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Guias e Dicas
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Cuidados com população de rua, Notas de estudo de Enfermagem

Cuidados com população de rua

Tipologia: Notas de estudo

2012

Compartilhado em 26/10/2012

gerson-souza-santos-7
gerson-souza-santos-7 🇧🇷

4.8

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Baixe Cuidados com população de rua e outras Notas de estudo em PDF para Enfermagem, somente na Docsity! MINISTÉRIO DA SAÚDE o ce ter MDA De quis t MANUAL SOBRE “| O CUIDADO À SAÚDE JUNTO ] A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA MINISTÉRIO DA SAÚDE MANN 0 =] É | O CUIDADO À SAÚDE JUNTO E A POPULAÇÃO EMSITUAÇÃO DE RUA © 2012 Ministério da Saúde. Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que não seja para venda ou qualquer fim comercial. A responsabilidade pelos direitos autorais de textos e imagens desta obra é da área técnica. A coleção institucional do Ministério da Saúde pode ser acessada na íntegra na Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde: http://www.saude.gov.br/bvs. Tiragem: 1ª edição – 2012 – 5.000 exemplares Elaboração, distribuição e Informações: Ministério da Saúde Secretaria de Atenção à Saúde Departamento de Atenção Básica Edifício Premium, SAF Sul, Quadra 2, Lote 5/6, Bloco II, Subsolo CEP: 70.070-600, Brasília – DF Fone: (61) 3306-8090 / 6606-8044 Correio eletrônico: dab@saude.gov.br Endereço eletrônico: www.saude.gov.br/dab Supervisão geral: Hêider Aurélio Pinto Coordenação Técnica Geral: Eduardo Alves Melo Organização: Alexandre Teixeira Trino Rosana Ballestero Rodrigues Elaboração Técnica: Alejandra Prieto de Oliveira Alexandre Teixeira Trino Ana Lúcia Gomes Andrea Gallassi Ângela Maria Mazzilli Fassy Angélica da Silveira Antonio Garcia Reis Junior Branca Eliane Bittencourt Charleni Inês Scherer Claudia de Paula Claudio Candiani David de Souza Iacã Imacerata Juliana M. de Melo Vidal Júlio Lanceloti Laila Louzada Leonardo Quintão Marcelo Pedra Martins Machado Marcia Helena Leal Marivaldo da Silva Santos Marta R. Marques Lodi Rosana Ballestero Rodrigues Vera Lúcia Martins Colaboração: Daniele Chaves Kuhleis Graziella B. Barreiros Joseane Prestes de Souza Letícia Toledo do Amaral Mariangela Soares Nogueira Silvia Freire Apoio: Equipe de Saúde da Família para População em Situação de Rua de Belo Horizonte Equipe de Saúde da Família para População em Situação de Rua do Rio de Janeiro Equipe de Saúde da Família sem Domicílio de Porto Alegre Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto – Núcleo A Gente na Rua Estratégia Saúde da Família de Rua / PSF – São Paulo Movimento Nacional de População em Situação de Rua – MNPR Equipe do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais Equipe da Área Técnica de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas – DAPES Equipe do Programa Nacional de Controle da Tuberculose – PNCT Equipe do Departamento de Apoio à Gestão Participativa – DAGEP Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa – SGEP Coordenação Editorial: Marco Aurélio Santana da Silva Projeto Gráfico, capa, diagramação e ilustrções: Roosevelt Ribeiro Teixeira – MS/DAB Normalização: Marjorie Fernandes Gonçalves – MS Revisão de texto: Ana Paula Reis Ficha catalográfica Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto a população em situação de rua / Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2012. 98 p.: il. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos) ISBN 978-85-334-1950-6 1. População em situação de rua. 2. Atenção à Saúde. 3. Promoção em Saúde. I. Título. II. Série. CDU 364 Catalogação na fonte – Coordenação-Geral de Documentação e Informação – Editora MS – OS 2012/0076 Títulos para indexação: Em inglês: Manual on the health care to the population in a street situation Em espanhol: Manual sobre el cuidado a la salud junto la población en situación callejera Impresso no Brasil / Printed in Brazil Agradecemos, de forma especial, a todos os homens, mulheres, adoles- centes e crianças em situação de rua que, com suas histórias e trajetórias de vida, nos possibilitaram o aprendizado que nenhuma academia poderia nos proporcionar, e representam os verdadeiros autores deste manual. AgrAdecimento SUmÁrio ApreSentAção....................................................................................................................................11 1 popUlAção em SitUAção de rUA: contexto HiStórico e político..........................17 2 cArActerizAção dA popUlAção em SitUAção de rUA..................................................21 3 VíncUlo no Atendimento À popUlAção em SitUAção de rUA..................................27 4 A popUlAção em SitUAção de rUA e SeUS territórioS...............................................31 4.1 Cartografia....................................................................................................................................37 4.2 Abordagem e acolhimento à pessoa em situação de rua.................................................39 5 AtriBUiçÕeS dA eQUipe mUltiproFiSSionAl................................................................43 5.1 relato de experiência do Serviço Social no Atendimento à pessoa em Situação derua............................................................................................................................45 5.2 relato de experiência de Atuação integrada da Atenção Básica e Saúde mental...................................................................................................................................47 6 eSpeciFicidAdeS do Atendimento À popUlAção em SitUAção de rUA ....................................................................................................................51 7 oS proBlemAS clínicoS mAiS comUnS JUnto A popUlAção em SitUAção de rUA...................................................................................................................57 7.1 problemas nos pés.......................................................................................................................57 7.2 infestações.....................................................................................................................................58 7.3 tuberculose....................................................................................................................................59 7.4 dSt, HiV e AidS............................................................................................................................63 7.5 gravidez de alto risco.................................................................................................................64 7.6 doenças crônicas..........................................................................................................................69 7.7 Álcool e drogas.............................................................................................................................72 7.8 Saúde bucal...................................................................................................................................78 8 eStrAtégiAS de SUporteS Ao cUidAdo pArA A eQUipe do conSUltório nA rUA.................................................................................................................81 9 experiÊnciAS com popUlAção em SitUAção de rUA: proJetoS Bem SUcedidoS e SUAS FerrAmentAS..................................................................................85 9.1 equipe de saúde da família para a população em situação de rua de Belo Horizonte...................................................................................................................................85 9.2 BompArceiro psicossocioambiental: Um trabalho Assumido........................................91 reFerÊnciAS....................................................................................................................................94 11Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua “Com cacos de mundo, de paus, de barro e de sonhos, ergue-se o esplendor de uma morada. Prateleiras, um catre e um fogão para a transformação de vida em vida, para conter a friagem que desce pela serra.” (Regis de Moraes) Este manual inaugura um novo marco na atenção à saúde da População em Situação de Rua (PSR) no Sistema Único de Saúde (SUS). Em que se pretende ampliar o acesso e a qualidade da atenção integral à saúde dessa população. Sendo a atenção básica um espaço prioritário para o fortalecimento do cuidado e a criação de vínculo na rede de atenção à saúde, possibilitando sua inserção efetiva no SUS, tendo como porta de entrada prioritária na Atenção Básica (AB) as equi- pes do Consultório na Rua. O Ministério da Saúde (MS), ao eleger como modelo a criação de uma política pública de saúde para a população em situação de rua em convergência com as diretrizes da atenção bá- sica e a lógica da atenção psicossocial com sua proposição de trabalhar a redução de danos, assume legitimamente a responsabilidade da promoção da equidade, garantindo o acesso dessa população às outras possibilidades de atendimento no SUS, com a implantação dos Consultórios na Rua. Abaixo, segue esquema que contextualiza a junção das duas experiên- cias anteriores que culminaram com a atual proposta da atenção básica no que se refere ao cuidado integral de saúde dessa população. ApreSentAção MINISTÉRIO DA SAÚDE14 Entende-se por agente social o profissional que desempenha atividades que visam garantir a atenção, a defesa e a proteção às pessoas em situação de risco pessoal e social, assim como aproximar as equipes dos valores, modos de vida e cultura das pessoas em situação de rua. É necessário que este profissional tenha habilidades e competências para: trabalhar junto a usuários de álcool, crack e outras drogas, agregando conhecimentos básicos sobre Redução de Danos, quanto ao uso, abuso e dependência de substâncias psicoativas; realizar atividades educativas e culturais; dispensação de insumos de proteção à saúde; encaminhamentos/mediação para Rede de Saúde e intersetorial; acompanhar o cuidado das pessoas em situação de rua. Recomenda-se ainda que este profissional tenha preferencialmente, experiência prévia em atenção a pessoas em situação de rua e/ou trajetória de vida em situação de rua. O técnico em Saúde Bucal da equipe do consultório na rua deverá ser supervisionado por um Cirurgião-Dentista vinculado a equipe de Saúde da Família (ESF) da área correspondente à área de atuação do consultório na rua ou da UBS mais próxima da área de atuação, conforme definição do gestor local. Esta equipe deverá também se responsabilizar pelo atendimento da população e programar atividades em conjunto com o Técnico em Saúde Bucal da equipe do consultório na rua. A supervisão direta do cirurgião-dentista será obrigatória em todas as atividades realizadas pelo técnico em saúde bucal. As equipes dos Consultórios na Rua deverão atender de oitenta a mil pessoas em situação de rua, cumprindo Carga Horária mínima semanal de 30 horas, tendo horário de funcionamento adequado às demandas das pessoas em situação de rua, podendo ocorrer em período diurno e noturno e em qualquer dia da semana. Todas as modalidades de equipes dos Consultórios na Rua poderão agregar Agentes Comunitários de Saúde, complementando suas ações. Frente a essa realidade, o MS, por meio deste manual, busca instrumentalizar os profissionais de saúde da atenção básica, na perspectiva da promoção do cuidado à população em situação de rua no cotidiano da sua prática profissional, para a ampliação e construção de novas formas de atuação frente aos problemas de saúde dessa população. 21Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua cArActerizAção dA popUlAção em SitUAção de rUA “Lutar pela igualdade sempre que as diferenças nos discriminem,lutar pelas diferenças sempre que a igualdade nos descaracterize”. (Boa ventura de Sousa Santos) Em relação ao termo “população em situação de rua” (PSR), as classificações são heterogê- neas, sobretudo se comparadas diferentes realidades internacionais (ADORNO; WARANDA, 2004). No Brasil, o termo consolidado expressa mais a situação do sujeito em relação à rua, e não apenas como “ausência de casa”, como outros países tendem a classificar. Autores como Escorel (1999), por exemplo, discutem a exclusão social como sendo um “processo no qual – no limite – os indivíduos são reduzidos à condição de animal laborans, cuja única atividade é a sua preservação biológica, e na qual estão impossibilitados de exercício pleno das potencialidades da condição humana”. Já Castell (1997) prefere o termo “desfiliação” para designar o processo pelo qual as pessoas adotam as ruas. Além desses e de outros autores que adotam conceitos específicos para a PSR, já há muitos estudos socioetnográficos institucionais considerando bases municipais (BRASIL, 2006) e nacionais (BRASIL, 2009). Ferreira lembra a definição do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome ao analisar a população em situação de rua de Belo Horizonte: “Grupo populacional hetero- gêneo constituído por pessoas que possuem em comum a garantia da sobrevivência por meio de atividades produtivas desenvolvidas nas ruas, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados, e a não referência de moradia regular” (FERREIRA, 2005). O censo para população em situação de rua realizado pelo governo federal em 2007 oferece várias informações para melhor compreensão a respeito das características desse grupo social em 71 municípios brasileiros. O perfil socioeconômico encontrado pela pesquisa sugere que a população em situação de rua em 2007 era predominantemente masculina (82%), mais da metade (53%) possuía entre 25 e 44 anos, aproximadamente 69% se declararam afrodescendentes (29,5% se declararam pretas e 39,1% Antonio Garcia Reis Junior 2 MINISTÉRIO DA SAÚDE24 Gráfi co 4 – Costumam dormir Fonte: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua, Meta/MDS, 2008. onde se encontravam, porém 38,9% deles não mantinham contato com esses parentes e 14,5% manti- nham contato em períodos espaçados (de dois em dois meses até um ano); 39,2% consideram como bom ou muito bom o relacionamento que mantinha com os parentes que viviam na mesma cidade, enquanto 29,3% consideravam esse relacionamento ruim ou péssimo. Sobre o trabalho e renda, a população em situação de rua é composta, em grande parte, por tra- balhadores, já que 70,9% exerciam alguma atividade remunerada. Dessas atividades, destacavam-se: catador de materiais recicláveis (27,5%), fl anelinha (14,1%), construção civil (6,3%), limpeza (4,2%) e carregador/estivador (3,1%). Apenas 15,7% das pessoas pediam dinheiro como principal meio para a sobrevivência. Esses dados são importantes para desmistifi car o fato de que a PSR é composta por “mendigos” e “pedintes” (BRASIL, 2009). Em relação à alimentação, a maioria (79,6%) conseguia fazer ao menos uma refeição por dia, sendo que 27,4% destes compravam comida com seu próprio dinheiro. Contudo, 19% não conseguiam se alimentar todos os dias (ao menos uma refeição por dia). Sobre suas condições de saúde, 29,7% dos entrevistados afi rmaram ter algum problema de saúde, cujos problemas mais prevalentes foram: hipertensão (10,1%), problema psiquiátrico/mental (6,1%), HIV/aids (5,1%) e problemas de visão/cegueira (4,6%). Dos entrevistados, 18,7% faziam uso de algum medicamento. Postos/centros de saúde eram as prin- 25Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua Gráfi co 5 – Declaração de problemas de saúde Fonte: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua, Meta/MDS, 2008. cipais vias de acesso a esses medicamentos. Daqueles que os utilizavam, 48,6% afi rmaram consegui- -los por esse meio. Quando doentes, 43,8% procuravam em primeiro lugar o hospital/emergência. Em segundo lugar, 27,4% procuravam o posto de saúde. Esse dado demonstra o quanto os Consultórios de Rua e outras estratégias de atenção primária devem se aproximar do usuário em situação de rua. Sobre os hábitos de higiene, os principais locais utilizados por esse público para tomar banho foram a rua (32,6%), os albergues/abrigos (31,4%), os banheiros públicos (14,2%) e a casa de parentes ou ami- gos (5,2%). Os principais locais utilizados para fazer suas necessidades fi siológicas foram a rua (32,5%), os albergues/abrigos (25,2%), os banheiros públicos (21,3%), os estabelecimentos comerciais (9,4%) e a casa de parentes ou amigos (2,7%). Sobre a posse de documentação, 24,8% das pessoas em situação de rua não possuíam quaisquer documentos de identifi cação, o que difi culta a obtenção de emprego formal, o acesso aos serviços e pro- gramas governamentais e o exercício da cidadania. A grande maioria não era atingida pela cobertura dos programas governamentais: 88,5% afi rmaram não receber qualquer benefício dos órgãos governamentais. Em relação às discriminações sofridas, as pessoas citaram, em ordem de prevalência, serem im- pedidas de entrar em estabelecimento comercial, shopping center, transporte coletivo, bancos, órgãos públicos, receber atendimento na rede de saúde e tirar documentos. Apesar de esses dados extraídos do sumário executivo do censo de população em situação de rua (BRASIL, 2009) constituírem um diagnóstico da realidade da população em situação de rua em muitos municípios brasileiros, é importante considerar que o período apurado pode não mais retratar a rea- lidade atual, tendo em vista a característica migratória dessa população, a mudança de estratégicas públicas dirigidas a ela e outras variáveis sociais que dão novas facetas ao fenômeno. Assim, a equipe do Consultório na Rua deve se esforçar em buscar outros diagnósticos acadêmicos e institucionais para melhorar seu olhar técnico e humano sobre essa população. 31Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua A popUlAção em SitUAção de rUA e SeUS territórioS Entendendo que o indivíduo em situação de rua, no seu processo de exclusão, sofre rupturas familiares, sociais e afetivas,tendo que necessariamente vivenciar novas formas de se relacionar em contextos sociais marcados pela desumanização e caracterizados por estigmas, violência e segre- gação, o que o incita a ressignificar sua inserção no andar a vida, consideramos importante ressaltar o gráfico a seguir, no qual a psicodinâmica da vida nas ruas1 representa um conceito de construção de resiliência e que deve ser entendido pelo profissional sob o prisma de como essa população se move nos seus contextos relacionais. Diante dessa realidade, o indivíduo sente a necessidade da busca de mecanismos psíquicos de adaptação que possibilitam conviver com a nova realidade que a ele se impõe, construindo uma resiliência, que, como define Grotberg (1995), é a “capacidade universal humana para enfrentar as adversidades da vida, superá-las ou até ser transformado por elas”, implementando em si novos recursos de mediação. 1Projeto Meio-Fio – Organização Médicos sem Fronteiras, 2004. Alexandre Trino Rosana Ballestero Rodrigues Antonio Garcia Reis Junior 4 MINISTÉRIO DA SAÚDE34 até que o sintoma paralise suas atividades diárias. Assim, diante das especificidades do atendimento a essa população, mesmo sem consulta marcada ou encaminhamento para marcação de consulta – no fluxo hierarquizado de referência e contrarreferência –, esse usuário deve ser acolhido para que consiga alguma orientação, conforto e encaminhamento para a resolução de seu problema. Caso contrário, sua circulação/acesso pela rede poderá ficar impossibilitada perante os inúmeros procedimentos impesso- ais e burocratizados. O fato de ter ocorrido procura pelo serviço sinaliza reconhecimento pelo usuário da oportunidade de cuidado, de construção de vínculos positivos. Abaixo, citamos alguns pontos importantes para auxiliar o profissional de saúde no atendimento integral à PSR: • Concepção de saúde não centrada somente na assistência aos doentes, mas, sobre- tudo, na promoção de saúde e no resgate da qualidade de vida, com intervenção nos fatores que a colocam em risco; • Incorporação das ações programáticas, incluindo acesso às redes sociais; • Desenvolvimento de ações intersetoriais; • Consciência dos aspectos que condicionam e determinam um dado estado de saúde e dos recursos existentes para sua prevenção, promoção e recuperação; • Para a organização desse modelo, é fundamental que sejam pensadas as “linhas do cuidado” (da criança, do adolescente, do adulto, do idoso etc.); • O trabalho em equipe é um de seus fundamentos mais importantes. Considerando as fases das diretrizes do cuidado junto à população em situação de rua, o diagnósti- co situacional inclui, além da escuta direta das pessoas que compõem nosso público-alvo, a utilização das informações colhidas em território no processo de cartografia, tais como: locais de maior concen- tração e faixas etárias da população em situação de rua, fluxos de trânsito vinculados aos horários as- sociados à alimentação, ao sono, presença de policiamento e tráfico/consumo de drogas, detectando também as áreas críticas, no que se refere à violência, observando demandas de saúde, coexistência de transtornos mentais sem tratamento, prostituição e uso abusivo de álcool e drogas. A dinâmica desses percursos, a escuta dessas demandas e o estabelecimento necessário de com- promisso diante de algumas delas, de acompanhamento contínuo, podem representar para a equipe a necessidade de intensificar a sua presença em determinados territórios. O conhecimento gradativo, a apresentação do serviço, a constituição de etapas fundamentais da formação do vínculo para acompa- nhamento tornam, ainda mais singular, cada microárea. Com base nessas informações, a fase do diagnóstico instrumentaliza o planejamento das ações da equipe do Consultório na Rua, com vistas a reconhecer as especificidades das subáreas identificadas no território, com fluxo e perfil diferenciados, nas quais os processos de trabalho devem ser focados, gerando práticas orientadas às demandas de cada uma das realidades observadas. Assim contextualizado, o diagnóstico deve possibilitar à equipe um olhar focado em um tripé: terri- tório, grupo social e singularidade do sujeito. Território: compreendendo-o como processo e para além de sua extensão geográfica, representa uma complexidade de fatores que, no diagnóstico situacional da rua, devem ser considerados. Frente aos diversos perfis e olhares, a equipe do Consultório na Rua deve ampliar sua percepção no sentido de reconhecer nesse contexto as variáveis so- ciais, culturais, demográficas, sanitárias, administrativas, políticas, econômicas, entre ou- tras, de valiosa importância na construção do planejamento da equipe. 35Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua Desta forma, a noção de território em suas várias dimensões, tais como o “território físico” (material, visível e delimitado), o “território como espaço-processo” (construído cultural e so- cialmente, de forma dinâmica) e o “território existencial” (referido às conexões produzidas pelos indivíduos e grupos na busca de sentidos para a vida). Na prática, é importante perceber como essas diferentes perspectivas coexistem, se interpenetram e, às vezes, se tensionam. Um exemplo é o que ocorre nas chamadas “cidades-dormitório”, e outro é o dos territórios escolhidos/inventados pelas pessoas em situação de rua (BRASIL, 2012). Autores como Barcellos (2007), Mendes (2007), Mehry (2002) e outros consideram que, no campo da saúde, o território e suas variáveis representam um fator relevante para a compreensão do conceito de risco, pois levam em consideração múltiplas dimensões das condições de vida que cercam as pessoas em seus contextos sociais. Assim, citamos abaixo alguns pontos importantes relacionados ao território que devem ser observa- dos pela equipe na realização do diagnóstico: – Forma como a população em situação de rua circula no território; – A relação da comunidade com essa população; – Características geográficas, econômicas e sociais; – Aspectos históricos e políticos; – Divisão administrativa; – Condições de vulnerabilidade e violência; – Condições sanitárias e ambientais; – Determinantes de saúde e doença; – Cultura local; – Equipamentos existentes no território (governamentais e não governamentais). Grupo social: considerando ser a população em situação de rua, um grupo social que tem a maioria de seus direitos negados por um processo de exclusão social, ao qual Castel (1997, p. 28-29) denomina de “sobrantes”, indivíduos “que foram inválidos pela conjuntura econômica e social dos últimos vinte anos e que se encontram completamen- te atomizados, rejeitados de circuitos que uma utilidade social poderia atribuir-lhes”. No entanto, apesar da realidade citada acima, verificamos que pela convivência grupal – que é ne- cessidade fundamental do ser humano – na rua essa população ressignifica suas relações sociais, cons- tituindo novos grupos que se caracterizam por identidades definidoras de comportamento e da neces- sidade da sobrevivência. Assim, é comum encontrarmos os indivíduos em situação de rua acompanhados ou próximos das mesmas pessoas, dormindo nos mesmos lugares, reconstruindo vínculos afetivos, que em muitas das vezes reproduzem o contexto familiar, até com denominações peculiares, tais como: família da rua, ir- mão da rua, mãe/pai da rua, filho da rua. Dessa forma, citamos abaixo alguns pontos importantes relacionados ao grupo social que devem ser observados pela equipe na realização do diagnóstico: • Necessidade de identificar se o indivíduo está ou não vinculado a outra pessoa ou a al- gum grupo social na rua; MINISTÉRIO DA SAÚDE36 • Faixa etária do grupo ao qual o indivíduo encontra-se inserido; • Relações de gênero estabelecidas nos grupos; • Uso de álcool e outras drogas; • Atividades econômicas; • Possíveis envolvimentos com ações ilícitas; • Condições de risco e vulnerabilidade; • Potencialidades do grupo social; • Fluxos de circulação dos grupos no território; • Prostituição masculina e feminina; • Relações com o comércio e a comunidade local. Singularidade do sujeito: cada ser humano traz consigo a marca da sua história e trajetória de vida, o que determina a sua singularidade. A partir desse princípio, o profissional de saú- de que trabalha com população em situação de rua não pode deixar de considerar todos os aspectos subjetivos que contribuem para construir a identidade do sujeito e o lugar que hoje ocupa na sociedade e em seu contexto de vida. Reconhecer que o indivíduo em situação de rua tem uma história que em algum momento o levou para a rua, é fator primordial para a realização do diagnóstico por parte do profissional de saúde. Vale ressaltar que nos dias de hoje encontramos nos contextos urbanos os chamados “filhos” e “netos” da rua, pessoas que já nasceram e se criaram em situação de rua, tendo menores oportunidades de inclusão social. Dessa forma, citamos abaixo alguns pontos importantes relacionados à singularidade do sujeito que devem ser observados pela equipe na realização do diagnóstico: – História de vida do sujeito; – vínculos familiares; – Queixas e demandas principais de saúde; – Potencialidades do indivíduo; – Grau de instrução; – Origem do sujeito; – Faixa etária; – Tempo em situação de rua; – Uso de álcool e outras drogas; – Condição de saúde (sofrimentos emocionais, doenças crônicas, dermatoses, tuberculose etc.); – Uso de medicamentos; – Forma de geração de renda; – Riscos e vulnerabilidades. Para realizar o diagnóstico conforme acima descrito, a equipe deverá construir um planejamento de ações diárias, como um roteiro a ser seguido em território na abordagem ao usuário. Esse roteiro deve contemplar os pontos de atendimento que serão realizados pela equipe a cada dia da semana, bem como outros fatores relacionados ao seu processo de trabalho no contexto de cada território, levando em consideração os diferentes perfis de grupo e observando os critérios para a gestão de riscos emi- nentes no atendimento in loco. 39Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua 4.2 ABordAgem e AcolHimento À peSSoA em SitUAção de rUA Cláudio Candiani Certo dia, uma equipe da assistência social em abordagem à população de rua ligou para a equipe de saúde da atenção básica pedindo avaliação de um paciente, desconhecido, deitado na rua há alguns dias. Lá chegando, o médico e a enfermeira encontraram-no confuso, com higiene precária e com sinais de pneumonia. Eles o levaram até o serviço de urgência de referência, mas a equipe de acolhimento recusava-se a atendê-lo, pois não tinha documentos. A equipe se responsabilizou pelo usuário, conseguindo que ele fosse admitido. No acolhimen- to, o médico recusou-se a avaliá-lo pelo estado de higiene precária. A equipe deu banho no paciente em banheiro indicado pelo assistente social. Finalmente avaliado e medicado, foi in- ternado. Diariamente, o ACS visitava o paciente, que teve seu estado físico e mental melhorado, o que permitiu sua identificação. Após a alta, começou a ser acompanhado regularmente pela equipe da atenção básica. Acolhimento é muito mais do que receber o usuário de forma acolhedora. Acolher é compreender a sua demanda para além da queixa principal apresentada, é perceber esse cidadão no seu contexto so- cial e inseri-lo em uma rede de atenção à saúde em que a atenção básica é a coordenadora do cuidado. Na abordagem inicial do usuário, a equipe deve priorizar uma observação e escuta qualificada, que necessariamente passam pela valorização e respeito aos diversos saberes e modos de viver dos indiví- duos, possibilitando a construção de vínculos de confiança junto a essa população, que se reproduz em processos relacionais no cuidado integral à saúde. Quando se trata de população em situação de rua (PSR), a abordagem e o acolhimento são de funda- mental importância para a produção do cuidado, tendo em vista que esse grupo social é historicamente marcado por um processo de exclusão dos serviços de saúde, onde a sua presença se traduz em forte incômodo tanto para os profissionais de saúde quanto para os demais usuários, ficando quase sempre renegado o seu direito à atenção integral à saúde e, quando muito, apenas é atendido nas emergências. Dessa forma, a PSR, além de enfrentar uma variedade de barreiras para uso dos serviços de saúde, como a limitação, muitas vezes, tem dificuldade de identificar o local apropriado para procurar assistên- cia. São poucas as equipes de saúde específicas e as eSF tradicionais, com a lógica hegemônica da territorialização rígida, nem sempre têm as portas abertas a esse grupo social. Os serviços de urgência, em sua maioria, são distantes e inacessíveis. Longas esperas podem significar perda de refeições ou acesso a abrigamento. Processos complicados de registro que exigem identificação são fatores que MINISTÉRIO DA SAÚDE40 desencorajam a busca. A falta de simpatia/sensibilidade da equipe ou a inabilidade de um único local atender à variedade de problemas apresentados pelos moradores de rua são barreiras adicionais. Algumas barreiras para a assistência: A produção de uma rede de cuidado traz consigo a proposta da humanização de ações e serviços de saúde e, como consequência, a responsabilização de todos os trabalhadores e gestores em construir, com os usuários, transformações concretas na prática cotidiana das unidades de saúde. Dessa forma, a rede de cuidado implica a reorganização da atenção em saúde em todos os níveis, no âmbito do SUS, garantindo a integralidade e coordenação do cuidado como diretrizes importantes para a atual Política Nacional de Atenção Básica do Ministério da Saúde. 1. Hospitais exigem acompanhante para a pessoa em situação de rua ser atendida; 2. As UBS tradicionais não costumam adscrever moradores de rua; 3. O SAMU, por considerar um problema social, muitas vezes tem dificuldade em atender pacientes que julgam ser em situação de rua; 4. Horários de consultas às vezes são incompatíveis com horários de sobrevivência na rua; 5. Profissionais de saúde alheios à realidade da PSR prescrevem medicamentos inexistentes na rede e caros; 6. Falta de vagas suficientes de psiquiatria em hospitais gerais para a população; 7. Dificuldades na dispensação de medicamentos para quem não pode absoluta- mente comprá-los; 8. Serviços que deem suporte a usuários de álcool e droga em quantidade suficiente; 9. Falta habilidade para os profissionais trabalharem com a população em si- tuação de rua; 10. Dificuldade no acesso a vagas em leitos de urgência; 11. Locais adequados para restabelecimento após alta hospitalar em quantida- de suficiente; 12. Dificuldade dos usuários com a marcação de consultas especializadas, não ten- do acesso à guia de referência quando marcadas as consultas; 13. Demora na marcação de consultas em algumas especialidades. MINISTÉRIO DA SAÚDE44 A atividade multiprofissional in loco requer a realização de procedimentos que não demandem maior privacidade. Sendo possível, nesse contexto, ações como entrevista inicial para anamnese, orientação e promoção de saúde, curativos de pequeno porte, atendimentos/avaliações clínicas não invasivas, atendimento em conjunto com os profissionais da equipe, com as equipes das UBS e com os NASFs. vale ressaltar que essas atividades possibilitamo cuidado à saúde e maior integração com os usuários, a construção de vínculos que estimulem a autonomia e a autoestima, favorecendo a abordagem específi- ca e discussões de temas de interesse comum ao grupo e viabilizando, também, a busca de alternativas para as problemáticas vivenciadas no contexto da rua. A equipe do Consultório na Rua deve organizar seu processo de trabalho prevendo momentos de reuniões de equipe da ECR e interequipes(NASF, CAPS etc.), realizar planejamentos, discussão de ca- sos, elaboração e acompanhamento de projetos terapêuticos singulares, fundamentais para a atenção integral à saúde, a resolutividade das ações e a gestão do cuidado. Apesar da importância de todos os profissionais que compõem a equipe multiprofissional do Consul- tório na Rua, consideramos relevante citar as atribuições de duas novas categorias profissionais que se inserem nesse serviço, quais sejam o agente social e o técnico de saúde bucal(TSB). Entende-se por agente social o profissional que desempenhe atividades que visam a garantir a aten- ção, a defesa e a proteção às pessoas em situação de risco pessoal e social, assim como aproximar as equipes dos valores, modos de vida e cultura das pessoas em situação de rua. Recomenda-se que esse profissional tenha experiência em atenção a pessoas em situação de rua e/ou trajetória de vida em situação de rua, além de habilidades e competências para: – Atendimento das demandas espontâneas ou identificadas pelo profissional/equipe; – Ter boa capacidade de estabelecer contatos e vínculos; – visão sistêmica; – Adequação da linguagem, utilizando discursos apropriados à realidade do usuário; – Atuar sempre com disponibilidade para a escuta de forma ampliada e diferenciada; – Articulação com as equipes das UBS referentes ao território de abordagem para encaminha mento e acompanhamento das demandas de saúde do usuário; – Atuar de forma proativa, estimulando o usuário ao autocuidado; – Articulação com a rede de saúde; – Articulação com outras redes sociais; – Desenvolver atividades de educação em saúde; – Evitar julgamentos, críticas e/ou opiniões sobre a situação de vida do usuário; – Observar o “comportamento” do usuário e do grupo, objetivando a garantia da sua segu- rança e da equipe; – Observar o relato verbal e a comunicação não verbal do usuário; – Registro com histórico do atendimento nos moldes da ESF; – Atuar com estratégia de redução de danos; – Fazer busca ativa de agravos prevalentes na rua, priorizando a tuberculose, DST, hepatites virais, dermatoses, uso abusivo de álcool e outras drogas, entre outros; – Realizar atividades em grupo. 45Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua O técnico em saúde bucal (TSB) da equipe do Consultório na Rua deverá desenvolver suas ações em articulação com uma equipe de Saúde Bucal Modalidade I ou II, da Estratégia Saúde da Família ou outras estratégias de organização da atenção básica da área correspondente ao campo de atuação do Consultório na Rua, conforme definição do gestor local. A equipe de Saúde Bucal deverá se responsabi- lizar pelo atendimento da população e programar atividades em conjunto com o técnico em saúde bucal da equipe do Consultório na Rua. As atividades do TSB serão extraclínicas, com a supervisão indireta do cirurgião-dentista. As atividades extraclínicas do TSB devem estar de acordo com suas competências técnicas e legais da profissão. Seguem abaixo as principais ações a serem realizadas na equipe do Consultório na Rua: A seguir, contextualizamos doisrelatos de experiências que ilustram a abordagem multiprofissional. 5.1 relAto de experiÊnciA do SerViço SociAl no Atendimento À peSSoA em SitUAção de rUA Uma Escola de Vida “O saber daquele que nada sabe.” (Sócrates) Angélica da Silveira Apesar de já passados muitos anos, ainda me recordo do sentimento de interrogação e indignação que senti diante do título de um artigo... “Por sorte, existem moradores de rua”. O enfoque do texto, algo religioso e assistencialista, não me agradou. Mas o tempo me mostrou, sem falso moralismo, que – Trabalhar junto a usuários sobre o tema de álcool, crack e outras drogas, agregando conhe- cimentos básicos sobre redução de danos; – Articular junto à rede de saúde; – Realizar articulação intersetorial; – Apoiar o desenvolvimento da autonomia; – Realizar atividades educativas e culturais (educativas e lúdicas); – Acompanhar o cuidado das pessoas em situação de rua. 1. Acompanhar, apoiar e desenvolver atividades referentes à saúde bucal com os demais membros da equipe do Consultório na Rua, buscando aproximar e integrar ações de saúde de forma multidisciplinar; 2. Realizar ações educativas, atuando na promoção de saúde e prevenção de doenças bucais; 3. Encaminhar e agendar pacientes para a equipe de Saúde Bucal; 4. Desenvolver em equipe ações de promoção da saúde e prevenção de riscos ambien- tais e sanitários, visando à melhoria da qualidade de vida da população; 6. Organizar o ambiente de trabalho, considerando a sua natureza e as finalidades das ações desenvolvidas em saúde bucal. MINISTÉRIO DA SAÚDE46 a população em situação de rua é sim uma bela escola de vida. Desde os primeiros contatos com essa população, percebi que meus conceitos e valores seriam confrontados a cada atendimento. Não foram poucas as vezes em que precisei me calar para ouvir, como dizia Sócrates, o “saber daquele que nada sabe”. Citando apenas um exemplo, relato minha agonia e preocupação durante os meses de gravidez de uma jovem de 20 anos, grávida pela primeira vez e em situação de rua desde a infância. Preocupei-me com o enxoval, com o lugar que a abrigaria juntamente com o bebê, com sua alimentação durante a gravidez e com a confecção de documentos, para que o filho pudesse ter um registro de nascimento. Ela parecia não dar a menor importância a tudo que eu dizia e não se movia para tomar as providências necessárias. Só percebi que estava no caminho errado quando ela me disse: “Porque você se preocupa tanto com isso? Eu vivi sozinha na rua a minha vida toda e estou muito bem! A única coisa que me preocupa é se vou conseguir ser MÃE para esta criança!” Foi um balde de água gelada... ou melhor, foram baldes e mais baldes durante muitos anos... Não se pode negar que, à primeira vista, um grupo de moradores de rua é um triste espetáculo que faz vir à tona nossos sentimentos mais solidários e de compaixão. A possibilidade de ser um profissio- nal em condições de ajudá-los nos dá, a princípio, o estímulo necessário para mergulhar naquele novo mundo. O serviço social possui as ferramentas para reinseri-los socialmente, por meio dos projetos de for- mação e emprego, busca das origens familiares e referências antigas, feitura de documentos, escuta, aconselhamento, orientação e acompanhamento. Pode parecer muito, mas pode ser muito pouco. Com alguns, percebe-se que é impossível conseguir algum resultado positivo, e a frustração aparece inevita- velmente. vem a vontade de largar tudo. vem um turbilhão de sentimentos: cansaço, raiva, pena, culpa etc. Somente a experiência nos mostra que não somos nenhum monstro por sentirmos tudo isso. A complexidade dos casos, aliada aos poucos recursos de que dispomos na rede de saúde e assistência social, leva-nos, frequentemente, a questionar a qualidade da nossa formação profissional e, muitas vezes, a uma baixa autoestima. É preciso ter consciência de todos os elementos envolvidos para o sucesso no acompanhamento de uma pessoa em situação de rua para que não se tome para si toda a responsabilidade dos casos malsucedidos. A começar pela população em geral, as pessoas em situação de rua são sempre vistas como um grupo indesejável. Os usuários das unidades de saúde não se sentem bem em dividir o mesmo espa- ço; as famílias têm medo quando um deles está em frente à sua casa; os comerciantes querem vê-los longe para não espantar a freguesia; algumas políticas públicas querem tirar deles a liberdade de ir e vir para que não enfeiem a cidade. A violência física e moral estão em todos os lugares. E violência gera violência... Nesse círculo que se forma, vê-se a formação de um grupo repleto de contradições. Uns plenamente organizados, com leis, valores e hierarquia próprios, dormindo reunidos para se protege- rem, dividindo o pouco que têm. Outros onde a solidão toma conta, os roubos e agressões se repetem. Enfim, cada pessoa em situação de rua tem sua própria história e sua própria forma de lidar com ela. A maioria se viu forçada a ir para rua em decorrência de transtornos mentais, dependência química ou desajustes familiares. Algumas se “acostumaram” e não se veem mais vivendo dentro de quatro paredes, outras anseiam em voltar para casa, mesmo que ela não exista mais. A nós profissionais de serviço social cabe desenvolver a capacidade de perceber onde e quando intervir, sem a ansiedade de querer resolver todas as questões que envolvem a vida de um morador de rua. É possível fazer uma boa intervenção, com ações aparentemente simples. E aprender a valorizar as pequenas conquistas 49Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua • Apesar de os transtornos mentais significativos não estarem presentes na maioria da população em situação de rua, são muito prevalentes. A avaliação psicossocial- deveria fazer parte de toda primeira consulta. • Os usuários com transtorno mental mais grave necessitam que a equipe desenvolva ações no sentido de possibilitar o maior nível de autonomia possível. • O trabalho em rede é essencial para a boa condução desses casos. 51Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua eSpeciFicidAdeS do Atendimento À popUlAção em SitUAção de rUA David de Souza “A nossa casa é de carne e osso Não precisa esforço para namorar A nossa casa não é sua nem minha Não tem campainha pra nos visitar A nossa casa tem varanda dentro Tem um pé de vento para respirar A nossa casa é onde a gente está A nossa casa é em todo lugar” (Arnaldo Antunes e Celeste Moreau Antunes) Rua e saúde A vida na rua pode ser abordada como causa ou consequência de problemas de saúde. Há quem vá viver na rua e, por isso, adoeça e há quem adoeça e, por isso, vá viver na rua. Um mo- rador pobre e doente de área rural pode acorrer a um grande centro urbano porque apenas ali há equipamentos de saúde dos quais necessita. Sem recursos para custear um alojamento, ele passa a dormir nas ruas. “Problema de saúde” foi a causa de ida para as ruas relatada por 7% dos entrevistados pela Pesquisa Nacional sobre População em Situação de Rua, desenvolvida pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Por outro lado, a vida na rua pode precipitar problemas de saúde secundários ao aumento da exposição a riscos de doença, como vulnerabilidade às violências, ingestão de alimentos e água contaminados, variações cli- máticas extremas e muitos outros. O trecho retirado da pesquisa mencionada acima ilustra bem as dimensões possíveis de causa e consequência na relação da rua com a saúde por meio do exemplo do uso de álcool: “A população em situação de rua costuma usar abusivamente o álcool, seja por comporta- mento e hábitos anteriores, seja pelos adquiridos em função da necessidade de não sentir frio e de esquecer as realidades adversas.” (BRASIL, 2009) A vida na rua expõe homens, mulheres e crianças a riscos que fazem com que essa popu- lação mereça, sob diversos aspectos, abordagem específica das equipes de saúde. Alguns desses riscos estão listados abaixo, mas você é convidado, a partir de sua prática, a aprimorar essa lista. Literatura escassa no País e número ainda pequeno de pesquisas sobre o tema fazem com que a dinâmica da vida nas ruas das grandes cidades e os determinantes de saúde relacio- nados a ela sejam um campo sob muitos ângulos ainda pouco explorado. 6 MINISTÉRIO DA SAÚDE54 vida nas ruas. Teme-se que a implementação de ações de cuidado que reconheçam a rua como espaço de vida dessas pessoas, ainda que transitório, de algum modo estimule sua permanência nessa condição. Tal argumento é uma distorção da realidade. Um morador de rua que criou víncu- los e recebeu atenção e cuidado de uma equipe de saúde na rua tem mais chance de reencontrar sua autonomia e deixar a vida nas ruas do que aquele que passivamente é aguardado nas Unida- des Básicas de Saúde. Nesse sentido, é sempre útil ao profissional de saúde que lida com esse grupo social realizar o exercício mental de encadear causas de problemas de saúde originadas pelo fator “vida na rua”. Por exemplo: Essa reflexão ajuda a manter claro o sentido de se redobrarem os esforços que melhorem a atenção à saúde das pessoas que vivem nas ruas por conta de sua maior vulnerabilidade e expo- sição a riscos de saúde. Infelizmente, a principal porta de entrada dessas pessoas no SUS são os serviços de urgência e emergência, quando condições crônicas mal cuidadas culminam em quadros agudos. A cria- ção de vínculos com esse grupo social, respeitando sua autonomia, direito de escolha e evitando juízos morais, é um desafio difícil, mas possível para trabalhadores de saúde. Para tanto, o ponto de partida é o treinamento do olhar profissional que deve enxergar as pessoas na calçada como portadoras dos direitos de um cidadão brasileiro, nada mais e nada menos. 59Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua Questões a serem observadas: INFESTAÇÕES COMUMENTE ENCONTRADAS PELOS MORADORES DE RUA Pediculuscorporis (piolho de corpo, muquirana) Pediculus capitis Pthiruspubis Escabiose (sarna) O tratamento torna-se difícil por causa da reexposição diante das condições dos locais de dor- mida e higiene das roupas. Ressaltamos ainda que picadas de insetos podem levar a abscessos locais, impetigos e celulites. No caso de tratamento local, deve-se ter atenção com o tetmosol (monossulfiram) pelo risco de reação em usuários de álcool. Ivermectina é uma boa opção para o cuidado, podendo ser usado ainda o benzoato de benzila. Ações que podem ser realizadas: • Orientar os albergues quanto aos cuidados com roupas de cama, evitando o rodízio delas sem higienização; • Mapear locais de doação de roupas na cidade; • Utilizar dosagem de ivermectinade 2cp de 6 mg em dose única; • Unidades Básicas de Saúde que atendam a população em situação de rua com estrutu- ra apropriada de banheiros que possibilite ao usuário o acessoà higiene pessoal; • Articulação com outros equipamentos que possibilitem a higiene pessoal e a lavagem de roupas. 7.3 tUBercUloSe Cláudio Candiani EAD era paciente conhecido da eSF para a população em situação de rua de Belo Hori- zonte há alguns anos. Apresentava esquizofrenia e fazia uso de crack, tinha família no interior do Estado e já morava nas ruas de BH há vários anos. Aposentado por invalidez, usava toda a aposentadoria para comprar crack no dia em que recebia. Era acompanhado pela equipe de apoio de saúde mental também, numa política de redução de danos. Tendo iniciado tosse persistente, fez Baar na unidade e, no dia seguinte, feito diagnóstico de tuberculose (TB). Tentou-se internação social em hospital de referência de TB em Belo Horizonte, mas foi ne- gada pela concomitância de transtorno mental, o hospital estava sem psiquiatria na ocasião. Foi realizada uma reunião com abordagem de população de rua, eSF para a população em situação de rua, equipe de Saúde Mental e iniciou-se tratamento com DOTS possível. O pa- ciente seguiu bastante irregular em seu tratamento, sumindo várias vezes. A equipe priorizou o caso em seus registros clínicos e buscou várias parcerias. Mesmo dormindo na rua, rece- bendo alta inicial por abandono, após dois anos, o paciente teve alta por cura comprovada. MINISTÉRIO DA SAÚDE60 Existem poucos dados disponíveis sobre a tuberculose (TB) na população em situação de rua que nos permitam traçar com clareza o seu perfil de adoecimento e/ou de suas representações sobre os processos de saúde e doença. Mas, por meio dos estudos já realizados, bem como de depoimentos desse grupo social e de técnicos que trabalham junto a ele, estima-se que se trate de um grave problema de saúde, sempre com elevada taxa de incidência e de abandono do trata- mento. Essa população é considerada pelo Ministério da Saúde como um grupo de elevada vulne- rabilidade. O Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) considera a prevalência 67x maior de TB que na população geral, de acordo com estudo realizado em 2004 (ADORNO, 2004). Fatores dificultadores: São vários os obstáculos ao tratamento continuado: • Baixa autoestima; • Alimentação inadequada; • Sintomas imperceptíveis; • Uso de álcool e outras drogas; • Transtornos mentais; • Dinâmica da rua, que não contribui para que os remédios sejam tomados com regularidade; • Roubo dos pertences individuais e/ou seu recolhimento pelos órgãos públicos – entre eles, os medicamentos sobre o cuidado do doente; • Regras rígidas estabelecidas pelos serviços de saúde; • Fixação de horários e dias de atendimento; • Não disponibilidade de atendimento no momento em que apresentam efeitos colaterais. Ações que podem ser realizadas: • A intersetorialidade é pré-requisito básico para conseguir melhores resultados, sem a qual várias ações não podem ser desenvolvidas. Para isso, é necessário: • Fazer o mapeamento das instituições que configuram a rede de atendimento, incluindo instituições governamentais e não governamentais (abrigos, albergues, centros de convi- vência, casas de acolhida etc.); • Envolver o maior número possível de atores sociais e de instituições governamentais e não governamentais, em todas as fases do atendimento – detecção, diagnóstico e trata- mento. A UBS deve buscar parcerias; • Definir as unidades de saúde que serão referência para o atendimento, estabelecendo um fluxo claro entre elas e as instituições da rede de proteção social; 61Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua • Sensibilizar e capacitar os profissionais de saúde além dos conteúdos programáticos, priorizando aqueles relacionados às especificidades da população em situação de rua. Deve-se considerar: a) Todas as UBS com população em situação de rua em sua área de abrangência devem buscar parcerias e/ou instituições que tenham vínculos com o paciente; b) As equipes do Consultório na Rua, além de atender a essa demanda, devem prestar apoio matricial às demais equipes; c) As equipes de atenção básica/Consultório na Rua devem buscar acompanhar os pa- cientes nos locais onde vivem; d) Nos abrigos, albergues e/ou casas de acolhida, os profissionais devem receber sensi- bilização e capacitação em tuberculose; e) Articular junto aos abrigos, albergues ou casas de acolhida para que possa ser realiza- do o tratamento diretamente observado (TDO) por profissional da assistência social; f) Buscar, junto aos hospitais, principalmente os de referência para o tratamento da TB, oferecer a possibilidade de internação por vulnerabilidade social no início ou em todo o período de duração do tratamento, caso necessário e com consentimento do paciente. Todos que apresentam tosse, independentemente do tempo informado, devem ser examina- dos. Lembrar que se trata de uma população com dificuldades relacionadas à percepção do tem- po, que existe um número de pessoas que não chegam a perceber que estão apresentando tosse, e que dormir nas ruas e associar a tosse à dependência química podem levá-las a desvalorizar o sintoma.Para que isso ocorra, é necessário: • Estabelecer rotinas para a identificação dos indivíduos com tosse tanto pelos equipamen- tos da rede de proteção social, quanto pelas unidades de saúde. A busca ativa de casos deve ser feita em toda a rede de atendimento mapeada e parceira; • Na abordagem, tanto para busca ativa de casos, quanto na visita espontânea às unidades de saúde, deve-se explicar a importância de realização do exame de escarro por dois dias consecutivos. É importante oferecer a possibilidade de coleta do material na própria ins- tituição (no momento da entrevista) ou na unidade de saúde (no momento da consulta), respeitando-se os procedimentos de biossegurança; • Sempre que possível e necessário, solicitar e/ou realizar no primeiro contato bacilosco- pia, cultura, teste de sensibilidade e RX de tórax, buscando otimizar o encontro. Trata-se de uma população de risco tanto para a TB resistente como para o HIv/aids e que pode não conseguir coletar material para exame bacteriológico de boa qualidade; • Por se tratar de uma população com característica migratória, é comum que entrem no sistema de acolhimento por várias vezes. Por isso é importante que seu prontuário regis- tre os desdobramentos dos exames realizados; • No caso de realização de inquéritos, o ideal é montar toda a estrutura para que os que têm indicação de realizarem exames possam ter os resultados de baciloscopia e RX de tórax no momento das entrevistas. MINISTÉRIO DA SAÚDE64 • Facilitar ao máximo o acesso a preservativos é uma estratégia importante para essa população. HIV • Mesmo que pacientes portadores de HIv façam tratamento nos centros de referência, é essencial que a UBS tenha os registros clínicos deles e acompanhem o caso, pois todas as complicações entre as consultas com infectologista deverão ser atendidas na AB. Hepatites virais • Hepatite C e B são muito frequentes na população em situação de rua. Propiciar o acesso à vacinação de hepatite B e colocar nos exames periódicos sorologias para hepatites são estratégias importantes. Mensagens-chave: • Sempre abordar a questão da sexualidade, DST e HIv com a população em situação de rua, pois a incidência de DST é elevada nesse grupo. • Oferecer exames de HIV, hepatites virais e sífilis como parte dos exames laboratoriais periódicos para a população de rua. 7.5 grAVidez de Alto riSco Isabel Munaretti Silvana Boeira Zanella Angélica Maria Bolla Charleni Inês Scherer Marcia Helena Leal MSG, 17 anos, e seu atual companheiro chegam à UBS sem Domicílio acompanhados pela agente comunitária de saúde e pela enfermeira após abordagem de rua e identificação de gravidez sem acompanhamento de pré-natal. Primeiramente, passam ao acolhimento de enfermagem, que, além da verificação de sinais vitais, verifica em conjunto com o agente de saúde a falta de documentação da usuária, do seu cadastro na unidade e a necessidade de gerar um cartão SUS. Em seguida, a gestante é encaminhada à consulta com a enfermeira da unidade, que faz todo o atendimento inicial: anamnese e exame físico sumário. Devido ao relato espontâneo de ser portadora do vírus HIv e do uso no passado de crack e maconha e às dificuldades em acessar dados precisos da gestação, a enfermeira passa para a consulta médica por se tratar de uma gravidez de alto risco. MSG mostra-se agitada e impaciente, não entende qual o motivo de tantas perguntas e o porquê de passar em consulta médica, e relata ainda estar irritada e sem vontade de esperar, enfatizando que ela e o companheiro não podem ficar por estarem com fome e por necessitarem reciclar latinhas e pet para conseguir dinheiro para se alimentarem mais tarde. A enfermeira então busca estratégias para o convencimento 65Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua A construção da lista de problemas identificados ajuda na condução do caso. Assim, podería- mos elencar as seguintes situações na nossa avaliação: • Fatores de cuidado à saúde: gravidez na adolescência; ausência de pré-natal adequa- do; HIv positiva e com abandono de tratamento; uso prévio de drogas; relações sexuais desprotegidas com parceiro soropositivo; idade gestacional incerta (“a termo”?) e altura uterina de 32 cm (crescimento fetal adequado?); contrações em idade gestacional des- conhecida; queixas urinárias (possibilidade de infecção urinária?); hipocoramento de mu- da gestante e consegue, após algum tempo de negociação, encaminhá-la à consulta médica. Lá, confirma ser HIV positiva e que fazia uso de terapia antirretroviral, mas parou e não sabe há quanto tempo. Também usava crack e, às vezes, maconha para “se acalmar e dar fome”, parando com as drogas há um mês por preocupar-se com o bebê. O companheiro atual não é o pai da criança e também é soropositivo. Ela não sabe a data da última menstruação, mas acha que já está com nove meses. Um pouco preocupada, refere contrações quatro a seis vezes ao dia, de fraca intensidade e de curta duração, mas sem perdas vaginais. No entanto, queixa-se de dor para urinar e aumento da frequência destas. Esta é sua terceira gestação, sendo que sofreu dois abortos espontâneos e de causa desconhecida. MSG relata início da vida sexual aos 13 anos, nunca coletou citopatológico e está sem nenhum exame de pré-natal nem ecografia obstétrica. O exame clínico e obstétrico de rotina não mostram alterações, exce- to o hipocoramento de mucosas. Chama atenção a altura uterina de 32 cm. Diante do quadro acima, a conduta médica adotada foi a solicitação e o encaminhamento imediato da gestante para avaliação em emergência hospitalar obstétrica. O objetivo seria possibilitar a realização de exames de rotina de pré-natal em caráter de urgência, já que se caracteriza uma gravidez de alto risco, com possibilidades de complicações, como transmissão materno-fetal do vírus HIV e talvez outras DST, com repercussões deletérias ao feto. Além da necessidade de definir com rapidez a idade gestacional, pesquisar situações agravantes agudas, como anemia, in- fecção urinária, diabetes e outros. Foi realizado contato com o Conselho Tutelar e Assistência Social do município para compartilhar a situação de vulnerabilidade social da gestante, solici- tar avaliação com vistas a abrigamento e apoio para a concretização do encaminhamento da referida avaliação obstétrica. Concluiu-se que conseguir o abrigamento para que toda a rotina de acompanhamento pré-natal pudesse ser realizada com segurança era de fundamental im- portância para o bom andamento da gravidez, além da necessidade de realização de avaliação psicossocial pela equipe do CAPS AD da região, com vistas ao planejamento de intervenção em dependência química. A avaliação obstétrica optou por internação hospitalar, pois consta- tou que se tratava de uma gestação de alto risco sem acompanhamento adequado, com várias comorbidades, como a descoberta nos exames da emergência de sífilis gestacional, infecção urinária e anemia grave. Após o nascimento, a mãe e o bebê foram abrigados em equipamento da assistência social e foi trabalhada a reaproximação familiar, que possibilitou que posterior- mente mãe e bebê fossem acolhidos por uma tia. Atualmente todos estão morando com ela, e MSG mantém vínculo e acompanhamento com a equipe de saúde da sua região, embora frequentemente venha à SF sem Domicilio para rever a equipe. MINISTÉRIO DA SAÚDE66 cosas (anemia?); descoberta de sífilis gestacional, ausência de diagnóstico e tratamento do parceiro. • Fatores emocionais: resistência inicial em aceitar abordagem da equipe e orientações prestadas a respeito do risco dessa gravidez sem acompanhamento tanto para ela quanto para o bebê; sinais de irritabilidade, impaciência, agitação psicomotora (abstinência às drogas?); relato de abstinência devido à gestação. O Caderno de Atenção Básica nº 32: Atenção ao Pré-Natal de Baixo Risco aborda a importância da captação precoce da gestante para o início do pré-natal no primeirotrimestre da gestação e a oferta dos testes rápidos (gravidez, HIV e sífilis) a ela e seu parceiro, subsidiando os profissionais da atenção básica para um olhar qualificado na atenção ao pré-natal de baixo e alto risco. A seguir, apresentamos fluxograma do pré-natal para classificação e avaliação de risco gestacio- nal. Sugerimos que seja adaptado à realidade local para garantia da linha de cuidado da gestante em situação de rua. 69Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua Mensagens-chave: • No momento de captação da gestante e de seu parceiro, a equipe de atenção básica/ Consultório na Rua deverá garantir o acesso aos testes rápidos (gravidez, HIV e sífilis) para a detecção precoce desses agravos e tratamento em tempo oportuno. • No caso de relato de uso de substâncias psicoativas, a atenção psicossocial deve ser sempre considerada. • Devido à drogadição e outras comorbidades, égrande o númerode gestantes em situa- ção de rua definidas como sendo de alto risco. 7.6 doençAS crÔnicAS Cláudio Candiani João de Deus, 35 anos, tinha vindo de Dom Cavate, pequeno município do interior de Minas, para arrumar trabalho em Belo Horizonte. Com pouca instrução, foi trabalhar na cons- trução civil. Com forte história familiar de hipertensão, relatando que dois irmãos morreram por volta dos 40 anos por infarto e acidente vascular encefálico, João também era hipertenso. Em certo momento, começou a não dar conta mais do serviço pesado da construção civil, o fôlego começou a ficar curto. Sem trabalhar, não teve mais como pagar moradia e passou a viver na rua. Pouco depois, procurou a eSF para a população em situação de rua, encaminhado pela UPA, onde tinha sido internado. Diagnosticada insuficiência cardíaca já em classe funcional III, secundária à hipertensão, a equipe montou projeto terapêutico para João. Encaminhou as questões previdenciárias, que possibilitaram um auxílio-doença; e instituiu tratamento para a hipertensão, que, além dos medicamentos existentes na rede, necessitava de alguns que não existiam, pela gravidade do caso. O dinheiro do auxílio-doença não dava para comprar a me- dicação e pagar moradia ainda. Tornou-se, então, usuário do albergue municipal enquanto se reorganizava. A alimentação na rua também não favorecia a melhoria do quadro. A enfermeira fez intenso trabalho e, em conjunto com o generalista, conseguiu que o paciente parasse de fumar. O projeto terapêutico foi construído contando com clínico, generalista, cardiologista do centro de especialidades, assistente social, enfermeira e ACS. A equipe conseguiu que a prefeitura pagasse a medicação que faltava a João. Ele entrou no registro da equipe para pacientes graves e foi monitorado, chegando à classe funcional II, que não permitia o trabalho anterior, mas possibilitou que trabalhasse em outro posto de serviço. Após dois anos de con- trole, o paciente, controlado e estabilizado, conseguiu alugar um quarto e sair das ruas. Hipertensão, Diabetes mellitus e doença pulmonar obstrutiva crônica, entre outras, são agravos comuns de ocorrerem na população de rua. Em virtude dos hábitos de vida, com elevada prevalên- cia de tabagismo, alimentação inadequada etc., tais doenças podem se apresentar em idade mais precoce que na população em geral. O ótimo controle desses problemas pode ser bem difícil, pela ausência de abrigamento estável, impossibilidade de selecionar própria dieta e dificuldades para armazenarem e tomarem medicamentos em horários certos. MINISTÉRIO DA SAÚDE70 Ações que podem ser realizadas: • Esquemas terapêuticos simplificados, mesmo que não ideais, podem surtir melhor efeito que esquemas completos tecnicamente, mas impossíveis de serem compreendidos e usa- dos por moradores de rua com pouca alfabetização e sem condições de armazenamento; • O tabagismo é frequente na população de rua e responde pelo agravamento de uma série de condições que impactam diretamente na capacidade de sobreviverem na rua; • A lista de usuários estratificada por risco é chave na condução daqueles com condições crônicas. Em geral, a população em situação de rua acumula diversas patologias e con- dições crônicas, necessitando de projeto terapêutico com participação de vários pontos da rede. A atenção básica deve ser a coordenadora do cuidado desses pacientes, auxi- liando-os a circular pela rede de atenção, organizando as ações, auxiliando os usuários para completar as lacunas existentes nas redes. Ferramentas úteis: • Lista de problemas: Usuário: Sr._____________, ____ anos.Prontuário nº ________. 1. Esquizofrenia paranoide – 13/12/2010 Haldol decanoato 2amp/mês; controle com psiquia- tra, próxima consulta 2 meses; consulta com generalista mensal; enfermeira rever medica- ção em uso 2. Tuberculose pulmonar – 1º/6/10 Iniciado esquema I por DOTS, (ACS Cida) 3. Usuário de crack – 10/10/10 uso controlado, encaminho para CAPS AD, discussão de caso com eles 4. vacinas – 13/12/2010 Dt, FA e hepatite B em dia 5. Tabagismo – 13/12/2010 20 anos maço, em fase de pré-contemplação 6. vulnerabilidade social – 13/12/2010 Dormindo no albergue municipal; acompanhado por Luiz da abordagem de pop. de ruas 7. Próximo retorno 15 dias A lista de problemas é ferramenta extremamente útil na condução dos casos de usuários em situação de rua, principalmente os com situações mais complexas. Permite visualização rápida dos principais problemas do usuário; é instrumento de comunicação entre os diversos pontos da rede envolvidos; permite construção de projeto terapêutico multiprofissional e monitoramento dele. A lista deve ser construída numa primeira consulta médica e posteriormente discutida em reu- nião de equipe para construção do projeto terapêutico singular para o paciente. Uma cópia atualiza- da do projeto deve ser sempre digitada em campo específico quando houver prontuário eletrônico. • Índice de autonomia Abaixo, citamos uma ferramenta utilizada pela equipe de saúde para a população em situação de rua de Belo Horizonte que é um índice de autonomia (IA), útil para a avaliação do nível de vul- nerabilidade do usuário. 71Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua Índice de autonomia (IA) Risco físico Risco mental Risco social 0 Problema físico inca-pacitante Problema mental in- capacitante Dorme na rua 1 Problema físico grave, mas não incapacitante Problema mental gra- ve, mas não incapaci- tante Dorme em abrigo ou albergue 2 Sem doenças físicas graves Sem doenças men- tais graves Dorme em repúbli- cas ou superior a albergue As somas dos índices acima definirão as ações da equipe conforme escore abaixo: • 5 a 6 – Caso discutido só em reunião de equipe; • 3 a 4 – Discutir caso com equipe de apoio da UBS (saúde mental, serviço social etc.); • 0 a 2 – Discutir caso em reunião ampla da abordagem conjunta. O prontuário do usuário deve fazer referência ao Índice de Autonomia (IA) deste. A eSF da PSR de Belo Horizonte desenvolveu índice de autonomia (IA) para conseguir prio- rizar cuidado. Os pacientes com autonomia baixa eram discutidos mais frequentemente e em fóruns mais amplos. Um prontuário é mais que um cadastro de pacientes. Ele deve conter os principais registros clí- nicos para o acompanhamento, sendo reordenado pelo grau de autonomia. O prontuário deve ser alimentado em toda reunião de equipe com casos e registros novos. Sugerimos, quando possível, a agregação de foto, que pode ser tirada no próprio consultório, após autorização do usuário. A foto auxilia muito na comunicação da rede em vários momentos. Mensagens-chave: • Uma lista de problemas atualizada é uma ferramenta que permite a continuidade de cuidado para os casos mais complexos. • O projeto terapêutico singular deve ser construído em conjunto e pactuado com o usuário. • Para o seguimento adequado da população de rua, alguma estratificação de risco se faz necessária no registro clínico MINISTÉRIO DA SAÚDE74 Essa situação ocorre com frequência entre as pessoas com problemas com drogas, no que se refere à sua motivação para interromper o uso. Muitas vezes, querem intensamente parar o uso da substância e, no momento seguinte, decidem reiniciá-lo. Em alguns casos, elas nos descrevem que, em um mesmo momento, querem e não querem usar drogas. Ou seja, percebem seus danos e pre- juízos ese preocupam com isso; querem evitá-los e sabem que só conseguirão caso interrompam o uso, no entanto, permanecem com o desejo de usar a substância. É preciso compreender essa dinâmica para não cairmos no erro de pensar que um indivíduo, necessariamente, estava mentindo quando em uma ocasião disse que queria parar de usar drogas e minutos depois voltou a usar. Outra questão importante para o tratamento de quem usa drogas é o vínculo terapêutico, que é aquele que se constrói entre a pessoa e o profissional ou a equipe que a atende. Esse laço se desenvolve lentamente e não tem um padrão linear, sofrendo altos e baixos de acordo com o surgimento dos sentimentos e acontecimentos que envolvem o tratamento. Mas, pouco a pouco, esse vínculo acontece, propiciando o surgimento de confiança e facilitando o engajamento da pes- soa ao tratamento. De forma geral, as propostas atuais de tratamento destacam a motivação como aspecto de grande importância para as pessoas decidirem se tratar. Para isso, é importante considerar a ambiguidade como condição quase sempre presente nas suas etapas iniciais. Muitas vezes, o en- gajamento no tratamento só ocorre quando a pessoa não aguenta mais a sua vida e não suporta as perdas que a droga tem produzido. As abordagens devem, com isso, envolver vários recursos que favoreçam a motivação, diminuam as resistências e propiciem o estreitamento da relação com o profissional e a instituição. Como exemplo de abordagem que favoreça a motivação, é possível pensar na possibilidade de retomar as relações familiares, geralmente bastante enfraquecidas ou rompidas em função do uso de drogas, caso a pessoa se engaje em uma proposta de tratamento. Isso fará com que a família veja que ela está se esforçando para interromper ou diminuir o uso de drogas e poderá se reapro- ximar para apoiá-la nessa decisão, fortalecendo, assim, seu engajamento. Com relação à abordagem para diminuir a resistência ao tratamento, pode ser feito valorizando os ganhos obtidos com o seu início, mesmo que mínimos, e também não colocando a abstinência como meta única. Isso ajudará a pessoa a ver que, mesmo que ela, nesse momento, não quer ou não consegue parar de usar drogas, já conseguiu avanços nesse processo. Os exemplos acima descritos funcionam em cadeia, o que, consequentemente, promove o es- treitamento da relação da pessoa com o profissional e a instituição. No tratamento baseado em redução de danos, a definição de seu objetivo, metas intermedi- árias e procedimentos são discutidos com a pessoa, e não impostos. A interrupção do uso de drogas quase sempre é um dos objetivos, mas outros avanços devem ser valorizados, como evitar colocar-se em risco, melhorar ou retomar o relacionamento familiar e recuperar a ativida- de profissional. A participação ativa da pessoa nas escolhas das metas e etapas do tratamento valoriza e aumenta a sua motivação e engajamento. Por trajetórias diversas, muitas têm história de relacionamentos conturbados com pessoas significativas e este é um dos motivos pelos quais é comum que aqueles com problemas com drogas tenham dificuldades com sua auto- estima e autoconfiança. Essa insegurança é agravada pelas sucessivas perdas decorrentes do uso das drogas e, também, pelas recaídas, que muitas vezes ocorrem pelo fato de colocarem a abstinência como meta única do tratamento. Por isso, reagem de forma negativa e intensa 75Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua quando se sentem controladas ou criticadas em suas opções. Muitas vezes, pessoas que têm problemas com drogas propõem que o objetivo do tratamento seja controlar o uso de forma a não ter mais os riscos e prejuízos. Os serviços e profissionais que têm experiência nesse campo sabem que é muito raro que elas consigam esse fim e esforçam-se para motivá-las a parar. De toda forma, o tratamento que tem a redução de danos como estratégia não se prende somente ao consumo da substância. Outros aspectos que compõem a história dessa pessoa, como os emocionais, sociais, de relacionamento com os demais e consigo mesmo, a função que tem o uso da droga para ela, bem como outros problemas de saúde, são questões centrais abordadas no tratamento. Com frequência, a mudança e melhora nesses aspectos ocorrem em paralelo com a mudança na relação com a droga. No que se refere ao uso, é comum que diminuições, interrupções e reca- ídas ocorram, mas com o estabelecimento do vínculo terapêutico e o engajamento da pessoa no tratamento, as mudanças vão se tornando mais sólidas e consistentes. Os avanços e recuos, para- das e recaídas também ocorrem no tratamento com exigência de abstinência; uma das diferenças é que, com as estratégias de redução de danos, não ocorre a exclusão daqueles que não querem ou não conseguem interromper o uso. A troca de uma droga por outra que diminua riscos e danos também é um exemplo de prática de redução de danos. É o caso do uso da metadona no tratamento de pessoas com dependência de opioides, como a morfina ou a heroína. A metadona é também um opioide e igualmente pode provocar dependência. Mas, como os riscos e os danos são menores, é prescrita em serviços médicos nos Estados Unidos e na Europa como forma de facilitar a retirada da heroína ou como substituição, quando os indivíduos não conseguem ou não querem interromper o uso. No Brasil, os casos de dependência de opioides não são tão comuns, mas, quando ocorrem, o tratamento da dependência também é realizado em serviços de saúde, incluindo a troca provisória pela metadona. O uso de benzodiazepínicos como o diazepan no tratamento da abstinência alco- ólica, rotina nos serviços de saúde no Brasil e no exterior, constitui outro exemplo de substituição de uma droga por outra de menor risco e, portanto, uma estratégia de redução de danos. Com a abordagem de substituição, a interrupção do uso de drogas pode ser um objetivo a ser alcançado mais adiante. Assim, não há contradição entre redução de danos e abstinência como meta, mas sim entre redução de danos e abstinência como uma exigência para que as pessoas recebam atendimento e acolhimento nos serviços. Considerando o contexto das pessoas em situação de rua, a abordagem deve passar, necessa- riamente, pela redução de danos. Os serviços substitutivos de saúde mental, como os CAPS AD, e serviços de urgência e emergência que acolhem usuários de álcool e outras drogas devem se organizar para acolher essas pessoas e articular seus projetos terapêuticos singulares(PTS) com outros pontos da rede setorial e intersetorial. As equipes do Consultório na Rua devem contar com o apoio matricial das equipes dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) e dos CAPS e com- partilhar a criação de uma linha de cuidado no município. A intersetorialidade é um aspecto-chave do PTS, e deve haver interlocução frequente entre a equipe de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas de referência, de forma regular, com os dispositivos da assistência social, do esporte, da cultura e organizações não governamentais. A exigência da abstinência para atendimento e a rigidez na abordagem são duas estratégias MINISTÉRIO DA SAÚDE76 contraproducentes para se promover saúde. Muitas vezes, é no atendimento da pessoa em seu mo- mento de maior vulnerabilidade que se cria o vínculo dela com o profissional e o serviço de saúde. 7.8 SAÚde BUcAl Alejandra Prieto de Oliveira Ângela Maria Mazzilli Fassy Entre as prioridades em saúde da população em situação de rua está a saúde bucal. Uma das maiores críticas da promoção à saúde bucal tradicional tem sido sua abordagem estreita, isolada e segmentada, essencialmente separando a boca do resto do corpo. Muitas ve- zes, os programas de saúde bucal têm sido desenvolvidos isolados de outras iniciativas de saúde. Essa abordagem descoordenada pode levar a uma duplicação de esforço, que resulta em mensa- gens conflitantes e contraditórias transmitidas ao público. A abordagem de fator comum de risco reconhece que as condições crônicas, tais como doença coronária, câncer, diabetes, sofrimento mental e doenças bucais, compartilham um conjunto de riscos comuns. Dieta inadequada, fumo, higiene deficiente e estresse são fatores ligados ao desenvolvimento de diversas condições crô- nicas, incluindo doenças bucais. O conceito essencial de abordagem de risco é que, por meio do direcionamento da ação sobre esses riscos comuns e seus determinantes sociais subjacentes, haverá melhora de uma série de condições crônicas, por serem alcançadas mais eficientemente e com maior eficácia. A abordagem de fator de risco comum fornece uma linha de pensamento para o trabalho em conjunto, princípio essencial de prática de promoção da saúde (WATT, 2004). Ainda segundo Watt (2004), um achado das revisões de eficácia de promoção de saúde bucal foi o reconhecimento das limitações de educação em saúde como único meio dessa promoção e de redução de desigualdades. O aumento do conhecimento é um fator de melhora de saúde bucal. Contudo, a ampliação no conhecimento não leva automaticamente a qualquer alteração susten- tável de comportamento. Assim, o conhecimento aperfeiçoado de saúde bucal pode ser de valor limitado para aqueles que vivem em um ambiente onde escolhas saudáveis não são disponíveis. Nessas circunstâncias, outras estratégias são requeridas. É necessário mudança na ênfase de uma atividade isolada em ações educacionais para uma atividade na qual uma série de estratégias complementares, apropriadas às necessidades e circunstâncias da população-alvo, possam ser implementadas. Assim, reconhecendo a especificidade e a demanda da população em situação de rua, a equipe de Saúde Bucal (ESB) em conjunto com o técnico em saúde bucal (TSB) têm a responsabilidade de abordar, além da provisão de cuidado clínico, também as necessidades preventivas de seus pa- cientes. Realizar esse papel de forma eficiente requer a compreensão dos princípios de promoção de saúde e, em especial, o reconhecimento da influência dos determinantes sociais sobre os com- portamentos individuais. A ESB precisa adotar uma postura de compreensão e apoio para esse grupo social, possibilitando o acesso dessa parcela da população, que, historicamente, vivencia a negação de seus direitos básicos, a políticas públicas que efetivamente possibilitem a equidade. Como tratar dos dentes de uma pessoa que poderá estar alcoolizada, em uso de drogas, sem 81Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua eStrAtégiAS de SUporteS Ao cUidAdo pArA A eQUipe do conSUltório nA rUA Alexandre Trino Rosana Ballestero Rodrigues “Certo domingo, estava em casa e tive que ir ao supermercado. Estava andando pela rua com um amigo e, antes de chegar ao supermercado, presenciei uma cena que me causou pro- funda indignação. Um morador de rua de mais ou menos uns 50 anos, com o corpo bastante sujo, atravessou a rua correndo, assustado e completamente nu. Atrás dele, vinham quatro jovens moradores ali da área que o maltratavam de forma desumana, dando-lhe chutes, tapas e rindo sarcasticamente dele. O homem caiu na calçada e ficou ali feito um animal indefeso, que, de tão assustado, não conseguia nem falar. Isso aconteceu em plena rua movimentada, no final da tarde. Algumas pessoas que passavam pelo local fingiam não ver aquilo e outras riam, achando engraçada a brincadeira perversa dos moleques. O homem aparentava ter pro- blemas mentais e estava muito assustado. Mas o que mais me causou sensação de revolta foi que, na hora, passou por ali uma viatura policial e nem sequer parou. Os policiais viram os moleques maltratando um mendigo pelado e aparentemente doente na rua e não fizeram nada, passaram direto como se nada estivesse acontecendo. Diante daquilo, meu amigo até comentou ironicamente que, se fosse um de nós que estivesse andando nu pela rua, iria preso por atentado ao pudor. Mas a impressão que tive é de que as pessoas ali em volta, aqueles moleques e os policiais que passaram sem fazer nada não enxergavam aquele homem como um ser humano, e sim como um cachorro de rua. Fiquei me sentindo bastante mal por ter presenciado uma situação tão desagradável. No dia seguinte, segunda-feira, aproveitando um momento de conversa que fora aberto no grupo, resolvi compartilhar com os colegas o que tinha visto na tarde anterior. Eu me senti aflito por ter percebido que a partir daquele momento eu já não podia mais fazer de conta que não via esse tipo de coisa. Ali na hora não consegui fazer nada, mas a verdade é que me bateu um peso na consciência. Antes de ser um ACS, talvez não me incomodaria tanto com a situação, mas a sensibilidade que essa experiência vem me trazendo já me fez observar aquilo com outros olhos. E vi que é difícil se livrar desse sentimento de responsabilidade quando a gente trabalha nisso, é como se fôssemos ACS em tempo integral, e não apenas no horário de expediente. Pra mim, foi muito bom conversar com o grupo sobre esse sentimento, os colegas também disseram o que pensam, deram outros relatos, enfim, foi um momento de reflexão muito rico para todos. Aí percebemos que o grupo precisava daquilo, de um momento para expor suas angústias e opiniões, dar suas impres- sões, falar o que aflige e ouvir os colegas. Combinamos, então, que toda tarde de segunda- -feira terá esse espaço de reflexão tão necessário para todos nós e fundamental para o grupo.” 8 85Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua experiÊnciAS com popUlAção em SitUAção de rUA: proJetoS Bem SUcedidoS e SUAS FerrAmentAS 9.1 eQUipe de SAÚde dA FAmíliA pArA A popUlAção em SitUAção de rUA de Belo Horizonte Cláudio Candiani Leonardo Quintão História da equipe A história do Centro de Saúde Carlos Chagas (CSCC), nos últimos 15 anos, confundiu-se com a história das políticassociais para a população em situação de rua (PSR) de Belo Horizonte. Em 1994, os catadores de papel e os flanelinhas/guardadores de carros se organizaram e fizeram aprovar, no orçamento participativo (OP) daquele ano, uma Unidade Básica de Saúde para o Centro da cidade. O OP94 garantiu recursos para a reforma que transformou em 1996 o CSCC, que era ambu- latório especializado em raiva (há 40 anos)e imunobiológicosespeciais, em Unidade Básica de Saúde (UBS), com equipe de Saúde Mental (um assistente social, um psicólogo e um psiquiatra). Desde então, o atendimento à PSR, além do que é feito aos demais moradores da área de abrangência, passoua ser realizado nessa UBS. Uma ação importante para organizar o atendi- mento a essa população foi a individualização de prontuários. A prática de “abordagem conjunta” nas ruas foi iniciada por meio da parceria da equipe de Saúde Mental do CSCC com a equipe de abordagem de rua centro-sul – da Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS) –, que foi a primeira de BH. No início, era preciso sustentar, junto aos colegas da rede de saúde, que os colegas da SMAS não estavam levando “problema”, e sim ajudando a resolver a demanda (do usuário e da equipe), quando o paciente em situação de rua chegava já identificado, com uma história de vida já conhecida, para atendimento, com possibilidades de albergamento etc. À época, era muito comum buscar nos arquivos de pron- tuários dos hospitais psiquiátricos as informações sobre os antecedentes de tratamento para estabelecermos um plano terapêutico. Em 2002, a unidade se articulou e, aproveitando o movimento da Saúde da Família, conse- guiu instituir a primeira eSF para a população em situação de rua do País. Os objetivos traçados para a equipe foram: 1. Adquirir conhecimentos sobre a PSR para capacitar todas as UBS da cidade para tal atendimento; 9 MINISTÉRIO DA SAÚDE86 2. Responsabilizar-se pela PSR que dormisse dentro da área compreendida pela Av. do Contorno e nos equipamentos sociais para essa população. Composta como as demais eSF da cidade (médico, enfermeira, dois auxiliares de enfermagem e quatro ACS), a equipe iniciou seu trabalho em abril de 2002. No início, contou com o coordena- dor da Secretaria Municipal de Saúde e com a coordenação da gerente da unidade. Os primeiros movimentos, concomitantemente ao início dos atendimentos, foram o levantamento de bibliografia e o mapeamento da rede de atenção à PSR na cidade. Com o tempo, a equipe formou grande rede que se comunicava intensamente por fone, e-mail ou reuniões, com o objetivo de prestar suporte necessário a esse grupo social. Os principais atores dessa história são: 1. Equipe de apoio do Carlos Chagas, principalmente saúde mental e odontologia; 2. Abordagem de população em situação de rua e plantão social; 3. Equipamentos sociais (albergue, Abrigo São Paulo, República Maria Maria, República Reviver e centro de referência para a população em situação de rua); 4. Referências da secretaria (Coordenação de Tuberculose etc.). Por força de necessidade, a eSF precisou atuar em contextos ampliados de redes de apoio: 1. Em conjunto com a pastoral de rua, conseguiu reativar o fórum de população de rua, que ocorre mensalmente; 2. Participou dos movimentos da população relativos ao orçamento participativo e constru- ção de planilha de direitos de moradores de rua; 3. Apresentou as situações precárias vividas por essa população em todos os fóruns possí- veis: congressos nacionais e internacionais, eventos nas faculdades, eventos municipais; 4. Conseguiu, com o distrito, que a população tivesse acesso ao prontuário eletrônico; 5. Conseguiu ampliação do cardápio de vacinas, agregando hepatite B. Ações Entre o cardápio de ações implementado pela equipe para conseguir dar conta da grande vul- nerabilidade da população, destaca-se: 1. Reunião mensal com abordagem de população em situação de rua, CAPS e outras referências; 2. Reunião semanal de equipe; 3. Reunião mensal com a equipe de Saúde Mental; 4. Abordagem conjunta na rua; 5. Condução involuntária para exames e cuidados; 6. Ações preventivas e terapêuticas nos equipamentos sociais. 89Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua CASO 2 (Abordagem conjunta – psiquiatra+educador social) -se o lavador de carro que tinha acesso ao paciente. O generalista fez heteroanamnese com o lavador e descobriu que o paciente se chamava Antônio e disse que, certa vez, passara um profissional de uma empresa que tinha reconhecido o usuário como um morador de certa cida- de próxima a BH que tinha sumido. Os ACS começaram a monitorar Antônio enquanto pesqui- savam mais dados sobre ele. Descoberto o profissional que o reconhecera, a equipe conseguiu contato com familiares. Tratava-se de Sr. Antônio, portador crônico de transtorno mental que tinha sido trazido por um irmão para BH e abandonado. Tinha outro irmão na cidade que estava à procura dele. Abordagem de população de rua fez contato com família e articulou o retorno de Antônio. Planejamos continuar o monitoramento e, assim que possível, encaminhá-lo para a UPA, para avaliação, a seguir para o CAPS, com vistas ao retorno a sua cidade. Certo dia, a equipe foi avisada que o paciente tinha parado de se alimentar e estava com sinais de des- compensação clínica. O generalista e os ACS contactarama UPA e foram para o local. Levado à UPA, foi estabilizado e enviado para o CAPS e, depois, para a sua cidade, onde entrou em tratamento no CAPS. No mês seguinte, tivemos notícia que o Sr. Antônio estava ótimo (...) DFP era uma senhora de meia-idade que vivia há 20 anos nas ruas de um bairro do Centro. Ela tinha uma filha, que, ainda pequena, foi entregue à família para poder estudar. Com a pró- pria mãe convivia muito raramente (rompeu com ela mais de uma vez, a última quando perma- necera na casa da mãe, na periferia de BH, convalescente de um atropelamento). A senhora foi acompanhada em visitas de abordagem conjunta durante cerca de quatro anos. Nesse período, tínhamos notícias de abuso de etílicos e de atitudes delas que fizeram com que o en- torno quisesse enquadrá-la judicialmente por “atentado ao pudor”. Suas passagens por salas de urgências (clínicas e psiquiátricas)denotavam uma adaptação razoável à realidade quando estava sóbria. Só quando ela aceitou uma entrevista psiquiátrica sob pretexto de requerer bene- fício junto ao INSS é que ela explicitou (sóbria) o conteúdo delirante místico-persecutório de sua maneira de pensar – e concluímos pelo diagnóstico de esquizofrenia, associado ao alcoolismo. Em uma das visitas de abordagem conjunta (EAR/ESM), ela gritava, tirava roupas, estava hostil, inabordável. Devido à intoxicação etílica, constatamos a necessidade de condução involuntá- ria pelo SAMU, que pediu que solicitássemos também uma viatura da Polícia Militar para dar suporte (evitar agressões/registro de ocorrência). DFP foi levada para uma sala de urgência psiquiátrica num hospital do Estado, com acordo de transferência para o CAPS/CERSAM de referência no dia seguinte. A continuidade do tratamento permitiu a família reaproximar-se dela. MINISTÉRIO DA SAÚDE90 A eSF para a população em situação de rua de Belo Horizonte é responsável pelo atendimento do morador de rua que dorme na área compreendida pela Av. do Contorno ou nos equipamentos sociais (albergue, abrigo, república). Nessa população, encontramos prevalência de transtorno mental grave e/ou drogadição em torno de 80%. Entre os pacientes atendidos pela equipe de saúde para população em situação de rua, os de mais difícil abordagem são os moradores de rua não vinculados a nenhum equipamento social e com transtorno mental ou drogadição grave. Para eles, a equipe desenvolveu todo um cardápio de ações possíveis e, entre elas, o que chamamos de condução involuntária para exames e cuidados (CIEC). Condução involuntária para exames e cuidados PASSOS DA CIEC Entrada do caso • Em geral, após solicitação de equipe de abordagem da SMAS; • Na maioria das vezes, a causa básica da entrada do caso é o transtorno mental. Discussão em equipe • Discussão em reunião periódica com abordagem e equipe de Saúde Mental com montagem de plano de ação.Na maioria das vezes, a causa básica da entrada do caso é o transtorno mental. Levantamento da história • Levantamento de histórico com anamnese, heteroanamnese com entorno, interna- ções hospitalares; • Acompanhamento da abordagem contínua. Acompanhamento • Acompanhamento periódico pelos agentes comunitários ou educadores sociais; • Definição de necessidade de CIEC se há aumento de vulnerabilidade; • Às vezes,dura anos. Definição de atribuições • Quem vai fazer a ação? • Para onde vai? • Para onde vai após a estabilização? • Quem vai cuidar da articulação pós-estabilização? Monitorização • Acompanhamento periódico e avaliação médica se há instabilização. 91Manual sobre 0 Cuidado à saúde junto a PoPulação eM situação de rua Mensagens-chave: • Onde no mundo tem dado mais certo o atendimento à saúde da população em situação de rua conta com a experiência de equipes junto a esse grupo social, criando tecnologias, servindo como matriciadora e com o cuidado compartilhado por toda a rede. • A Rede de Atenção à Saúde no Brasil tem como eixo organizador a atenção básica e deve ser centrada nas necessidades das pessoas e coletivos, assim, o atendimento à população em situação de rua deve partir necessariamente desse modelo. 9.2 BompArceiro pSicoSSocioAmBientAl: Um trABAlHo ASSUmido Marta Regina Marques Lodi Marivaldo da Silva Santos Juliana Mendes de Melo O Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto, ligado à Pastoral do Menor, foi fundado em 1946. Tem como missão articular e contribuir para a defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, familiares e população em situação de rua da zona leste de São Paulo, por meio de programas socioe- ducativos, desenvolvidos em unidades de atendimento, favorecendo o protagonismo social, valorizan- do o acolhimento, solidariedade e compromisso, vivenciados por todos que atuam na organização. Nesse contexto, a instituição sediou, no município de São Paulo, em 2004, o Programa A Gente na Rua, o qual surgiu da mobilização social da população em situação de rua (PSR), que reivin- dicava o direito do acesso à saúde conforme os princípios e diretrizes do SUS. Posteriormente, consolidou-se como Estratégia Saúde da Família. A Estratégia Saúde da Família para a População em Situação de Rua está inserida nas sub- prefeituras da Sé, Mooca e Pinheiros, pois concentram a maior PSR no município de São Paulo. A equipe da ESFR é composta por médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem, assistente social, psicóloga, gestor ambiental. Considerando que o ACS atua como elo entre a comunidade e o serviço de saúde, passando a ser um facilitador por meio do vínculo e vivência, destacamos a im- portância da contratação de pessoas com vivência em situação de rua/albergue para atuar como agentes comunitários de saúde.Esse profissional é o primeiro facilitador que promove as diversas formas de interlocução com as pessoas, acompanhado dos diferentes olhares profissionais para os fatores de promoção e prevenção e reinserção delas. Esse grupo social encontra-se em estado de alta vulnerabilidade social, morando nas ruas, casas de acolhidas ou frequentando espaços de convivência. Devido a vários motivos, tem dificul- dade de se reestruturar na sociedade e passa a não se preocupar mais com seu bem-estar, muito menos, refletir sobre o impacto que o meio ambiente exerce sobre a saúde. Pensando em melhorar a condição dessas pessoas é que a equipe da ESFR desenvolveu pro- jetos ambientais como o BOMPARceiro, visando a contribuir para a melhora da autoestima e o bem-estar biopsicossocial em todos os níveis, incluindo a discussão sobre o meio ambiente. Esse projeto busca, por meio de um gestor ambiental que também teve a vivência de situação de rua, MINISTÉRIO DA SAÚDE94 REFERÊNCIAS ADORNO, R. C. F.; vARANDA, W. Descartáveis urbanos: discutindo a complexidade da população de rua e o desafio para políticas de saúde. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 13, n. 1, p. 23-45, 2004. BARCELLOS, C.; MONKEN, M. Instrumentos para o Diagnóstico Sociossanitário no Programa Saúde da Família.In: FONSECA, A. F.; CORBO, A. D. A.O território e o processo saúde-doença. Rio de Janeiro: EPSJv/ Fiocruz, 2007. BASTOS, C.M. et al. Pastoral do povo de rua: vida e missão. São Paulo: Loyola, 2003. BARRETO, F.P. A urgência subjetiva na saúde mental. 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Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monito- ramento, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1, 24 dez. 2009. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. 2º Censo da População em Situação de Rua e análise qualitativa da situação dessa população em Belo Horizonte: meta 10 – realização de ações de atendimento socioassistencial, de inclusão produtiva e capacitação para população de rua. Belo Horizonte: MDS, 2006. ______. Ministério da Saúde. Portaria GM nº 1.059, de 4 de julho de 2005.Destina incentivo finan- ceiro para o fomento de ações de redução de danos em Centros de Atenção Psicossocial para o Álcool e outras Drogas – CAPSad – e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1, 5 jul. 2005. ______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. ______. 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