modos que permiten al creador transmitir determinados mensajes de una forma menos explícita o i i i i i i i i Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía... 21 más encubierta. El empleo de estas estrategias hace que la intención comuni- cativa del H sea ambigua, de forma que es tarea del O recuperar toda una serie de implicaturas acerca de las intenciones comunicativas de éste, mediante la atención a otros modos como las imágenes y a la música. El porcentaje de uso de estos anuncios es de un 17,4% en el corpus en lengua inglesa (aun- que un 10% de los anuncios combinan este tipo de estrategias con otros de cortesía positiva) y de un 37% en el español (con un 19% de anuncios com- binando cortesía positiva y sin constancia). Los porcentajes son más elevados que los de las estrategias de cortesía negativa, y se acompañan de formatos de anuncio tales como mini-dramas donde se plantea al O una narración que, en ocasiones, nada tiene que ver con el producto en sí, pero que alude a un conjunto de valores que conforman la identidad de la mujer que menstrúa5. Además, en el corpus en inglés un 39,1% de los anuncios comunican este tipo de cortesía mediante el empleo de imágenes, y un 51% las utiliza en el corpus de anuncios en español. Estos porcentajes indican una mayor dependencia de elementos o modos extralingüísticos, imágenes y música en este caso. Entre las estrategias más destacadas nos encontramos con la invitación al O a rea- lizar una implicatura conversacional mediante la violación de algunas de las máximas de Grice. Esta estrategia se consigue mediante el ofrecimiento de pistas, la insinuación al O o la presuposición y también a través del empleo de preguntas retóricas. Algunas marcas de compresas, entre ellas Ausonia, Evax y Alldays son proclives al empleo de este tipo de estrategias. En estos anun- cios no se ofrece información acerca de las propiedades del producto. Por el contrario, el espectador debe descifrar mini-dramas donde las mujeres se ven envueltas en situaciones que poco tienen que ver con otros anuncios sobre productos de higiene femenina ya analizados. En muchos de estos anuncios, se intenta transmitir la idea de que la mujer que usa un producto determinado perteneciente a una marca especifica es una mujer activa, segura de sí misma, una mujer con determinación, sexy, e inteligente ante situaciones donde el hombre no lo es, una mujer que rompe con estereotipos y tabúes, etc. Todos estos calificativos que conforman un universo femenino son comunicados de forma encubierta por el publicista, que no puede ser acusado de haber querido transmitir tales asunciones. 5Para un análisis más detallado sobre este tipo de anuncios y las estrategias de creación de una identidad femenina véase Del Saz-Rubio & Pennock-Speck (2009). i i i i i i i i 24 Ma Milagros del Saz Rubio terísticas del producto. Por el contrario, los mecanismos de cortesía negativa se emplean de forma más aislada, siempre en combinación con la cortesía po- sitiva y su finalidad es la de mitigar determinadas afirmaciones, ofreciendo al O una ‘vía de escape’ de manera que las mismas resulten tentativas o menos impositivas. En lo que respecta al empleo de otros modos de carácter extra- lingüístico, también se ha constatado, de forma indirecta, que las imágenes de mujeres jóvenes, entusiastas, que ayudan a otras mujeres y que pasan por la experiencia de la menstruación sirven también para apoyar el empleo lingüís- tico de determinadas estrategias. Aunque los resultados pueden considerarse representativos de la publicidad del siglo XXI, es importante también recordar que los mismos surgen en un contexto muy particular, puesto que el corpus aparece dirigido a un tipo de público específico, y publicita un producto que, por sus características, exigen una alta carga de contenido lingüístico informa- tivo. No obstante, hemos constatado la existencia de una tendencia por parte de determinadas marcas hacia un empleo de técnicas más sofisticadas y menos informativas, que ponen un mayor énfasis en construir mini-dramas donde las imágenes, música y voces en off son clave para recuperar toda una serie de asunciones encubiertas de carácter más emotivo. Bibliografía Austin, J. L. 1962. How to Do Things with Words. Oxford: Oxford University Press. Baker, Edwin C., 1994. Advertising and a Democratic Press. Princeton Uni- versity Press, Princeton. Brown, P. y S. Levinson. 1978. Universals in Language Usage: Politeness Phenomena. En E. N. Goody (ed.), Questions and Politeness. Strategies in Social Interaction. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 56- 289. Brown, P. y S. Levinson. 1987. Politeness: Some Universals of Language Use. Cambridge: Cambridge University Press. i i i i i i i i Análisis pragamalingüístico de las estrategias de cortesía... 25 Brown, R. y A. Gilman. 1960. 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Journal of Advertising Research, 30, (6), 44-51. i i i i i i i i “O sushi é fish” – análise de publicidades a restaurantes... 29 http://www.sushi.infogate.de/query.php3 http://www.hotfrog.pt/Empresas http://www.guiadacidade.pt/portugal/?G=empresas.index&parent= 1204&li=empresas Assim, obtivemos a informação da existência de 82 restaurantes japoneses em Portugal, de entre os quais um total de 34 (ou seja 41,5%) com site na Internet. Analisámos estes sites, estudando em especial os seguintes elementos: o nome do restaurante, as línguas do site, a existência de sucursais, a presença de música e animação, a composição da página de entrada do site e as eventuais páginas secundárias. Apresentação de resultados Nome do restaurante O nome do restaurante constitui um elemento fundamental no site e, jun- tamente com o logótipo, tem uma função identificativa. Debruçámo-nos deta- lhadamente sobre este aspecto em Pereira Bendiha e Coimbra (em curso). No presente estudo, de acordo com os critérios já expostos, foram analisados te- maticamente os nomes dos 34 restaurantes do nosso corpus de análise. Deste modo, chegámos às seguintes categorias: gastronomia, cultura, natureza, an- troponímia, religião, toponímia e interculturalidade. Não é de estranhar que se insiram no tema da gastronomia grande parte destes nomes: Castella Paulo (sendo castella a adaptação japonesa do pão de ló português), Mikisushi (sendo miki caule), Nood (massa), Noori (rolinhos de alga e arroz), Shis (sílaba comum a sushi e sashimi), Suntory (marca de bebida), Sushi Bar da Bica, Sushicafé, Sushimoto e Sushi-Ya. Constatamos ainda uma forte presença de elementos de origem cultural no nome dos restaurantes analisados. Estes remetem para diversos aspectos, uns mais acessíveis e transparentes para o público português do que outros. Encontrámos referências históricas, às artes marciais japonesas e a lendas e crenças. Os restantes items remetem para outros aspectos culturais e do quo- tidiano. Mais uma vez, a palavra sushi aparece em dois casos, um em posição i i i i i i i i 30 Rosa Lídia Coimbra & Urbana Pereira Bendiha final e outro medial. Inserem-se respectivamente nesta categoria: Assuka (pe- ríodo da História do Japão), Sumo, Manekineko (gato da sorte), Gaijin Sushi Bar (tendo gaijin o sentido de estrangeiro), Góshó (palácio imperial), Matsuri (festival), Mishi-mishi (onomatopeia remetendo para o ranger do soalho) e Takô Sushi (tendo takô o sentido de papagaio de papel). Vários nomes de restaurantes remetem para a natureza, seja animal, ve- getal ou focando outros elementos naturais. De salientar que, em dois casos, a este nome se acrescenta a palavra sushi, quer por anteposição, quer por pos- posição. Os nomes do corpus que integram esta categoria temática são: Koi Sushi (carpa), Midori (árvore), Sakura (cerejeira), Sushi Yama (montanha) e Tsuki (lua). Com uma menor representatividade no presente corpus, encontramos no- mes de restaurantes ligados a antropónimos, caso de Aya e Ken-Ichi, a topó- nimos, caso de Nagoya (nome de uma cidade japonesa) e à religião, Hakisushi (tendo haki o significado de ânimo, energia). Por último, considerámos os nomes que integravam elementos de diver- sas culturas: Estado Líquido Sushi Lounge (integrando termos em português, japonês e inglês), Lucullus-Jappa Sushi (justapõe o nome de um gastrónomo latino, apontando a oferta de comida italiana, e outro nome que remete para a comida japonesa, ambas servidas nesse restaurante, para além da palavra sushi), Sushiguia e Sushi-Sushillout (nome que apresenta um duplo jogo de palavras: hill remetendo para a colina de Alfama onde se situa o restaurante e chill out para o género de música que se ouve na página de entrada do res- pectivo site, sendo que estes dois termos ingleses surgem amalgamados com a palavra japonesa sushi). Línguas do site Como acabámos de referir a propósito da interculturalidade, temos a re- gistar a presença, por vezes simultânea, de duas ou três línguas. É bem patente no gráfico 1 a larga maioria de sites que apenas se apresentam em português, seguindo-se sites bilingues português e inglês e em menos quantidade trilin- gues português, inglês e japonês, havendo apenas uma ocorrência de um site bilingue português japonês. No caso de sites multilingues, o consumidor pode escolher, na página de i i i i i i i i “O sushi é fish” – análise de publicidades a restaurantes... 31 entrada a língua que pretende, como podemos observar no exemplo da figura 2. Gráfico 1 – Línguas presentes nos sites de restaurantes japoneses em Portugal Figura 2 – Exemplo de página de entrada de site multilíngue i i i i i i i i 34 Rosa Lídia Coimbra & Urbana Pereira Bendiha Gráfico 2 – Elementos constitutivos da página de entrada dos sites (frequências absolutas das páginas que incluem estes elementos) Para além do nome do restaurante, obviamente presente em todas as pá- ginas de abertura, grande parte destas fazem-no acompanhar de um logótipo identificativo da marca. Também um número significativo de sites apresenta, na sua página inicial, imagens do restaurante, de produtos nele oferecidos, um pequeno texto de apresentação e elementos informativos como contactos e horário de abertura. Na figura 4 supra, podemos observar um exemplo de uma destas pági- nas de entrada, onde se destaca o nome do restaurante e elementos gráficos alusivos à cultura japonesa. Páginas secundárias Partindo da página de entrada, o consumidor pode seguidamente consul- tar as páginas secundárias que compõem o site do restaurante. Observando o nosso corpus, verificamos que cada site apresenta a sua própria composição e ordenação destas páginas. No entanto, constatamos, depois do seu levan- tamento exaustivo, algumas tendências gerais para a inclusão dos seguintes i i i i i i i i “O sushi é fish” – análise de publicidades a restaurantes... 35 Figura 4 – Exemplo de página de entrada tipos de página, de acordo com o seu conteúdo: menu do restaurante (fre- quentemente incluindo imagens dos pratos como atesta o exemplo da figura 5), contactos e localização (muitas vezes incluindo um pequeno mapa ilus- trativo, como na figura 6), apresentação do restaurante (exemplo na figura 7), notícias e eventos relativos ao restaurante (figura 8), informações culturais sobre o Japão e a cozinha japonesa (figura 9), livro de visitas ou pedido de sugestões (figura 10), galeria de imagens (figura 11), horários e apresentação da equipa ou do chefe de cozinha (podendo incluir uma breve biografia ou entrevista, como ilustrado na figura 12). No gráfico 3 supra, podemos observar a frequência dos tipos de página secundária atrás referidos, bem como a referência a outros tipos menos fre- quentes. i i i i i i i i 36 Rosa Lídia Coimbra & Urbana Pereira Bendiha Gráfico 3 – Tipos de páginas secundárias dos sites (frequências absolutas) i i i i i i i i “O sushi é fish” – análise de publicidades a restaurantes... 39 Figura 9 - Exemplo de página secundária com informação cultural Figura 10 - Exemplo de página secundária com pedido de sugestões/opinião i i i i i i i i 40 Rosa Lídia Coimbra & Urbana Pereira Bendiha Figura 11 - Exemplo de página secundária com galeria de imagens Figura 12 - Exemplo de página secundária com apresentação de chef Algumas destas páginas interiores do site apresentam interactividade, principalmente as do tipo livro de visitas ou pedido de sugestões. Nas pa- lavras de Nielsen, a possibilidade de interacção, no mundo publicitário, vai para além de uma retórica unidireccional e leva ao envolvimento do consumi- dor no próprio acto de persuasão: Persuasion in itself is obviously not new. From Cicero’s oratory to modern TV commercials, communicators have tried to persu- ade audiences. What’s different is that websites and other compu- terized designs are going beyond one-way rhetoric and becoming i i i i i i i i “O sushi é fish” – análise de publicidades a restaurantes... 41 interactive. Doing something is much more engaging and thus potentially more compelling and persuasive than passively recei- ving messages. (Nielsen, 2003). A preocupação em saber algo acerca dos visitantes das suas páginas levou alguns restaurantes, ainda que no corpus uma minoria, a disponibilizar um mecanismo de registo de informação pessoal para a constituição de mailing lists, as quais permitem o envio de informação actualizada por email. Conclusão Nesta pesquisa procurámos determinar formas e conteúdos no processo de auto-apresentação de restaurantes japoneses em Portugal junto dos visitantes das respectivas homepages. As homepages empresariais são instrumentos de comunicação e publici- dade que permitem alcançar um público diversificado e familiarizado com o ambiente virtual. Tais restaurantes, cujas homepages constituíram o cor- pus do presente trabalho, dirigem-se também a esse público, mas, em geral, não utilizam a respectiva homepage para actividades de comércio electrónico (quando muito aceitam reservas). Assim, estes espaços comunicativos vir- tuais configuram-se antes de mais como cartas de apresentação, autênticos super-cartões de visita aos públicos potencialmente interessados neste tipo de cozinha. Em alguns casos, os sites têm também uma vertente assinalável de difusão da cultura japonesa, não apenas no que respeita à gastronomia, mas também à História, arte e tradições. A apresentação de um mundo oriental com o qual o público português nem sempre está familiarizado constituirá, assim, uma mais-valia acrescida à descoberta de sabores: a descoberta de mundos. Da análise dos dados de que dispomos, podemos ainda concluir que este tipo de sites não denota uma grande preocupação em obter um lugar destacado na rede, já que esses públicos serão maioritariamente locais, o que explica a grande predominância de sites apenas em Português. Independentemente da configuração, design e extensão do site, estas ho- mepages pressupõem a alteração do tradicional modelo do consumidor e do texto publicitário para um mundo em que as transformações operadas pela i i i i i i i i 44 Paulo Serra ora ao sexo, ora ao riso, ora a ambos, para procurar suscitar a atenção dos seus destinatários. É certo que nem todo o riso é provocado pela ironia – o riso pode ter outras causas (Bergson, 1991); como nem toda a ironia provoca riso – há ironias sérias, mesmo demasiado sérias. A associação entre riso e ironia é da ordem da concomitância, que não da necessidade (Eggs, 2009, s/p). O poder do riso – e, portanto, da ironia que provoca o riso – nos discursos retóricos é conhecido desde há muito. Assim, já na sua Retórica, ao tratar da utilidade do “ridículo” (γελoíoν) nos debates, Aristóteles cita uma afirmação de Górgias de que “é necessário desfazer a seriedade dos oponentes com ironia e a ironia com seriedade” (Aristóteles, 1149b). Já mais perto de nós, Bergson afirmava que “nada desarma tanto como o riso” (Bergson, 1991, p. 90).1 A razão é fácil de entender: é que, por boas ou más razões, o riso apa- rece sempre como uma desqualificação daquele (ou daquilo) de que se ri, é “sempre algo humilhante para quem é o seu objecto” (Bergson, 1991, p. 89). Há, no entanto, um riso que faz (apenas) rir, e um riso que faz pensar. De facto, e reportando-nos de novo a Aristóteles e à sua Retórica, distingue- se aí entre os risos que são apropriados ao homem livre e os que o não são, dando como exemplo dos segundos o escárnio e, dos primeiros, a ironia. A razão reside, segundo Aristóteles, em que “O que emprega ironia, fá-lo para se rir dele próprio, o trocista, para escárnio dos outros.” (Aristóteles, 1149b). Deixemos em suspenso, para já, esta afirmação enigmática de Aristóteles. O carácter argumentativo das figuras A partir do renascimento e culminando em retóricas como a de Pierre Fontanier, já no século XIX,2 as figuras foram entendidas, fundamentalmente, como ornamentos estilísticos. Nas últimas décadas, autores como Chaim Pe- relman e Lucie Olbrechts-Tyteca3 e Olivier Reboul4, para referirmos apenas alguns, têm vindo a sublinhar o carácter retórico das figuras – que não se re- duzem, portanto, a meras “figuras de estilo”, a introduzir apenas na fase da 1Ver, sobre esta mesma questão, Mariano, 2005; Murad, 2007. 2Manuel classique pour l’étude des tropes, 1821; Traité général des figures du discours autres que les tropes, 1827. 3Traité de l’argumentation, 1958. 4Introduction à la réthorique, 1991. i i i i i i i i Imagens da ironia na publicidade 45 elocução (elocutio); elas são, antes de mais, argumentos, ainda que sob uma forma mais intuitiva, implícita e “condensada”- e relevando, portanto, também da inventio e da própria configuratio.5 Assim, e para darmos apenas um exemplo, quando se diz metaforicamente que “Ricardo é um leão”, podemos pensar num entimema do género: “Ricardo é um leão, pois é corajoso”, a que corresponde o seguinte silogismo: “(Se) To- dos os leões são corajosos; (e) João é corajoso; (então) João é um leão.” Pode- se argumentar que este silogismo representa uma falácia evidente, resultante da troca do antecedente pelo consequente. No entanto, o facto de estarmos perante uma falácia não torna menos poderoso o argumento quando utilizado num discurso retórico. Podemos, aliás, pôr a hipótese de que figuras como a metáfora ou a comparação – figuras ditas ”de semelhança” – são utilizadas, precisamente, para fazer passar como válidos argumentos que, na realidade, são falaciosos. Por outras palavras: que estas figuras são uma forma de que o orador se serve para jogar o verosímil contra o lógico e, assim, vencer retori- camente a própria lógica. Para nos referirmos especificamente à ironia, vejamos o seguinte exemplo, adaptado de Eggs (2009, s/d): “Os membros da Frente Nacional não são anti- semitas [p]; a prova é que o tribunal de Aubervilliers acaba de condenar o seu grande chefe Le Pen por esse motivo [q].” Esta ironia pode ser facilmente transformada numa argumentação (ou contra-argumentação) com a seguinte forma: “Os membros da frente Nacional pretendem que não são anti-semitas [p]; mas o tribunal de Aubervilliers acaba de condenar o seu grande chefe Le Pen por esse motivo [q].” Como comenta Eggs, apesar de em ambos os exemplos estarmos perante a tentativa de demonstrar o contrário do que os membros da Frente Nacional defendem (que não são racistas), tal tentativa é feita de forma diferente – já que, no caso da ironia, o seu “fim principal” não é a contra-argumentação, mas “mostrar que o adversário defende uma tese contra toda a evidência”, o que “constitui uma forma de troçar de outrem e de o criticar”. (Eggs, 2009, s/d) 5Como refere Bonhomme, “[...] por pouco que elas entrem num argumentação, a maior parte das figuras são procedimentos argumentativos de pleno direito, pelo que extravasam do domínio da locução para o da invenção. De acordo com esta versão forte, poder-se-ia ver nas figuras formas condensadas de argumentos.” (Bonhomme, 2009). Para um exemplo da aplicação desta tese à metonímia, cf. a secção 4, “Étude de cas: l’argumentation métonymique dans la Publicité”. i i i i i i i i 46 Paulo Serra Em termos mais formais, a “negatividade crítica” da ironia poderia ser esque- matizada da seguinte forma: “x fez Z; na medida em que Z representa algo que, segundo as normas que partilhamos no nosso saber tópico, não deveria ter sido feito, x tem de ser criticado”. (Eggs, 2009, s/d). Da concepção clássica à concepção ecóica da ironia De acordo com a conhecida definição de Du Marsais – que segue, no essencial, clássicos como Cícero ou Quintiliano –, “a ironia é uma figura pela qual se quer dar a entender o contrário do que se diz: assim, as palavras de que nos servimos na ironia não são tomadas no seu sentido próprio e literal.” (Dumarsais, 1730, p. 162).6 De forma bastante semelhante, Kierkegaard, que dedicou à ironia a sua primeira grande obra, define-a como uma figura “cuja característica está em se dizer o contrário do que se pensa. Aí já temos então uma definição que per- corre toda ironia, ou seja, que o fenômeno não é a essência, e sim o contrário da essência”. (Kierkegaard, 1991, p. 215). Para o nosso Fernando Pessoa – que vê, na “incapacidade de ironia”, “o traço mais fundo do provincianismo mental” – por ironia “entende-se, não o dizer piadas, como se crê nos cafés e nas redacções, mas o dizer uma coisa para dizer o contrário”, consistindo a sua essência em “não se poder descobrir o segundo sentido do texto por nenhuma palavra dele, deduzindo-se porém esse segundo sentido do facto de ser impossível dever o texto dizer aquilo que diz.” Uma definição que Pessoa exemplifica com o conhecido texto de Johnatan Swift,7 “o maior de todos os ironistas”, sobre as fomes na Irlanda, em que sugere que se resolva o problema comendo as crianças com menos de sete anos. (Pessoa, 1980, p. 159). No entanto, a definição de ironia patente em Dumarsais, Kierkegaard e Pessoa, que é também a da tradição retórica e gramática em geral, tem vindo a ser objecto de revisão por parte de um sem número de autores. Dois desses 6No original : “l’ironie est une figure par laquelle on veut faire entendre le contraire de ce qu’on dit : ainsi les mots dont on se sert dans l’ironie ne sont pas pris dans le sens propre et litéral.” 7Jonathan Swift, A modest proposal for preventing the children of poor people in Ireland, from being a burden on their parents or country, and for making them beneficial to the publick (sic), 1729. i i i i i i i i Imagens da ironia na publicidade 49 auge da campanha, apareceu uma edição da revista satírica Private Eye. Na capa havia uma fotografia de espectadores num jogo de críquete numa aldeia, deitados em espreguiçadeiras, cabeças pendentes, dormindo e ron- cando; por baixo, estava a seguinte legenda: "Mercado Comum, O Grande Debate".” (2007, p. 35) E, acrescentam Wilson e Sperber, “Este é um exemplo típico de ironia verbal”. Ora, como dificilmente se poderá considerar que a fotografia é um elemento “verbal”, estamos antes perante aquilo a que, parafraseando a ex- pressão “ironia verbal”, podemos chamar uma ironia visual.11 Quanto ao tipo de fenómenos abrangidos por esta designação, Gibbs e Colston observam que, sendo a ironia “tanto uma forma de pensamento quanto uma espécie de expressão linguística”, há todo um conjunto de “expressões não linguísticas” da ironia, “incluindo vestuário, publicidades visuais, obras de arte, mensagens políticas e mesmo música”; acrescentando ainda que “mui- tos artistas, incluindo pintores, escultores e performers, de que os mais famo- sos serão Marcel Duchamp e Salvador Dali, expressaram frequentemente te- mas irónicos no seu trabalho” (Gibbs & Colston, 2007, p. 588). A publicidade é, pois, uma das áreas em que esta “ironia não linguística” é utilizada. Como referem os autores, “os anúncios publicitários fazem fre- quentemente uso da ironia tanto nas suas imagens como nos seus textos (bem como na relação entre ambos), de forma intencional ou não”. (Gibbs & Cols- ton, 2007, p. 589). E, para ilustrar este uso, dão o seguinte exemplo: “Considerem um outdoor publicitário visto em Wisconsin com uma men- sagem de saúde pública, muito bem-intencionada, relativa ao tratamento da depressão. O anúncio mostrava uma mulher claramente deprimida, com a cabeça entre as mãos, e um texto sob a imagem dizendo ‘Depressão, você não tem que viver com ela.’ Seguindo este texto, um observador inegavel- mente insensível mas inteligente tinha pintado com spray as palavras ‘sim, tente o suicídio’, com o desenho de um laço de corda.” (Gibbs & Colston, 2007, p. 589) Repare-se, no entanto, e desde já, que o exemplo escolhido pelos autores é-o não de uma publicidade mas de uma anti-publicidade, classificável na- 11O que dizemos da ironia aplica-se, mutatis mutandis, às outras figuras – configurando aquilo a que Barthes (2002) chamou uma “retórica da imagem” e, actualmente, se tem vindo a chamar “retórica visual” (cf. Olson, Finnegan, & Hope, 2008; Hill, & Helmers, 2004). i i i i i i i i 50 Paulo Serra quilo a que Naomi Klein (2000) chama o culture jamming.12 Este e outros exemplos mostram, quanto a nós, que a ironia é um recurso retórico que, dada a sua natureza crítica, é mais aplicável à anti-publicidade do que à publici- dade propriamente dita – que é sempre, por definição, epidíctica. (Voltaremos adiante a esta questão). A ironia visual na publicidade Qualquer que seja a nossa posição acerca da relação entre retórica e pu- blicidade – que a publicidade se tenha transformado no “refúgio” último de uma retórica “negligenciada pelo ensino oficial e pela ‘literatura superior’” (Durand, 1970, p. 70), ou que, em alternativa, ela constitua um quarto ramo da retórica (Fidalgo, 2005) –, parece profunda a relação entre ambos os domí- nios, o da publicidade e o da retórica. Igualmente profunda parece ser a relação entre imagem e publicidade. De facto ainda que haja publicidade sem imagem – por exemplo a publicidade radiofónica ou a escrita –, a imagem está estreitamente ligada à publicidade praticamente desde os inícios desta. Assim, logo em 1918, ao referir-se à importância crescente dos anúncios publicitários nos jornais como meio de persuasão colectiva13 e, consequentemente, como fonte de receitas, seja para os anunciantes (industriais, financeiros) seja para os próprios jornais, Le Bon sublinha a importância crescente da imagem na publicidade, seja através da “ilustração” – os cartazes ilustrados – seja, “ainda melhor”, através do “mé- todo comparativo pela imagem”, que exemplifica da seguinte forma: “Se se trata, por exemplo, de uma água que se pretende fazer renascer os cabelos, o cliente é mostrado de um lado calvo e, do outro, munido de uma farta ca- beleira após o emprego do produto.” (Le Bon, 1918, p. 161) E, de entre os 12Que a autora define como “a prática de parodiar peças publicitárias e usar os outdoors para alterar drasticamente as suas mensagens” (Klein, 2000, p. 285). Ainda segundo Klein (2000, p. 286), “o termo ‘culture jamming’ foi cunhado em 1984 pelo grupo de colagem áudio de S. Francisco Negativland. Os praticantes de culture jamming são os jammers e os adbusters, podendo estes últimos ser definidos como os indivíduos e grupos que se dedicam a alterar (adulterar) os anúncios publicitários com o objectivo de criticar e discutir a sua mensagem. A revista Adbusters (http://www.adbusters.org), sediada em Vancouver e editada por Kalle Lasn, tem no adbusting um dos eixos do seu activismo. 13“A publicidade, sob a forma de anúncios, é um dos principais meios de persuasão colectiva da era moderna.” (Le Bon, 1918, p. 160) i i i i i i i i Imagens da ironia na publicidade 51 vários tipos de imagens de que a publicidade faz uso, a fotografia – no jornal, na revista, no outdoor, nos espaços públicos e privados mais diversos – sempre teve e continua a ter uma importância fundamental. A confluência entre retórica, publicidade e imagem fotográfica é, como sabemos, o objecto do artigo seminal do artigo de Roland Barthes sobre a “retórica da imagem”, publicado em 1964. Inspirado em – e orientado por – Barthes, Jacques Durand publica, em 1970, o seu conhecido trabalho sobre “retórica e imagem publicitária”. Nesse trabalho, que toma como ponto de partida o “inventário” de “vários milhares de anúncios”, Durand apresenta uma classificação das figuras usadas na publicidade. Ora, nessa classificação não se encontra qualquer referência à ironia – e isso apesar da afirmação de Durand de que foi possível encontrar, na imagem publicitária, “não algumas, mas todas as figuras clássicas da retórica”. (Durand, 1970, p. 70; ver também Durand, 1978). Contudo, um trabalho mais recente de McQuarrie e Mick sobre “figuras de retórica na linguagem publicitária”, que partilha com o de Durand o ponto de partida empírico14 e o intuito classificatório, já inclui a ironia – que os autores definem, de forma tradicional, como “um enunciado que significa o contrário do que é dito” (McQuarrie & Mick, 1996, p. 431). A ironia é ainda classificada, pelos autores, na “desestabilização”, que é uma das quatro “ope- rações retóricas”15 e pode ser definida como a (operação) que “selecciona uma expressão tal que o contexto inicial torna o seu significado indetermi- nado. Por ‘indeterminado’ queremos dizer que são disponibilizados múltiplos significados, nenhum dos quais oferece uma resolução final.” (McQuarrie & Mick, 1996, p. 433). Para ilustrar esta característica “desestabilizadora” da ironia, os autores referem um anúncio do Ranger Rover constante no número de Dezembro de 1990 da revista Car and Driver, com o título “Os britânicos sempre guiaram no lado errado da estrada”, a que se juntava “a fotografia do automóvel a ser conduzido numa encosta íngreme de fora de um dos lados da estrada.” (McQuarrie e Mick, 1996, p. 433). 14Constituída, segundo os autores, por “uma grande amostra de revistas contemporâneas de publicidade” – mais concretamente, por 621 anúncios publicados em 1990 e 1991 nas revistas People, Business Week, Car and Driver, Sports Illustrated, Cosmopolitan e Good Housekee- ping. (McQuarrie & Mick, p. 425) 15As outras operações são a repetição, a inversão e a substituição (McQuarrie e Mick, 1996, p. 426). i i i i i i i i 54 Paulo Serra Ironia visual e anti-publicidade Apesar da afirmação de Susan Sontag de que o principal efeito da fo- tografia é o de “converter o mundo na secção de uma loja ou num museu- sem-paredes no qual todo o sujeito é depreciado como artigo de consumo, promovido como um item para apreciação estética” (Sontag, 1977, p. 85), a fotografia tem sido muitas vezes utilizada na crítica da publicidade e/ou das marcas que ela promove. Como escreve Naomi Klein, “Curiosamente, a última vez que houve um ataque bem-sucedido à prática da publicidade – mais do que um desacordo acerca do seu conteúdo ou técnicas – foi durante a Grande Depressão. [. . . ] Os violentos culture jam- mers da época não eram os humoristas da Balyhoo,18 mas fotógrafos como Walker Evans, Dorothea Lange e Margaret Bourk White.” (Klein, 2000, p. 308-9). O que os fotógrafos referidos por Klein mostram, nas (e com as) suas fotografias, é a contradição patente entre o mundo ideal que a publicidade da época retrata e a miséria real da maior parte daqueles a quem ela se destina – algo que fazem recorrendo, em grande medida, à ironia. Sendo certo que a ironia visual pode ou não envolver palavras (Scott, 2004, p. 32) sabemos, pelo menos desde o já mencionado trabalho de Barthes sobre a “retórica da imagem”, que a imagem fotográfica, seja de imprensa, seja publicitária, dificilmente dispensa a palavra para lhe fixar o sentido, confi- gurando aquilo a que Barthes chama a função de “ancoragem” (Barthes, 2002, pp. 579-80). Compreende-se, assim, que “os exemplos mais óbvios” de ironia fotográfica recorram à palavra, incluindo “exemplos em que um outdoor, ou uma outra forma de texto, é incorporado numa imagem maior e onde, signi- ficativamente, emerge um conflito entre o que o texto diz e o que a imagem envolvente mostra.” (Scott, 2004, pp. 32-3).19 É o que acontece, precisa- mente, com algumas das obras de fotógrafos da época da Depressão referidos 18“Houve uma revista de curta existência publicada em Nova York chamada The Ballyhoo, uma espécie de Adbusters da época da Depressão. No despertar do crash da bolsa de 1929, The Ballyhoo surgiu como uma nova voz cínica, zombando viciosamente da “psiquiatria criativa” dos anúncios dos cigarros e desinfectantes bucais, bem como do rematado charlatanismo usado para vender todo o tipo de poções e loções. The Ballyhoo foi um sucesso imediato, alcançando uma circulação de mais de 1,5 milhão de exemplares em 1931” (Klein, 2000, p. 308). 19Como sublinha Scott noutro passo, “a armadilha central da ironia visual sem palavras reside na dificuldade de estabelecer, com suficiente clareza, a representação dominante e o sis- i i i i i i i i Imagens da ironia na publicidade 55 por Klein no texto citado e também por Scott (2004, pp. 33-4), como é o caso de Bread Line during the Louisville flood (Margaret Bourke-White, Kentucky, 1937)20 ou On the road towards Los Angeles (Dorothea Lange, 1937).21 Quando, ao contrário do que acontece nos casos anteriores, não há possi- bilidade de produzir os efeitos irónicos fotografando realidades contrastantes – já preexistentes ou expressamente criadas para o efeito –, aqueles são, mui- tas vezes, produzidos por técnicas como a fotomontagem, a colagem ou a legendagem. Essas técnicas permitem figurar a ironia através de processos como os seguintes (as designações e os exemplos são de Scott, 2004, p. 39): i) Inversão: John Heartfield, Hitler’s Dove of Peace from AIZ, 1935;22 ii) Li- teralização: John Heartfield, Hurrah, The Butter Is All Gone, 1935;23 iii) Hi- pérbole: Peter Kennard, Defended to Death, 1982;24 iv) Corrupção: Barbara Kruger, Untitled (I shop therefore I am), 1987.25 Exemplos mais recentes de ironia fotográfica anti-publicidade podem ser encontrados entre os “Spoof Ads”, da Adbusters26 e na série Brand Irony, do fotógrafo indiano Sharad Haksar.27 Em ambos os casos, o que está em causa não é apenas a luta contra a publicidade, mas contra a publicidade das marcas globais – que não só invadem e exploram, literalmente, as culturas e economias locais/nacionais, mas também se despreocupam com os eventuais efeitos nocivos dos produtos que anunciam/vendem sobre a saúde das pes- soas e do ambiente. Se muitos dos “Spoof Ads” parecem estar especialmente preocupados com estes últimos efeitos – vejam-se as séries Absolute (álcool) Joe Chemo (tabaco) ou a dedicada ao McDonalds –, a Brand Irony revela-se tema de crenças associadas que os fotógrafos procuram subverter por meio das suas imagens” (Scott, 2004, p. 52). 20Fonte: http://www.masters-of-photography.com/B/bourke-white/ b-w_living_full.html. 21Fonte: http://lcweb2.loc.gov/pnp/ppmsc/00200/00235r.jpg. 22Fonte: http://johnheartfield.tumblr.com/page/6. 23Fonte: http://johnheartfield.tumblr.com/page/10. A legenda que dá o título à fotografia é inspirada no discurso de Goering em Hamburgo, em que afirma: “O ferro faz sempre um povo forte; a manteiga e a banha apenas fazem as pessoas gordas.” 24Fonte: http://www.tate.org.uk/servlet/ViewWork?cgroupid= 999999961&workid=92041&searchid=9265&tabview=image. 25Fonte: http://www.tate.org.uk/magazine/issue3/consume_image2. htm. 26Fonte: http://www.adbusters.org/gallery/spoofadslink 27Fonte: http://www.sharadhaksar.com/sharad-website.html. i i i i i i i i 56 Paulo Serra mais preocupada com a questão cultural e económica, como se torna patente nas fotografias referentes às marcas Colgate, Mastercard, Coca Cola, IBM ou Nike. A ironia presente em todas estas séries de fotografias, como nas outras referidas ao longo desta secção, só pode ser interpretada recorrendo, em si- multâneo, à concepção tradicional da ironia e à concepção da teoria ecóica de Sperber e Wilson – já que, em nossa opinião, tais concepções são não mu- tuamente exclusivas mas complementares, sendo a primeira mais semiótico- estrutural (o que a ironia significa) e a segunda mais pragmático-funcional (como a ironia significa). Assim, e de acordo com a primeira das concepções, verifica-se que as fo- tografias irónicas tornam patente uma contradição: seja entre o que se diz/ mostra numa parte da fotografia e o que se diz/mostra noutra parte; seja entre o possível e o real, figurada através de processos retóricos como a inversão, a literalização, a hipérbole ou a corrupção, referidos atrás. No entanto, esta concepção não nos explica porque é que, colocados perante uma tal contradi- ção, e perante a impossibilidade de aceitarmos os dois pólos da mesma, somos levados a passar do sentido “literal” ao sentido “figurado” (irónico). É preci- samente essa transição que nos é explicada pela teoria ecóica, de acordo com a qual em todas as fotografias irónicas “ecoa” algo anterior e em relação ao qual se toma uma atitude crítica, há algo que foi objecto de um “uso” que é, agora, objecto de “menção”. No entanto, e ao contrário do que a teoria ecóica parece esquecer, o efeito irónico não se produziria se as fotografias não tornassem patente uma contradição entre o que é usado e o que é mencionado. Conclusão Mais do que um instrumento ao serviço da publicidade, a ironia visual revela-se como um instrumento precioso na luta contra a publicidade das gran- des marcas globais e, em geral, daquilo que deve ser criticado como negativo ou a rejeitar. Pode dizer-se, é claro, que é um instrumento bastante frágil. No entanto, essa aparente fragilidade esconde a real potência filosófica – racional, crítica, problematizadora – da ironia. De facto, sendo uma figura retórica, a ironia não é, no entanto, uma figura retórica como as outras. De facto, e como sublinha Kierkegaard, a ironia “é uma determinação da subjec- i i i i i i i i Imagens da ironia na publicidade 59 social and cultural influences (pp. 131-152). Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates. Gibbs, R. W., & Colston, H. L. (2002). The risks and rewards of ironic com- munication. In L. Anolli, R. Ciceri, & G. Riva (Eds.), Say not to say: New perspectives on miscommunication (pp. 181-194). Amsterdam, Netherlands: IOS Press. Gibbs, R. W., & Colston, H. L. (2007). The future of irony studies. Irony in language and thought: a cognitive science reader (pp. 581-593). New York: Lawrence Erlbaum Associates. Grice, H. P. (1975). Logic and conversation. In P. Cole, & J. L. Morgan (Ed.). 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Mais ainda, ao centrar-se de forma exclusiva naquilo que é explícito, a gestão convencional “deita fora o bebé com a água do banho”, segundo a ex- pressão anglófona. É ao nutrir os aspectos dinâmicos e criativos da realidade organizacional que é possível potenciar a capacidade de inovação e de res- posta às oportunidades e às mudanças que são continuamente impostas pelo meio externo. Quanto mais turbulento o meio, mais importante a capacidade de inovação. Esta ligação de proporcionalidade entre a complexidade do meio e a necessidade de respostas em termos de inovação, é bem conhecida das ci- ências de gestão e, ainda, faz parte das agendas políticas da generalidade dos países ditos desenvolvidos. Contudo, surge o paradoxo. As mesmas ciências de gestão, ao realçar a importância da inovação, não admitem, em simultâneo, a necessidade de atender aos movimentos espontâneos e informais que caracterizam o meio de cultura mais propício ao desenvolvimento da criatividade. De forma desintegrada e parcelar, as teorias de gestão salientam aspectos como a cultura organizacional, o estilo de comunicação e liderança, o traba- lho colaborativo e a partilha do conhecimento, mas rejeitam os contributos de áreas cuja produção de saber trata exemplarmente das questões ligadas à criatividade humana, como a filosofia, a semiótica ou a psicanálise. Em termos gerais, as ciências de gestão organizam-se em volta de um con- junto estável de conceitos, formando aquilo que é conhecido pelo termo de or- todoxia ou de mainstream. Em oposição a este pensamento dominante surge uma diversidade de correntes de pensamento alternativas, em que estas sim, introduzem conhecimento de outras disciplinas, e que são apelidadas de hete- rodoxas. Assim, o presente trabalho identifica-se com as posições assumidas i i i i i i i i Práticas e Discursos Estratégicos 65 como periféricas e críticas em relação aos pensamento dito convencional ou tradicional em gestão. A comunicação em gestão, o marketing estratégico e os contributos da semiótica e da filosofia A comunicação é como uma casa com uma grande porta da frente e gran- des janelas na fachada. Nas traseiras, lateralmente, no telhado e junto ao chão tem pequenas portas e janelas, túneis, clarabóias, corredores, alçapões e esconderijos, que passam despercebidos a quem entra pela porta da frente ou a quem espreita pelas grandes janelas da fachada. Mas o que se vê é muito diferente, consoante se espreita por um lado ou pelo outro. Quando dois amigos se cumprimentam ao se encontrarem na rua, quando trocam emails, ou quando apenas se abraçam sem trocar palavras num mo- mento emocionante, dizemos que comunicam algo entre si, uma mensagem, algo que é inteligível para ambos, o que exprime e o que escuta e acolhe. Quando dizemos que uma paisagem, um quadro ou uma peça de música nos inspira, pensamos que nos está a comunicar algo mas aqui não temos dois sujeitos, nem uma relação intersubjectiva. Digamos que aqui usamos o termo comunicação em sentido figurado, como se fosse possível que uma realidade não humana pudesse comunicar. Podemos ainda pensar que é o autor (dum texto), o compositor, o pintor, o arquitecto paisagista que desenhou um parque do qual gostamos que está a enviar-nos alguma mensagem, com um conteúdo específico para quem a emitiu e para quem a recebe, mesmo que não seja exactamente o mesmo, ou que até seja muito diferente. Este conteúdo é, assim, algo que não é estático, de interpretação única. Tem por trás um código, uma linguagem, uma gramática, uma sintaxe especí- fica. Quem não estiver familiarizado com estes elementos não pode aceder ao conteúdo da mensagem. Passando para a comunicação em animais não humanos, reconhecemos facilmente que certas espécies são sensíveis a ondas, timbres e níveis de som que são inaudíveis e imperceptíveis aos seres humanos, por exemplo quando pressentem a aproximação de uma trovoada ou terramoto. Esta interpretação da linguagem é aquela que nos é dada pela entrada pela porta da frente, da casa da comunicação. i i i i i i i i 66 Ângela Lacerda Nobre A comunicação organizacional interna e externa Ao nível da gestão, identificamos dois níveis essenciais de comunicação, o interno e o externo. O que é a empresa ou organização? O que faz, pro- duz, oferece? Como, onde, quando? Para quem? E porque o faz, com que finalidade, e com que consequências? Pretende satisfazer que necessidades? Ao responder a estas questões e ao transmiti-las ao seu mercado potencial, está a definir-se, a criar uma imagem sobre aquilo que é e o que oferece. É possível responder a estas questões de forma estática e objectiva? A algumas sim mas em relação à maioria trata-se de explicitar intenções, afir- mações que se reportam ao futuro, àquilo que é possível esperar, em relação ao potencial existente. Este será o nível de comunicação externo. Quanto ao interno, consiste em explicitar de que forma se vão concretizar estes objectivos e intenções, incluindo como se vai transmiti-las ao exterior, isto é, a comunicação externa. A missão, aquilo que a organização faz ou pretende fazer, a visão, aquilo que interpreta como o seu enquadramento, e os valores, aquilo que a inspira, orienta e compromete, são os conceitos utilizados como linha de base para a definição dos objectivos, quantificados e calendarizados, e da estratégia, isto é, do caminho utilizado para atingir tais metas, através de tácticas concretas. A missão, ao definir a organização, vai determinar todos os outros elemen- tos, daí o termo missão estratégica. A explicitação por escrito desta missão - “mission statement”, declaração da missão estratégica - é redigida tendo como público potencial os colaboradores, fornecedores, parceiros, accionistas e só- cios, ao nível interno, e os consumidores, clientes, comunidade envolvente e entidades públicas, ao nível externo. Em gestão utilizam-se ainda conceitos ligados à distinção entre comuni- cação formal e informal, verbal e não verbal, vertical e horizontal, top-down e bottom-up, programada e espontânea, entre pares e hierárquica, ou pessoal e profissional. Assume-se ainda que diferentes estilos de liderança corres- pondem a diferentes estilos de comunicação, mais laissez-faire ou mais au- tocrático, open-door ou centralizado, colaborativo e participativo ou rígido, procedimental e burocrático. i i i i i i i i Práticas e Discursos Estratégicos 69 simplificadora em relação às dificuldades concretas encontradas; por outro lado, a alternativa proposta implica a introdução de áreas de pensamento que são distantes e estranhas à prática e à teoria de gestão tradicional. A saída, é remetermos para a análise do comportamento humano, em termos mais vas- tos, para depois identificarmos o caso particular do contexto organizacional. Desafios O desafio a que pretende responder o presente trabalho é até que ponto a expressão “pensar fora da caixa” se adapta àquilo que é exigido aos gesto- res contemporâneos. Se não aos gestores, àqueles que se debruçam sobre os assuntos de gestão, académicos ou investigadores aplicados, envolvidos em projectos do tipo investigação-acção. Parte deste desafio envolve a identificação de processos que captem, em simultâneo, as dimensões individual e a colectiva da realidade organizacional. As perspectivas antropológicas e sociológicas procuram fazê-lo, pois reme- tem para a forma como cada indivíduo é afectado pelas estruturas e pelos mitos sociais e, em paralelo, como cada indivíduo é também actor e interve- niente nesse processo social. Cada indivíduo como produto e produtor, criado e criador, consequência e causa, influenciado e influenciador do meio social. As normas sociais são reproduzidas, repetidas, e daí surge a sua estabi- lidade, e são, também, permeáveis à transgressão. Este equilíbrio dinâmico, entre estabilidade e mudança, surge na sociedade como um todo, ao nível da cultura vigente, por exemplo, mas surge ainda no seio de cada instituição. A manifestação da realidade dá-se em termos de mudança constante. Quando essa mudança é identificada como uma evolução positiva, que ex- pressa o pleno potencial de cada situação presente, então, identificamos essa mudança como sendo desenvolvimento. Desenvolvimento, como conceito, pode ser aplicado ao nível individual, organizacional e societal, sempre corres- pondendo ao mesmo fenómeno da expressão do máximo potencial da reali- dade, hic et nunc, aqui e agora, isto é, em relação a cada situação concreta e particular. O filósofo medieval Agostinho explicava o tempo como passado-presente, presente-presente e futuro-presente. É esta dimensão dinâmica do tempo que importa realçar ao caracterizarmos o conceito de desenvolvimento. Ao nível i i i i i i i i 70 Ângela Lacerda Nobre da gestão, o conceito de desenvolvimento sustentável tem também esta ideia de equilíbrio dinâmico e de visão holística, relacionando tudo com tudo, inte- grando simultaneamente as três vertentes do desenvolvimento, a ecológica, a económica e a social. Tópicos relevantes Em termos de estrutura e de desenvolvimento das ideias expressas, este trabalho aborda diferentes conceitos, procurando explorar as suas ligações, de uma forma generalizada: práticas sociais - participação activa em comunida- des específicas, nomeadamente na organizacional; discursos - discursividades sociais e “textual formations”, ou, como o uso da linguagem e a formação de narrativas molda, orienta e sustenta cada prática concreta; estratégias e proces- sos de conhecimento - aquilo que caracteriza de forma única cada instituição e que a identifica como um todo, sendo uma fonte insubstituível da criação de vantagens competitivas sustentáveis; a repetição e a mudança - a forma como a própria identidade, estratégia e conhecimento de cada organização não são conceitos estáticos mas sim dinâmicos e orientados para o futuro, em aberto, pelo que o equilíbrio entre aquilo que se reproduz e repete e aquilo que se altera e modifica vai moldando o potencial de desenvolvimento de cada orga- nização; o pragmatismo e os não-dualismos - são corpos teóricos que rejeitam a separação de psique e corpo, teoria e prática, interior e exterior, indivíduo e social - têm a vantagem de permitirem uma integração dos diferentes níveis de análise e situam-se, em termos epistemológicos, como uma reação ao car- tesianismo e à evolução trazida pela modernidade ao nível da autonomia das diferentes ciências modernas; a comunicação publicitária - é um bom exemplo da possibilidade de leitura e de interpretação de teorias como a semiótica ou o pragmatismo pois, inevitavelmente, utiliza a simbologia e os processos de significação presentes em sociedades e em grupos sociais específicos para in- fluenciar o comportamento ao nível individual; o marketing - como função de gestão e ainda como elemento fundamental e primordial da gestão estratégica; o conhecimento e os processos de criação de sentido - como o cerne da ques- tão da análise organizacional, pois aplicam-se ao seio das organizações e das suas comunidades e ainda, aos seus clientes e parceiros - o sucesso de cada empresa, organização ou instituição joga-se na sua capacidade de promover processos de conhecimento e de criação de sentido que são significativos para i i i i i i i i Práticas e Discursos Estratégicos 71 todos os envolvidos - significantes e significativos, produzem, criam sentido, pois tiram o máximo partido da manifestação do pleno potencial de cada rea- lidade concreta e isso é perceptível de forma objectiva por todos os elementos envolvidos. Complexidade e turbulência Esta visão pouco ortodoxa da gestão e da realidade organizacional é par- ticularmente relevante no actual contexto de crescente complexidade e turbu- lência dos mercados e das sociedades contemporâneas. Como crítica feroz àquilo que é ensinado e assumido como estado-da-arte ao nível do pensamento dominante em gestão, pode dizer-se que se continua a olhar para a realidade actual como se fosse a de há cem anos, numa pers- pectiva da sociedade industrial, em que o que importa é controlar, quantificar, medir e prever de forma exacta e mecânica, numa perspectiva de “comando e controlo”. Em 1900, tudo o que era produzido ao nível industrial era imediatamente absorvido pelos mercados, ainda incipientes mas ávidos de oferta, pelo que bastava centrar toda a atenção na produção, procurando ganhos sucessivos ao nível da produtividade, da repetição e especialização de tarefas e da meca- nização. Em 1950, os mercados aproximam-se da saturação e já não basta produzir, nem centrar todas as atenções apenas na produção, pois torna-se ne- cessário conhecer o mercado alvo, identificar as suas necessidades específicas e dar-lhes resposta através de produtos únicos, diferenciados, que respondem à segmentação previamente definida como relevante - e assim surge o marke- ting. Passamos duma produção em massa para um marketing de massa. Em 2000 já não são só os mercados mas ainda os segmentos de mercado que es- tão saturados e é necessário responder ainda de forma mais fina e localizada, surgindo a produção e o marketing relacional, 1:1, um-para-um. A tecnologia permitiu o desenvolvimento da linha de montagem na pri- meira metade do século XX, a estatística e a sociologia promoveram o de- senvolvimento do marketing nos anos cinquenta e as novas tecnologias de in- formação e de comunicação permitiram a resposta ao nível individual, tailor- made, soluções feitas à medida ao longo da segunda metade do século XX. A partir do pós-guerra e ao longo de toda a segunda metade do século XX dá-se a transição, ainda em curso, da chamada sociedade industrial para i i i i i i i i 74 Ângela Lacerda Nobre O sucesso comercial de empresas inovadoras como a Amazon explica-se em termos da utilização de exactamente a mesma estratégia, de aposta nas franjas populacionais ignoradas pelos líderes de mercado e por uma resposta exaustiva às suas necessidades. O sucesso da YouTube e das redes sociais, utilizando as infinitas possi- bilidades das novas tecnologias, cria novas oportunidades de negócio, novas práticas de trabalho e novas formas de produção e de consumo, tal como anun- ciado por Touraine. O conceito da Web 2.0, em que os utilizadores não têm já apenas um papel passivo de mera recolha do material disponível em páginas estáticas de reposi- tórios de conteúdos, como acontecia com a internet da primeira geração, mas são já produtores activos, interagindo e produzindo continuamente conteúdos específicos, em interacção com as comunidades em que estão envolvidos, é revelador da transição em curso. Ao nível da gestão e da inovação, em termos de modelos de gestão, te- mos o exemplo do conceito de inovação aberta, o qual argumenta que a visão tradicional da criação de departamentos estanques e herméticos de produção de investigação - Investigação & Desenvolvimento - são ineficientes e inefica- zes pois a verdadeira inovação revela-se na interacção com os clientes, com a comunidade, com os fornecedores e até com os concorrentes. Para finalizar a caracterização desta nova realidade que se adivinha nas mais diversas áreas, importa referir um comentário sobre a obra de Shakes- peare, sobre a importância da linguagem e da imagem agora e então, e sobre a importância da sensibilidade histórica para que se possam contrastar dife- rentes épocas. Na transição do século XVI para o XVII o conceito que temos hoje de imagem, em termos pessoais, nas sociedades ditas desenvolvidas, em que desde a adolescência se trabalha e se produz uma imagem social, em ter- mos visuais e de estilo, imagem esta que funciona nas relações virtuais e nas do mundo físico, esta imagem, a sua promoção e divulgação, há quatro sécu- los atrás, estava reduzida a meia dúzia de individualidades da nobreza e do clero. O próprio conceito de imagem pessoal era irrelevante dado praticamente não existir em termos práticos. A par desta pobreza ao nível da produção e divulgação da imagem, autores como Shakespeare, génios da literatura, com- pensavam esta ausência com uma extrema riqueza da linguagem utilizada. Era i i i i i i i i Práticas e Discursos Estratégicos 75 a linguagem que fazia todo o trabalho, o trabalho de criação de um enredo, de uma trama e de uma narrativa eficaz, altamente eficaz. Em comparação, a linguagem utilizada pelos dramaturgos contemporâ- neos não precisa de recorrer ao mesmo nível de elaboração e de complexi- dade uma vez que utiliza inúmeros outros elementos de comunicação com o público e de criação da trama psicológica de cada peça. Outro exemplo elucidativo da mudança em termos de épocas históricas e da complexificação das relações, é o diálogo entre um maestro e uma sua aluna. Conta-se que um certo maestro pretendia contrapôr os argumentos de uma jovem música que contestava a necessidade da utilização de grandes or- questras quando pequenos grupos de câmara serviriam os mesmo propósitos. Após sucessivas explicações mais ou menos técnicas o maestro acabou a con- versa com o seguinte exemplo: “precisamos de grandes orquestras porque já não nos satisfazemos com pequenas, pela mesma razão que nos dias hoje o seu pequeno almoço é certamente diferente daquele que tomava a Rainha Vi- tória, que tinha para o pequeno almoço meia libra de toucinho e uma caneca de café.” Reflexões aplicadas Tensão criadora e o papel da linguagem e da acção A ideia de tensão criadora, de algo que se manifesta de forma dinâmica e orientada, e que está presente em todos os processos de manifestação da vida e da realidade, é importante para a caracterização do processo de inovação e de estímulo à criatividade no seio organizacional. A linguagem, e o dinamismo que a caracteriza, é talvez a melhor metáfora do processo de desenvolvimento, entendido como um processo dinâmico e criativo de abertura ao novo. A acção, entendida como instância de inteligibilidade e de criação de sen- tido, partilha exactamente das mesmas qualidades da linguagem, em termos de ser movida por um dinamismo criador, já orientado e inteligível. Assim, podemos dizer que a acção implica necessariamente uma orientação e um e- xercício de preferência, o qual é reconhecível apenas a posteriori. Linguagem, acção, conhecimento e sentido formam um todo interligado, i i i i i i i i 76 Ângela Lacerda Nobre como várias imagens de um caleidoscópio, ou vários estágios de um mesmo processo, o processo dinâmico de manifestação da realidade. Do conceito à linguagem poética A relação entre o formal e o não-formal, o explícito e o implícito, o visível e o invisível, o predefinido e o espontâneo, revelam-se férteis em termos de permitirem o acesso a esse dinamismo que tem origem no não-formal, no im- plícito, no invisível e na espontaneidade, e que se concretiza no que é formal, explícito, visível e que se pode definir, antever, desenhar e planear. Dinamismo, orientação, manifestação, potencial, transformação e desen- volvimento continuam a ser imagens ligadas pelas diferentes faces de um ca- leidoscópio. A relação entre a determinação (conceito) e a abertura ao novo (interpretação), opõem Ricoeur (1981) e Heidegger (1962), um privilegiando a explicitação exacta e o outro o poema e a linguagem poética. E ambos têm razão, ambos estão certos, pois trata-se do movimento incessante entre ambas as interpretações que o conhecimento humano avança e acontece. Um, argumenta que se tem de chegar ao conceito, à determinação, à ex- plicitação e, de certa maneira, à cristalização, ainda que provisória, de uma interpretação específica e que só a partir de fixações sucessivas, que se vão auto-substituíndo, é que o conhecimento avança. O outro, nega e contra-argumenta que a fixação cega, pára e interrompe o processo de interpretação e de entendimento, e que é ao nível da poesia e da linguagem poética que se pode garantir a contínua e permanente abertura ao novo. Voltando à metáfora do caleidoscópio, ambas as interpretações são não só necessárias como imprescindíveis, para explicar o dinamismo de evolução do conhecimento. Funcionamento humano e as teorias do signo Ao estudar as organizações e a realidade organizacional importa identifi- car as particularidades do funcionamento humano, em termos daquilo que nos é possível e acessível. Por exemplo, em termos abstractos, podemos imaginar que seja possí- vel estabelecer relações entre todos os elementos constituintes da realidade i i i i i i i i Práticas e Discursos Estratégicos 79 volvendo e transformando consoante a função que vai tendo no universo das outras coisas. Quando pensamos, por exemplo, na filosofia de Platão, podemos dizer que Platão faz o que todos nós fazemos, i.e. traduzir o processo de viver, que é fazer o melhor possível nas diferenças de cada existência. Mais uma vez, este processo corresponde à manifestação do real, do máximo de possibilidades da realidade. Natureza e cultura As relações entre os conceitos de natureza e de cultura são complexos. Na filosofia pré-socrática identificaram-se os elementos fundamentais: terra, ar, água e fogo. Contudo, esta identificação tinha uma forta carga simbólica, abrindo a novas interpretações. Isto é, cada elemento pode ser caracterizado de forma única, através de uma matematização, formalização ou fórmula quí- mica, mas essa é a interpretação mais redutora, não sendo exclusiva, existindo ainda a possibilidade de outras, múltiplas interpretações, cada uma diferente e diferente em cada instante e em cada época histórica. A história simbólica - a qual é uma interpretação aplicável a tudo - vai mu- dando constantemente. Por exemplo, a natureza pode ser interpretada como sendo fixa, contudo, vivemos na natureza simbolicamente, i.e. interpretamos a natureza segundo um conjunto de valores que se vão desenvolvendo conti- nuamente. Dito de outra forma, estudamos a natureza dentro dos limites que estabelecemos pela cultura. Conhecimento A problemática do conhecimento pode resumir-se na expressão “o remeter para”. Isto é, conhecer é sempre remeter para algo. Este processo tem um sentido quantitativo e um sentido qualitativo e habi- tuámo-nos a identificá-los como estando em oposição, quando será mais cor- recto entendê-los como um continuum, com crescentes graus de complexi- dade. Da mesma forma em relação à utilização do termo metáfora. Usualmente, pensamos na utilização do conceito de metáfora como a relação entre duas i i i i i i i i 80 Ângela Lacerda Nobre entidades ou objectos entendida como algo que é semelhante, que se pode comparar, colocar lado a lado e que pode ter o mesmo tipo de interpretação. Contudo, a metáfora aplica o nome que tinha um sentido a outra coisa com outro sentido, isto é, actua no sentido da simbolização e abre à criação de mais sentido. Temos, assim, o confronto entre duas interpretações do processo de meta- forização - como unidade e afinidade das coisas ou dos nomes e como busca daquilo que é semelhante, como acontece com os gregos, por exemplo, com a Poética de Aristóteles - ou, por outro lado, a interpretação de que quem metaforiza procura a diferença. É este sentido da metáfora como busca da diferença - do que não é bem as- sim, é outra coisa, que apenas se pode indicar e tactear - que importa salientar aqui pois, mais uma vez, é pela diferença que surge a abertura ao novo. Unidade na diversidade Na cultura da sociedade ocidental existe uma tendência para a homoge- neização, isto é, para a anulação da diferença. Contudo a diferença é riqueza e é abertura ao novo, fonte de inovação e de criatividade. Derrida (1978) cria o termo “differance”, um neografismo como o próprio refere, para salientar a ideia da necessidade de desconstrução, de desmontar o sentido por trás do uso da linguagem, revelando camadas sucessivas de níveis de interpretação. Ainda, Saussure (1959) salienta a importância da diferenciação, da dife- rença, da não homogeneização, e argumenta que “na linguagem só existem diferenças” (“in language there are only differences”). A ontologia, como ramo da filosofia ligada à corrente de filosofia conti- nental (ex. Heidegger, 1962), que se opõe à corrente da filosofia analítica, foca a importância da abertura à manifestação da realidade, múltipla e dife- renciada. Num certo sentido, podemos dizer que parece que vivemos todos da mesma maneira - mas cada um vê as coisas de modo muito diferente. Desenvolvimento e transformação Valor abre sempre a maior valor, como foi referido em cima. As coisas e os valores são independentes do que conhecemos? Não conhecemos as coisas. i i i i i i i i Práticas e Discursos Estratégicos 81 Conhecemos as coisas que têm valor. Mas o valor é valor para mim ou valor em si? Valor das coisas em si mesmas? Não é para mim - eu é que estou numa posição de procurar o melhor valor possível. O mal - é a fixação num ponto do percurso e tomá-lo como ideal. É fundamental caracterizar-se o que se entende por desenvolvimento e por transformação. Ambos os conceitos são entendidos como tendo uma interpre- tação positiva e construtiva, como já foi referido atrás, reveladora do máximo potencial existente em cada situação concreta. Cada cultura, quer se trate duma sociedade ou duma organização, surge através dum processo de formalização e implica uma tendência de fixação e de uma certa idolatria, fixando um estádio do processo, contrariando, assim, o movimento dinâmico de manifestação do máximo de possibilidades da rea- lidade. A cultura corresponde à vivência de valores. Quanto à relação entre a cultura e a simbolização, é esta última que traz o dinamismo do desenvolvimento e da transformação, pois é sempre o simbó- lico que obriga à modificação. O simbólico abre à interpretação, num processo contínuo, e sempre inacabado e incompleto. Um texto, um conto, um poema, uma obra de arte, estão sempre abertos a novas interpretações precisamente porque exploram o lado simbólico. Antes do logos, do saber racional, perfeitamente expresso e articulado, existe a acção espontânea, já ela profundamente racional, orientada e inteli- gível, plena de sentido, embora ainda não verbalizada, formalizada e explici- tada. Quando não compreendemos algo, vamos ver o que fazemos, aprender “a ver como fazemos”, pois nesta acção, neste fazer, está já o sentido que é continuado e integrado nos processos de racionalização posteriores, formais, conscientes e lineares. Tudo tem valor - partir de algo, com valor, e ir à pro- cura dum maior valor. E a isso chamamos desenvolver e transformar. i i i i i i i i i i i i i i i i Narrativas de defesa e culpa nos discursos organizacionais Gisela Gonçalves Universidade da Beira Interior NO DIA 20 de Abril de 2010, uma explosão na plataforma petrolífera daBritish Petroleum (BP) no mar do Golfo do México provocou 11 mor- tos e 17 feridos. Durante 87 dias, ou mais precisamente, até 15 de Julho, data em que a fuga é dada como controlada, foram libertados para o mar cerca de 780 milhões de litros de crude, provocando o pior desastre ambiental dos EUA. A empresa britânica viria a gastar cerca de 4,6 mil milhões de euros na luta contra a maré negra no Golfo do México. Este montante inclui as despe- sas para conter e limpar o crude na zona, as despesas com as equipas de apoio, e o valor entregue às autoridades federais e aos Estados norte-americanos com costa afectados pelo desastre. Até meados de Junho de 2010, a BP terá rece- bido cerca de 150.000 pedidos de indemnização tendo vindo a criar um fundo de 20 mil milhões de dólares para as vítimas da maré negra. Apesar dos valores elevados associados à gestão da crise, muitos são os analistas que consideram que a factura provocada pela desvalorização da marca em cerca de 61% ainda está por pagar: a difícil recuperação da imagem e reputação da BP provocada, em grande parte, pela má gestão da comunica- ção em situação de crise. Entre os vários episódios que marcaram a comuni- cação de crise da BP, sem dúvida que o pico mais mediático foi marcado pela campanha publicitária em que Tony Hayward, CEO da BP, pede desculpas publicamente e afirma o compromisso da empresa em resolver o problema do derrame de crude. Tendo como pano de fundo o estudo de caso da BP, o objectivo principal deste artigo consiste em perceber como as organizações modernas recorrem a estratégias discursivas de responsabilização para se legitimarem como actores sociais. Pretende-se reflectir como através de narrativas que oscilam entre a defesa e a culpa, as empresas defendem a sua imagem aos olhos da opinião pública. Esta reflexão parte do pressuposto de que o discurso organizacio- nal – tal como as pessoas, o dinheiro, a matéria-prima, ou as máquinas – é um recurso das organizações que pode ser utilizado para resolver problemas. Além disso, subjaz ao nosso raciocínio a ideia de que o processo comuni- Pragmática: Comunicação Publicitária e Marketing , 85–100 i i i i i i i i 86 Gisela Gonçalves cacional promovido pelas relações públicas não deve ser interpretado apenas como spin control, mas antes como um processo de criação de significados partilhados entre a organização e os seus diferentes públicos. O artigo encontra-se dividido em três momentos principais. Em 1o lugar, numa abordagem mais lata, começa-se por analisar o discurso de responsa- bilização da BP à luz da literatura sobre estratégias de comunicação de crise. Em 2o lugar, descodifica-se o pedido de desculpas público e oficial da BP, vei- culado numa campanha publicitária, através de um estudo discursivo e inter- pretativo. Finalmente, propõe-se uma interpretação do insucesso da estratégia de comunicação de crise através de uma explicação discursiva do recurso ao acto ilocutório que constitui o pedido de desculpas. Revisitando os teorias de comunicação de crise A comunicação de crise tem sido amplamente estudada por parte dos au- tores de relações públicas, ou não estivesse no centro da actividade desta dis- ciplina de gestão a criação, manutenção e defesa da legitimidade de uma or- ganização para operar na sociedade. O direito de uma organização existir e desenvolver as suas actividades advém do respeito pelas regras sociais, valo- res e expectativas múltiplas estabelecidas pelos stakeholders.1 Daí que sempre que a opinião pública se questiona sobre se uma organização está a seguir as expectativas normativas existentes exista uma crise – de maior ou menor grau – mas que ameaça ou desafia a legitimidade pública de uma organização. É nestas situações que as organizações recorrem à comunicação com os seus diferentes públicos de forma a esclarecer ou defender as suas opções de ac- ção. Através do discurso organizacional procuram, no fundo, modelar a forma como as pessoas percepcionam a organização. De acordo com a revisão bibliográfica levada a cabo por Avery et al (2010), nos últimos 18 anos, entre 1991 e 2009, podem-se identificar dois principais paradigmas teóricos que suportam a produção científica no âmbito 1Os conceitos de stakeholder e de público são muitas vezes utilizados como sinónimos. O conceito de stakeholder é aqui utilizado no sentido clássico teorizado por Freeman (1984: 25), isto é, “qualquer indivíduo ou grupo que pode afectar ou ser afectado pelas acções, decisões, políticas, praticas ou objectivos de uma organização”. No âmbito da gestão da comunicação, público é considerado aquele grupo de pessoas que é, de facto, alvo das estratégias comunica- cionais. i i i i i i i i Narrativas de defesa e culpa nos discursos organizacionais 89 ceito similar ao introduzir o conceito de dissociações individuais/grupo na sua análise da corporate apology. Uma táctica que, na opinião de Hearit, permite que a empresa identifique os transgressores ao mesmo tempo que preserva a sua reputação: afirmando que o seu comportamento, além de atípico, desafia os valores da empresa e deve ser sancionado. Para que a separação ou dis- sociação funcione, Brinson e Benoit (1999) argumentam que a organização deve ser capaz de mostrar que as suas políticas foram ignoradas, que os pre- varicadores foram punidos e que medidas foram tomadas para evitar novos problemas. (2) Fugir à responsabilidade Nesta categoria, Benoit (1997) discrimina quatro subcategorias: reacção a uma provocação, vitimização, acidente e boas intenções. O primeiro caso ocorre quando uma empresa afirma agir em resposta a um acto ofensivo de outro e, consequentemente, que o seu comportamento pode ser visto como uma reacção razoável a essa provocação. Por exemplo, uma fábrica justificar a sua mudança de país com o aumento de impostos. Para fugir à responsabi- lidade uma empresa pode também alegar que a acção ofensiva foi acidental e por isso mesmo não intencional; ou ainda, explicar que por detrás da sua acção estavam boas intenções. A vitimização é uma sub-categoria que tem sido alvo de grande atenção. O discurso da vitimização é uma estratégia para reduzir a responsabilidade do indivíduo ou organização acusada através do argumento de falta de con- trolo, ou de informação pertinente, em relação a determinada situação. Benoit (2006), por exemplo, demonstrou que o antigo Presidente dos EUA, George W. Bush, recorreu a este tipo de defesa ao justificar a sua decisão de enviar tropas para o Iraque: Bush argumentou que agiu em conformidade com a in- formação secreta que possuía naquela altura. (3) Reduzir o grau de ofensa Qualquer empresa acusada de más acções pode tentar reduzir a percepção sobre o grau da ofensa através de seis estratégias: apoiar, minimizar, dife- renciar, transcender, atacar e compensar. O apoio consiste numa tentativa de melhorar a credibilidade realçando comportamentos positivos da empresa no passado. A sua eficácia será maior quanto maior e mais antiga for a admiração e apoio do público à organização (Holtzhausen & Roberts, 2009). As outras estratégias para reduzir o grau de ofensa passam por minimizar os sentimen- tos negativos associados ao acto em causa; diferenciar-se por comparação a i i i i i i i i 90 Gisela Gonçalves problemas similares muito mais graves; transcender-se no sentido em que a organização pode explicar o seu acto como um mal necessário tendo em vista um objectivo muito mais importante; atacar o acusador com a intenção de diminuir a sua credibilidade e, por último, compensar as vítimas através de indemnizações. (4) Acção correctiva Quando uma empresa promete corrigir o problema por ela provocada pro- põe-se desenvolver uma acção correctiva. Esta acção pode tomar a forma de restituição do estado das coisas anteriores ao acto ofensivo e/ou a promessa de evitar a recorrência desse acto. Hearit (1995) argumenta que ao optar por uma acção correctiva, a organização está a aceitar algum tipo de responsabi- lidade no evento em questão. Por isso mesmo, não pode ser usada com uma estratégia de negação. Também Caldiero, Taylor e Ungureanu (2009), ao exa- minarem 17 tipos de crises fraudulentas, descobriram que a acção correctiva foi a estratégia mais utilizada e aquela que mais compromete uma organização em relação à sua acção no futuro. (5) Mortificação A última estratégia geral de renovação da imagem referida por Benoit consiste no acto de confessar e pedir desculpas. A mortificação tem sido considerada uma forma de resposta efectiva em muitas situações. No entanto, muitos autores realçam que nem sempre é utilizada devido às implicações le- gais e financeiras que acarreta para quem assume a responsabilidade do acto. Além disso, em determinadas circunstâncias, outras estratégias menos com- prometedoras, parecem poder gerar o mesmo nível de reacção positiva (Co- ombs & Holladay, 2008; Coombs & Schmidt, 2000). Por exemplo, Holtzhau- sen e Roberts (2009) descobriram que as estratégias de redução do grau de ofensa estão correlacionadas com um tipo de cobertura mediática mais posi- tiva, enquanto que a mortificação a uma cobertura mais negativa. Estes autores concluíram que o pedido de desculpa nem sempre conduz a resultados mais positivos, não sendo necessariamente, por isso mesmo, uma boa opção. Pelo contrário, Sheldon e Sallot (2009) estudaram a retórica política e descobriram que a mortificação era a melhor estratégia para gerar suporte pú- blico e melhorar a reputação. Estes resultados contraditórios indicam que o sucesso das estratégias de reparação da imagem depende dos indivíduos ou organizações em questão, assim como, da natureza da crise. Em suma, tal como para Coombs, as opções discursivas identificadas por i i i i i i i i Narrativas de defesa e culpa nos discursos organizacionais 91 Benoit, dependem da gravidade da acção que despoletou a crise e do grau de responsabilidade do actor corporativo. Em ambos os modelos, a opção por pe- dir desculpas publicamente corresponderá a situações limite na comunicação de crise, pois implica que a organização assuma a culpa, total ou parcial pela situação despoletada e pelas suas consequências. É precisamente o acto de pedir desculpas que de seguida analisamos mais pormenorizadamente, após apresentação do caso de crise da BP – um fenómeno privilegiado para aplicar as tipologias dos autores antes apresentadas. A estratégia de comunicação de crise da BP Optamos por apresentar os principais momentos da gestão da comuni- cação de crise encetada pela BP, no caso do derrame de petróleo no Golfo do México, através de uma representação esquemática. Nesse resumo, os momentos-chave da comunicação de crise são analisados à luz do enquadra- mento teórico proposto por Coombs e Benoit, anteriormente revisitado. No dia 20 de Abril de 2010, a plataforma Deep Horizon explode e incen- deia-se provocando 11 mortos e 17 feridos. Dois dias depois, a plataforma
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