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Guias e Dicas
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Livro didático público de educação física, Manuais, Projetos, Pesquisas de Química

ÓTIMO LIVRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA - SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARANÁ

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2010
Em oferta
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Compartilhado em 16/05/2010

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Baixe Livro didático público de educação física e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Química, somente na Docsity! EDUCAÇÃO FÍSICA ENSINO MÉDIO SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO Este livro é público - está autorizada a sua reprodução total ou parcial. Governo do Estado do Paraná Roberto Requião Secretaria de Estado da Educação Mauricio Requião de Mello e Silva Diretoria Geral Ricardo Fernandes Bezerra Superintendência da Educação Yvelise Freitas de Souza Arco-Verde Departamento de Ensino Médio Mary Lane Hutner Coordenação do Livro Didático Público Jairo Marçal Depósito legal na Fundação Biblioteca Nacional, conforme Decreto Federal n.1825/1907, de 20 de Dezembro de 1907. É permitida a reprodução total ou parcial desta obra, desde que citada a fonte. SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO Avenida Água Verde, 2140 - Telefone: (0XX) 41 3340-1500 e-mail: dem@seed.pr.gov.br 80240-900 CURITIBA - PARANÁ Catalogação no Centro de Editoração, Documentação e Informação Técnica da SEED-PR Educação Física / vários autores. – Curitiba: SEED-PR, 2006. –248 p. ISBN: 85-85380-32-2 1. Educação física. 2. Ensino médio. 3. Esporte. 4. Dança. 5. Ginástica. 6. Jogos. 7. Lutas. I. Folhas. II. Material de apoio pedagógico. III. Material de apoio teórico. IV. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. V. Título. CDU 796+373.5 2ª. Edição IMPRESSO NO BRASIL DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Aos Estudantes Agir no sentido mais geral do termo significa tomar ini- ciativa, iniciar, imprimir movimento a alguma coisa. Por constituírem um initium, por serem recém-chegados e ini- ciadores, em virtude do fato de terem nascido, os homens tomam iniciativa, são impelidos a agir. (...) O fato de que o homem é capaz de agir significa que se pode esperar de- le o inesperado, que ele é capaz de realizar o infinitamente improvável. E isto, por sua vez, só é possível porque cada homem é singular, de sorte que, a cada nascimento, vem ao mundo algo singularmente novo. Desse alguém que é singular pode-se dizer, com certeza, que antes dele não havia ninguém. Se a ação, como início, corresponde ao fa- to do nascimento, se é a efetivação da condição humana da natalidade, o discurso corresponde ao fato da distinção e é a efetivação da condição humana da pluralidade, isto é, do viver como ser distinto e singular entre iguais. Hannah Arendt A condição humana Este é o seu livro didático público. Ele participará de sua trajetória pelo Ensino Médio e deverá ser um importante recurso para a sua formação. Se fosse apenas um simples livro já seria valioso, pois, os livros re- gistram e perpetuam nossas conquistas, conhecimentos, descobertas, so- nhos. Os livros, documentam as mudanças históricas, são arquivos dos acertos e dos erros, materializam palavras em textos que exprimem, questionam e projetam a própria humanidade. z Mas este é um livro didático e isto o caracteriza como um livro de en- sinar e aprender. Pelo menos esta é a idéia mais comum que se tem a res- peito de um livro didático. Porém, este livro é diferente. Ele foi escrito a partir de um conceito inovador de ensinar e de aprender. Com ele, como apoio didático, seu professor e você farão muito mais do que “seguir o li- vro”. Vocês ultrapassarão o livro. Serão convidados a interagir com ele e desafiados a estudar além do que ele traz em suas páginas. Neste livro há uma preocupação em escrever textos que valorizem o conhecimento científico, filosófico e artístico, bem como a dimensão his- tórica das disciplinas de maneira contextualizada, ou seja, numa lingua- gem que aproxime esses saberes da sua realidade. É um livro diferente porque não tem a pretensão de esgotar conteúdos, mas discutir a realida- de em diferentes perspectivas de análise; não quer apresentar dogmas, mas questionar para compreender. Além disso, os conteúdos abordados são alguns recortes possíveis dos conteúdos mais amplos que estruturam e identificam as disciplinas escolares. O conjunto desses elementos que constituem o processo de escrita deste livro denomina cada um dos tex- tos que o compõem de “Folhas”. Em cada Folhas vocês, estudantes, e seus professores poderão cons- truir, reconstruir e atualizar conhecimentos das disciplinas e, nas veredas das outras disciplinas, entender melhor os conteúdos sobre os quais se debruçam em cada momento do aprendizado. Essa relação entre as dis- ciplinas, que está em aprimoramento, assim como deve ser todo o pro- cesso de conhecimento, mostra que os saberes específicos de cada uma delas se aproximam, e navegam por todas, ainda que com concepções e recortes diferentes. Outro aspecto diferenciador deste livro é a presença, ao longo do tex- to, de atividades que configuram a construção do conhecimento por meio do diálogo e da pesquisa, rompendo com a tradição de separar o espaço de aprendizado do espaço de fixação que, aliás, raramente é um espaço de discussão, pois, estando separado do discurso, desarticula o pensamento. Este livro também é diferente porque seu processo de elaboração e distribuição foi concretizado integralmente na esfera pública: os Folhas que o compõem foram escritos por professores da rede estadual de en- sino, que trabalharam em interação constante com os professores do De- partamento de Ensino Médio, que também escreveram Folhas para o li- vro, e com a consultoria dos professores da rede de ensino superior que acreditaram nesse projeto. Agora o livro está pronto. Você o tem nas mãos e ele é prova do valor e da capacidade de realização de uma política comprometida com o pú- blico. Use-o com intensidade, participe, procure respostas e arrisque-se a elaborar novas perguntas. A qualidade de sua formação começa aí, na sua sala de aula, no traba- lho coletivo que envolve você, seus colegas e seus professores. 10 Esporte Ensino Médio A p r e s e n t a ç ã o Apresentação Para a Educação Física, este livro didático tem dupla importância: primeiro, por constituir-se em um material produzido por professores da rede pública de ensino e distribuído gratuitamente; segundo, por representar um momento histórico para a disciplina, pois, pela primei- ra vez, um livro didático subsidia a prática docente, trazendo reflexões sobre diversos assuntos que constituem o corpo teórico-prático desta área de conhecimento. Refletir sobre as práticas corporais significa buscar a superação de uma visão que vinculou, por muito tempo, a Educação Física a uma perspectiva tecnicista voltada para o desenvolvimento de aptidões físi- cas, o que priorizou, historicamente, na escola, a simples execução de exercícios físicos destituídos de uma reflexão sobre o fazer corporal. O Livro Didático Público de Educação Física tem por objetivo prin- cipal desenvolver uma abordagem histórica de como, por que e a par- tir de que interesses o conhecimento que compõe o campo de estudos desta disciplina foi produzido e validado. Os Folhas presentes no livro propõem a desnaturalização das práticas que compõem o desenvolvi- mento teórico-prático do ensino da Educação Física na escola. Ao analisarmos a constituição histórica da Cultura Corporal – funda- mento dos estudos e do ensino da Educação Física escolar – compre- endemos que suas raízes estão na relação homem-natureza, na ação humana de transformar a natureza para retirar dela sua subsistência. As primeiras ações humanas sobre a natureza constituiriam as sociedades e seus diferentes modos de produção. A relação homem-natureza pos- sibilitou a constituição da materialidade corpórea humana. Não nascemos pulando, saltando ou até mesmo manuseando obje- tos (ESCOBAR, 1995), mas fomos nos adequando às necessidades que o meio impunha. Para uma criança que acaba de nascer é impossível andar, pois sua constituição corporal não lhe permite realizar tal movimento. Esta mesma criança dará seus primeiros passos somente quando sua materialidade corpórea estiver preparada, impulsionada pelas necessi- dades que o meio imprimir, seja para alcançar um objeto fora do seu alcance ou para locomover-se até determinado local de seu interesse. No trabalho pedagógico, o ensino da constituição histórica da ma- terialidade corporal está organizado pelos fundamentos teóricos da Cultura Corporal e pelos Conteúdos Estruturantes – Jogos, Esportes, Danças, Lutas e Ginástica – que, tradicionalmente, compõem os cur- rículos escolares da Educação Física e identificam a disciplina como campo do conhecimento. z Apresentação 11O futebol para além das quatro linhas Educação Física E D U C A Ç Ã O F Í S I C A Os Conteúdos Estruturantes possibilitam a abordagem pedagógica das diversas manifestações corporais que foram se constituindo ao lon- go do desenvolvimento histórico da humanidade. As discussões e as práticas fundamentadas na Cultura Corporal pos- sibilitam a problematização de questões importantes para o desen- volvimento crítico do aluno e a desnaturalização de alguns conceitos como, por exemplo, o de que a competitividade individualista, dos tempos atuais, é inata ao ser humano. O ser humano é entendido, aqui, como social, histórico, inacabado e, portanto, em constante transformação. Essa compreensão exige da Educação Física uma abordagem teórica que contextualize as práticas corporais, relacionando-as aos interesses políticos, econômicos, sociais e culturais que as constituíram. Na sociedade capitalista, as práticas corporais têm a função de pre- parar o futuro trabalhador para o mercado de trabalho. Assim, a com- petição e superação de dificuldades baseiam-se no princípio da indivi- dualidade. A organização coletiva e solidária é relegada a um segundo plano. A Cultura Corporal, como fundamento para o estudo e o ensino da Educação Física, possibilita a análise crítica das mais diversas práticas corporais, não restringindo o conhecimento da disciplina somente aos aspectos técnicos e táticos dos Conteúdos Estruturantes. Assim, julgamos necessário que você conheça os conteúdos estru- turantes apresentados neste livro, considerando seus aspectos técni- cos, táticos, históricos, sociais, políticos, culturais, possibilitando uma compreensão mais ampla e crítica das práticas corporais propostas pe- la Educação Física. O Livro Didático Público de Educação Física con- fere um grande desafio, a saber: construir possibilidades diversas de análise e (re)criação das práticas corporais, por meio das variadas ma- nifestações da Cultura Corporal, aprofundando a reflexão crítica dos alunos acerca dos conhecimentos próprios desta disciplina escolar. 12 Esporte Ensino Médio Intr dução I n t r o d u ç ã o Esporte Artista: Luiz Ventura Título painel: Crianças do Brasil – O Futebol Técnica: pintura com tinta acrílica sobre lona preparada, montada em chassis Dimensões:1.20x2.40m Falar sobre o esporte, enquanto manifestação da Cultura Corporal, sig- nifica discutir o que este Conteúdo Estruturante foi, desde sua origem histórica até a atualidade. Esta abordagem permitirá reflexões sobre as possibilidades de recriar o conceito de esporte, por meio de uma in- tervenção consciente. No início do século XIX, o desenvolvimento da sociedade capitalista tornava cada vez mais profunda a divisão do trabalho – funções bra- çais, ligadas ao esforço físico e atividades intelectuais, ligadas ao inte- lecto. Essa divisão separava as pessoas em classes sociais, ou seja, clas- se dirigente/elite e trabalhadores. Configurou-se um quadro em que a separação entre elite (econômica, política e intelectual) e trabalhadores se refletia nos costumes e formas de viver de ambas as classes. As classes sociais realizavam atividades que as distinguiam entre si, e uma dessas atividades era o esporte. z 15O futebol para além das quatro linhas Educação Física E D U C A Ç Ã O F Í S I C A da escola. Seria possível pensar formas de recriar determinadas mo- dalidades, sob aspectos ligados à competição, cooperação, prazer em jogar, sem considerar a técnica como fator decisivo? Algumas das res- postas para essa última questão você poderá encontrar no Folhas inti- tulado “Eu faço uso do esporte, ou sou usado pelo esporte?”. Você já pensou como seria jogar com todos os colegas, sem excluir aqueles que não tiveram a mesma oportunidade de praticar uma mo- dalidade? É realmente necessário jogar contra o seu colega? Não seria interessante que você jogasse com ele, respeitando as limitações e pos- sibilidades de cada um? Todas essas alternativas compõem uma nova forma de pensar o espor- te, que não descarta a idéia de competição, mas tem como fundamento o prazer, sem vinculação à lógica do individualismo egoísta e exacer- bado, sem que você seja usado pelo esporte como forma de adequa- ção às normas e regras sociais estabelecidas. É com esse objetivo que o convidamos a mergulhar no mundo espor- tivo, jogando, tanto na teoria como na prática, o esporte da escola, aquele realizado para você, para suas necessidades, para que você se divirta juntamente com sua turma, recriando outras formas de praticar e discutir o esporte, sem a estereotipação de movimentos, tampouco ideologias tidas como verdadeiras. 16 Esporte Ensino Médio 17O futebol para além das quatro linhas Educação Física 1 O FUTEBOL PARA ALÉM DAS QUATRO LINHAS Fabiano Antonio dos Santos1, Rita de Cássia2n Procure imaginar a situação: você está sen- tado na platéia para assistir a uma apre- sentação em sua escola. Certamente não há a preocupação, de sua parte, sobre o que possa estar ocorrendo por trás das cortinas fechadas, prontas para serem abertas e re- velarem as mais diversas possibilidades e sensações. Até porque você foi ao espetá- culo na condição de espectador, e como tal, seu interesse estava nas sensações propor- cionadas, sejam elas de satisfação, alegria, tristeza, indignação. E se o futebol fosse esta apresentação e você tivesse a oportu- nidade de olhar por trás das cortinas, o que lhe chamaria a atenção? O que enxergaria? Com certeza, coisas que o deixariam intri- gado, curioso, ou até decepcionado. 1Colégio Estadual Padre João Wilinski. Curitiba - PR 2Lindaura R. Lucas - São José dos Pinhais - PR 20 Esporte Ensino Médio Artista: Luiz Ventura Título painel: Futebol Técnica: pintura com tinta acrílica sobre lona preparada, montada em chassis Dimensões:1.82x4.22m Data: 2000 minados períodos históricos na conformação ou efervescência da po- pulação. A ideologia, conceito do qual tanto ouvimos falar, tem, na maioria das vezes, seu real significado pouco discutido. Você já deve ter ouvido falar que cada um tem uma ideologia, ou que devemos ter nossas próprias ideologias. Será que ideologia é, então, a mesma coi- sa que ideais a serem alcançados por cada um de nós? Karl Marx (1818-1883), importante pensador na história da humani- dade, conceituou ideologia a partir da dinâmica da luta de classes. Ou seja, para ele, a ideologia está colocada na luta entre aqueles que do- minam e aqueles que são dominados. Veja um trecho que Marx escre- veu sobre ideologia: Assim, os dominantes apresentam suas idéias como únicas válidas e verdadeiras e perseguem, excluem ou exterminam aqueles que as con- testam. A ditadura militar vivida pelo Brasil, entre os anos 60 e 80 do século XX, é um bom exemplo disso. Você já ouviu falar das torturas aplicadas àqueles que não “seguiam a ordem” estabelecida, ou contes- tavam o governo? Do exílio de autoridades e pessoas comuns que fu- giam do país para não serem mortas, permitindo que o governo auto- ritário mantivesse a sua “ordem”? Enfim, nossa história está repleta de acontecimentos em que a ideologia das classes dominantes era impos- ta como doutrina, impossível de ser contestada. Mas como a ideologia pode ser transmitida à população? Por meio de vários canais, tais como: a mídia televisiva, os jornais, revistas, dis- cursos, ou até mesmo as leis de censura próprias dos governos autori- tários, como foi o caso do Brasil no período do regime militar. Os defensores do futebol, como ópio do povo, entendiam este es- porte como uma das possibilidades de veiculação ideológica do pen- samento da classe dominante. “Com efeito, cada nova classe que toma o lugar da que dominava antes dela é obrigada, para alcançar os fins a que se propõe, a apresentar seus inte- resses como sendo o interesse comum de todos os membros da sociedade, isto é, para expressar isso mesmo em termos ideais: é obrigada a emprestar às suas idéias a forma de universalidade, a apresentá-las como sendo as úni- cas racionais, as únicas universalmente válidas”. (MARX, 1987, p.74) Karl Marx (1818-1883). n 21O futebol para além das quatro linhas Educação Física Na década de 70, para neutralizar a oposição ao regime, o governo fez uso de vários instrumentos de coerção. Da censura aos meios de comunicação, às manifestações artísticas, às prisões, torturas, assassi- natos, cassação de mandatos, banimento do país e aposentadorias for- çadas, espalhou-se o medo e a violência. Os setores organizados da sociedade passaram a viver sob um clima de terrorismo, principalmen- te após o fechamento do Congresso Nacional, em 1966. Para amenizar essas crises, o governo do presidente Médici (1969- 1974) lançou mão do futebol como possibilidade de desviar a aten- ção da população dos conflitos políticos da época. O objetivo era que, ao invés das pessoas saírem às ruas para participar de manifestações políticas, ficariam em suas casas torcendo pela seleção brasileira nu- ma “corrente pra frente”, como diz a música de Miguel Gustavo, “Pra frente Brasil”. O governo militar utilizou-se da vitória da seleção, no mundial de 1970, para desviar a atenção da crise econômica, dos pro- blemas sociais e políticos e, principalmente, das atitudes autoritárias relacionadas às torturas, perseguições e mortes, freqüentes naquele período triste de nossa história. Mais recentemente, em 2004, a visita do fute- bol brasileiro ao Haiti foi o evento que voltou a vincular, ostensivamente, o futebol à função de “ópio do povo”. Muito se falou na mídia a respei- to desta visita. Você se lembra das notícias que cir- cularam nesta época? Procurando realizar nosso exercício, aquele de “espiar” o que estaria escondido atrás das corti- nas deste episódio, acompanhemos uma reporta- gem apresentada ao jornal Folha de São Paulo, re- alizada em função da visita da seleção brasileira ao Haiti. Futebol não afasta pavor do Haiti Escrito por Marcos Guterman Ronaldo não é Henri Cristophe, mas teve seus momentos de rei do Haiti. Em “O Dia em que o Brasil Esteve Aqui”, o craque aparece em uma dimensão impressionante mesmo para um espectador brasilei- ro, orgulhoso de seu “país do futebol”. Mas o filme, feito para registrar os efeitos da histórica passagem da seleção de futebol do Brasil pelo Haiti, em agosto de 2004, na verdade pode ser visto como um in- cômodo lembrete de como o país antilhano continua a ser um espectro a rondar o horizonte brasileiro. Há pouco mais de 200 anos, o Haiti tornava-se a primeira nação negra independente das Américas. A revolução, cuja violência deixou marcas históricas, sacudiu o imaginário da elite brasileira da época, 22 Esporte Ensino Médio temerosa que o 1,5 milhão de escravos do país se inspirasse nos haitianos. “Haitianismo” virou nome de crime e pesadelo no Brasil. Os dois séculos de lá até aqui não parecem ter mudado essencialmen- te essa relação. No documentário, a seleção brasileira aparece como representante do que há de mais significativo da cultura nacional, coisa capaz de enlouquecer os países por onde passa, sobretudo os mais pobres. Na véspera do amistoso contra o Haiti, soldados brasileiros distribuíram nas ruas camisetas amarelas, disputadas como se fossem sacos de comida. Um jornalista haitiano sugere que esse é o autêntico “soft power”, isto é, o poder de conquistar corações e mentes por meios persuasivos. Mas os astros dessa poderosa trupe são endinheirados exilados na fria Europa, e seu traço negro é só uma pálida lembrança dos 400 anos de escravidão no Brasil. Em cima de carros blindados da ONU, desfilaram pelas ruas de Porto Príncipe como imperadores em meio a uma inacreditável multidão de mi- seráveis súditos que se empilharam para ter o privilégio de ver seus deuses por uma fração de segun- do, se tanto. A seleção, símbolo de um Brasil cuja identidade foi construída no passado recente em cima da len- da da democracia racial, manteve um prudente distanciamento dessa massa negra informe. Sob forte proteção, o time chegou, entrou em campo, goleou e foi embora, sem maior envolvimento, o que cau- sou uma mal disfarçada frustração entre os haitianos. O comando militar brasileiro alegou que a visita da seleção foi rápida para evitar tumultos que po- deriam converter-se em violência. Mas, no limite, talvez tenha sido medo de contaminação, o velho pa- vor da elite brasileira. Ao final do documentário, o que se impõe não é a força do futebol nem o acerto da iniciativa brasi- leira, e sim uma incômoda pergunta: quanto falta para sermos o Haiti? Nota: O documentário que trata a matéria é dirigido por Caíto Ortiz e João Dornelas, e denomina-se “O Dia em que o Brasil Esteve Aqui”. Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u54863.shtml 03/11/2005 - 09h48 n Tanto em 1970 como em 2004, o futebol funcionou como válvu- la de escape para os problemas sociais, ora para o povo brasileiro, de maneira direta; ora indiretamente para o povo haitiano. O interesse do governo Médici e do governo haitiano, nestes dois eventos, foi distrair a população, “aliviar” conseqüências da instabilidade política do país em questão com o uso do papel simbólico que o futebol assumiu his- toricamente. A nossa discussão a respeito do futebol apresentará, também, o pensamento de outro autor, para quem esse esporte é manifestação da cultura do povo e constituidor da identidade da nação brasileira. Você deve pensar: como um esporte, ou jogo, pode se constituir num objeto que identifica uma nação? Identidade estranha quando se pensa em um esporte que veio de fora do país e hoje anunciamos aos quatro cantos, como se fosse nossa invenção. Futebol: a formação da identidade nacionalz 25O futebol para além das quatro linhas Educação Física cipalmente no que se refere à importância desta prática corporal, no cenário social e esportivo, bem como no desenvolvimento dos negó- cios de maneira em geral. O cenário esportivo e dos negócios andam juntos, constituem o ce- nário nacional? Acompanhe-nos em mais esta “espiadinha”! O futebol, tanto como prática de lazer quanto prática esportiva de alto rendimento, tem sofrido um processo de mercadorização em nossa sociedade. A venda dos direitos de imagem dos jogadores ou o uso e venda das marcas de patrocinadores, bem como a venda dos direitos de transmissões de jogos pela TV e, até mesmo, a venda de jogadores em altas transações formam um complexo e ren- doso mercado (AZEVEDO e REBELO, 2001). Você sabe o que significa mercado? Deve ter ouvido, em telejornais, expressões como: “o mer- cado está nervoso”, ou ainda, “o mercado de ações caiu”. A palavra mercadoria é derivada de mercado. O que ela significa? Se, vivemos numa sociedade produ- tora de mercadoria, o que o futebol tem a ver com es- sas terminologias? Vivemos numa sociedade que visa o lucro Digamos que você está em um passeio e, porventura, lhe dá fome, você vai até sua mala e percebe que esqueceu o lanche que havia pre- parado para comer. Mas não pode esperar até chegar em casa, pois es- tá faminto e sai à procura de algum lugar que tenha algo para satisfa- zer sua fome. Chegando neste local, escolhe o alimento que deseja e se dirige ao caixa. Neste momento, é preciso pagar pela mercadoria que irá consumir. Mesmo que você não tenha esquecido o lanche que havia preparado, a procedência do mesmo pode ser da vendinha perto de sua casa e, portanto, também foi comprado. Ainda em nosso exer- cício de imaginação, agora você quer comprar uma bola, um rádio, ou algo que o agrade, que o distraia em momentos de lazer. Pois bem, aqui gostaríamos de dialogar com você sobre nossa so- ciedade, a sociedade capitalista, e como as mercadorias assumem pa- pel central na produção de toda a riqueza existente. No futebol não é diferente. Como esporte espetáculo, suas mercadorias são vendidas aos torcedores e, entre elas, o jogador é uma mercadoria que pode es- tar à venda por um determinado preço. A riqueza de nossa sociedade baseia-se na acumulação de capital e dos lucros obtidos pela venda das mercadorias – feitas pelas mãos dos trabalhadores. z 26 Esporte Ensino Médio A mercadoria é, antes de mais nada, um objeto exter- no, uma coisa que, por suas propriedades, satisfaz neces- sidades humanas, seja qual for a natureza, a origem de- las, provenham do estômago ou da fantasia. (MARX, 2001, p. 57). Com tanta riqueza por aí cadê sua fração? Escrito por Sérgio Rangel Com tanta riqueza por aí, cadê sua fração? Enquanto a parcela que ganha até dois salários mínimos cresce, o grupo composto pelos milionários do esporte vem diminuindo a cada temporada Ao mesmo tempo em que o futebol brasileiro recebe investimentos nunca antes vistos, com os prin- cipais clubes firmando parcerias com multinacionais milionárias, os jogadores do país estão cada vez mais pobres. Segundo documentos oficiais do Departamento de Registro e Transferência da CBF (Confedera- ção Brasileira de Futebol) obtidos pela Folha, os ‘’boleiros ricos’’ integram uma parcela cada vez menor no futebol brasileiro. De acordo com o levantamento, apenas 3,7% dos jogadores profissionais relacionados na entidade receberam mais de 20 salários mínimos no ano passado. Ou seja, 765 dos 20.496 jogadores registra- dos na CBF ganharam mais de R$ 2.720 mensais em 1999. Em 1998, a porcentagem de jogadores que integravam a elite do futebol nacional era de 4,3 %. Estas mercadorias são criadas para suprirem as necessidades huma- nas, sejam necessidades básicas ou necessidades criadas culturalmente. A mercadoria possui dois valores: o de uso e o de troca. O valor de uso diz respeito a sua utilidade, ou seja, a partir da necessidade é que se produz determinada mercadoria. Digamos que você necessita de roupa, então o produto “roupa” é criado para atender a sua necessidade, pa- ra que não passe frio em dias gelados, para que possa vestir roupas le- ves em dias quentes. O valor de troca da mercadoria serve para cumprir a necessidade da sociedade capitalista de acumular riqueza, aumentan- do o poço das desigualdades sociais entre ricos e pobres, grandes e pe- quenos consumidores. Essas desigualdades assolam, inclusive, o meio futebolístico. Assim como na sociedade, no futebol as desigualdades são enormes. Há jogadores cujo salário é superior a 5 milhões de reais por mês, co- mo é o caso de Ronaldinho Gaúcho, enquanto outros ganham o salário mínimo em pequenos times sem nenhuma expressão, nem mesmo lo- cal ou regional. Os miseráveis do futebol também engordam as estatísticas do mun- do da bola, as desigualdades e a injustiça são generalizadas, tanto no fu- tebol, quanto na sociedade. Em reportagem que retrata estas desigualdades sociais no mundo do futebol, bem como o processo transformação do futebol em mercado- ria, o jornal Folha de São Paulo publicou uma matéria em 29 de feverei- ro de 2000. Leia atentamente: 27O futebol para além das quatro linhas Educação Física Analisando as estatísticas dos últimos quatro anos, descobre-se que, enquanto o grupo que ganha até dois salários mínimos mostra uma tendência de crescimento, a parcela daqueles que recebem de duas a mais de 20 vezes esse valor apresenta inclinação contrária Em 1996, 81% dos profissionais do país recebiam até dois salários mínimos, número que pulou pa- ra 84,8% no ano passado (crescimento de 4,7%). Ocorre que a categoria dos miseráveis do futebol nacional foi engordada em 20% por atletas que, em 1996, estavam no grupo dos que ganhavam mais de dois salários mínimos (naquele ano, eles eram 19%, ao passo que hoje representam 14,7%). O fenômeno contrasta com a injeção de dinheiro observada recentemente no futebol do país, es- pecialmente no ano passado. Em 1999, o Flamengo firmou contrato com a ISL pelo qual receberá cerca de R$ 145 milhões em 15 anos (a maior parte para o futebol), enquanto o Corinthians fechou acordo com o HMTF recebendo aproximadamente R$ 55 milhões por dez anos. Cruzeiro, Grêmio, Santos e Atlético-MG também acertaram recentemente parcerias milionárias com multinacionais. A CBF fechou, em 1996, contrato com a Nike para receber US$ 160 milhões (cerca de R$ 285 mi- lhões) em dez anos. O levantamento da pirâmide salarial do futebol brasileiro é feito anualmente pela CBF, com base na palavra dos clubes. Todos os contratos são registrados, obrigatoriamente, na entidade. Mas a estatística tem distorções provocadas por clubes que não declaram o valor verdadeiro dos vencimentos. Muitos dirigentes obrigam os jogadores a assinar contratos no valor de um salário míni- mo, mas pagam por fora até R$ 1.000 – o conhecido “caixa dois” (contabilidade paralela para recolher menos imposto). Mas como isso também ocorria em anos anteriores, os dados da CBF evidenciam o empobreci- mento dos jogadores e voltam a exibir o enorme fosso que separa a minoria rica da maioria pobre. 1. Talvez você esteja pensando: “Mas esta reportagem já está defasada, antiga, hoje muitas coisas de- vem ter mudado!”. Para tirar suas dúvidas, organize com mais dois colegas uma pesquisa, buscan- do informações, em jornais, revistas e Internet, de como está configurada, hoje, a distribuição sala- rial dos jogadores. PESQUISa 2. Organize um debate junto à turma, procurando aproximar os dados encontrados na pesquisa an- terior com a realidade salarial, em geral, no nosso país. Elabore, ainda, um quadro comparativo en- tre os percentuais encontrados, organizando os maiores e menores salários, e monte um painel de apresentação. dEbatE 30 Esporte Ensino Médio Referências Bibliográficas: AZEVEDO, C.; REBELO, A. A corrupção no futebol brasileiro. In: Revista Motrivivência. Florianópo- lis: Editora da UFSC, 2001. DAMATTA, R. Esporte na sociedade: um ensaio sobre o futebol brasileiro. In: Universo do futebol: es- porte e sociedade brasileira. Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1982. GALEANO, E. Futebol ao sol e à sombra. 3. ed. Porto Alegre: L&PM, 2004. LUCENA, R.; PRONI, M. (orgs.). Da Matta: o futebol como drama e mitologia. In: Esporte e Socie- dade. Campinas: Autores Associados, 2002. MARX, K. O Capital: Crítica da economia política. 18. ed. Trad. Reginaldo Sant’Anna. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. MARX, K.; ENGELS, F. A Ideologia Alemã. 6. ed. Trad. José Carlos Bruni e Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Hucitech, 1987. NADAL, T. de. Futebol alienação das massas. In: Revista mundo jovem, Porto Alegre, ano 16, no 107, março de 1978. Documentos consultados OnLInE GUTERMAN, M. Futebol não afasta pavor do Haiti. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ folha/ilustrada/ult90u54863.shtml> Acesso em: 03 nov. 2005. RANGEL, S. Com tanta riqueza por aí, cadê sua fração? Disponível em: <http://www1.folha.uol. com.br/fsp/esporte/fk2902200001.htm> Acesso em: 04 nov. 2005. z z 31O futebol para além das quatro linhas Educação Física aNOtaÇÕES 32 Esporte Ensino Médio BRUEGEL, Pieter. Jogos infantis. Óleo sobre painel de madeira, 118 x 160,9 cm. 1560. Museu de História da Arte, Viena 35A relação entre a televisão e o voleibol no estabelecimento de suas regras Educação Física va de superação de um país sobre o outro, principalmente nos jogos olímpicos. A constante batalha, entre os países capitalistas e os chamados co- munistas, durou décadas, mas apesar de todas as conseqüências eco- nômicas, sociais e políticas da Guerra Fria, algumas inovações tecno- lógicas ocorreram e foram aprimoradas. Com o fim da Guerra Fria e a expansão territorial do mundo capi- talista, o comércio reativou atividades e tornou-se um fator decisivo na distribuição e divulgação dos novos bens de consumo. PARA VOCÊ PENSAR Se refletirmos sobre a tecnologia e suas possibilidades para o desenvolvimento da humanidade, vo- cê poderá verificar a existência de graves contradições, inerentes ao modelo de produção capitalista. Um exemplo desta contradição pode ser buscado na produção dos alimentos. Hoje, o homem produz para quase o dobro da população do globo terrestre, no entanto, o número de miseráveis cresce ainda mais, justamente com a fome. Identificar as causas destas contradições significa analisar, além da tec- nologia, qual sua utilidade e objetivos. Como as imagens de uma partida de voleibol chegam até nossas casas pela TV A facilidade que os meios de comunicação têm para levar informação ao mundo é decorrente de grandes descobertas. Como é possível que vo- cê assista a uma partida de voleibol ao vivo, ocorra ela em qualquer parte do mundo? Sabe qual é o processo de transmissão das imagens? As partidas de voleibol são transmitidas, via satélite, através das mi- cro-ondas que se propagam na camada ionosférica da atmosfera, onde os sinais transmitidos sofrem menos interferências. Os canais abertos, ou pagos de TV, usam antenas com comprimentos de onda da ordem de centímetros, sendo necessário, para a captação do sinal das micro- ondas, o formato de parábolas vindas de satélites artificiais. Os satélites artificiais são equipamentos colocados, por meio de fo- guetes, em uma órbita elíptica, tendo, como um dos focos, o centro da Terra. Os primeiros satélites postos em órbita foram o Sputnik I (4 out. 1957) e o Sputnik II (3 nov. 1957), lançados pelos soviéticos, e segui- dos pelo Explorer I (31 jan. 1958), lançado pelos norte-americanos. z Como você já deve estar imaginando, em meio a todas essas ino- vações tecnológicas provenientes do período de disputas políticas e econômicas, os meios de comunicação tiveram papel decisivo, prin- cipalmente por cumprir a função de intermediários na divulgação de novos produtos, e na criação da idéia de consumo. Para que você te- nha uma idéia da grandeza do boom tecnológico, veja o Folhas “Nós da rede”, no Livro Didático Público de Geografia. 36 Esporte Ensino Médio Os satélites são de grande importância para o mundo atual, sendo que somente os países desenvolvidos dominam a tecnologia de seus lançamentos. A maioria dos meios de comunicação utiliza os satélites como meio de propagação de sinais de rádio e televisão. As ondas ele- tromagnéticas são provenientes de uma estação geradora e lançadas para a órbita da terra, onde são recebidas por um satélite. Este, por sua vez, retransmite o sinal para uma segunda estação na terra, cha- mada receptora, muitas vezes, a milhares de quilômetros de distância da primeira. Estas inovações tecnológicas contribuíram muito para o que alguns historiadores chamaram de uma nova era. A televisão, ao levar as ima- gens instantaneamente a grandes distâncias, combina com os interes- ses do modo de produção capitalista, baseado no lucro, no consumo e na acumulação de capital. Mas você sabe o que são ondas magnéticas? Em 1865, o físico escocês Maxwell (1831-1879), apresentou qua- tro equações, conhecidas como ”Equações de Maxwell”. Essas equa- ções produziam a unificação de tudo que era conhecido sobre eletri- cidade e óptica. A partir dessas equações, Maxwell previu a existência das ondas eletromagnéticas, imaginando que elas combinavam tanto os campos elétricos como os campos magnéticos. Uma onda eletromagnética con- siste de duas ondas: uma elétrica e outra magnética. As duas ondas os- cilam perpendicularmente, uma em relação à outra, na mesma direção de propagação. ww w. ha rm on icc icl e. co m n 37A relação entre a televisão e o voleibol no estabelecimento de suas regras Educação Física Televisão: um meio de comunicação de massa Ao referirmo-nos aos meios de comunicação de massa, é impor- tante saber que estamos tratando daquelas formas mais populares de divulgação das informações. A televisão, em especial, tornou-se um meio de comunicação de massa a partir do momento que o domí- nio da nova tecnologia possibilitou à maioria das pessoas acesso aos aparelhos de TV. z Experimente encher uma banheira ou uma bacia. Com a mão, em- purre a água para cima e para baixo. Da mesma maneira uma carga elétrica em movimento cria uma onda eletromagnética, conforme fi- gura abaixo: Polarização circular para a esquerda Polarização circular para a direita No vácuo, todas as ondas eletromagnéticas têm a velocidade da luz, ou seja, 300 mil quilômetros por segundo. As ondas eletromagnéticas são classificadas segundo a sua freqüên- cia e comprimento de onda em: ondas de rádio, microondas, infra vermelho, luz visível, raios ultra violetas, raios x e raios gama. Esse conjunto de ondas constitui o que chamamos de espetro de onda ele- tromagnética. 40 Esporte Ensino Médio ww w. sx c. hu n Voleibol à moda antiga A principal característica do voleibol prati- cado antes das principais modificações de suas regras era sua dinamicidade. As partidas eram muito demoradas, o que ocasionava, ao espor- te, uma certa dificuldade de expansão, já que sua popularidade dependia também de sua es- petacularização através de um maior dinamis- mo. As regras deste esporte modificaram-se com o passar dos anos, refletindo inclusive às necessidades de seus participantes, bem co- mo do conjunto da sociedade. A seguir, acom- panhe atento algumas regras que vigoraram por muito tempo no vo- leibol e que atingiram os objetivos, de acordo com as necessidades da época. O sistema de vantagens aplicado ao voleibol era o principal proble- ma aos interesses da televisão. O ponto era marcado somente quan- do a equipe recuperasse a vantagem e, logo em seguida, confirmasse a vantagem adquirida. Se você perceber, isso se tornava um grande problema, pois partidas chegavam a durar de 3 a 4 horas. Outra característica importante da constituição das regras neste mo- mento é a possibilidade de tocar a bola com outras partes do cor- po. Era permitido o contato com partes do corpo que fossem aci- ma da cintura. O local destinado para o saque era restrito, a um espaço pré-esti- pulado, não sendo possível sua transposição. No saque, antes de 1984, era possível o seu bloqueio, sendo extinto já a partir das olimpíadas realizadas naquele ano em Los Angeles. Para a chamada recepção da primeira bola, não era permitido o contato com as mãos separadas umas das outras, caracterizando 2 toques. O saque, ao tocar a rede, era imediatamente anulado, dando a van- tagem à equipe adversária. z l l l l l l 2. Exponha as informações em edital escolar ou elabore um painel. 3. Liste os atletas que você se lembra de já terem feito comerciais anunciando algum produto na tele- visão. Depois, comente qual sua opinião a este respeito. atIVIdadE 41A relação entre a televisão e o voleibol no estabelecimento de suas regras Educação Física Este conjunto de regras sofreu transformações que possibilitaram ao jogo uma maior dinamicidade e previsão temporal. Isso teve, na mí- dia, uma grande aliada. A transição: o papel da mídia O voleibol teve a oportunidade de ampliar sua “popularidade” por meio da espetacularização efetuada na televisão, e, com isso, divulgar os produtos dos novos patrocinadores que começavam a se interessar pelo esporte. z Vale questionar alguns pontos controversos a respeito da populariza- ção do voleibol como segundo esporte mais praticado no Brasil: como explicar o fato de que alguns jogadores se mantêm por vários anos jo- gando pela seleção? Se este esporte é tão praticado em nosso país, não haveria outros jogadores de talento para renovar o time da seleção? O que contribui para essa lenta renovação? De outra perspectiva, como explicar a pouca expressividade de nos- so país nas olimpíadas? Será mesmo a falta de incentivo ao esporte? Co- mo explicar um país como Cuba, arrasado pelos embargos econômicos impostos pelos Estados Unidos, ser superior ao Brasil no quadro de me- dalhas em uma olimpíada e ainda, mais recentemente, em julho de 2007, foi segundo colocado nos XV Jogos Pan-Americanos, realizados no Rio de Janeiro? Mas voltemos à nossa intenção principal: analisar a mídia como ele- mento importante na transição do voleibol a um formato voltado ao es- petáculo. Retomemos as discussões com estes quadros: “De forma mais elaborada, Diniz e Cesar, da agência de publicidade Tops Sports Ventures, afirmam que o Voleibol apresenta uma situação estratégica para um esporte que tem a pretensão de inserir-se no campo dos negócios. Eles apontam (...) “atraentes” características básicas da modalidade. São elas: a “popularidade, garantindo público consumidor”, a “adaptabilidade à transmissões televisivas”, e a “es- trutura do esporte organizada”. (DINIZ e CÉSAR citado por MARCHI JR., 2001) 42 Esporte Ensino Médio “A mediação efetuada pela câmera televisiva construiu uma nova moda- lidade de consumo para o grande público: o esporte espetáculo.” (Betti, 2002, p. 29.) Nos textos acima, alguns termos são importantes para entender- mos o processo de transição do esporte transformado em espetáculo por meio das mudanças de suas regras para “garantir o público con- sumidor”. Em que termos a popularidade do voleibol o levou a garantir um público que consumisse seus pro- dutos? dEbatE Para que o negócio fosse completo, havia a necessidade de organizar o esporte, a partir de campeonatos e eventos, cuja finalidade era colocar o voleibol no mercado como espetáculo rentável para os investidores e agradável, dinâmico aos espectadores. Assim, o voleibol seguia suas transformações, atendendo às perspectivas do mercado e às exi- gências de ampliação e retorno financeiro. A partir das relações entre os clubes, confederações e organizadores de torneios vinculados aos interesses das emissoras de TV, o voleibol se transformou em esporte espetáculo, cujo ob- jetivo tem por trás da diversão, e simples competição, o incentivo ao consumo de grandes mar- cas esportivas, produtos variados, formas e estilos de vida, modismos e idéias. Nesse contexto, o voleibol, com a ajuda da televisão e o interesse de outros agentes envolvi- dos (dirigentes, técnicos, jogadores, etc.) passou de um esporte pouco conhecido, voltado para as classes mais abastadas, a um esporte “popular”, conhecido e praticado por pessoas de todas as classes sociais e de todas as regiões do Brasil. Tornou-se um empreendimento, marca regis- trada que rende milhões anualmente. 1. Assistir a gravação de uma partida de voleibol, ou cenas do jogo, disputado com as regras anterio- res. (Ex.: Final masculina nas Olimpíadas de 1992). Em seguida, propor um debate comparando as diferentes regras e discutir o por quê das mudanças; 2. Que tal organizar uma proposta de voleibol à moda antiga? Aqui você poderá seguir as primeiras re- gras, com as quais uma partida terminava em apenas 15 pontos, além do uso da “vantagem”. Co- mo a proposta é que o jogo seja o mais popular possível, a rede poderá ser ajustada a uma altura menor, bem como a quadra poderá ser em tamanho a sua escolha. As regras poderão ser flexíveis. Como exemplo, poderia ser permitido o toque na rede, desde que não atrapalhasse a jogada do ti- me oponente. A proposta é que se organize um festival, e isso pede música, acrobacia, invenção de novas maneiras de jogar, novos movimentos que podem ser realizados no voleibol, e até a inven- ção de novas regras. atIVIdadE 45A relação entre a televisão e o voleibol no estabelecimento de suas regras Educação Física 1. Agora, organize um novo festival de voleibol em sua aula de Educação Física, mas, desta vez, se- guindo a regra atual. Depois, elabore um relatório em seu caderno observando as seguintes ques- tões: a) Quanto tempo durou a aula? b) Que dificuldade foi encontrada durante o jogo? c) Quais foram as principais semelhanças e as principais diferenças da partida com as regras “an- tigas”, e da partida com as “novas” regras? atIVIdadE O tempo destinado às equipes também sofreu alterações. O motivo pelo qual foi instituído o chamado tempo “técnico”, no oitavo e déci- mo sexto ponto, foi oportunizar o anúncio dos produtos dos patroci- nadores para que possam vender suas imagens ao grande público. Es- sa alteração, provavelmente, tenha passado despercebida ao conjunto de espectadores, porém coloca, de maneira definitiva, o voleibol como um negócio muito interessante para os diversos investidores. Assim, não houve uma preocupação com o esporte em si. Os ca- pitalistas, donos dos meios de comunicação, imprimiram as novas re- gras ao voleibol para torná-lo mercadoria, de acordo com a exigência do mercado, sem levar em conta as opiniões dos espectadores, e mui- to menos dos antigos e atuais praticantes. 2. Utilizando-se das anotações do festival com as antigas regras, promova uma discussão em mesa redonda comparando as observações feitas entre os dois festivais. Você pode discutir, entre outras questões: quais regras facilitam mais o jogo? No que o jogo ficou mais dinâmico? Por quê? dEbatE A importância da crítica que estabelecemos aqui recai na análise que você pode fazer do voleibol como fenômeno social, e, como esta- belecemos em todo o texto, vale não só para o esporte, mas para toda a sociedade. Reflita sobre todas essas questões, e retire daqui aquelas que o deixaram mais intrigado. Vá em busca de novos questionamentos, de soluções para as dúvidas que este texto deixou. Fica o desafio. 46 Esporte Ensino Médio Referências Bibliográficas: BORDIEU, P. Sobre a televisão. Tradução. Maria Lucia Machado. Rio de Janeiro: Jorge Zarar, 1997. CHESMAM, C.; ANDRÉ, C.; MACEDO, A. Física moderna: experimental e aplicada. São Paulo: Livra- ria da física, 2004. Confederação Brasileira de Voleibol, Regras oficiais de voleibol. Rio de Janeiro: Ed.Sprint, 2005. CRUZ, G. de C. Classe especial e regular no contexto da educação física: segregar ou inte- grar? Londrina: UEL, 1997. HOBSBAWN, E. A era dos extremos: O breve século XX: 1914-1991. Tradução Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. MARCHI J. W. “Sacando” o voleibol: do amadorismo à espetacularização da modalidade no Brasil (1970 - 2000). 2001. Tese (Doutorado em Educação Física) - Universidade Estadual de Campinas, Fa- culdade de Educação Física, Campinas, São Paulo, 2001. Regras oficiais de voleibol 1995 -1997. Rio de Janeiro: Sprint, s/d. Documentos consultados OnLInE: www.diaadiaeducacao/educacaofisica/esportes Acesso em: 20 ago. 2005. www.trabajadores.co.cu/.../ noticias/28/color.htm Acesso em: 08 nov. 2005. www.vivercidades.org.br/publique/media/energiasolar1.jpg Acesso em: 08 nov. 2005. z z 47A relação entre a televisão e o voleibol no estabelecimento de suas regras Educação Física aNOtaÇÕES 50 Esporte Ensino Médio Bola na trave não altera o placar Bola na área sem ninguém pra cabecear Bola na rede pra fazer o gol Quem não sonhou em ser um jogador de futebol? (...) Que coisa linda, é uma partida de futebol Posso morrer pelo meu time Se ele perder, que dor, imenso crime Posso chorar se ele não ganhar Mas se ele ganha, não adianta Não há garganta que não pare de berrar (...) Está rolando agora, é uma partida de futebol. Música: É uma partida de Futebol. Composição: Samuel Rosa E Nando Reis n Quando pensamos em esporte na escola, pensamos diretamente na Educação Física. Esta disciplina tem-se apoiado na prática es- portiva como forma de legitimar-se nos currí- culos escolares. O esporte praticado no meio escolar serve, principalmente, como forma de socialização, mas não é explorado em to- da sua potencialidade transformadora. Neste trabalho, procuraremos, por meio de diversos questionamentos, proporcio- nar maior entendimento a respeito do espor- te competitivo: sua origem, evolução, identi- ficação com o sistema capitalista, intenções da mídia presentes nas transmissões, e dife- renciá-lo do esporte escolar para ampliar as perspectivas de uma prática pedagógica cons- ciente. Queremos também que você entenda o que está por trás do discurso da mídia e sua real intenção quando o assunto é esporte. • Escolha um esporte qualquer e escreva, em aproximadamente 15 linhas, tudo o que você sabe so- bre ele: surgimento, evolução, regras, curiosidades, entre outros. atIVIdadE Evolução do Esporte até a Profissionalização: “O esporte que conhecemos hoje é fruto de profundas transforma- ções sociais ocorridas com o advento da chamada Revolução Indus- trial na Europa dos séculos XVIII e XIX, com origens, sobretudo, ingle- sas.” (BETTI, 2004, p.17) Para entender o processo histórico em que surgiu o esporte, tão apreciado pela sociedade contemporânea, é necessário compreender algumas das transformações sociais que ocorreram naquele contexto. Entre os séculos XVI e XVIII, a sociedade européia era organiza- da em estamentos, ou seja, a posição dos sujeitos na hierarquia social era definida pelo seu nascimento. As pessoas que descendiam da no- breza tinham direitos e privilégios sociais muito maiores que o povo. Mesmo a burguesia, grupo social que se desenvolveu aos poucos, ao longo daquele período até conquistar o poder econômico, não gozava dos mesmos direitos que os nobres. z 51Eu faço esporte ou sou usado pelo esporte? Educação Física Essa situação passou a ser questionada mais intensamente, no sécu- lo XVIII, pelos filósofos franceses do movimento iluminista. Estes filó- sofos opunham-se ao poder absolutista do rei, à intervenção deste na economia, aos privilégios do clero e da nobreza e defendiam a igual- dade jurídica, a separação dos poderes e a liberdade econômica. As idéias desses pensadores influenciaram as revoluções que levaram a burguesia a conquistar o poder político, como a Revolução Francesa, ao final do século XVIII, e a organização política contemporânea. Veja o que Jean-Jacques Rousseau pensava a respeito da desigualdade en- tre os homens: Concebo na espécie humana duas espécies de desigualdade: uma que chamo de natural ou física, porque é estabelecida pela natureza, e que consiste na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do espírito, ou da alma; a outra, que se pode chamar de desigualdade moral ou política, porque depende de uma espécie de convenção, e que é estabelecida ou, pelo menos, autoriza- da pelo consentimento dos homens. Consiste esta nos diferentes privilégios de que gozam alguns com prejuízo dos outros, como ser mais ricos, mais honrados, mais poderosos do que os outros, ou mesmo fazerem-se obedecer por eles. Não se pode perguntar qual é a fonte da desigualdade natural, porque a resposta se encontraria enunciada na simples definição da palavra. Ainda menos se pode procurar se ha- veria alguma ligação essencial entre as duas desigualdades, pois isso eqüivaleria a perguntar, por outras palavras, se aqueles que mandam valem necessariamente mais do que os que obedecem, e se a força do corpo e do espírito, a sabedoria ou a virtude, se encontram sempre nos mesmos indivíduos em pro- porção do poder ou da riqueza: questão talvez boa para ser agitada entre escravos ouvidos por seus se- nhores, mas que não convém a homens razoáveis e livres, que buscam a verdade. ROUSSEAU, J-J. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade, 1775, p.12-13.n Jean Jacques Rousseaun ww w. m ala sp in a. or g n A burguesia, classe que passou a ter forte influência sobre as de- mais, utilizava-se da pratica esportiva como forma de normatizar e dis- ciplinar seus próprios filhos, a fim de prepará-los para saber controlar as tensões sociais. Ao mesmo tempo em que essa classe social buscava conquistar o poder político, consolidava-se seu poder econômico por meio da Revolução Industrial. No século XIX, com as reivindicações da classe operária para redu- ção das jornadas de trabalho, os trabalhadores obtiveram acesso a um tempo destinado ao lazer. Mas o que fazer nas horas vagas? Junto a is- so, intensificou-se o processo de urbanização que criava espaços pú- blicos. Mas como utilizar esses espaços de forma correta? A classe trabalhadora conquistou, após inúmeros enfrentamentos, a redução da jornada de trabalho e alguns direitos como o sufrágio uni- versal. Estas conquistas preocuparam a burguesia em relação à forma como os trabalhadores poderiam aproveitar o tempo de folga. Isso se- ria uma poderosa arma a ser utilizada contra ela mesma (burguesia), uma vez que com esse tempo de folga e com os espaços públicos dis- poníveis para os momentos de lazer, seria fácil a criação de movimen- tos sociais contra a classe dirigente. 52 Esporte Ensino Médio Sufrágio Universal: Está relacionado ao voto de todos os cidadãos não im- portando a classe social ou sexo: Modo de manifestar a vontade ou opinião num ato eleitoral ou assembléia, ato de exercer o direito a esta manifestação. (PINSKY, 2003, adaptado). • Você e seus colegas deverão dividir-se em grupos encarregados de pesquisar determinada moda- lidade esportiva (aquela que for de interesse do grupo) quanto a: sua origem e evolução, ressaltan- do quando passou a ser uma modalidade praticada profissionalmente (criação de sua federação); e, se for o caso, quando a modalidade passou a ser um esporte olímpico. • Ainda em equipes, pesquisem diferentes instituições sociais, como a escola, igreja, estado, clubes, associações, partidos políticos, entre outras, para saber de que forma essas instituições influenciam ou sofrem influências do fenômeno esportivo. PESQUISa Nesse sentido, surgiu a importância de incentivar a classe trabalha- dora a aderir à prática esportiva, como forma de ocupação do tempo livre, diminuindo as possibilidades de tensões sociais. “No entanto, o significado dessa prática para essas classes sociais era outro, o corpo foi o meio, caracterizando-se uma prática mais viril” (RODRIGUES, 2004). Dentro dessa perspectiva, o esporte assumiu diferentes papéis e um deles foi de elemento de socialização (para a elite), tendendo a uma prática amadora. Já para a classe trabalhadora, o esporte era pratica- do de uma forma mais combativa, aproximando-se do que viria a ser, mais tarde, o esporte “profissional”. Você está entendendo como o es- porte originou-se? Então vamos ver se é capaz de responder as ques- tões abaixo: Fo to : J . U rb an n 55Eu faço esporte ou sou usado pelo esporte? Educação Física • Compra de ingressos para assistir um evento esportivo; • Investimentos de multinacionais em marketing esportivo; • Matrícula de crianças em escolinhas esportivas com pais influenciados pela mídia; • Compra de calçados e materiais específicos para a prática esportiva. • Promova um debate em que todos devem colocar sua opinião sobre a influência da mídia nas prá- ticas esportivas. dEbatE • Pesquise quais são as formas de controle social além da mídia, e exponha a sua opinião se deve haver ou não alguma forma de controle social. Em caso afirmativo, que tipo de controle você suge- re? Justifique. PESQUISa A televisão e os meios de comunicação em geral, por influenciarem um grande público com proporções, muitas vezes incalculáveis, tor- nam-se produtores de verdades, criando crenças, ídolos e divulgando informações pertinentes aos seus interesses. Essa produção de idéias e valores é interpretada pelas pessoas como verdades absolutas, sem que haja uma reflexão crítica a respeito de tais modelos, contribuindo, assim, na formação de uma massa consumidora. Para aprofundar es- sa discussão, consulte o Folhas “Saúde é o que interessa! O resto não tem pressa!”. O Esporte na Escola:z O processo de implantação da prática esportiva no ambiente escolar aconteceu, principalmente, na década de 1970, pois alguns anos antes desse perío- do, poucas equipes nacionais conseguiram resulta- dos expressivos no cenário esportivo internacional. Nesse aspecto, Betti (1991) aponta que: 56 Esporte Ensino Médio “O esporte pareceu também ir ao encontro da ideologia propagada pelos condutores da Revolução de 1964: aptidão física como sustentáculo do desenvolvimento, espírito de competição, coesão nacio- nal e social, promoção externa do país, senso moral e cívico, senso de ordem e disciplina”. (p. 161) O esporte pareceu também ir ao encontro da ideologia propagada pelos condutores da Revolução de 1964: aptidão física como sustentá- culo do desenvolvimento, espírito de competição, coesão nacional e social, promoção externa do país, senso moral e cívico, senso de or- dem e disciplina. (BETTI, 1991, p. 161) Entendia-se, na época, que para um país destacar-se mundialmen- te, tanto política como economicamente, era necessário destacar-se também nos esportes. Desse período advém, até os dias de hoje, a im- plantação do fenômeno esportivo associado à Educação Física escolar. O quadro a seguir retrata, em parte, o que se pensava a respeito do futebol no período da ditadura no Brasil e em outros países da Amé- rica do Sul: Os generais e o Futebol “Em pleno carnaval da vitória de 70, o general Médici, ditador do Brasil, presenteou com dinheiro os jogadores, posou para os fotógrafos com o troféu nas mãos e até cabeceou uma bola na frente das câ- maras. A marcha composta para a seleção, Pra Frente Brasil, transformou-se em música oficial do go- verno, enquanto a imagem de Pelé, voando sobre a grama, ilustrava, na televisão, anúncios que procla- mavam: Ninguém segura o Brasil. Quando a Argentina ganhou o mundial de 78, o general Videla utilizou, com idênticos propósitos, a imagem de Kempes irresistível como um furacão. O futebol é a pátria, o poder é o futebol: Eu sou a pátria, diziam essas ditaduras militares. Enquanto isso, o general Pinochet, manda-chuva do Chile, fez-se presidente do Colo-Colo, time mais popular do país, e o general García Mesa, que havia se apoderado da Bolívia, fez-se presidente do Wilstermann, um time com torcida numerosa e fervorosa. O futebol é o povo, o poder é o futebol: Eu sou o povo, diziam essas ditaduras.” (GALEANO, 2004, p. 136-137) Atualmente, a razão de a Educação Física escolar apoiar-se em tal fenômeno está relacionada com a “crença comum de que a participa- ção é um elemento de socialização que contribui para o desenvolvi- mento mental e social.” (LOY et al, 1978 citado por BRACHT, 1997, p.75). Os resultados obtidos pela política esportiva da ditadura podem ser considerados um desastre quase social. Ao utilizar-se do esporte nas aulas de Educação Física, muitas vezes a “(...) escola tende a reproduzir os discursos e soluções apontadas pe- la mídia. Não promove um diálogo. Apenas reforça a obtenção de in- formação compacta e fácil em detrimento de uma reflexão crítica. Essa situação gera uma ausência de significados (...)” (GOMES, 2001). 57Eu faço esporte ou sou usado pelo esporte? Educação Física • Pesquise sobre o cenário político e econômico que envolvia o país no período que antecedia a Co- pa de 1970, quando o Brasil tornou-se tri-campeão mundial no futebol. Ressalte ainda elementos que identifiquem influências da política nacional sobre este acontecimento. PESQUISa O esporte escolar deve estar caracterizado como “Esporte Educação” e não como “Esporte na Escola”. Do ponto de vis- ta prático, o esporte não pode ser negado, mas sim utilizado de forma que desperte no aluno interesse e prazer e tenha uma intencionalidade educativa, nunca o jogo pelo próprio jo- go. Você não acha mais interessante jogar “com” do que jo- gar “contra”? Obtenha mais informações sobre esta propos- ta no Folhas de jogos intitulado “Competir ou cooperar: eis a questão”. A prática esportiva deve propiciar a você uma com- preensão mais ampla sobre as relações sociais, às quais, constantemente, somos submetidos. Para que, por meio do esporte, possamos entendê-las de forma mais crítica e autô- noma, tornando-nos donos de nosso próprio entendi- mento. E então? Você já é capaz de responder ao problema inicial: “Você faz uso do esporte ou é usado pelo esporte”? Nesta atividade, tentaremos desviar o esporte das características competitivas, através de um en- foque cooperativo. O jogo chama-se “Handebol Cooperativo”. A seguir, explicitaremos como se desen- volve a atividade proposta. 1º. Divide-se a turma em equipes de 5 a 6 jogadores cada, organiza-se uma espécie de campeonato ou torneio, que pode durar uma ou mais aulas, dependendo do interesse da turma. 2º. O jogo é semelhante às regras do handebol, o que muda é a pontuação: • cada gol vale 1 ponto; • cada 10 passes consecutivos da mesma equipe valem 3 pontos; • cada assistência ao capitão vale 1 ponto; • cada gol do capitão, 5 pontos. atIVIdadE 60 Jogos Ensino Médio Intr dução I n t r o d u ç ã o Jogos Falar sobre o jogo, enquanto manifestação da cultura corporal, sig- nifica traçar o que tal Conteúdo Estruturante foi desde sua constituição até a atualidade, para refletir sobre as possibilidades de recriá-lo por meio de uma intervenção consciente. Os jogos existem desde a pré-história e seus registros indicam as mais variadas formas de jogar, nas diversas partes do mundo. Como forma de manifestação da cultura de povos na Ásia, na América pré- colombiana, na África, na Austrália e entre os indígenas das ilhas mais longínquas do Oceano Pacífico, foram encontrados jogos de expressão utilitária, recreativa e religiosa (RAMOS, 1982, p.56). Alguns jogos passaram por alterações e muitos deles vieram compor um elenco de modalida- des que mais tarde foram disputadas nos Jogos Olímpicos da Grécia antiga. Este último evento tinha, em sua origem, como um dos princí- pios, a finalidade de aclamar os deuses do Olimpo. Porém, muito anterior a este evento, desde o surgimento do ho- mem, há registros de jogos, encontrados em paredes de cavernas espa- lhadas pelo mundo. Este fato retrata a necessidade que já se apresen- tava de dar aos momentos de luta pela sobrevivência (atividades como a caça e pesca) um caráter lúdico. O jogo, analisado a partir dos fundamentos teóricos da Cultura Cor- poral, caracteriza-se pela espontaneidade, flexibilidade, descompro- z Calcio fiorentino - Fußball in Florenz im 17. Jahrhundertn 61Competir ou cooperar: eis a questão! Educação Física E D U C A Ç Ã O F Í S I C A misso, criatividade, fantasia e expressividade, representadas de diver- sas formas, próprias de cada cultura. As regras existem sem a rigidez aplicada aos esportes, mas são previamente discutidas e combinadas pelos participantes, que poderão modificá-las ou não, de acordo com o interesse do grupo. O jogo é uma atividade livre que deve ser realizada sem o caráter da obrigatoriedade. Possibilita a liberdade e a criação, permitindo o surgimento de outras formas de jogar, implica um sentido e um signifi- cado que, com o tempo, passam a fazer parte da cultura do grupo, co- munidade, povo ou nação que o inventou. Você pode perceber isto se buscar um jogo que é típico em sua região, mas que poderá ter carac- terísticas diferentes ou nem existir em outra região do país. Sua importância, enquanto Conteúdo Estruturante da disciplina de Educação Física, está na representação das raízes históricas e culturais de diversos povos, bem como as transformações ocorridas ao longo do tempo que possam ter causado modificações no modo como se joga determinado jogo em várias partes do mundo. É importante, também, considerar o jogo em seu processo de criação, recriação e readapta- ção, levando-se em conta as possíveis influências políticas, econômi- cas e sociais pelas quais tenha passado, dando-lhe uma nova configu- ração e uma compreensão crítica. Enfim, é uma produção humana que tem um “(...) significado dentro da produção coletiva dos homens vi- vendo em sociedade” (BRUHNS, 1996, p.29). O jogo, enquanto fenômeno social, está relacionado aos processos de produção que aconteceram desde sua invenção. A integração entre as atividades relacionadas ao trabalho e o jogo se manifestavam possi- bilitando perpetuação de hábitos transmitidos de geração em geração. Você percebe o quanto os jogos tinham e têm um significado impor- tante na vida dos seres humanos? Com as novas possibilidades de desenvolvimento da economia, desde o final do século XVIII, e com a intensificação da produção in- dustrial, os valores se modificaram, impondo alterações no modo e nas condições de vida. A classe dominante condenava as atividades popu- lares, como os jogos, pois viam nelas uma ameaça à ordem imposta pelo modo de produção capitalista. Para a elite (econômica, política e 62 Jogos Ensino Médio Intr dução I n t r o d u ç ã o intelectual), o jogo, além de provocar “desvio de atenção sobre a vida santificada”, não contribuía para o restabelecimento das forças neces- sárias para a retomada do trabalho. Percebendo as potencialidades desse caráter de insubordinação e de criação inerentes ao jogo, a classe dirigente procurou dar destaque ao esporte e minimizar a importância social do jogo. Nesse contexto, surgiu a padronização do esporte que objetivava disciplinar por meio da aceitação da idéia de que regras rígidas devem ser seguidas por to- dos, para o bem e a ordem social. Sobre esporte, você pode buscar in- formações interessantes no texto de apresentação desse conteúdo es- truturante e seus respectivos Folhas. Apesar das interferências históricas, políticas e econômicas, o jogo praticado atualmente ainda apresenta algumas características originais, especialmente quanto ao seu caráter lúdico e espontâneo. Você já observou com que prazer as crianças, adolescentes e adul- tos jogam futebol na rua ou num espaço improvisado qualquer? Você e seus colegas jogam vôlei, basquete ou qualquer outra modalidade apenas para se divertir, criando regras próprias acordadas por todos? Será que, mesmo de maneira descontraída e sem regras rígidas, vo- cê não estaria jogando para competir? E com quem você estaria com- petindo: consigo mesmo para superar-se ou com o outro para provar quem é o melhor? 65Competir ou cooperar: eis a questão! Educação Física 4 COMPETIR OU COOPERAR: EIS A QUESTÃO! Cristiane Pereira Brito1n Seria o ser humano naturalmente competitivo ou o meio o influencia para que se torne assim? As relações sociais nos conduzem à competição, fazendo-nos provar, o tempo todo, que somos os melhores em alguma coisa? Será que a escola tornou-se um ambiente que também promove a competição valorizando ape- nas aqueles que se sobressaem? Os esportes e os jogos só se aplicam de maneira competitiva? É possível diferenciar o esporte do jogo? 1Colégio Estadual André Andreatta. Quatro Barras - PR 66 Jogos Ensino Médio O exemplo dado retrata a forma como o mecanismo da competi- ção se desenvolveu nas empresas, com a intenção de obter lucros ca- da vez maiores. O capitalismo apresenta algumas características, sobre as quais vo- cê, possivelmente, já ouviu falar. Uma delas é a competição desenfrea- da pela conquista de mercado cada vez mais amplo no mundo globali- zado. Outra característica é a exploração do trabalho com o objetivo de aumentar os lucros da empresa capitalista. Podemos verificar tal exploração no salário recebido pelos trabalhadores. Os produtos do trabalho dos empregados ge- ram, para a empresa, lucros cujo montante ultrapassa mui- to o valor dos salários que recebem. Para que continuem produzindo, cada vez mais, alguns patrões estimulam a competição entre seus empregados. Trata-se, então, de uma sociedade onde poucos ganham muito e muitos ga- nham pouco. Esta mesma relação pode ser percebida no esporte. O esporte beneficia poucos oferecendo um espetáculo de entretenimento e diversão para muitos que lotam estádios e ginásios e pagam por isso. Os mandantes do mundo es- portivo enriquecem ao explorar suas equipes subordinadas em competições municipais, estaduais, nacionais e inter- nacionais. Delas são cobrados resultados, além imporem extensas jornadas de treinamentos. Treinar e jogar são deveres do atleta, portanto, o tem- po que ele gasta fazendo isso deve ser cada vez maior, para que o time seja sempre vitorioso – esta é a explo- ração sofrida por ele. Um dirigente industrial, no momento de receber uma distinção honorífica da Academia do Comércio de uma determinada cidade, diz o seguinte: “Desde minha entrada nesta companhia tem havido uma autêntica cor- rida entre os técnicos e o departamento de vendas. Os primeiros procuram produzir mercadoria em quantidade tal que o departamento de vendas se- ja incapaz de vendê-la completamente, enquanto os membros do segun- do procuram vender tanto que os técnicos se vejam na impossibilidade de acompanhar o ritmo. Esta corrida jamais parou, às vezes, tendo uns à frente, outras, os outros. Tanto meu irmão como eu nunca consideramos o negócio como um trabalho e sim como um jogo, cujo espírito sempre nos temos es- forçado por incutir no pessoal mais novo”. Fonte: HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. São Paulo. Editora Perspectiva, 1996. 4 ed., p. 223. n Analise a seguinte situação: 67Competir ou cooperar: eis a questão! Educação Física O jogo tem se transformado numa atividade competitiva institucio- nalizada, regida por um conjunto de normas e controlada por orga- nizações que promovem o desenvolvimento das modalidades, aten- dendo aos interesses do modo capitalista de produção. Nos grandes eventos esportivos internacionais, pode-se dizer que a confraterniza- ção entre os povos acontece, mas a competição é um dos seus princi- pais objetivos. Porém, quem são os maiores beneficiados com toda es- ta situação? Reflita sobre esta questão. Para que a competição seja possível, é necessário que haja compe- tidores. Tomando o esporte e a sociedade capitalista como referência para compreendermos um pouco da natureza humana quanto sua ten- dência à competição, veremos o que pensam alguns autores a respei- to. Antes, realizem as atividades propostas: Junto com seus colegas, organize uma minicompetição que possa ser finalizada em, no máximo, duas aulas, com as seguintes características: • todos de sua turma devem participar; • evitem fazer o evento em data que já tenha outro programado. O mo- mento deve ser apenas de sua turma; • escolham um esporte que seja de conhecimento geral. Determinem o tempo; • formulem regras claras que não possam ser alteradas. A arbitragem se- rá responsabilidade da organização; • escolham um local apropriado e previamente preparado para a organiza- ção do evento; • estipulem um prêmio para as equipes masculinas, femininas ou mistas que ficarem em primeiro lugar; • a inscrição prévia é obrigatória, e deve ocorrer antes da data do evento. Organização é fundamental; • promovam uma premiação especial ao aluno e à aluna que mais se des- tacarem durante a competição. *Lembrem-se de motivá-los a participar. A propaganda é a alma do negócio. atIVIdadE • Depois de concluída a competição, investiguem como os competidores se sentiram diante da rea- lidade competitiva, solicitando que manifestem sua opinião quanto à clareza das regras e às possí- veis injustiças cometidas pela arbitragem. PESQUISa 70 Jogos Ensino Médio A influência cultural que se apresenta nas competi- ções tem suas raízes manifestadas em países como a Chi- na, onde “na fase mais primitiva os clãs rurais celebravam as festas das estações por meio de competições destinadas a favorecer a fertilidade e o amadurecimento das colheitas. Quase todas as atividades assumiam a forma de competição ritual: atravessar um rio, escalar uma montanha, cortar ár- vores ou colher flores”. (ibidem, p. 62-63) Por outro lado, a positividade da competição está em alguns motivos que movem os competidores, tais co- mo: a necessidade de reconhecimento, a demonstração de superioridade de uns diante de outros e a superação dos li- mites individuais. Você já passou por algumas discussões sobre competição e deve tentar evitar que este seja o único objetivo nas aulas de Educação Física. O jogo é parte da cultura e a competição é um dos elementos que o constituem, das civilizações mais antigas às mais modernas. • Você conseguiu perceber que as relações (conflito, consenso, imposição, sucesso, fracasso etc.) que se produzem numa atividade competitiva organizada são, de certo modo, reproduções da luta de classes e de lutas dentro de uma mesma classe? • Quantas pessoas tinham o “controle” sobre o que acontecia durante o pequeno evento? • Como você e seus colegas da organização se sentiram com o “poder” de controlar tudo? • Analise os dois pontos de vista apresentados pelos autores (Huizinga e Chauí) e escreva o seu quanto à questão da competição. atIVIdadE E em nossa escola, como se configuram estas questões relaciona- das à competitividade e natureza humana? Será que ela tornou-se um ambiente que também promove a competição sem limites? Vamos pes- quisar sobre essas questões, para que não se tenham dúvidas sobre o assunto? Entreviste colegas de sua sala e de outras perguntando-lhes sobre as seguintes questões: • Você percebe a existência da competitividade nas aulas de Educação Física? PESQUISa 71Competir ou cooperar: eis a questão! Educação Física • E nas demais disciplinas, a competição também ocorre? • Em ambos os casos, se ocorrem a competição, ela é motivada por alunos ou por professores? • O ambiente escolar é o local mais propício para que ocorra competição de qualquer natureza com o outro? Pode haver um tipo de competição onde o resultado não seja vencedor e derrotado? • Reflita sobre os problemas levantados, tire suas conclusões e faça um relatório geral sobre o tema. Jogo e esporte: tão diferentes assim? Em que termos o esporte se diferencia do jogo? Será mesmo que são tão distintos quanto possa parecer? Ou são tão parecidos que os confundimos, tratando-os como sinônimos? Pode-se dizer que o jogo se diferencia do esporte quando ao pri- meiro imprimimos um caráter lúdico, realizado por meio de uma ati- vidade voluntária que pode ser modificada a qualquer tempo, inter- rompida a qualquer instante e transferida a qualquer hora. O jogo não deve estar sujeito a ordens ou regras rígidas, a não ser nos casos em que represente uma atividade cultural com a finalidade de perpetua- ção de hábitos dos mais diversos povos. Ou seja, o jogo tem como ca- racterísticas marcantes a liberdade e o prazer. Ao mencionarmos o lúdico como elemento diferencial entre espor- te e jogo, cabe uma simples pergunta: o que é lúdico? Vejamos o que alguns autores apontam sobre este conceito que em muito diferencia o jogo do esporte. É importante que você perceba o que aproxima estes autores sobre a profundidade deste conceito e o que os afasta, podendo assim, formar seus próprios conceitos. z www.diaadiaeducação.pr.gov.brn Lúdico ou atividade lúdica: • Identifica-se o lúdico em diferentes esferas da vida social, considerando-o, fundamental- mente, como o jogo, uma atividade não sé- ria, mas absorvente para o jogador, desligada de interesses materiais e praticada de acordo com regras de ordem (organização), tempo e espaço, e cuja essência repousa no diver- timento. Sendo parte integrante da vida em geral, possui um caráter desinteressado, gra- tuito e provoca evasão do real (HUIZINGA, in: FENS- TERSEIFER, P. E. e G.; Fernando J. (orgs). Dicionário crítico de educa- ção física. Ijuí: Editora Unijuí, 2005., p. 270). Atividade lúdica: voleibol de praia Fonte: wikipedia (This file has been relea- sed into the public domain by the copyright holder, its copyright has expired, or it is ineligible for copyright. This applies worldwide). n 72 Jogos Ensino Médio • Algo concernente à cultura do homem, haja vista que é pelo jogo que a humanidade se desenvolve e é exatamente este fator que diferencia o homem dos animais, dando-lhe a possibilidade da auto- nomia e da criatividade (CHATEAU, in: FENSTERSEIFER, P. E. e G.; Fernando, J. (orgs). Dicionário crítico de educação física. Ijuí: Editora Uni- juí, 2005. p. 270). • Atividade lúdica pode ser entendida como prática das relações sociais, como produto coletivo da vida humana, podendo se manifestar no jogo, no brinquedo e na brincadeira, desde que possua caracte- rísticas como desinteresse, seriedade, prazer, organização, espontaneidade (BRUHNS, in: FENSTERSEIFER, P. E. e G.; Fernando, J. (orgs). Dicionário crítico de educação física. Ijuí: Editora Unijuí, 2005. p.270). • Contrapondo-se à autora acima, “justamente por não ser sério é que se torna importante”, pois o lúdico, enquanto exercício individual carregado de emoções, densidade, enigmas e significados, é algo que provoca o imaginário e a sensibilidade (Oliveira in: Dicionário de Educação Física, p.270). • “É uma das essências da vida humana que instaura e constitui novas formas de fruir a vida social, marcadas pela exaltação dos sentidos e das emoções” (WERNECK, In: FENSTERSEIFER, P. E. e G.; Fernando, J. (orgs). Dicionário crítico de educação física. Ijuí: Editora Unijuí, 2005. p. 271). Diferente do esporte, o jogo não deve estar vinculado à necessida- de física ou ao dever moral de representar alguma instituição ou gru- po. Nunca constitui uma tarefa, sendo praticado nas horas vagas. Al- gumas características poderão auxiliá-lo a compreender melhor o que coloca o jogo em situação distinta do esporte. Segundo Huizinga: Distingue-se do esporte pelo simples fato de que, ao se iniciar o jogo, pode ser finalizado a qualquer tempo; É construído de maneira coletiva e na medida em que é incorporado aos hábitos de determinado grupo, po- vo ou população, torna-se fenômeno cultural; Deve ser livre; O caráter social do jogo torna-o uma necessidade re- gular como se fosse um complemento, um hábito ne- cessário na vida do jogador; É uma atividade desligada de todo e qualquer interes- se material, com o qual não se objetiva obter lucro. Você deve estar se perguntando: mas o que é o es- porte, então? Veja o quadro abaixo e faça uma compa- ração com as origens do jogo e com o que você leu nas primeiras páginas deste trabalho em relação aos conflitos de classes e ao capitalismo, observando as relações que daí decorrem: 75Competir ou cooperar: eis a questão! Educação Física Pessoa Para Pessoa *Para cooperar é preciso aproximar-se mais uns dos outros e da gente mesmo. Que tal jogarmos para diminuir a distância e desfazer as barreiras que nos distanciam? • Participação: joga-se com um único grupo e com a participação ilimitada. • Espaço: aberto ou fechado, compatível com o número de participantes e livre de obstáculos. • Como fazer: reúnam toda a turma e comecem sugerindo a um colega que, em voz alta, diga como as ações devem ser feitas. Sugerimos chamá-lo de focalizador. • O focalizador deve pedir que todos explorem suas possibilidades de movimentar-se de maneiras va- riadas pelo ambiente (passos largos, passos curtos, saltando em um pé só, rastejando, ou seja, use sua criatividade). • Depois de alguns minutos, o focalizador deverá falar em voz alta duas partes do corpo (mão na tes- ta, dedo no nariz, orelha com orelha, cotovelo na barriga, etc.). • A este estímulo, todos deverão formar uma dupla e tocar, um no outro, as partes do corpo faladas pelo focalizador, o mais rápido possível, lembrando que você tocará em uma pessoa no local indi- cado e ela tocará você também no local indicado. • Quando todos estiverem em duplas e tocando as partes faladas, o focalizador reinicia o processo, propondo a caminhada livre e criativa. • Após 2 ou 3 dessas combinações, que devem variar, o focalizador pode dizer em voz alta o nome do jogo: “Pessoa para pessoa”. • Nesse momento, todos – inclusive o focalizador – devem formar uma nova dupla e abraçar um ao outro, para garantir o encontro. • Com a entrada do focalizador diretamente no jogo, poderá haver um desequilíbrio numérico: alguém poderá ficar sem par. Como resolver o problema? Uma possibilidade é trabalhar em duplas, trios, quartetos ou conforme o grupo sugerir, desde que não fique ninguém de fora. Outra sugestão é que aquele que não tiver dupla seja, por um curto período de tempo, o focalizador que irá reiniciar o jo- go servindo ao grupo, ao invés de ser servido por ele, evitando-se o castigo ou a exclusão. (*Esta atividade foi retirada do livro: Jogos Cooperativos de Fábio Otuzi Brotto, 2002, p. 131-132.) Para você refletir e conversar com seus colegas: 1. Que dificuldades surgiram ao longo da atividade? 2. Estas dificuldades foram solucionadas? Como? 3. Quem participou com sugestões para a solução das dificuldades? 4. A maioria de nós tem dificuldades para tocar nas pessoas. Isso aconteceu? Por quê? 5. Como o grupo ajudou as pessoas tímidas a entrarem na brincadeira? 6. Faça uma comparação entre as diferenças desta atividade em relação à primeira que você fez. atIVIdadE Vamos exercitar esta nova forma de vivenciar o jogo? 76 Jogos Ensino Médio Para que você perceba o quanto pode ser prazeroso fazer uma ati- vidade que envolva ações cooperativas, aqui vai mais uma atividade que possibilita a interação com este tipo de jogo, fazendo com que vo- cê e seus colegas reflitam, um pouco mais, sobre o assunto: O Barco Cooperativo. • Para realizar esta atividade, você e seus colegas irão precisar de canetas coloridas, papéis, ven- das e algo para imobilizar os membros superiores. • Para iniciar a atividade, divida sua turma em grupos formados por cinco pessoas que deverão posicionar-se sentadas no chão. Caso alguém fique sem grupo deverá participar auxiliando uma pessoa que irá conduzir as ações. Esta pessoa poderá ser seu professor ou sua professora de Educação Física. • A tarefa é simples: desenhar um barco num tempo de 5 minutos. • Cada participante fará uma ação de cada vez, passando em seguida o desenho para o outro participante e assim por diante. Cada um, na sua vez, poderá fazer apenas um traço no papel, até que o desenho esteja concluído ou o tempo tenha acabado. Simples, não é? • Além de poder fazer apenas um traço por vez, os participantes também deverão ter as seguin- tes características individuais: o participante 1 é cego e só tem o braço direito; o participante 2 é cego e só tem o braço esquerdo; o participante 3 é cego e surdo; o participante 4 é cego e mudo e o participante 5 não tem os braços. 1. Para desempenhar estes papéis, o focalizador pede que os grupos escolham quem será 1, 2, 3, 4 e 5, entregando as vendas para os olhos e tiras de pano para amarrar os braços de quem for esco- lhido como número 5. 2. Quando os grupos estiverem prontos, o focalizador iniciará a contagem do tempo, deixando que os grupos façam a atividade sem interrupção, permanecendo em silêncio até que o tempo se esgote. 3. Todas as dúvidas que surgirem devem ser esclarecidas pelo próprio grupo e poderão ser retoma- das posteriormente em discussão com o grande grupo. 4. Após o jogo, cada grupo deverá apontar quais foram as dificuldades encontradas, os desafios su- perados e as formas de cooperação colocadas em prática. Dica: inicialmente, vocês podem fazer esta atividade sem que ninguém represente os papéis pro- postos com as necessidades especiais apresentadas. Depois de se familiarizar com a atividade, num segundo momento, daí sim seria interessante distribuir os papéis que cada um deverá desempenhar. Lembre-se de que usar a criatividade é fundamental em todos os momentos da atividade. (**Esta atividade foi enviada para a Revista dos Jogos Cooperativos, 3 ed., 2003, p.21, por Ana Paula Perón e passou por algumas alterações.) atIVIdadE 77Competir ou cooperar: eis a questão! Educação Física Nosso objetivo, nesse Folhas, foi lhe possibilitar a análise e a reflexão sobre o problema que levantamos inicialmente. Encerramos provocando-lhe, mais uma vez, com o texto abaixo, de Fábio Otuzi Brotto: “Exercitando no Jogo e no Esporte a reflexão criativa, a comunicação sincera, a tomada de decisão por con- senso e a abertura para experimentar o novo, todos po- dem descobrir que são capazes de intervir positivamen- te na construção, transformação e emancipação de si mesmos, do grupo e da comunidade onde convivem. (BROTTO, Fábio Otuzi. Jogos Cooperativos: o jogo e o esporte como exercício de convivência. Santos: Projeto Cooperação, 2001, p. 63) Referências Bibliográficas: BROTTO, F. O. Jogos cooperativos: o jogo e o esporte como exercício de convivência. Santos: Projeto Cooperação, 2001. _________. Jogos cooperativos: se o importante é competir, o fundamental é cooperar. São Paulo: Cepeusp, 1995 / Santos: Projeto Cooperação, 1997 (ed. Renovada). BROWN, G. Jogos cooperativos: teoria e prática. São Leopoldo: Sinodal, 1994. BRUHNS, H. T. O jogo nas diferentes perspectivas teóricas. In: Revista Motrivivência, Florianópolis, ano VIII, nº 9 , Dezembro/1996. CHAUI, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2003. FENSTERSEIFER, P. E. e G.; Fernando, J. (orgs). Dicionário crítico de educação física. Ijuí: Editora Unijuí, 2005. HUIZINGA, J. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 4 ed. São Paulo: Perspectiva, 1996. IWAYA, M. Instituição escolar. In.: Livro Didático Público de Sociologia. Curitiba/PR: Secretaria de Estado de Educação do Paraná, 2006. LOVISOLO, H. O princípio da cooperação. In: Conferencia Brasileira do Esporte Educacional. Rio de Janeiro, 1996. MARX, K. Manuscritos econômico-filosóficos. Tradução (do alemão) Jesus Ranieri. São Paulo: Boitempo, 2004. PINTO, L. M. S. de M. Sentidos do jogo na educação física escolar. In: Revista Motrivivência, Florianópolis, ano VIII, nº 9 Dezembro/1996. z 80 Jogos O grande jogo O jogo será constituído por três estações que você percorrerá com seus colegas com a finalidade de realizar os desafios propostos. A ca- da estação realizada, você deverá dirigir-se à próxima, até que tenha transcorrido todas as três. A turma deverá ser divida em três equipes e cada uma deverá ter um nome. O enredo da nossa história começa numa região onde viviam mui- tas pessoas advindas de diversas localidades, unidas por um único ide- al: descobrir o paradeiro da cidadania. As pessoas que ali viviam es- tavam bastante desorientadas, cansadas das ordens absurdas do chefe daquela região e decididas a retirá-lo do poder. Para tanto, era preci- so que a cidadania fosse recuperada, conforme alertou o grande mes- tre da região: “Somente quando o povo descobrir sua identidade, terá condições de reconquistar o poder. E isso só ocorrerá quando encon- trarem a cidadania”. As leis criadas pelo poderoso chefe não consideravam a po- pulação, mas atendiam somente os interesses de algumas pessoas importantes. A população mais pobre era obrigada a cumprir as ordens sem questionar, sob a justificativa de que todos eram res- ponsáveis pelo bom desempenho da região por meio do cum- primento dos deveres impostos pelo grande chefe, os quais en- volviam leis e regras visando à ordem. É importante ressaltar que essas medidas eram tomadas por um grupo de pessoas que se reuniam em locais fecha- dos, quase sempre sem a participação do povo e que as leis e regras visavam aos interesses da elite. Era costumeiro, na- quela região, que o salário da população pobre fosse deci- dido pela elite, o que fortalecia as desigualdades. Para que nossa história continue, é preciso que você destaque da turma alguns personagens: o mestre, que se- rá o condutor da atividade e dará as orientações para as equipes. Sugerimos que este personagem seja seu professor ou sua professora. z Mestre Ensino Médio O jogo é jogado e a cidadania é negada Agora que você já sabe como será nossa história, que personagens serão necessários para que o jogo se realize, é hora de conhecer um pouco sobre a cidadania, e alguns dos elemen- tos que a constitui. Iniciamos nossa viagem no tempo, da Grécia Antiga até o período Contem- porâneo, passando pela Idade Média e ainda pela Revolução Francesa. Antes disso, o convida- mos a conhecer o jogo jogado e o jogo jogante. O/A Homem/Mulher do tempo: terá o papel de ficar na estação da História da cidadania. Será o responsável por julgar as equipes quando cumprirem a prova determinada para tal estação. Aluno/a de Educação Física: será o res- ponsável para julgar as equipes que pas- sarem pela segunda estação com o obje- tivo de cumprir a prova. O grande Cidadão: Será responsável por julgar as equipes que passarem pela estação referente aos direitos e deveres. O chefe: deverá impedir que o obje- tivo do jogo seja atingido. Para tanto, deverá elaborar leis que confundam os participantes dos outros grupos. Educação Física 81 82 Jogos Ensino Médio O Jogo jogado e o jogo “jogante” Talvez você se pergunte o que um jogo teria a ver com a cidadania. Façamos uma comparação pensando num jogo que envolva muitos jo- gadores. Podemos compará-lo com as relações que se estabelecem en- tre os grupos e as classes de uma sociedade. Tanto para os participan- tes do jogo quanto os das diferentes classes sociais há regras a serem seguidas, lógicas pré-estabelecidas, valores considerados importantes, etc. Essas coisas já estabelecidas organizam o “jogo jogado” (FALCÃO, 2006). Quando queremos mudar as regras, as lógicas, e propor novos valo- res, temos que criar o “jogo jogante”, aquele que pressupõe uma trans- formação no jogo jogado ou na organização social dada. Tendo como perspectiva mecanismos que possibilitem a transfor- mação do jogo jogado, propomos que se elabore, aos poucos, o jogo jogante – aquele que ainda está em construção e transformação. Discutir sobre o conceito de cidadania e suas faces tem estreita rela- ção com o jogo jogado, porém é fundamental, se quisermos jogar o jo- go jogante, visualizar formas alternativas de viver na atual sociedade. Se você estabelecer a relação do jogo jogado com a prática corporal, terá como visualizar o que estamos falando. Pense num jogo que, por princípio, tenha como características a exclusão e o individualismo (va- lores bastante difundidos no jogo jogado pela atual sociedade). Tal jogo, ou brincadeira, poderia ser a simples dança da cadeira. Quem não senta a tempo na cadeira, sai do jogo, certo? No entanto, se procurarmos intro- duzir, nesta brincadeira, valores que possam se manifestar no jogo jogan- te – aquele que ainda está por vir –, teremos condições de torná-lo mais interessante, possibilitando a participação de todos, sem que nenhum jo- gador fique à margem das ações tomadas. Poderia, portanto, tirar uma cadeira, ao invés de um jogador, fazendo com que as pessoas chegassem a um acordo a fim de que todos continuassem na brincadeira. Este exemplo deixa mais clara a relação entre o jogo jogante e o jo- go jogado? Qual seria a nova lógica do jogo/dança das cadeiras? Qual seria o sentido da dança? O que se pretende com tais formas de se jo- gar, e o que isso representa na atual sociedade? A partir de agora, o jogo começa para valer, esperamos que você esteja preparado para essa aventura, aproveite, corra bastante, divirta- se e aprenda um pouco mais sobre “a cidadania perdida”! z Primeira estação: Que História é essa de Cidadania? O conceito de cidadania possui amplo significado, abrangendo vá- rias dimensões, as quais vêm se constituindo ao longo dos anos. Você sabia que é possível distinguir uma cidadania para o indivíduo e ou- tra para a coletividade? z 85O jogo é jogado e a cidadania é negada Educação Física as terras, o título registrado e elevando mui- to o valor das propriedade rurais. Assim, para se tornar proprietário de terras, era preciso ter muito dinheiro em mãos, o que impossibilita- va os pobres e os ex-escravos de tornarem-se donos de áreas rurais. Vale lembrar de que a propriedade capita- lista, na época, estava sustentada por valores liberais, como: liberdade, fraternidade e igual- dade. Ora, se liberdade era um valor universal naquela época, como explicar que alguns te- riam possibilidades de possuir terras e outros não? Simples, pelo conceito liberal de cidada- nia. Somente possuiriam terras aqueles que se enquadrassem nas de- terminações necessárias ao que se entendia por cidadão. Dessa forma, ficavam de fora desse conceito os trabalhadores que possuíam tão so- mente seus braços para trabalhar. Devido a isso, ser cidadão naquele momento era um privilégio de alguns e não de outros. Pode-se fazer um paralelo entre exclusão social e as práticas corpo- rais de suas aulas de Educação Física. Digamos que hoje sua aula é de qualquer esporte, seja futebol, voleibol, enfim, qualquer dos chama- dos “bols”. Se você é um grande praticante, teve uma vasta experiência motora nesta modalidade, logo fica entusiasmado, já que terá oportu- nidade de praticar o que mais gosta de fazer. Por outro lado, seu cole- ga, que não teve a mesma oportunidade de experimentar esta modali- dade, seja por falta de interesse ou qualquer outro motivo, não terá o mesmo entusiasmo, certo? Imagine agora a cena da aula se construindo, você começa a jogar. Antes disso, logicamente escolhe os melhores colegas, aqueles que co- mo você tiveram oportunidade de praticar a mesma modalidade, ad- quirindo habilidades motoras condicionantes com sua prática. A aula começa, você joga por 40 minutos, chega a cansar, suar, e pede para descansar um pouco. Termina a aula e você pensa: “puxa vida, hoje eu joguei bem. Nossa, como joguei!”. CÂNDIDO PORTINARI, Café, 1935, óleo sobre tela, 130x195 cm; Museu Nacional de Belas Artes; Rio de Janeiro. n 86 Jogos Ensino Médio Parece-lhe uma cena normal, natural, sem maiores implicações, cor- reto? Ainda pode perguntar o que esta história tem a ver com o prin- cípio comentado acima sobre a exclusão, na concepção de cidadania elaborada no início do capitalismo em nosso país. Bem, vamos retroce- der um pouco a fita e lembrarmos dos personagens dessa história. Havia você, um belo praticante da modalidade esportiva, mas havia também aquele/a seu/sua colega que não teve contato suficiente com a modalidade, lembra? Pois bem, agora preste atenção na versão dele/ a da aula de Educação Física: Bem, ele/a chegou no local onde a Educação Física ocorreria, es- tava ao seu lado, observou você escolher os/as melhores/as jogado- res/as e, sabendo que não seria escolhido/a, dirigiu-se a um local para se sentar e observá-lo/a jogar. Ele/a ficou toda a aula sentado/a, sem oportunidade para jogar, excluído/a de toda a prática desenvolvida nos 40 minutos que você jogou. Mas como você tem argumento para tudo, deve responder: “Sim, mas ele/a não jogou porque não quis, e tem mais, ele/a é ruim mesmo”. Ou “mulher não sabe jogar, só serve para assistir, torcer por nós”. Contrariamente aos seus argumentos, acreditamos que este/a seu/ sua colega não domina os movimentos básicos do jogo por não ter oportunidade. As pessoas se constroem, ou seja, são o que são, em função das oportunidades que tiveram e têm. Exclusão do cidadão, exclusão do aluno, será que a vida imita a ar- te? Será que são meras coincidências? Ou são fatos que estão coloca- dos na sociedade e na aula de Educação Física e não conseguimos vê- los com criticidade? O discurso sobre exclusão/inclusão social tem, hoje, uma força de ilusão que acoberta as dificuldades que a humanidade tem encontra- do para sobreviver. Na maioria das políticas públicas implantadas no 87O jogo é jogado e a cidadania é negada Educação Física “O voto é considerado um di- reito para os cidadãos com determinada idade. Porém, o que se configura, na realida- de, é mais um dever incutido na forma de um direito, desti- nado a população em geral.” Terceira Estação: Direitos e deveres Vincula-se, atualmente, o conceito de cidadania ao ato de corres- ponder às responsabilidades do indivíduo quanto à execução de de- veres e reivindicações de direitos. Você já ouviu dizer que um bom ci- dadão deve cumprir deveres e lutar por seus direitos? Mas se levarmos em conta quais deveres temos para cumprir ao longo de nossas vidas e com quais direitos podemos contar, veremos que as coisas não são tão simples nem tampouco eqüitativas. A idéia e o discurso sobre direitos e deveres foram mecanismos criados para justificar práticas de cidadania e ocultar desigualdades. Es- se discurso dá a impressão de que todos estão em igualdade de condi- ções e, para se tornarem cidadãos, é preciso, apenas, que todos cum- pram seus deveres e usufruam de seus direitos. Porém, como você já deve imaginar, nem sempre os direitos são ofertados de igual forma para as diferentes classes sociais, muito me- nos são exigidos, delas, os deveres. z Brasil, nas últimas décadas, a idéia de inclusão é tão somente um me- canismo para amenizar desigualdades e minimizar a força política dos discursos sobre exclusão. Exemplos podem ser retirados do desporto de rendimento e da prática corporal. Tais manifestações são importantes para constatarmos as prioridades dadas às políticas desportivas, como, por exemplo: o significado de um pan-americano, de uma medalha olímpica ou uma copa de futebol per- to do estado de abandono de praças e escolas, em verdadeiro estado de miséria material, falta de equipamentos, de profissionais qualificados. Os elevados investimentos nos grandes eventos esportivos e a espeta- cularização dos mesmos fazem com que a população se “esqueça” das necessidades de sobrevivência e dedique-se às atividades de lazer. Urna eletrônican ww w. wi kip ed ia. or g n [...] o Brasil, país capitalista, caracteriza-se por ser uma sociedade autoritária e hierarquizada, em que os direitos do homem e do cidadão simplesmente não existem. Não existem para a elite, de vez que ela não precisa de direitos porque tem privilégios. Está, pois, acima deles. Não existem para a imensa maioria da população – os despossuídos -, pois suas tentativas de consegui-los são encaradas como problemas de polícia e tratadas com todo rigor do aparato repressor de um Estado quase onipotente. (BUFFA, 2002, p.28) O que, na verdade, aparece como forma de equivaler as desigual- dades, torna-as mais evidente, marcadas por profundas desigualdades sociais. Por exemplo, a famosa igualdade jurídica, baseada na consti- tuição de leis e regimentos, em muitos casos, amplia a dimensão da cidadania construída para poucos. Pesquise, em jornais e revistas, no- tícias de casos reais que exemplifiquem essa afirmação sobre a cida- dania jurídica. 90 Ginástica Ensino Médio Introdução I n t r o d u ç ã o Ginásticaz Você sabia que a ginástica surgiu no século XIX como forma de “educar o corpo”? É isso mesmo! Você está convidado a viajar na his- tória da ginástica para conhecer um pouco mais sobre este Conteúdo Estruturante. Então vamos viajar para a Europa e dar uma “paradinha” no século XIX. Neste período, a ginástica tinha finalidade de constituir um cor- po saudável, afastando-o das doenças que cresciam juntamente com a população dos grandes centros urbanos. A ginástica foi usada co- mo prática de poder das elites perante a nova classe pobre urbana, e sob a condição de ciência, buscou posicionar o corpo de forma retilí- nea, utilizando, para tanto, da anatomia, da fisiologia, da higiene, den- tre outras áreas desta natureza. Ela se constituía numa forma de educar gestos e comportamentos, tão necessários para a ordem social daque- la época. Foram criados os chamados métodos ginásticos em diferentes paí- ses. Para melhor compreender a importância destes métodos, veja os Folhas intitulados: “O circo como componente da ginástica” e “Ginásti- ca: um modelo antigo com roupagem nova? Ou uma nova maneira de aprisionar os corpos?”. Você saberia responder como a ginástica é apropriada pela socieda- de capitalista? E como chegou ao Brasil? Para isso, é necessário lembrar que o Brasil, no século XIX, sofria influência européia e também pas- sava por algumas transformações, como, por exemplo, o crescimento das cidades devido à ampliação da sociedade capitalista. Havia, então, a necessidade de fazer com que as pessoas se ade- quassem ao novo modelo econômico vigente. Para isso, medidas fo- ram tomadas e a ginástica foi fundamental na aplicação dos preceitos de moralidade e para instaurar a ordem social naquele momento his- tórico. CÂNDIDO PORTINARI. Me- ninos brincan- do, 1955. Óleo sobre tela; 60 X 72,5 cm; Cole- ção Particular; Rio de Janeiro. n 91O circo como componente da ginástica Educação Física E D U C A Ç Ã O F Í S I C A O principal responsável por implementar a ginástica aqui no Brasil foi Rui Barbosa. Importante figura na história brasileira, realizou estu- dos relacionados à saúde do povo brasileiro, empregando a ginástica como fator decisivo para tal objetivo. Desta forma, e com este objeti- vo, a ginástica chegou às escolas, da mesma forma que fora pensada para a saúde coletiva do povo brasileiro e com forte influência da ins- tituição militar. Como as aulas de ginásticas começaram a ser desenvolvidas nas au- las de Educação Física? Como é atualmente a ginástica da escola? Da mesma forma que outros Conteúdos Estruturantes, a ginástica deve ser pensada de acordo com as necessidades da escola, para não ser reduzida e submetida aos modelos dos jogos olímpicos e das gran- des competições destinadas à modalidade. Mas será que a ginástica se resume a esta modalidade? Que outras formas a ginástica podem ser apresentadas? Se disséssemos que a ginástica está relacionada ao circo, você acre- ditaria? Pois é verdade, e para conferir esta possibilidade de praticar gi- nástica de forma divertida, leia o Folhas que discute o circo. E o seu corpo? Como você viu, a ginástica surge com objetivos de regular o corpo conforme padrões estabelecidos pela elite dominante, certo? Será que os modelos de ginástica do século XIX são diferentes daqueles que temos hoje? Vamos discutir esta e outras questões no Folhas: “Ginástica: um modelo antigo com roupagem nova? Ou uma nova maneira de aprisionar os corpos?”. E os atletas que praticam ginástica, como são seus corpos? Talvez você responda que são corpos perfeitos, “sarados”, porém, no fundo, são corpos que estão no limite de suas funções, suscetíveis a diversas contusões. Os benefícios da prática da ginástica para seu corpo po- dem ser muitos, desde que sejam respeitados seus limites. Para melhor compreender as relações entre a prática da ginástica e os segredos de seu corpo, consulte o Folhas: “Os segredos do corpo.” Como você deve ter percebido, a ginástica aqui apresentada deve estar relacionada com a realidade escolar, o que significa adequação de atividades e formas de encaminhamento que contemplem a diver- são e a importância de estarmos atentos às questões que se referem ao corpo. Esperamos, a partir de agora, que você incorpore cada uma das per- sonagens que serão apresentadas, sejam elas circenses ou não. Dessa forma, chegará ao final desses Folhas conhecendo um pouco mais so- bre história, sobre o corpo como mercadoria e sobre a ginástica. 92 Ginástica Ensino Médio 95O circo como componente da ginástica Educação Física Em contraposição aos interesses da burguesia européia do século XIX, mas contemporâneas a ela, os artistas realizavam práticas corpo- rais descompromissadas, simples espetáculos em feiras e circos, onde palhaços, acrobatas, gigantes e anões despertavam, na população, vá- rios sentimentos, entre eles, o assombro e o medo. Antes de discutirmos essa contraposição, façamos o seguinte exer- cício: 1. Procure, em jornais ou revistas, qual é o modelo de padrão corporal apresentado hoje pelos meios de comunicação de massa (a televisão, o rádio, as revistas, os jornais). Observe se existem relações com o código de civilidade na Europa do século XIX no que diz respeito à ginástica. Discuta em gru- pos com seus colegas e monte um painel com as reportagens escolhidas. Em seguida, apresente para a turma. PESQUISa Circo!!! E isso é ginástica? Ao entrarmos no mundo mágico do circo, precisamos entender um pouco melhor suas origens e desenvolvimento. Não podemos datar com exatidão quando a atividade corporal cir- cense foi originada, no entanto, Torres, ao citar Ruiz, coloca que z “... o remoto ancestral do artista de circo deve ter sido aquele troglodita que, num dia de caça surpreendentemente farta, entrou na caverna dando pulos de alegria e despertando com suas caretas, o riso de seus companheiros de dificulda- des” (RUIZ, R. apud TORRES, A. O Circo no Brasil. Rio de Ja- neiro: Funarte, Editora Atrações, 1998, p.13) De acordo com Castro (1997), os primeiros registros sobre artes circenses foram encontrados na China, em pinturas de quase 5.000 anos onde aparecem acrobatas, contorcionistas e equilibristas. A acrobacia, por exemplo, era uma forma de treinamento para os guerreiros, cuja função social exigia agilidade, flexibilidade e força. No entanto, as raízes da arte circense se fazem presen- tes em toda antiguidade clássica, desde os hipódromos da Grécia antiga até o grande Império Egípcio. Nas pirâ- mides do Egito, os primeiros sinais dessa arte estão gra- vados em desenhos de domadores, equilibristas, malaba- ristas e contorcionistas. Ac er vo C ul tu ra l T ea tro G ua íra – F ot o To m L isb oa . n 96 Ginástica Ensino Médio Contudo, foi na Europa que o circo ganhou força e se desenvolveu. Os espetáculos tomaram impulso no Império Romano, em anfiteatros cujas apresentações mais tarde seriam classificadas como atividades circenses. A importância e a grandiosidade desses espetáculos podem ser demonstradas pelo Circo Máximo de Roma (40 a.C). No lugar em que esse Circo se instalava, foi criado, mais tarde, o Coliseu, que com- portava mais de 87 mil espectadores e apresentava excentricidades co- mo gladiadores, animais exóticos, engolidores de fogo, entre outros. Porém, os espetáculos realizados no Coliseu tornaram-se sangren- tos, com cristãos jogados às feras e isso teve como conseqüência uma redução no interesse pelas artes circenses. No final do Império Roma- no, os artistas circenses passaram a se apresentar, então, em locais pú- blicos, como praças e feiras (CASTRO,1997). De acordo com Soares (1998), o circo no Renascimento deslocava os habitantes das vilas e cidades de suas rotinas simples que envolviam apenas trabalho e descanso. O circo rompia com a ordem estabelecida ao proporcionar, sobretudo, diversão e encantamento ao público. Era uma arte do entretenimento. O circo se apresentava como uma atividade de grande fascínio na sociedade européia do século XIX. O corpo era o centro do espetácu- lo das “variedades” apresentadas pela múltipla atuação de seus artis- tas. Pode-se dizer que o circo surgia como a encarnação do espetácu- lo moderno e seu sucesso era inegável nas diferentes classes sociais que assistiam ao mesmo espetáculo, embora em dias e horários dife- rentes. Para melhor compreensão do que estamos comentan- do, assista ao filme: “Gladia- dor” (2000, EUA, direção: Ridley Scott) Mudanças no circo contemporâneo? Para quê e para quem? Hoje podemos dizer que além dos circos itinerantes e dos circos tradicionais ou circo família, temos o circo contemporâneo. Diversos fatores levaram a mudanças na organização e administra- ção do circo. Inicialmente quem dirigia os circos eram as famílias de artistas. Pai, avô, tios, filhos e sobrinhos eram responsáveis por tudo, desde a infra-estrutura e montagem até o espetáculo. O mundo da fa- mília circense era circunscrito pela lona do circo. Com o surgimento dos grandes centros urbanos e com o desen- volvimento tecnológico, apareceram novas formas de entretenimento, como a televisão, cinema, teatros, parques de diversão, e o circo foi perdendo espaço e público. Para Torres (1998, p.45), “na verdade o circo adaptou-se aos novos tempos do mass media” (aos meios de comuni- cação de massa). “Tornou-se performático”, mas sem esquecer a maio- ria das atrações de antigamente. É preciso destacar, no entanto, que os z Para melhor entendimento do conceito “mass media” ou mídia de massa, veja o Fo- lhas: “Ginástica: um mode- lo antigo com roupagem no- va? Ou uma nova maneira de aprisionar os corpos?”. 97 Educação Física circos pequenos que se apresentam principalmente nas cidades do in- terior ainda mantêm as antigas “tradições”. Quanto aos que se adaptaram aos novos tempos, a primeira mu- dança que ocorreu foi na relação familiar. Os filhos dos proprietários dos circos passaram a se dedicar aos estudos e trabalhar como admi- nistradores do circo, não mais como artistas. O circo tornou-se uma grande empresa. Duas conseqüências decorreram dessas mudanças: a primeira é que os novos “empresários” têm do circo uma visão menos sentimental. Pa- ra eles o circo é um negócio que tem que dar lucro. A segunda é que, para suprimir a demanda de artistas, já que as famílias circenses ago- ra cuidam da administração, surgiram as escolas de circo, que formam novos artistas. Estes não fazem parte da família e a relação que se es- tabelece é de patrão e empregado. Da mesma forma que um funcionário que vende sua força de tra- balho, o artista de circo trabalha por um salário. Sua força de trabalho tornou-se, também, mercadoria. Com essas mudanças, observamos uma perda das características culturais originais do circo, pois não se tem mais a transmissão familiar dos conhecimentos circenses, salvo em algumas exceções. As mudanças ocorridas na administração do circo moderno ajuda- ram também a criar uma nova categoria de circo, conhecida como “no- vo circo”. Na opinião de Baroni (2006), o circo contemporâneo se ca- racteriza por uma mescla de práticas, das quais podemos destacar a dança, o teatro, a técnica, a estética e os elementos da tecnologia como luz e som. Trata-se de um modelo artístico de circo em que não basta ser hábil, mas é preciso que se conte algo. Para sua efetiva realização, os artistas precisam ser polivalentes. O modelo mais expressivo deste tipo de circo é o canadense Cirque du Soleil. Para Marx, “o valor de uma mercadoria é determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário gas- to para sua produção” (2001, p. 60) Hoje tem circo? Tem sim senhor! Reeeeeeeeeespeitável público!... A partir de agora, vocês não serão mais espectadores, mas farão parte do espetáculo. Não podemos esquecer que devemos re- fletir sobre aquilo que estamos realizando e relacionar com a nossa sociedade. Vocês estão prontos para entrar no picadeiro? Para enfrentar a platéia que está ansiosa pelo show? Convi- do então os primeiros artistas a entrarem em cena: Os Malabaristas!!! z Veja o Folhas: “O futebol pa- ra além das quatro linhas”. SE UR AT , G EO RG ES . O C irc o, 1 89 1. Ó le o so br e te la, 1 80 × 1 48 c m ; Lo uv re , P ar is ( ou m us eu d o Lo uv re ) n O circo como componente da ginástica
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