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Nucleo de apoio á saúde da familia, Notas de estudo de Enfermagem

NUCLEO DE APOIO Á SAÚDE DA FAMILIANASF

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 05/12/2010

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Baixe Nucleo de apoio á saúde da familia e outras Notas de estudo em PDF para Enfermagem, somente na Docsity! Brasília – DF 2010 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família CADERNOS DE ATENÇÃO BÁSICA MINISTÉRIO DA SAÚDE APRESENTAÇÃO .....................................................................................................7 1 NÚCLEO DE APOIO À SAUDE DA FAMÍLIA .......................................................9 1.1 Introdução ..................................................................................................9 1.2 Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF): aspectos normativos ...........10 1.3 Sobre o conceito de “apoio matricial .........................................................11 1.4 O NASF e sua missão ...............................................................................13 1.5 NASF: princípios e diretrizes gerais ............................................................16 1.6 NASF: processos de trabalho ....................................................................20 1.7 Ferramentas tecnológicas para o NASF ......................................................24 1.8 Finalizando para iniciar ...............................................................................31 2 SAÚDE MENTAL NO NASF ..............................................................................33 2.1 Introdução ................................................................................................33 2.2 Cenário atual dos transtornos mentais no Brasil.........................................34 2.3 Saúde mental na atenção primária: diretrizes e prioridades ........................36 2.4 Estratégias de integração NASF – Equipe de Saúde da Família ....................39 2.5 Considerações finais .................................................................................44 3 REABILITAÇÃO E A SAÚDE INTEGRAL DA PESSOA IDOSA NO NASF.............46 3.1 Introdução ................................................................................................46 3.2 A reabilitação nas políticas sociais brasileiras ...............................................47 3.3 A reabilitação nos núcleos de apoio à saúde da família NASF .....................49 3.4 Observações finais ....................................................................................57 4 ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO NO NASF........................................................59 4.1 Introdução ...............................................................................................59 4.2 Segurança alimentar e nutricional e direito humano à alimentação adequada ................................................................................................60 4.3 Perfil epidemiológico e nutricional da população brasileira .........................61 4.4 Ações de alimentação e nutrição na atenção primária à saúde ...................63 4.5 Possibilidades de atuação do nutricionista da equipe do NASF ...................71 4.6 Conclusão ................................................................................................73 5 ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA NO NASF ........................................................75 5.1 Introdução ................................................................................................75 5.2 Planejamento das ações de assistência farmacêutica no NASF ....................76 5.3 Promoção do uso racional de medicamentos ............................................77 5.4 Educação permanente em saúde ..............................................................78 5.5 Gestão da assistência farmacêutica ............................................................79 5.6 Participação social .....................................................................................81 5.7 Atividades de assistência à saude ...............................................................81 5.8 Práticas integrativas e complementares ......................................................85 5.9 Considerações finais .................................................................................86 SUMÁRIO 6 INTERSETORIALIDADE, REDES SOCIAIS E PARTICIPAÇÃO CIDADÃ: O SERVIÇO SOCIAL NO NASF .........................................................................88 6.1 Introdução ...............................................................................................88 6.2 O serviço social no NASF .........................................................................89 6.3 Considerações finais .................................................................................96 7 ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO NASF...........................................................................................................97 7.1 Introdução ...............................................................................................97 7.2 O papel do NASF na atenção integral à saúde da criança ..........................98 7.3 Conclusões .............................................................................................107 8 ATENÇÃO INTEGRAL À SAUDE DA MULHER NO NASF ..............................109 8.1 Introdução ..............................................................................................109 8.2 A atenção integral à saúde da mulher ......................................................110 8.3 O papel dos grupos ................................................................................115 9 AS PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES NO NASF ...................116 9.1 Medicina tradicional chinesa ....................................................................116 9.1.1 Acupuntura ..........................................................................................117 9.1.2 Práticas corporais .................................................................................117 9.1.2.1 Do-in ...............................................................................................117 9.1.2.2 Lian gong em 18 terapias ..................................................................118 9.2 Tai chi chuan ..........................................................................................119 9.3 Homeopatia ...........................................................................................119 9.3.1 Medicamentos homeopáticos ..............................................................120 9.4 Políticas públicas envolvidas .....................................................................120 9.4.1 Política nacional de práticas integrativas e complementares no SUS .......120 9.4.2 Política nacional de plantas medicinais e fitoterápicos (PNPMF) .............121 9.4.3 As PICS e o processo de trabalho no NASF .........................................121 10 PRÁTICAS CORPORAIS E ATIVIDADE FÍSICA NO NASF..............................124 10.1 Introdução ...........................................................................................124 10.2 PCAF: aspectos conceituais ...................................................................125 10.3 Responsabilidades profissionais nas PCAF ..............................................126 10.4 As PCAF e os processos de trabalho no NASF ......................................128 10.5 Considerações finais .............................................................................133 REFERÊNCIAS .....................................................................................................134 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 7 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família APRESENTAÇÃO A Atenção Primária à Saúde (APS) representa um complexo conjunto de conhecimentos e procedimentos e demanda uma intervenção ampla em diversos aspectos para que se possa ter efeito positivo sobre a qualidade de vida da população. Na definição já clássica de Bárbara Starfield, APS representa o primeiro contato na rede assistencial dentro do sistema de saúde, caracterizando-se, principalmente, pela continuidade e integralidade da atenção, além da coordenação da assistência dentro do próprio sistema, da atenção centrada na família, da orientação e participação comunitária e da competência cultural dos profissionais. São assim estipulados seus atributos essenciais: o acesso de primeiro contato do indivíduo com o sistema de saúde, a continuidade e a integralidade da atenção, e a coordenação da atenção dentro do sistema. A Estratégia de Saúde da Família (ESF), vertente brasileira da APS, caracteriza- se como a porta de entrada prioritária de um sistema de saúde constitucionalmente fundado no direito à saúde e na equidade do cuidado e, além disso, hierarquizado e regionalizado, como é o caso do SUS. A ESF vem provocando, de fato e de direito, um importante movimento de reorientação do modelo de atenção à saúde em nosso país. Assim é que, dentro do escopo de apoiar a inserção da Estratégia de Saúde da Família na rede de serviços e ampliar a abrangência, a resolutividade, a territorialização, a regionalização, bem como a ampliação das ações da APS no Brasil, o Ministério da Saúde criou os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf), mediante a Portaria GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008. Um Nasf deve ser constituído por uma equipe, na qual profissionais de diferentes áreas de conhecimento atuam em conjunto com os profissionais das equipes de Saúde da Família, compartilhando e apoiando as práticas em saúde nos territórios sob responsabilidade das equipes de SF. Tal composição deve ser definida pelos próprios gestores municipais e as equipes de SF, mediante critérios de prioridades identificadas a partir das necessidades locais e da disponibilidade de profissionais de cada uma das diferentes ocupações. O Nasf não se constitui porta de entrada do sistema para os usuários, mas sim de apoio às equipes de SF. O Nasf deve atuar dentro de algumas diretrizes relativas à APS, a saber: ação interdisciplinar e intersetorial; educação permanente em saúde dos profissionais e da população; desenvolvimento da noção de território; integralidade, participação social, educação popular; promoção da saúde e humanização. Assim, a organização dos processos de trabalho dos Nasf, tendo sempre como foco o território sob sua responsabilidade, deve ser estruturada priorizando o atendimento compartilhado e interdisciplinar, com troca de saberes, capacitação e C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 10 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica O processo de trabalho das equipes de Saúde da Família é o elemento-chave para a busca permanente de comunicação e troca de experiências e conhecimentos entre os integrantes da equipe e destes com a comunidade. As equipes de SF são compostas por no mínimo um médico de família, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e agentes comunitários de saúde. Pode ser ampliada com a equipe de Saúde Bucal, na qual estão presentes: dentista, auxiliar em saúde bucal e técnico em saúde bucal. Cada equipe se responsabiliza pelo acompanhamento de no máximo quatro mil pessoas de uma determinada área, e estas passam a ter corresponsabilidade no cuidado à sua saúde. A atuação das equipes ocorre no território, principalmente, nas unidades básicas de Saúde da Família, nas residências e nos espaços comunitários. A ESF caracteriza-se por ser a porta de entrada de um sistema hierarquizado e regio- nalizado de saúde tendo sob sua responsabilidade um território definido, com uma população delimitada, partindo do conhecimento do perfil epidemiológico e demo- gráfico de sua área de atuação, podendo intervir sobre os fatores de risco aos quais a comunidade está exposta, de forma a oferecer às pessoas atenção integral, perma- nente e de qualidade. 1.2 NÚCLEOS DE APOIO À SAÚDE DA FAMÍLIA (NASF): ASPECTOS NORMATIVOS O Ministério da Saúde criou os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf), me- diante a Portaria GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008, republicada em 4 de março de 2008. O principal objetivo foi o de apoiar a inserção da Estratégia de Saúde da Família na rede de serviços, além de ampliar a abrangência e o escopo das ações da Atenção Básica, e aumentar a resolutividade dela, reforçando os processos de territorialização e regionalização em saúde. A referida Portaria traz como pressupostos políticas nacionais diversas, tais como: de Atenção Básica; de Promoção da Saúde; de Integração da Pessoa com Deficiência; de Alimentação e Nutrição; de Saúde da Criança e do Adolescente; de Atenção In- tegral à Saúde da Mulher; de Práticas Integrativas e Complementares; de Assistência Farmacêutica; da Pessoa Idosa; de Saúde Mental; de Humanização em Saúde, além da Política Nacional de Assistência Social e da Saúde do Homem. O Nasf é uma estratégia inovadora que tem por objetivo apoiar, ampliar, aperfei- çoar a atenção e a gestão da saúde na Atenção Básica/Saúde da Família. Seus requisitos são, além do conhecimento técnico, a responsabilidade por determinado número de equipes de SF e o desenvolvimento de habilidades relacionadas ao paradigma da Saúde da Família. Deve estar comprometido, também, com a promoção de mudanças na atitude e na atuação dos profissionais da SF e entre sua própria equipe (Nasf), incluindo na atuação ações intersetoriais e interdisciplinares, promoção, prevenção, reabilitação C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 11 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família da saúde e cura, além de humanização de serviços, educação permanente, promoção da integralidade e da organização territorial dos serviços de saúde. O Nasf deve ser constituído por equipes compostas por profissionais de diferen- tes áreas de conhecimento, para atuarem no apoio e em parceria com os profissionais das equipes de Saúde da Família, com foco nas práticas em saúde nos territórios sob responsabilidade da equipe de SF. 1.3 SOBRE O CONCEITO DE “APOIO MATRICIAL” O correto entendimento da expressão “apoio”, que é central na proposta dos Nasf, remete à compreensão de uma tecnologia de gestão denominada “apoio matri- cial”, que se complementa com o processo de trabalho em “equipes de referência”. Equipes de referência representam um tipo de arranjo que busca mudar o padrão dominante de responsabilidade nas organizações: em vez das pessoas se responsabili- zarem por atividades e procedimentos (geralmente uma responsabilidade quantitativa), o que se busca é construir a responsabilidade de pessoas por pessoas. Ou seja, formar uma equipe em que os trabalhadores tenham uma clientela sob sua responsabilidade, por exemplo, uma equipe responsável por certo número de leitos em um hospital ou, como no caso da equipe de SF, a responsabilidade por uma clientela dentro de um território de abrangência. Então, aqui é essencial ressaltarmos que, quando falamos de equipe de referência no Caderno, remetemos-nos à equipe de Saúde da Família, que é a referência de saúde para certa população na APS. No entanto, não é somente a definição da responsabilização sobre uma clientela que define a equipe de referência. Refere-se, também, a outra dimensão: a distribuição do poder que se quer na organização. Assim, uma equipe de referência é definida tam- bém por uma coordenação (gerência) comum e deve enfrentar a herança das “linhas de produção” tayloristas nas organizações da saúde, nas quais o poder gerencial estava atrelado ao saber disciplinar fragmentado e as chefias se dividiam por corporações. Por exemplo, a presença de uma chefia de enfermagem, outra chefia de médicos e outra ainda de ACS, em vez de uma coordenação (gerência) por equipe, aumentando a chance de fragmentação do trabalho em uma equipe de SF, produzindo uma tendência de responsabilidade maior para com uma atividade corporativa do que propriamente com o resultado final para o usuário. Na prática, essas chefias por corporações pro- fissionais produzem arranjos que desvalorizam ou rivalizam com a desejável “grupali- dade” da equipe, dando origem, assim, a diferentes “times”: de ACS, de médicos etc. A proposta de equipe de referência (equipe de SF) na APS parte do pressu- posto de que existe interdependência entre os profissionais. Prioriza a construção de objetivos comuns em um time com uma clientela adscrita bem definida. Assim, uma C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 12 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica das funções importantes da coordenação (gerência) de uma equipe de referência é justamente produzir interação positiva entre os profissionais em busca das finalidades comuns. Apesar das diferenças entre eles, sem tentar eliminar essas diferenças, mas aproveitando a riqueza que ela proporciona. O apoio matricial será formado por um conjunto de profissionais que não têm, necessariamente, relação direta e cotidiana com o usuário, mas cujas tarefas serão de prestar apoio às equipes de referência (equipes de SF). Assim, se a equipe de referência é composta por um conjunto de profissionais considerados essenciais na condução de problemas de saúde dos clientes, eles deverão acionar uma rede assistencial necessária a cada caso. Em geral é em tal “rede” que estarão equipes ou serviços voltados para o apoio matricial (no caso, os Nasf), de forma a assegurar, de modo dinâmico e interativo, a retaguarda especializada nas equipes de referência (no caso, as equipes de Saúde da Família). Vale ressaltar aqui que o Nasf está inse- rido na rede de serviços dentro da APS assim como as equipes de SF, ou seja, ele faz parte da APS. O apoio matricial apresenta as dimensões de suporte: assistencial e técnico-pe- dagógico. A dimensão assistencial é aquela que vai produzir ação clínica direta com os usuários, e a ação técnico-pedagógica vai produzir ação de apoio educativo com e para a equipe. Essas duas dimensões podem e devem se misturar nos diversos momentos. Fica claro, portanto, que o conceito de apoio matricial tem uma dimensão si- nérgica ao conceito de educação permanente. Como exemplo, podemos lembrar o fato de que não é possível a nenhum trabalhador em saúde esquivar-se de lidar em alguma medida com os afetos nas relações terapêuticas, por mais que se trate de um tema específico de psicólogos e psiquiatras. Cabe, portanto, aos profissionais da área psi, quando percebem dificuldades de uma equipe nesse campo, exercitar a dimensão técnico-pedagógica a partir das discussões de casos e temas, de forma a compartilhar seu conhecimento específico com a equipe de SF, para que possa lidar com esse saber e fazer dele conhecimento de todos. Um pressuposto fundamental da proposta do Nasf é o de que deve ocorrer a compreensão do que é conhecimento nuclear do especialista e do que é conhecimento comum e compartilhável entre a equipe de SF e o referido especialista. Tal conheci- mento, todavia, é sempre situacional e mutante. Por exemplo: uma equipe que lidasse com grande número de crianças com obesidade ou sobrepeso teria que incorporar grande quantidade de conhecimentos sobre o manejo dessas condições. Assim, um pediatra que fizesse apoio matricial a essa equipe teria que investir grande energia na dimensão técnico-pedagógica, compartilhando conhecimentos com a equipe para que ela pudesse se aproximar da resolutividade desejada para esses casos. Isso vale para um psicólogo, para um nutricionista ou para qualquer outro especialista que preste apoio C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 15 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família continuação população, desenvolve no plano da gestão vínculo específico entre um grupo de pro- fissionais e determinado número de usuários. Isso possibilita uma gestão mais cen- trada nos fins (coprodução de saúde e de autonomia) do que nos meios (consultas por hora, por exemplo) e tende a produzir maior corresponsabilização entre profis- sionais, equipe e usuários. Essa equipe de saúde terá, no Nasf, o apoio matricial, seja pela modalidade de atendimento compartilhado, pela discussão de casos/formulação de projetos terapêuticos, seja pelos projetos de saúde no território. O atendimento compartilhado consiste em realizar intervenção tendo como sujeitos de ação o pro- fissional de saúde e o apoiador matricial em regime de coprodução. A intenção é possibilitar a troca de saberes e de práticas em ato, gerando experiência para ambos os profissionais envolvidos. A discussão de casos e formulação de projetos terapêu- ticos consiste na prática de reuniões nas quais participam profissionais de referência do caso em questão, de um usuário ou um grupo deles, e o apoiador ou equipe de apoio matricial. A ideia é rever e problematizar o caso contando com aportes e possí- veis modificações de abordagem que o apoio pode trazer e, daí em diante, rever um planejamento de ações que pode ou não incluir a participação direta do apoio ou de outros serviços de saúde da rede, de acordo com as necessidades levantadas. Implantar o Nasf implica, portanto, a necessidade de estabelecer espaços rotinei- ros de reunião para pactuar e negociar o processo de trabalho: discussão de casos, definição de objetivos, critérios de prioridade, gestão das filas de compartilhamento (encaminhamento), critérios de avaliação dos trabalhos, resolução de conflitos etc. Nada disso acontece automaticamente e torna-se necessário que os profissionais as- sumam sua responsabilidade na cogestão e os gestores coordenem esses processos, em constante construção, do trabalho transdisciplinar. III: COORDENAÇÃO DO CUIDADO A coordenação de casos é uma de suas características mais importantes da APS, pois possibilita definição clara de responsabilidade pela saúde do usuário, considerando-o como sujeito em seu contexto e no decorrer do tempo em oposição a uma aborda- gem fragmentada por recortes disciplinares (estômago, emoção, alimentação etc.). As características da Atenção Primária de primeiro contato com as famílias, acompanha- mento longitudinal e inserção territorial protegem os usuários de intervenções exage- radas, desarticuladas e não negociadas com eles. A coordenação de casos ocorre em três cenários: 1) Dentro do estabelecimento de Atenção Primária, quando os usuários são vistos por vários membros da equipe e as informações a respeito do usuário são geradas em diferentes lugares (por exemplo, laboratórios). 2) Com outros especialistas chamados para fornecer aconselhamento ou intervenções de curta duração. 3) Com outros especialistas que tratam de um usuário específico por um longo período de tempo, devido à presença de um distúrbio específico. continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 16 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica continuação A coordenação do cuidado significa para a equipe assumir o usuário, mesmo (ou tal- vez principalmente) quando há procedimentos ou aspectos do problema de saúde que ela não domina totalmente, ou não lhe caiba executar (cirurgia ou tratamento prolongado, por exemplo). Não seria porque um usuário está sob cuidados quimio- terápicos para um problema oncológico, ou porque necessita de uma abordagem de um psiquiatra ou psicólogo, que os conhecimentos obtidos pelo vínculo, o se- guimento ao longo do tempo e a abordagem contextual (que inclui a família, entre outras dimensões) tornar-se-iam menos importantes. Ao contrário, é justamente nesses momentos de maior gravidade que esses conhecimentos da equipe de Saú- de da Família são fundamentais para a eficácia clínica. Vale acrescentar que, quem está na Atenção Primária à Saúde tem um ponto de vista diferente e complementar ao de quem está em outros serviços de saúde da rede (serviço hospitalar, unidades de urgência e emergência, centro de especialida- des). A equipe de SF tem mais chances de conhecer a família ao longo do tempo, conhecer a situação afetiva, as consequências e o significado do adoecimento de um de seus membros. Podem então ser estabelecidos como pontos de síntese na missão do Nasf os seguintes aspectos: a) O Nasf não se constitui porta de entrada do sistema para os usuários, mas apoio às equipes de Saúde da Família; b) Vincula-se a um número de equipes de Saúde da Família em territórios defini- dos, conforme sua classificação; c) A equipe do Nasf e as equipes de Saúde da Família criarão espaços de discus- sões para gestão do cuidado: reuniões e atendimentos compartilhados consti- tuindo processo de aprendizado coletivo; d) O Nasf deve ter como eixos de trabalho a responsabilização, gestão com- partilhada e apoio à coordenação do cuidado, que se pretende pela Saúde da Família. 1.5 NASF: PRINCÍPIOS E DIRETRIZES GERAIS A integralidade pode ser considerada a principal diretriz a ser praticada pelos Nasf. Ela pode ser compreendida em três sentidos: (a) a abordagem integral do indivíduo levando em consideração seu contexto social, familiar e cultural e com garantia de cuidado longitu- dinal; (b) as práticas de saúde organizadas a partir da integração das ações de promoção, prevenção, reabilitação e cura; além de (c) a organização do sistema de saúde de forma a garantir o acesso às redes de atenção, conforme as necessidades de sua população. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 17 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Na implantação da proposta do Nasf, há que se estar atento ao risco da fragmenta- ção da atenção. Se incorporar abordagens disciplinares variadas pode adicionar qualidade ao atendimento, isso também pode gerar a não responsabilização, tanto em termos indivi- duais como coletivos, mediante a focalização em aspectos parciais do indivíduo, com ine- vitáveis danos à saúde. O conceito de atenção integral pode ser uma contribuição impor- tante na organização do processo de trabalho, de forma a afastar o risco da fragmentação. O conceito de integralidade é também uma das diretrizes do SUS, ao lado da universalidade do acesso, do cuidado organizado em rede, da prioridade das ações preventivas, sem detrimento das assistenciais, bem como da equidade da oferta e das oportunidades em saúde. Mas isso implica modificação profunda dos modelos de aten- ção e de gestão dos processos de trabalho em saúde até hoje vigentes. É consensual que a amplitude da prática da integralidade exija que os sistemas organi- zados a partir da APS reconheçam a grande variedade de necessidades relacionadas à saúde e disponibilize os recursos para abordá-las. A reflexão sobre a integralidade deve, todavia, ampliar o conceito constitucional, em busca de outras possibilidades, ou seja, a integralidade como traço da boa medicina, como modo de organizar as práticas em saúde e como ele- mento da construção de políticas especiais. Com efeito, no modo tradicional dos sistemas de saúde, é notória a fragmentação da atitude dos médicos e dos outros profissionais de saúde, reduzindo o usuário a mero sistema biológico, desconsiderando seu sofrimento e outros aspectos envolvidos na sua qualidade de vida. Assim, a integralidade deve ser considerada como um valor e estar presente na atitude do profissional no encontro com seus usuá- rios, no qual deverá reconhecer demandas e necessidades de saúde, bem como incorporar ações de promoção, prevenção, assim como ações curativas e reabilitadoras. Outro conjunto de sentidos para a integralidade está baseado na importância de organizar as práticas dos serviços de saúde de forma orientada pelas necessidades da população, sejam estas explícitas ou não. Para isso, é importante equilibrar a demanda espontânea com a programada, ampliando o acesso da população aos serviços de saú- de. Além disso, a integralidade também sinaliza para a construção das políticas gover- namentais de enfrentamento de certos problemas de saúde e necessidades de grupos específicos, que subentende a captação das várias nuanças que envolvem a atenção à saúde. Dessa forma, a integralidade é tomada como ampliação do horizonte de inter- venção sobre problemas. A busca da integralidade nos serviços de saúde deve ser, portanto, um processo em construção, sendo a equipe de SF um fértil campo ao fomento da atenção integral. Em tal contexto, as equipes dos Nasf deverão atuar em conjunto com as equipes de Saúde da Família, apoiando-as para que possam incrementar não só a integralidade, mas também a resolutividade, a qualidade do cuidado, as ações de promoção de saúde e o acompanhamento e monitoramento em seus diversos aspectos. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 20 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica O tema dos princípios e diretrizes que regem a atuação do Nasf, sem embargo do consenso obtido em torno dele, é objeto de estudos aprofundados na literatura da saúde. A seção final deste capítulo traz sugestões de leituras complementares referen- tes a esses tópicos. 1.6 NASF: PROCESSOS DE TRABALHO Nos termos da Portaria no 154, existem duas modalidades de Nasf: o Nasf 1, composto por no mínimo cinco profissionais com formação universitária, entre os seguintes: psicólogo, assistente social, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, médico ginecologista, profissional da educação física, médico homeopata, nutricio- nista, médico acupunturista, médico pediatra, médico psiquiatra e terapeuta ocupa- cional. Cada um desses Nasf deve estar vinculado a um mínimo de oito e máximo de 20 equipes de SF, exceto nos estados da Região Norte, onde o número mínimo passa a ser cinco. O Nasf 2 deverá ter no mínimo três profissionais, entre os seguintes: psicólogo, assistente social, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, profissional da educação física, nutricionista e terapeuta ocupacional; e se vincular a no mínimo três equipes de SF. A definição dos profissionais que irão compor cada tipo de Nasf é de responsa- bilidade do gestor municipal, seguindo, entretanto, critérios de prioridade identificados a partir das necessidades locais e da disponibilidade de profissionais de cada uma das diferentes ocupações. O Nasf organizará o seu processo de trabalho com foco nos territórios de sua responsabilidade, conjuntamente com as equipes de SF que a ele se vinculam de forma a priorizar: (a) Ações clínicas compartilhadas, para uma intervenção interdisciplinar, com troca de saberes, capacitação e responsabilidades mútuas, gerando experiência para ambos os profissionais envolvidos. Com ênfase em estudo e discussão de casos e situações, realização de projeto terapêutico singular, orientações, espaços de reuniões, bem como consultas/atendimentos conjuntos, apoio por telefone, e-mail etc. (b) Intervenções específicas do profissional do Nasf com os usuários e/ou famílias, com discussão e negociação a priori com os profissionais da equipe de SF responsáveis pelo caso, de forma que o atendimento individualizado pelo Nasf se dê apenas em situ- ações extremamente necessárias e, quando ocorrer, continuar mantendo contato com a equipe de SF, que não se descomprometeria com o caso, ao contrário, procuraria redefinir um padrão de seguimento complementar e compatível ao cuidado oferecido pelo Nasf diretamente ao usuário, ou à família ou à comunidade. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 21 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família (c) Ações compartilhadas nos territórios de sua responsabilidade desenvolvidas de forma articulada com as equipes de SF. E outros setores como o desenvolvimento do projeto de saúde no território, planejamentos, reuniões, apoio aos grupos, trabalhos educativos, de inclusão social, enfrentamento da violência, ações junto aos equipamen- tos públicos, como escolas, creches, igrejas, pastorais etc. Do ponto de vista das responsabilidades individuais e coletivas dos profissionais do Nasf, algumas considerações devem ser feitas, como já colocado anteriormente, as metas a serem estipuladas para os profissionais do Nasf dependem da capacidade do profissional apoiador de articular e trabalhar em conjunto com as equipes de SF. Como as equipes do Nasf terão dois focos de responsabilidade, população e equipe, suas me- tas de trabalho deverão conter indicadores de resultado para a população, mas também indicadores de resultado da sua ação na equipe. Podem ser enumeradas algumas sugestões de tópicos a serem ajustados como itens de responsabilidade dos profissionais do Nasf, organizados por categorias temáti- cas, conforme se mostra no quadro abaixo. DEFINIÇÃO DE INDICADORES E METAS • Critérios para a definição de resultados e impacto: referência na população geral; foco na qualidade da atenção da equipe de referência – equipe de SF (exemplo: incorpo- ração de conhecimentos e diminuição de pedidos de consultas “desnecessárias” aos profissionais do Nasf, capacidade de reconhecer e utilizar critérios de risco e priorida- de adequados aos encaminhamentos). • Definição de metas de atendimento de cada profissional do Nasf: número máximo de usuários de tratamento prolongado e definição de indicadores de resultado para esses grupos específicos (adesão, internação, capacidade de compartilhamento do cuidado por parte da equipe de SF). • Definição dos números de usuários de tratamento temporário ou para exclusão de hipótese diagnóstica (essa categoria não pode ser acompanhada por longo prazo e o apoiador deve se empenhar na redução dela junto às equipes de SF, mediante apoio pedagógico). • Estimativas e revisões de indicadores e metas devem ser constantemente revistas em conjunto com os profissionais. AGENDAS DE TRABALHO • Parte deve ser reservada para atividades pedagógicas (exemplo: participação em reuniões de equipes de SF; discussões e construção de projetos terapêuticos e te- mas teóricos; atendimento compartilhado; visitas domiciliares, quando necessário). continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 22 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica • Outra parte: atividades assistenciais diretas, quando for o caso. • Disponibilidade de tempo reservado para as ações no território junto às equipes de SF. • Disponibilidade para acessos diretos não programados ou contatos telefônicos, via internet, pela equipe de SF. • Estimativas e revisões da agenda de atividades devem ser constantemente revistas em conjunto com os profissionais. ATIVIDADES PEDAGÓGICAS • Importante: confronto de saber recortado por olhar disciplinar com a realidade da atenção integral faz aumentar número de variáveis e complexidade dos problemas. • Buscar apoios (gestor, academia, outros especialistas) uma vez que essa atividade não costuma fazer parte da formação profissional. TRABALHO EM GRUPOS/EQUIPE • Importante: a maior parte dos profissionais de saúde não tem formação básica que valorize o trabalho em equipe. • Fomentar e incentivar os grupos a fazerem contratos de funcionamento em espa- ços coletivos (reuniões). • Devem ser objetos de atenção especial processos que devem ser estimulados pelos gestores: (a) sigilo relativo às reuniões de equipe; (b) disposição para crítica com maturidade, em dupla via: fazer crítica e receber crítica de forma adequada é um aprendizado coletivo que deve ser estimulado; (c) reconhecimento e lida com conflitos de forma positiva, considerando que grupalidade idealizada e sem conflitos não existe e impede a riqueza da explicitação das diferenças e empobre- ce o espaço coletivo; (d) reconhecimento de que o amadurecimento do grupo depende da capacidade de tomar as diferenças e conflitos na sua dimensão posi- tiva e produtora. • Espaço coletivo: cultivado e valorizado como momento extremamente importan- te, no qual ocorrem decisões e aprendizados. • Interrupções devem ser negociadas no grupo (exemplo: uso de celulares, evasão dos profissionais durante o tempo da reunião de equipe para atender à agenda de usuários). • Decisões devem ser tomadas e executadas; evitar que se termine uma discussão sem as decisões possíveis; zelar pelo cumprimento do que for decidido. E também reavaliar constantemente o que foi decidido. Além desses conjuntos de itens de responsabilidade relativos ao processo de trabalho dos Nasf, existem aspectos operacionais a serem considerados, por exemplo, nas ações por área estratégicas especificadas, que são: Saúde da Criança e Adolescen- te; Saúde da Mulher; Saúde Mental; Serviço Social; Assistência Farmacêutica; Atividade continuação C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 25 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Tudo isso não acontece automaticamente, tornando-se assim necessário que os profissionais assumam sua responsabilidade na cogestão e os gestores coordenem esses processos, em constante construção. O quadro “leituras recomendadas”, ao final do texto, traz algumas indicações para aprofundamento do leitor sobre essa ferramenta de gestão. • Clínica Ampliada A proposta de Clínica Ampliada se direciona a todos os profissionais que fazem clínica, ou seja, os profissionais de saúde na sua prática de atenção aos usuários. Toda profissão faz um recorte, um destaque de sintomas e informações, cada uma de acordo com seu núcleo profissional. Ampliar a clínica significa justamente ajustar os recortes teóricos de cada profissão às necessidades dos usuários. A Clínica Ampliada pode ser caracterizada pelos seguintes movimentos: 1. COMPREENSÃO AMPLIADA DO PROCESSO SAÚDE–DOENÇA A Clínica Ampliada busca evitar abordagem que privilegie excessivamente alguma ma- triz de conhecimento disciplinar. Ou seja, cada teoria faz um recorte parcialmente arbitrário da realidade (por exemplo, na mesma situação clínica, podem-se “enxergar” vários aspectos: patologias orgânicas, “forças sociais”, produção de subjetividade etc.) e cada recorte poderá ser mais ou menos relevante em cada momento. A Clínica Ampliada busca construir sínteses singulares tensionando os limites de cada matriz disciplinar e colocando em primeiro plano a situação real do trabalho em saúde, vivida a cada instante por sujeitos reais. Esse eixo da Clínica Ampliada traduz-se ao mesmo tempo em um modo de fazer a clínica diferente e na ampliação do objeto de trabalho, com a necessária inclusão de novos instrumentos. 2. CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DOS DIAGNÓSTICOS E TERAPÊUTICAS Reconhecer a complexidade da clínica pode produzir uma sensação de desamparo nos profissionais de saúde, na medida em que fica evidente a dificuldade em se obter os resultados idealizados de forma unilateral. É necessário, portanto, um segundo eixo de trabalho na Clínica Ampliada, que é a construção compartilhada dos diagnós- ticos e terapêuticas. Ou seja, é necessário, em um grande número de vezes, alguma mudança na autoimagem e/ou na expectativa pessoal do profissional de saúde em relação ao seu trabalho, de forma que ele não pretenda estabelecer uma relação unilateral com o paciente. Justamente, o reconhecimento da complexidade deve sig- nificar o reconhecimento da necessidade de compartilhar diagnósticos e problemas, assim como propostas de solução. Este compartilhamento vai tanto na direção da equipe de saúde, dos serviços de saúde e da ação intersetorial, como também do compartilhamento com os usuários. O que significa dizer que, ainda que frequente continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 26 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica continuação mente não seja possível resultados ideais, aposta-se que aprender a fazer algo em várias dimensões do problema, de forma compartilhada, é infinitamente mais poten- te do que insistir em uma abordagem pontual unilateral. Ou seja, é evidente que as questões sociais e subjetivas não se “resolvem” de forma mágica e simples, mas fazer alguma atuação sobre elas (mesmo que seja apenas falar sobre, ou adequar uma conduta) geralmente tem muito mais efeito do que tentar fingir que elas não existem. Evidentemente este eixo da clínica compartilhada nos obriga a um reconhecimento da singularidade de cada situação, para ponderar o quanto é possível e necessário compartilhar diagnósticos e decisões. 3. AMPLIAÇÃO DO “OBJETO DE TRABALHO” As doenças, as epidemias e os problemas sociais acontecem em pessoas e, portanto, o objeto de trabalho de qualquer profissional de saúde deve ser a pessoa ou grupos de pessoas, por mais que o núcleo profissional ou a especialidade sejam bem deli- mitados. No entanto, um desafio importante para a Clínica Ampliada na atualidade é que o objeto de trabalho restrito costuma produzir também nos profissionais um “objeto de investimento” restrito. O que significa dizer que se aprende a gostar e a identificar-se com procedimentos e atividades parciais no processo de tratamento. O que pode significar, por outro lado, NÃO gostar de outras atividades fora do núcleo profissional. Pior ainda, é possível que uma compreensão ampliada provoque uma grande sensação de insegurança profissional, porque necessariamente traz a neces- sidade de lidar com as incertezas do campo da saúde. Essas dificuldades fazem parte do desafio da Clínica Ampliada e não devem ser consideradas exceção, mas parte do processo de mudança e qualificação no processo de trabalho em saúde. 4. A TRANSFORMAÇÃO DOS “MEIOS” OU INSTRUMENTOS DE TRABALHO Os “meios” ou instrumentos de trabalho também se modificam intensamente na Clí- nica Ampliada. São necessários arranjos e dispositivos de gestão que privilegiem uma comunicação transversal na equipe e entre equipes (nas organizações e rede assis- tencial). Mas, principalmente, são necessárias técnicas relacionais que permitam uma clí- nica compartilhada. A capacidade de escuta (do outro e de si mesmo), de lidar com condutas automatizadas de forma crítica, de lidar com a expressão de problemas so- ciais e subjetivos, com a família, a comunidade, entre outras pessoas e grupos sociais. 5. SUPORTE PARA OS PROFISSIONAIS DE SAÚDE A clínica com objeto de trabalho reduzido acaba tendo uma função protetora (ainda que falsa- mente protetora), porque permite ao profissional “não ouvir” uma pessoa ou um coletivo em sofrimento e, assim, não lidar com a própria dor ou medo que, potencialmente, o trabalho em saúde pode trazer. Um exemplo clássico desse mecanismo inconsciente – ainda não de todo debelado – é a forma como serviços de saúde de oncologia justificavam o não atendimento ou o atendimento deliberadamente precarizado de pacientes “terminais” ou “fora de proposta te- rapêutica”. O argumento (sustentado pela cultura institucional) era de que os serviços deveriam ser voltados àqueles que tinham chances de serem curados. Com isso, os pacientes terminais continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 27 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família continuação ficavam sem atendimento: sem sedação, hidratação e outros procedimentos mínimos para uma sobrevida digna. Até hoje o Brasil é um país que ainda tem dificuldades na pres- crição de analgesia para pacientes terminais – embora seja pródigo com a prescrição de ansiolíticos, antidepressivos e outros analgésicos “sociais”. O fato é que a dificuldade dos profissionais de lidar com a morte (em grande medida inconsciente) produzia argumenta- ção falsa em relação ao atendimento de pacientes terminais, inventando uma falsa relação de mútua exclusão entre os pacientes com chance de cura e os, supostamente, sem chance de cura. Esse tipo de problema fica evidenciado na medida em que se propõe a Clínica Ampliada. Problemas crônicos, sociais ou subjetivos podem produzir a mesma reação nos profissionais de saúde que os pacientes terminais nos serviços de oncologia. Aqui o aspecto cognitivo é importante, mas não é suficiente, porque é necessário criar instrumentos de suporte aos profissionais de saúde para que eles possam lidar com as próprias dificuldades, identificações positivas e negativas com os diversos tipos de situ- ação. É necessário, nesse processo, que se enfrente um forte ideal de “neutralidade” e de “não envolvimento” profissional, prescrito nas faculdades de saúde, que muitas vezes coloca uma interdição para os profissionais de saúde quando o assunto é a própria sub- jetividade. A partir disso, a gestão deve cuidar para incluir o tema nas discussões de caso (PTS) e evitar individualizar/culpabilizar profissionais que estão com alguma dificuldade em lidar com esse processo (por exemplo, enviando sistematicamente os profissionais que apresentam algum sintoma para os serviços de saúde mental). As dificuldades pes- soais no trabalho em saúde refletem, na maior parte das vezes, problemas no processo de trabalho (a baixa grupalidade solidária na equipe, a alta conflitividade, a fragmentação etc.). Resumindo, o suporte aos profissionais de modo que possam realizar uma Clínica Ampliada se justifica porque não é possível fazer clínica COM o outro sem lidar CON- SIGO mesmo. • Projeto Terapêutico Singular A discussão em equipe de casos clínicos, principalmente se mais complexos, é um recurso clínico e gerencial importantíssimo. A existência desse espaço de cons- trução da clínica é privilegiada para o apoio matricial e, portanto, para o trabalho dos profissionais do Nasf. O Projeto Terapêutico Singular (PTS) é um conjunto de propostas de condutas terapêuticas articuladas, para um sujeito individual ou coletivo, resultado da discussão coletiva de uma equipe interdisciplinar, com apoio matricial, se necessário. Geralmente é dedicado a situações mais complexas. É uma variação da discussão de “caso clínico”. Foi bastante desenvolvido em espaços de atenção à saúde mental como forma de pro- piciar uma atuação integrada da equipe valorizando outros aspectos, além do diagnósti- co psiquiátrico e da medicação, no tratamento dos usuários. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 30 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica lidade/risco; (c) definição dos objetivos das equipes de saúde com relação à área e/ou população – desejos, limites, possibilidades; (d) estabelecimento das ações que seriam efetivas para alcançar os objetivos das equipes de saúde; (e) identificação de outros atores sociais e/ou instituições seriam importantes para o projeto e poderiam com ele estar comprometidos. Toda essa primeira fase da construção do projeto é de responsabilidade das equi- pes de saúde (equipe de SF com apoio do Nasf). Porém, ela não esgota o processo de elaboração e implementação do projeto. O PST deve ser sempre baseado na promoção da saúde, na participação social e na intersetorialidade, bem como na existência de demanda e na criação de espaços coletivos de discussão onde sejam analisados a priorização das necessidades de saú- de, os seus determinantes sociais, as estratégias e os objetivos propostos para a sua abordagem. É no espaço coletivo em que comunidade, outros sujeitos estratégicos (lideranças locais, representantes de associações e/ou grupos religiosos, entre outros) e membros de outras políticas e/ou serviços públicos presentes no território poderão se apropriar, reformular, estabelecer responsabilidades e pactuar o projeto de saúde para a comunidade. É assim que o projeto terá sua finalidade e seu processo de im- plementação avaliados. O PST funciona como catalisador de ações locais para a melhoria da qualida- de de vida e redução das vulnerabilidades num território determinado. O projeto de saúde do território busca estabelecer redes de cogestão e corresponsabilidade, instaurando um processo de cooperação e parceria entre os diversos atores sociais do território. Nessa direção, é importante conhecer e integrar instrumentos de pla- nejamento e gestão do setor saúde e/ou fora dele, como: Termo de Compromisso de Gestão, Plano Municipal de Saúde, Agenda 21 Local, Plano Diretor da Cidade, Projeto Político-Pedagógico das Escolas presente no território de responsabilidade, entre outros. O PST auxilia ainda o fortalecimento da integralidade do cuidado à medida que trabalha com ações vinculadas à clínica, à vigilância em saúde e à promoção da saúde. O quadro seguinte mostra, numa síntese, os diversos componentes de um Pro- jeto de Saúde do Território. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 31 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família 1.8 FINALIZANDO PARA INICIAR... Aqui é interessante reforçar como deve ser organizado o processo de trabalho dos profissionais do Nasf. Devem ser desenvolvidos por meio do apoio matricial, com a criação de espaços coletivos de discussões e planejamento. Organizando e estrutu- rando espaços de: (a) Ações clínicas compartilhadas; (b) Intervenções específicas dos profissionais do Nasf com usuários e famílias; (c) Ações compartilhadas nos territórios de sua responsabilidade. Utilizando ferramentas tecnológicas, das quais são exemplos: o Projeto Terapêu- tico Singular (PTS), o Projeto de Saúde no Território (PST), Apoio Matricial, a Clínica Ampliada e a Pactuação do Apoio. Nos capítulos seguintes, serão apresentadas as nove áreas estratégicas temáticas que compõem o Nasf, em detalhes relativos a suas diretrizes e principais ações a serem desen- volvidas. Por ora, torna-se importante destacar que tais áreas estratégicas não se remetem a atuação específica e exclusiva de uma categoria profissional. Por exemplo: a área de alimen- tação e nutrição, embora seja específica do nutricionista, acarreta ações que podem e devem ser desempenhadas por outros profissionais do Nasf. Assim, o que deverá definir se a ação é do nutricionista ou de outro profissional é a situação, ou seja, a necessidade da população e as características da equipe. E assim sucessivamente para todas as áreas estratégicas. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 32 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica LEITURAS RECOMENDADAS TEMA AUTOR Atenção Primária à Saúde: conceitos gerais e atributos STARFIELD, 2004 Sobre equipes de referência e apoio especializado matricial, com foco na reorganização do trabalho em saúde CAMPOS, 1999 Sobre o conceito de vulnerabilidade, psicológica, orgânica e social AYRES, 2003 OLIVEIRA, 2008 Sobre o sujeito singular e sua coprodução em face de doenças, desejos, interesses, trabalho, cultura, família e rede social CUNHA, 2005 Sobre conceito e estrutura de um Projeto de Saúde no Território (PST) MORAIS NETO; CASTRO, 2008 Identificação de problemas e seu processamento para definição de necessidades e situação de saúde em territórios OLIVEIRA, 2008 Sobre equipes de referência e apoio especializado matricial, com foco nos contratos de gestão CAMPOS, 1999 Integralidade nos sistemas de APS: necessidades de saúde e disponibilidade de recursos para abordá-las STARFIELD, B. 2004 Integralidade no SUS e sua ampliação para outras possibili- dades; integralidade como valor e atitude profissional MATTOS, 2001 Integralidade como construção nos serviços de saúde MINOZZO et al., 2008 Abordagem no território SANTOS, 2002 Sobre o conceito de educação popular em saúde SALLES, 2006 Sobre o conceito de interdisciplinaridade FAZENDA, 1991 Sociedade contemporânea e a produção da “alienação da dor” Ivan Illich, 1975 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 35 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família As diferentes formas de sofrimento psíquico constituem importante causa de perda de qualidade de vida na população em geral. A realidade das equipes de SF demonstra que, cotidianamente, elas se deparam com problemas de “saúde mental”: 56% das equipes de Saúde da Família referiram realizar “alguma ação de saúde men- tal”, segundo dados divulgados pela Opas/MS, relativos a 2002. Entre os pacientes atendidos pela Atenção Primária, grande proporção apresen- ta transtornos mentais. Não há estudos que representem os índices de prevalência de problemas mentais no âmbito nacional, sendo necessário recorrer a várias pesquisas. Alguns estudos realizados nas comunidades atendidas pela Saúde da Família verificaram prevalências de transtorno mentais comuns que variam de 22,7% a 38%. Entre os pacientes que procuram as unidades de SF, estudos desde a década de 80 demonstram que grande proporção apresenta transtornos mentais, revelando que entre 33% e 56% dos pacientes atendidos, nesse nível assistencial, podem apresentar sintomas de transtornos mentais comuns. A prevalência encontrada de transtornos mentais comuns em equipes de SF na periferia de São Paulo foi de 24,95%, sendo que os grupos mais vulneráveis são os de mulheres, idosos, pessoas com baixa escolaridade e menor renda per capita. Em Pelotas (RS), a prevalência foi de 22,7%. Um estudo da OMS, divulgado em 2001, avaliou os problemas psicológicos na Atenção Primária e encontrou com maior frequência a coexistência de depressão e an- siedade. Há ainda evidências apontando que os sintomas físicos sem explicação médica persistentes também podem estar associados a questões de saúde mental. Diante dessas prevalências, é preciso, portanto, qualificar a APS para o atendi- mento adequado de tais problemas. Uma das principais estratégias para ampliação do acesso ao cuidado em saúde mental é a priorização das ações de saúde mental na APS. Diversas experiências municipais já consolidadas demonstram que o apoio matricial em saúde mental melhorou a efetividade da atuação das equipes de Saúde da Família. Um levantamento preliminar de 2006, realizado pelo Ministério da Saúde do Brasil, em 12 estados da federação, no ano de 2006, constatou que apenas 16,3% dos municípios pesquisados realizam ações sistemáticas de saúde mental na Atenção Básica. No en- tanto, são referidas dificuldades pelos respectivos profissionais para lidar com o sofri- mento psíquico de seus pacientes, incluindo especialmente a abordagem das questões psicossociais da clientela por eles atendida e o manejo de transtornos mentais. A Organização Mundial da Saúde (OMS), juntamente com a Associação Mundial de Médicos de Família (WONCA), recentemente (2008) apontou as principais razões para a integração de saúde mental na APS: relevante magnitude e prevalência dos transtornos mentais; necessidade de um cuidado integral em saúde devido à indisso- C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 36 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica ciação entre os problemas físicos e de saúde mental; altas prevalências de transtornos mentais e baixo número de pessoas recebendo tratamento; aumento do acesso aos cuidados em saúde mental, quando realizados na APS; maior qualificação das ações e dos serviços, propiciando o respeito aos direitos humanos; redução de custos indiretos com a procura de tratamento em locais distantes; e bons resultados para a integralida- de da saúde de sujeitos com sofrimento psíquico. 2.3 SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA: DIRETRIZES E PRIORIDADES • Diretrizes gerais Diante do cenário apresentado, a inclusão de ações de saúde mental na APS deve ser prioridade na organização das redes de saúde. Para o melhor manejo da saúde mental na APS, propõe-se um trabalho compar- tilhado de suporte às equipes de SF por meio do desenvolvimento do apoio matricial em saúde mental pelos profissionais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf). O apoio matricial é um arranjo técnico-assistencial que visa à ampliação da clí- nica das equipes de SF, superando a lógica de encaminhamentos indiscriminados para uma lógica de corresponsabilização entre as equipes de SF e SM, com a construção de vínculos entre profissionais e usuários, pretendendo uma maior resolutividade na assistência em saúde, conforme as elaborações de Campos e Domitti (2007). Ao aumentar a capacidade das equipes de SF em lidar com o sofrimento psíquico e integrá-las com os de mais pontos da rede assistencial, o apoio matricial possibilita que a prevenção e o tratamento dos transtornos mentais, assim como a promoção da saúde e reabilitação psicossocial, aconteçam a partir da APS. A corresponsabilização pela demanda – tanto a equipe de SF como a equipe de SM são responsáveis por de- terminado território – leva à desconstrução da lógica de referência e contrarreferência, que favorece a não responsabilização e dificulta o acesso da população. O cuidado compartilhado prevê uma rede de ações, dispositivos de saúde e dispositivos comunitários que possibilitem que o processo de cuidar se organize tendo como eixo central o sujeito e seu processo de saúde/doença. O lócus do tratamento se revela mutável ao longo do tempo, com intensificação no ponto da rede em que a atenção demonstra ser mais viável, seja este na Atenção Primária, nos serviços es- pecializados ou em ambos. Assim, todos são responsáveis pela garantia do acesso, da equidade e da universalidade. A responsabilização compartilhada pelos casos visa aumentar a capacidade re- solutiva da equipe local, estimulando a interdisciplinaridade e a aquisição de novas C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 37 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família competências. Esse cuidado torna-se um dispositivo para que os usuários também possam se responsabilizar pelo seu tratamento, pelos seus sintomas e pela sua vida, produzindo outras relações com o seu processo de adoecimento. No planejamento e organização dessas ações, devem ser consideradas as se- guintes diretrizes gerais: Quadro: Saúde mental na Atenção Primária à Saúde – Diretrizes Gerais para a atuação das Equipes de Saúde 1. Deve-se identificar, acolher e atender às demandas de saúde mental do terri- tório, em seus graus variados de severidade – os pacientes devem ter acesso ao cuidado em saúde mental o mais próximo possível do seu local de mora- dia, de seus laços sociais e familiares. 2. Devem ser priorizadas as situações mais graves, que exigem cuidados mais imediatos (situações de maior vulnerabilidade e risco social). 3. As intervenções devem se dar a partir do contexto familiar e comunitário – a família e a comunidade devem ser parceiras no processo de cuidado. 4. É fundamental a garantia de continuidade do cuidado pelas equipes de Saúde da Família, seguindo estratégias construídas de forma interdisciplinar. 5. As redes sanitária e comunitária são importantes nas estratégias a serem pen- sadas para o trabalho conjunto entre saúde mental e equipes de Saúde da Família. 6. O cuidado integral articula ações de prevenção, promoção, tratamento e re- abilitação psicossocial. 7. A educação permanente deve ser o dispositivo fundamental para a organiza- ção das ações de saúde mental na Atenção Primária. Geralmente, as necessidades complexas expressas por parte significativa da população não podem ser satisfeitas com base apenas em tecnologias utilizadas por esta ou aquela especialidade, mas, sim, exigem esforços criativos e conjuntos in- ter e transdisciplinares, mobilização de recursos institucionais e comunitários, bem como recursos materiais e subjetivos que somente podem ser articulados a partir da construção de projetos terapêuticos singulares, ajustados entre o usuário e sua rede social significativa. As particularidades da saúde mental na Atenção Primária e a necessidade de am- pliação da clínica devem fazer parte do conhecimento e do cotidiano dos profissionais das equipes do Nasf que trabalharão junto às equipes de Saúde da Família. Busca-se evitar ações fragmentadas e aumentar a capacidade de acolhimento e de resolubilidade nesse nível de atenção. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 40 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica sável para que a equipe dos Nasf organize seu processo de trabalho no cotidiano das unidades de SF, por meio da proposta do apoio matricial, mencionada acima. Algumas estratégias são então propostas, conforme se mostra no quadro a seguir. FORTALECIMENTO DOS VÍNCULOS POR MEIO DA ESCUTA A escuta refere-se à apreensão e compreensão de sentidos, expectativas, ou seja, permite ouvir por meio das palavras, dos silêncios, dos gestos, das expressões, das condutas e das posturas. Busca-se que as equipes se escutem mutuamente e fortaleçam suas relações de trabalho, gerando a corresponsabilidade, o que auxiliará no cuidado junto à população. Para que isso se efetive, torna-se necessário que haja predisposição de todas as partes envolvidas. CRIAÇÃO DE ESPAÇOS DE APOIO E SUPORTE PARA OS PROFISSIONAIS DAS EQUIPES DE SF O intenso sofrimento dos usuários e das famílias assistidas pelas equipes de SF promove, em alguns contextos, o afastamento dos profissionais na tentativa de evitarem o contato com as dores e os sofrimentos ocasionados pela impotência perante as condições de vida (alta vulnerabilidade social, emocional, econômica). É fundamental a promoção de espaços de escuta das angústias e dificuldades dos profissionais em relação ao seu cotidiano de trabalho com essas famílias. O resgate junto às equipes de SF dos vínculos afetivos, de trabalho e dos processos de humanização pode mobilizar recursos coletivos, criando mais ferramentas e instrumentos para o trabalho em saúde mental. Ressalta-se que esses espaços não devem se configurar como psicoterapia para os profissionais/equipes, mas sim como momentos de trocas, construções mútuas que visam auxiliar na condução de casos e das situações com- plexas vividas no cotidiano do trabalho. HUMANIZAÇÃO DAS RELAÇÕES ENTRE OS MEMBROS DA PRÓPRIA EQUIPE Faz-se necessário criar vínculos entre os componentes da equipe, favorecendo uma relação de respeito do profissional com ele mesmo, com os outros componentes da equipe e com os usuários. Dessa forma, o apoio da equipe do Nasf às equipes de SF, o suporte da gestão e a possibilidade de um espaço de escuta das queixas e das sugestões das equipes são fundamentais para estimular a integração, sedimentar a implantação do apoio matricial e avaliar continuamente o processo para o aperfeiçoamento e o desenvolvimento de novas estratégias. • Diretrizes para o trabalho da saúde mental do Nasf com as equipes de Saúde da Família O exercício cotidiano do trabalho do Nasf e das equipes de SF envolve o de- senvolvimento de disponibilidade afetiva, criatividade, capacidade de acolhimento e vínculo, bem como de corresponsabilidade no cuidado. A partir desses componentes C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 41 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família é possível elaborar conjuntamente projetos terapêuticos e estratégias de reinserção social das pessoas com transtornos mentais. Cada município, partindo de sua organiza- ção local, deve organizar ações de saúde mental, a partir da responsabilidade conjunta das equipes. As diretrizes que devem nortear essas ações são: Quadro: Responsabilidades conjuntas NASF – Equipes de SF relativas à Saúde Mental 1. Responsabilidade pelo cuidado aos usuários de saúde mental do território, que deve ser compartilhada entre as equipes de Saúde da Família, Nasf e dispositivos de saúde mental (como Centros de Atenção Psicossocial, leitos de atenção integral em saúde mental – Caps III, hospital geral, centros de convivência, entre outros), permanecendo a coordenação do cuidado com a equipe de Saúde da Família. 2. Romper com a lógica do encaminhamento e da não responsabilização pós-referência. 3. Planejamento e realização do diagnóstico da situação de saúde mental da po- pulação do território, identificando os problemas mais frequentes e espaços de produção de vida. 4. Reuniões interdisciplinares periódicas para discussão de casos e educação permanente, onde podem ser incluídos materiais educativos e temas deman- dados pela equipe de Saúde Família ou dos profissionais do Nasf. 5. Reuniões interdisciplinares periódicas entre todos os profissionais da equipe do Nasf. 6. Atendimento compartilhado por meio de consultas conjuntas nas unidades, nos domicílios e outros espaços da comunidade. Essa estratégia deve propor- cionar a avaliação de risco, o manejo dos casos com a elaboração de projetos terapêuticos, caracterizando-se como um processo de educação permanen- te, onde vários profissionais têm a oportunidade de aprender na prática coti- diana do atendimento das demandas de saúde mental. 7. Integração entre equipes de Saúde da Família, Nasf e as redes de saúde e de apoio social – articulação com espaços comunitários, visitas aos serviços como residências terapêuticas, abrigos de crianças e de idosos, unidades so- cioeducativas etc. 8. Planejamento e execução conjunta de atividades comunitárias e terapêuticas (oficinas, grupos etc.) e de promoção da saúde (práticas corporais, atividades culturais e esportivas), além de atividades de geração de trabalho e renda. Essas intervenções necessitam ser desenvolvidas em conjunto com a equipe do Nasf. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 42 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica Organização do apoio matricial: ações de saúde mental e o papel estratégico dos profissionais de saúde mental Para iniciar essa discussão, remetendo aquela realizada na introdução do cader- no, o processo de trabalho dos profissionais do Nasf deve ser desenvolvido por meio do apoio matricial, com a criação de espaços coletivos de discussões e planejamento. Organizando e estruturando espaços de: (a) ações clínicas compartilhadas; (b) inter- venções específicas do profissional do Nasf com os usuários e/ou famílias; e (c) ações compartilhadas nos territórios de sua responsabilidade. Utilizando ferramentas tecno- lógicas, das quais são exemplos: o Projeto Terapêutico Singular (PTS), o Projeto de Saúde no Território (PST), Apoio Matricial, a Clínica Ampliada e a Pactuação do Apoio. As ações de saúde mental desenvolvidas pelos profissionais do Nasf devem ter como objetivo o aumento das possibilidades de intervenção e de resolutividade das equipes de SF em relação aos problemas de saúde mental do seu território, propician- do a ampliação da clínica em relação às questões subjetivas e à abordagem psicossocial. Nessa perspectiva, os profissionais do Nasf têm como responsabilidade as seguintes ações estratégicas: Quadro: Responsabilidades conjuntas NASF – Equipes de SF relativas à Saúde Mental 1. Apoiar as equipes de SF na abordagem e no processo de trabalho referente aos casos de transtornos mentais comuns, severos e persistentes. Ressalta-se que deve haver a articulação entre as equipes de Nasf e Saúde da Família com as equipes de Caps para um trabalho integrado e apoio do Caps nos casos necessários. As equipes de SF devem identificar os casos de saúde mental e, em conjunto com os Nasf e/ou Caps (a depender dos recursos existentes no território), elaborar estratégias de intervenção e compartilhar o cuidado; 2. Em relação aos casos de uso prejudicial de álcool e outras drogas, é necessário trabalhar com as estratégias de redução de danos, inclusive com a integração de redutores, onde houver. Da mesma forma, realizar detecção precoce de casos que necessitem de atenção e utilizar as técnicas de intervenção breve para a redução do consumo; 3. Possibilitar a construção de projetos de detecção precoce de situações de sofrimento mental, bem como desenvolver ações de prevenção e promoção em saúde mental; 4. Fomentar ações que visem à difusão de uma cultura solidária e inclusiva, di- minuindo o preconceito e a segregação com a loucura; 5. Incentivar e apoiar a organização de iniciativas de inclusão social pelo trabalho; continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 45 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Sobre o conceito de matriciamento CAMPOS E DOMITTI, 2007 Sobre a desconstrução da lógica de referência – contrarreferência – não responsabilização e a noção de cuidado compartilhado SARAIVA e CREMONESE, 2008 PEREIRA, 2007 Experiência de construção de projetos ter- apêuticos ajustados entre o usuário e sua rede social SMS – Aracaju, 2003 Sobre as particularidades da saúde mental na Atenção Primária e a ampliação da clínica GOLDBERG, 1996 Determinantes sociais na APS e Saúde Mental ONOCKO CAMPOS e GAMA, 2008 O vínculo como recurso terapêutico CAMPOS, 2003 continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 46 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica 3 REABILITAÇÃO E A SAÚDE INTEGRAL DA PESSOA IDOSA NO NASF 3.1 INTRODUÇÃO A criação dos Nasf propicia a ampliação das ações de APS, aumentando o esco- po de intervenções no processo saúde–doença, favorecendo o cuidado da população e fortalecendo a Estratégia de Saúde da Família. Isso inclui as ações de reabilitação, historicamente associadas, todavia, aos níveis secundários e terciários de atenção, baseadas em um modelo biomédico e reparativo, centrado na doença e em seus efeitos, com ênfase em procedimentos tecnicistas e individuais. Trata-se, esse último modelo, de algo que evidentemente não responde de forma eficiente aos problemas de saúde da população. Um novo entendimento do processo saúde–doença faz-se necessário, de for- ma a incluir questões sociais e desenvolver ações no plano coletivo e nos territórios respectivos, integrando assim os modelos clínico e social, dentro de uma perspectiva de responsabilidade coletiva e compromisso com a inclusão social. Assim é que de- vem ser pensadas as práticas dos profissionais da reabilitação, ou seja, na construção de ações de promoção à saúde, prevenção de agravos e deficiências e reabilitação no âmbito da APS, integrados em rede aos serviços especializados e hospitalares. A reabilitação na APS deve repercutir diretamente na atenção integral ao sujeito, de sua família e comunidade, considerando todas as necessidades identificadas no ter- ritório para além do plano da deficiência propriamente dita, contemplando as diversas condições e agravos de saúde habitualmente evidenciadas no cotidiano das equipes de Saúde da Família, tais como dor crônica, fraturas, alterações de linguagem oral e escrita, voz, na motricidade orofacial, entre outras. Mais do que isso, os papéis dos profissionais em tal campo devem contribuir para que sujeitos, famílias e comunidade assumam protagonismo no desenvolvimento de ações que promovam a mobilização da comunidade e também evitem e contornem obstáculos à qualidade de vida, com reflexos na prevenção de deficiências. Em termos conceituais, cabe citar o Programa de Ação Mundial para Pessoas com Deficiência, da ONU, para o qual reabilitação significa: “Um processo de duração limitada e com objetivo definido com vistas a permitir que uma pessoa com deficiência alcance o nível físico, mental e/ou social funcional ótimo, proporcionando-lhe assim os meios de modificar a sua própria vida. Pode com- preender medidas com vistas a compensar a perda de uma função ou uma limitação funcional (por exemplo, ajudas técnicas) e outras medidas para facilitar ajustes ou rea- justes sociais”. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 47 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família A reabilitação tem, assim, papel de fundamental importância nos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf), visto que a atuação multiprofissional pode propiciar a redução de incapacidades e deficiências com vistas à melhoria da qualidade de vida dos indivíduos, favorecendo sua inclusão social, combatendo a discriminação e ampliando o acesso ao sistema de saúde. A reabilitação deve ocorrer o mais próximo possível da moradia, de modo a facilitar o acesso, valorizar o saber da comunidade e integrar-se a outros equipa- mentos presentes no território. Assim, é fundamental que os serviços de APS, as equipes de SF sejam fortalecidas para o cuidado da população e da pessoa com de- ficiência, e que tenham os conhecimentos necessários à realização de uma atenção resolutiva e de qualidade. 3.2 A REABILITAÇÃO NAS POLÍTICAS SOCIAIS BRASILEIRAS O entendimento do conceito relativo à deficiência vem evoluindo no Brasil e em todo o mundo, especialmente após a década de 60, quando a conceituação passa a refletir a estreita relação entre as limitações que as pessoas com deficiência experimentam, a estrutura do meio ambiente e as atitudes da comunidade. Durante as décadas de 80 e 90, ocorreram mobilizações internacionais para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as pessoas com deficiência, ressaltando seu direito a terem oportunidades iguais para usufruto das melhorias resultantes do de- senvolvimento econômico e do progresso social. Estabeleceram-se, então, diretrizes para políticas públicas nas áreas da saúde, educação, emprego e renda, seguridade social e legislação. O Brasil integrou-se ao âmbito dessa tendência mundial, com sua Política Nacio- nal de Saúde da Pessoa com Deficiência, promulgada por meio da Portaria MS/GM nº 1.060, de 5/6/2002, resultado de múltiplos movimentos e longa mobilização, nacional e internacional, com participação diversificada de atores sociais e institucionais. As principais diretrizes estabelecidas pela Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência são: • A promoção da qualidade de vida das pessoas com deficiência, • A assistência integral à saúde, • A prevenção de deficiências, • A ampliação e fortalecimento dos mecanismos de informação sobre o tema; • E a capacitação de recursos humanos. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU/2006), ratifi- cada pelo Brasil em 2007 e incorporada à Constituição mediante uma emenda em julho C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 50 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica Os profissionais do Nasf realizarão diretamente também, embora em caráter excepcional, atenção aos usuários que requeiram cuidados de reabilitação, orientação, atendimento individual e coletivo. Desenvolvendo também, junto às equipes de SF, ações integradas em escolas, creches, igrejas, associações e outros ambientes, bem como visitas domiciliares. Como ações de apoio da equipe do Nasf às equipes de SF na área de reabilita- ção, podem ser citadas: Quadro: Ações das equipes NASF na reabilitação 1. Discutir e construir Projeto Terapêutico Singular (PTS); 2. Desenvolver projetos e ações intersetoriais, como o Projeto de Saúde no Território (PST); 3. Orientar e informar as equipes SF, as pessoas com deficiência, os cuidadores sobre manuseio, posicionamento e as atividades de vida diária; 4. Mobilizar recursos e tecnologias assistenciais para o desempenho funcional; 5. Desenvolver propostas de ações de reabilitação baseadas na comunidade; 6. Encaminhar e orientar, quando necessário, procedimentos para obtenção de órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção; 7. Realizar ações que facilitem a inclusão escolar, laboral ou social de pessoas com deficiência, conforme prevê a Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência; 8. Apoiar as equipes de SF no acompanhamento de idosos com problemas de locomoção ou acamados. Participar do planejamento e desenvolvimento das ações de reabilitação no Nasf exigirá desses profissionais mais que uma adequada formação técnico-científica. Re- quer o engajamento pessoal, estabelecimento de prioridades e definição de estra- tégias, comunicação e integração com diferentes atores sociais e conhecimento das políticas públicas de saúde e suas diretrizes na APS. É importante também ressaltar que o Nasf não constitui porta de entrada ao sis- tema de saúde. Nele, os profissionais devem se responsabilizar pelo acompanhamento dos casos, planejando, atuando e avaliando resultados em conjunto com as equipes de SF. Para tanto, o planejamento deverá partir do conhecimento, com profundidade, do território de abrangência, de seu perfil epidemiológico, mapeando as situações e áreas de maior risco, para programar uma atuação racional sobre esses fatores. As equipes dos Nasf deverão ser habilitadas para as metodologias de reconheci- mento e mapeamento de território, como são as equipes de SF – bagagem que nem C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 51 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família sempre está incorporada à formação acadêmica. Assim, poderão participar do planeja- mento e programação de ações que promovam impacto positivo nos indicadores que retratam as necessidades da população, moradora daquele território, em termos de prevenção, assistência e reabilitação. Dados de mortalidade e morbidade, por causas, sexo e faixas etárias, analisados em função de mapas do território, poderão apontar as prioridades e os locais mais crí- ticos onde deverão se concentrar esforços. Dessa forma, se poderá saber, por exem- plo, onde pedestres e ciclistas são atropelados; quantas crianças nasceram com sífilis congênita, com fissura labiopalatal e com lesões cerebrais graves; quais as condições de trabalho em construções, fábricas e domicílios, e seus riscos para acidentes ou do- enças do trabalho; quantos idosos estão restritos ao leito e por qual motivo; a situação dos diabéticos da área de abrangência; como está sendo realizado o pré-natal; onde a violência está mais presente; e se os cuidados com os recém-nascidos são prestados com qualidade nos hospitais. Atuar preventivamente sobre os fatores causadores de deficiências constitui tam- bém uma responsabilidade da APS e deve ser reforçada pelas equipes dos Nasf. É de fundamental importância mapear áreas de maior risco para crianças, mulheres, adoles- centes, jovens, adultos e idosos. E, quando já instalada uma incapacidade funcional ou deficiência, será preciso também conhecer a prevalência nas comunidades, mapeando e analisando os casos existentes. Há que se analisar, ainda, as condições de acessibilida- de que são, ou não, oferecidas pelos ambientes públicos, como ruas, calçadas, trans- porte, praças e parques, edifícios (guias rebaixadas, rampas, portas largas, sanitários). Uma atuação integral dos profissionais do Nasf, inclusive de reabilitação, deverá incluir a mobilização da comunidade e seus recursos; a transformação dos ambientes públicos e coletivos para permitir ampla acessibilidade; a melhoria da informação e da comunicação em linguagem acessível (Braille, Libras, Tadoma e outros sistemas). Uma atuação integral deverá também envolver as famílias no cuidado e incluir sem discriminação as pessoas com deficiência na vida da comunidade. Para tanto há que se trabalhar para que a comunidade possa reconhecer seus próprios recursos, auxiliando o desenvolvimento das potencialidades das pessoas com deficiências. Não se pode esquecer de que será imprescindível o estabelecimento de canais de comunicação entre as equipes de Saúde da família e a equipe dos Nasf e as Unidades de Reabilitação (física, auditiva, visual, intelectual) existentes em cada localidade ou região, para que se possa proceder aos encaminhamentos para cuidados que envolvam maior nível tecnológico, bem como o fornecimento de órteses, próteses, meios auxiliares de locomoção, bolsas de ostomia, recursos ópticos, estabelecendo-se também os canais para o retorno desses usuários e seu acompanhamento pelas equipes de SF. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 52 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica O papel dos profissionais de reabilitação do Nasf será fundamental, por exem- plo, na abordagem das deficiências físicas, auditivas, visuais, intelectuais ou múltiplas que poderiam ser evitadas ou atenuadas com a adoção de medidas apropriadas e oportunas, como ações em saneamento, no trânsito, em segurança, em saúde, em educação. As principais causas de deficiência estão correlacionadas a eventos como transtornos congênitos e perinatais, doenças transmissíveis e crônicas, transtornos psiquiátricos, abusos de álcool e droga, desnutrição, traumas e lesões (violência, aci- dentes no trânsito, no trabalho, na moradia). A elas somam-se as consequências das mudanças do perfil epidemiológico e o aumento da esperança de vida no País, que ampliam a necessidade de ações de prevenção às doenças crônico-degenerativas e de eventos incapacitantes, em especial no contingente populacional idoso. Intervir sobre os fatores que causam as deficiências é tarefa que ultrapassa, to- davia, o âmbito do Nasf ou das equipes de SF, competindo a toda a sociedade, o que inclui os poderes públicos, as entidades não governamentais e as privadas, as associa- ções, os conselhos, as comunidades, as famílias, além dos próprios indivíduos. A inclusão da assistência aos familiares é essencial para um atendimento humani- zado, completo e eficaz, o que compreende ações de apoio psicossocial, orientações para a realização das atividades de vida diária, oferecimento de suporte especializado em situação de internamento hospitalar ou domiciliar, entre outras. • Reabilitação e prevenção Há dois focos principais a direcionar as ações em prevenção desenvolvidas no SUS, envolvendo toda a rede de atenção. As realizadas para intervir nos eventos que causam as deficiências e também aquelas realizadas para evitar a progressão de uma deficiência já instalada. No primeiro foco, entre as principais ações de saúde para pre- venção, estão: acompanhamento do pré-natal (incluindo os exames de laboratório), especialmente das gestantes de risco, e do pós-natal (incluindo teste do pezinho, triagem auditiva neonatal e triagem visual para os bebês); acompanhamento do cres- cimento e desenvolvimento da criança (nutrição, desenvolvimento neuropsicomotor e de linguagem); prevenção e tratamento da hanseníase; programas de vacinação contra poliomielite, sarampo e rubéola; cuidados com relação a doenças sexualmente transmissíveis e Aids; aconselhamento genético, com acesso a exames para desco- brir doenças genéticas que causam deficiência (exame de cariótipo e outros erros próprios do metabolismo em geral), tais como fenilcetonúria, hemoglobinopatias e hipertireoidismo congênito; programas voltados aos diabéticos, hipertensos e cardía- cos; programas com adolescentes (para prevenção de violências) e com idosos para prevenção de eventos incapacitantes, como as quedas. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 55 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Quadro: Ações clínicas da APS nas deficiências 1. Identificação do tipo de deficiência; 2. Encaminhamentos para serviços de reabilitação adequados para a aquisição de tecnologias assistidas, favorecendo a acessibilidade e melhoria da qualidade de vida (órteses, próteses, meios auxiliares de locomoção e recursos ópticos); 3. Acolhimento, apoio e orientação às famílias, principalmente no momento do diagnóstico, para o manejo das situações oriundas da deficiência; 4. Reuniões para discussões de caso e educação permanente; 5. Articulação com as atividades dos agentes comunitários de saúde, importan- tes no tocante à questão do autocuidado, envolvimento da família e do repas- se de informações; 6. Realização de visitas domiciliares para avaliações, orientações, adaptações e acompanhamentos; 7. Indicação e orientação para acesso a recursos assistenciais e benefícios dis- poníveis como o auxílio-doença, o Benefício de Prestação Continuada (BPC/ Loas), o Programa Passe-Livre, bem como outros programas e políticas públi- cas para a garantia de direitos, como o de crianças com deficiência frequen- tarem o ensino público regular, entre outros. Do ponto de vista da reabilitação, é preciso que se conheça e se monitore as necessidades e potencialidades da população em todos os ciclos de vida, incluindo a ocorrência das incapacidades e deficiências, bem como se faça a análise de prevalência e tendências, sendo que essas informações precisam ser compartilhadas, de modo que o conjunto dos profissionais envolvidos utilize os dados e as informações obtidas como norteadores de suas ações. Em seguida, definem-se os planos de trabalho, a partir das necessidades dos usuários e das potencialidades das equipes de SF, de maneira compartilhada e descen- tralizada, priorizando-se as ações que promovam a capacitação relativa aos saberes de reabilitação aos profissionais de SF e demais envolvidos na questão. Esses dois aspectos são fundamentais para a construção dos projetos terapêuti- cos singulares, visto que implicam efetivo conhecimento relativo ao coletivo, de seus contextos e dos atores que se responsabilizarão pela intervenção. Ao se estabelecer as metas, devem ser levados em conta, de forma concreta e operativa, conceitos como melhoria de qualidade de vida e participação social. Aliás, o momento de ajuste de objetivos e metas relativos ao projeto terapêutico de um deter- minado caso e seus desdobramentos de reavaliação deve constituir, também, um pro- cesso educativo para todos os profissionais de saúde. Nesse aspecto, a equipe do Nasf C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 56 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica deverá ser facilitadora, junto à equipe de SF, para a compreensão e reconhecimento do processo de recuperação, às vezes revestido de alta sutileza, de forma a fundamentar o resgate da crença, por parte dos pacientes, na sua potencial recuperação. Trata-se, acima de tudo, de um exercício de capacitação das equipes para que possam adquirir um “olhar” às potencialidades dos sujeitos e das comunidades. Tal processo pode ser assim detalhado em etapas: (a) intervenção com cro- nograma, momento de tornar concreto o ajuste dos objetivos e estabelecimento do tempo necessário para se alcançar algumas metas ou retornar para nova discussão e avaliação das ações propostas para o caso; (b) definição do profissional de referência, que deve ser visto como aquele que articula e acompanha o processo como um todo, e que deve ser procurado e procurar pelos demais profissionais, pelas e famílias e pela comunidade quando alguma situação nova se colocar. • A reabilitação e a autonomia dos sujeitos Aumentar a autoconfiança, a capacidade, a autonomia de indivíduos e grupos sociais, seja nas relações interpessoais, seja nas institucionais, deve ser objetivo central das boas práticas de reabilitação. Isso tem sido chamado também de empoderamento. Seu significado é fundamental, traduzindo desenvolvimento de potencialidades, au- mento de informação, da percepção e da participação real e simbólica dos pacientes, que assim passam a ser sujeitos, e não meramente objetos das ações. Assim é que promover espaços de troca entre os profissionais, profissionais e usuários, estabelecer fóruns de diálogo e debate, construir redes colaborativas na cons- trução da saúde e no compromisso com a inclusão social contribuirá também para tal “empoderamento” não só dos pacientes, mas também dos profissionais, favorecendo o reconhecimento das suas potencialidades e facilitando o enfrentamento dos desafios inerentes à sua atuação, para que algumas recomendações possam ser formuladas. Quadro: Ações para o fortalecimento da reabilitação e atenção integral à pessoa idosa no âmbito dos NASF 1. Propiciar e estimular a criação de espaços de discussão do processo de traba- lho e modelo inclusivo de reabilitação; 2. Ter agenda de reuniões periódicas e discussões conjuntas entre as equipes do Nasf e as equipes de SF, favorecendo a mudança da lógica do encaminhamen- to verticalizado, compartimentalizado para a horizontalidade dos saberes nas equipes de saúde; 3. Fortalecer o trabalho em equipe multiprofissional/interdisciplinar; continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 57 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família continuação 4. Favorecer a apropriação do conhecimento das abordagens e práticas grupais e oficinas (socioeducativas, focais, operativas, terapêuticas, entre outras); 5. Propiciar e criar estratégias para a integração ensino–serviço–comunidade, estabelecendo novo cenário de prática para os profissionais da reabilitação e favorecendo a mudança na formação acadêmica; 6. Propiciar a educação permanente em serviço; 7. Favorecer a integração das ações da reabilitação aos outros equipamentos do território (escolas, creches, igrejas, associações, áreas de esporte e lazer, teatros). 3.4 OBSERVAÇÕES FINAIS As ações da reabilitação deverão ser constantemente acompanhadas por toda a equipe envolvida no processo de trabalho (do Nasf ou da própria equipe de SF), na busca por ações mais adequadas e pela melhoria da gestão da APS. Assim, as Unidades Básicas de Saúde, os profissionais de reabilitação do Nasf e a população devem tra- balhar em conjunto na construção das ações de saúde em seu território. Isso significa que o trabalho depende do desenvolvimento de metas que deverão ser avaliadas, acompanhadas e de conhecimento e apropriação de todos. De maneira esquemática, seguem algumas sugestões de temas que poderão ser utilizados para o desenvolvimento das ações de reabilitação no contexto local: Quadro: Sugestões temáticas na reabilitação no âmbito dos NASF 1. Mapeamento e conhecimento de toda a população com deficiência do território; 2. Aumento da adesão ao tratamento; 3. Garantia da universalidade do acesso; 4. Diminuição das barreiras arquitetônicas e atitudinais daquele dado território – Unidades Básicas de Saúde (como o aumento do calçamento com guias rebaixadas e a adequação dos espaços físicos das unidades de Saúde da Fa- mília, a ampliação do conhecimento dos profissionais para o atendimento dos usuários com deficiência); 5. Empoderamento das equipes de Saúde da Família dos saberes da reabilitação; 6. Prevenção de doenças e/ou agravos; continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 60 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica Quadro 1: Diretrizes da PNAN 1. Estímulo às ações intersetoriais com vistas ao acesso universal aos alimentos; 2. Garantia da segurança e da qualidade dos alimentos e da prestação de servi- ços nesse contexto; 3. Monitoramento da situação alimentar e nutricional; 4. Promoção de práticas alimentares e estilos de vida saudáveis; 5. Prevenção e controle dos distúrbios nutricionais e de doenças associadas à alimentação e nutrição; 6. Promoção do desenvolvimento de linhas de investigação; 7. Desenvolvimento e capacitação de recursos humanos. 4.2 SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL E DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA A Segurança Alimentar e Nutricional, nos termos dispostos na PNAN, consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qua- lidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sus- tentáveis. A segurança alimentar e nutricional abrange: (a) ampliação das condições de acesso aos alimentos por meio da produção, em especial da agricultura tradicional e familiar, do processamento, da industrialização, da comercialização, incluindo-se os acordos internacionais, do abastecimento e da distribuição dos alimentos, incluindo a água, bem como da geração de emprego e da redistribuição de renda; (b) conservação da biodiversidade e utilização sustentável dos recursos; (c) a promoção da saúde, da nutrição e da alimentação da população, incluindo-se grupos populacionais específicos e populações em situação de vulnerabilidade social; (d) a garantia da qualidade biológi- ca, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos, bem como seu aproveitamento, estimulando práticas alimentares e estilos de vida saudáveis que respeitem a diversida- de étnica e racial e cultural da população; (e) a produção de conhecimento e o acesso à informação; além de (f) a implementação de políticas e estratégias sustentáveis e participativas de produção, comercialização e consumo de alimentos, respeitando-se as múltiplas características culturais do País. O conceito de Direito Humano à Alimentação Adequada está fortemente re- lacionado ao conceito de Segurança Alimentar e Nutricional. O direito à alimentação é parte dos direitos fundamentais da humanidade, que foram definidos por um pacto mundial, do qual o Brasil é signatário. Esses direitos referem-se a um conjunto de condições necessárias e essenciais para que todos os seres humanos, de forma iguali- C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 61 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família tária e sem nenhum tipo de discriminação, existam, desenvolvam suas capacidades e participem plenamente e dignamente da vida em sociedade; devendo o poder público adotar políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população, de acordo com a PNAN. O Guia Alimentar para a População Brasileira, uma publicação do Ministério da Saúde, apresenta diretrizes acerca dos hábitos alimentares saudáveis e está inserido nas preocupações que têm inspirado as ações do governo, tanto na política de seguran- ça alimentar e nutricional como na promoção da prevenção de agravos à saúde que resultam de alimentação insuficiente ou inadequada. As práticas alimentares saudáveis devem ter como enfoque prioritário o resgate de hábitos alimentares regionais ine- rentes ao consumo de alimentos in natura, produzidos em nível local, culturalmente referenciados e de elevado valor nutritivo, como frutas, legumes e verduras, grãos integrais, leguminosas, sementes e castanhas, que devem ser consumidos a partir dos seis meses de vida até a fase adulta e a velhice, considerando sua segurança sanitá- ria. Não se pode se esquecer de considerar os aspectos comportamentais e afetivos relacionados às práticas alimentares. A alimentação saudável deve contemplar alguns atributos básicos, são eles: acessibilidade física e financeira, sabor, variedade, cor, har- monia e segurança sanitária. 4.3 PERFIL EPIDEMIOLÓGICO E NUTRICIONAL DA POPULAÇÃO BRASILEIRA Atualmente, um dos principais desafios para a gestão das políticas públicas de saúde é equacionar no planejamento das ações e serviços de saúde as mudanças decorrentes da transição demográfica, epidemiológica e nutricional. O aumento na expectativa de vida e a redução da fecundidade geraram alterações importantes na composição etária da população. A população idosa aumentou de 6,1% para 8,6% no período de 1980 a 2000 e, por outro lado, houve redução da proporção de me- nores de 15 anos na população de 38,2% para 29,6% no mesmo período, conforme dados do IBGE. O envelhecimento da população brasileira, com importante aumento do número de idosos nas últimas décadas, revela indicadores positivos de melhora na expectativa de vida da população. A transição epidemiológica caracterizada pelo processo de mudança nos pa- drões de morbimortalidade da população caracteriza-se pela substituição das doenças infectocontagiosas por doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e causas externas, com maior adoecimento de extratos mais idosos da população e maior sobrevida de pacientes doentes (caracterizando aumento na morbidade e redução na mortalida- de), sendo que atualmente no Brasil observa-se redução das doenças infecciosas e parasitárias com aumento concomitante das DCNT, como doenças cardiovasculares, neoplasias e diabetes. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 62 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica A transição nutricional no Brasil é marcada pela dupla carga de doenças, com a coexistência de doenças infecciosas e transmissíveis, desnutrição e deficiências nu- tricionais específicas e de DCNT relacionadas à alimentação, tais como obesidade, hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes e alguns tipos de câncer, e tem sido documentada em todas as faixas de renda da população, em particular entre famílias de menor poder socioeconômico. A transição nutricional no País chama atenção, entre- tanto, para um intrigante paradoxo: a concomitância da anemia por deficiência de ferro e da obesidade nos mesmos cenários e grupos populacionais, sinal da manutenção de um modelo de transição nutricional no qual ainda perdura a sobreposição do padrão, do atraso e da modernidade. No Brasil, as doenças cardiovasculares correspondem à primeira causa de morte há pelo menos quatro décadas, acompanhadas do aumento expressivo da mortalidade por dia- betes e ascensão de algumas neoplasias malignas. O perfil alimentar observado nas famílias brasileiras influencia fortemente a ocorrência do excesso de peso, hipertensão e diabetes. O excesso de peso, pela sua magnitude e velocidade da sua evolução em vá- rios países do mundo, tem sido definido como uma pandemia, atingindo tanto países desenvolvidos como em desenvolvimento, entre eles o Brasil. Atualmente 39,2% das mulheres e 41% dos homens apresentam excesso de peso e 12,7% e 8,8% são obesos, respectivamente, sendo que a prevalência de obesidade é mais elevada nas Regiões Sul e Sudeste do País. Essa tendência de aumento da obesidade foi registrada para os homens e mulheres de todas as faixas de renda, no período de 1974 a 1989. No período seguinte (1989–2003), os homens continuaram apresentando aumento da obesidade independentemente de sua faixa de renda, enquanto as mulheres, so- mente aquelas com baixa escolaridade e situadas nas faixas de renda mais baixas (entre as 40% mais pobres) apresentaram esse aumento, conforme dados do IBGE. A evolução da dieta do brasileiro que nos últimos 30 anos mostra tendência de redução de consumo de alimentos tradicionalmente presentes na mesma (arroz e feijão). Por outro lado, nesse mesmo período manteve-se um excesso de consumo relativo aos açúcares, com insuficiência de frutas e hortaliças e incremento dieta em gorduras, princi- palmente da variedade saturadas. Demonstra-se, assim, um padrão alimentar inadequado à manutenção da saúde com tal dieta inadequada, rica em gorduras e pobre em micro- nutrientes e fibras, resultando no aumento da obesidade e das DCNT a ela associadas. Em face do cenário exposto, no campo das políticas públicas, a resposta mais adequada parece ser a conjugação de esforços intersetoriais e multidisciplinares para a implementação de ações articuladas e condizentes com a necessidade do perfil de saúde e nutrição da população. Além disso, é imperativa a inclusão, na agenda da saú- de, de intervenções capazes de prevenir e evitar os agravos à saúde e os desfechos ocasionados pela transição nutricional. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 65 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família continuação 3. Desenvolvimento de programas de suplementação preventiva com micronu- trientes (ferro, ácido fólico e vitamina A); 4. Cuidado nutricional para grupos populacionais portadores de agravos espe- cíficos (desnutrição, risco nutricional, hipertensão, diabetes, obesidade, HIV/ Aids, entre outros); 5. Acompanhamento das condicionalidades de saúde do Programa Bolsa-Famí- lia, no âmbito municipal. • As ações de apoio matricial em alimentação e nutrição na APS O nutricionista, enquanto membro da equipe do Nasf, prioritariamente desen- volve as suas ações com a equipe da SF de sua área de abrangência. O atendimento clínico individual faz parte apenas ocasional das atribuições regulares dos profissionais do Nasf. Quando o usuário necessitar de cuidado nutricional específico, este deve ser operacionalizado por meio do Projeto Terapêutico Singular (PTS) a ser cuidado, acom- panhado e de responsabilidade direta das equipes de SF, sob orientação do Nasf. Vale destacar, como já colocado na introdução, o processo de trabalho dos pro- fissionais do Nasf, que deve ser desenvolvido por meio do apoio matricial, com a cria- ção de espaços coletivos de discussões e planejamento. Organizando e estruturando espaços de: (a) ações clínicas compartilhadas; (b) intervenções específicas do profissio- nal do Nasf com os usuários e/ou famílias; (c) ações compartilhadas nos territórios de sua responsabilidade. Utilizando ferramentas tecnológicas, das quais são exemplos: o Projeto Terapêutico Singular (PTS), o Projeto de Saúde no Território (PST), Apoio Ma- tricial, a Clínica Ampliada e a Pactuação do Apoio. Na lógica desse modelo de atenção, uma agenda da área de nutrição deve ser organizada, em conjunto com a equipe de SF, tendo como base as necessidades locais – pela caracterização do perfil epidemiológico, ambiental e social da comunidade e dos espaços domiciliares, com a identificação de riscos, potencialidades e possibilidades de atuação e reconhecimento da situação de saúde, alimentação e nutrição das famílias. O processo de territorialização, um dos atributos da Estratégia de SF, facilita o conhecimento da realidade de saúde da população. Deve-se considerar que há dina- micidade nos determinantes sociais e que eles estão em constante movimento. Assim, torna-se fundamental que a equipe do Nasf se aproprie da situação de saúde e doença no território e acompanhe, junto às equipes de SF, o mapeamento do território, o diagnóstico de agravos à saúde, relacionando-os com a alimentação e nutrição. Após esse diagnóstico local, é possível realizar o planejamento com vistas à estruturação das ações de prevenção e controle das deficiências nutricionais e de promoção da alimen- tação saudável. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 66 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica A promoção da saúde é um componente fundamental dos projetos terapêuticos, tanto em âmbito individual quanto coletivo, que implica, necessariamente, propiciar ao sujeito autonomia para escolha de modos de viver mais saudáveis com relação à alimentação, atividade física, entre outras tantas escolhas. O apoio matricial, já definido em outro tópico deste Caderno (ver introdução), pode ser operacionalizado por intermédio de diversas ações, por exemplo: atendimen- to compartilhado, estudos de casos, projetos terapêuticos singulares, atendimento em conjunto, ações no território, além de ações educativas. Clínica Ampliada é um compromisso com o sujeito visto de modo singular, com as implicações concretas do cotidiano, suas relações afetivas, seu trabalho, aspectos cul- turais, entre outros. É o reconhecendo dos limites do conhecimento técnico em saúde e a necessidade de construções interdisciplinares e intersetoriais. Projeto Terapêutico Singular é utilizado, também, quando a equipe de saúde ne- cessita de outros saberes para o enfrentamento de casos especiais, dentro do objetivo de traçar estratégias de intervenção junto ao usuário, levando em conta os recursos da equipe, do território, da família e do próprio sujeito. Ações clínicas compartilhadsas diz respeito a uma forma de interação entre os apoiadores do Nasf e os profissionais da equipe de SF, constituindo um momento em que se realiza a troca de saberes específicos e de experiências vivenciadas, bem como a formação em serviço e a discussão do projeto terapêutico, de forma a possibilitar uma abordagem integral e resolutiva ao caso. Ações no território representam um momento rico de (re)conhecimento do ter- ritório, de seus equipamentos sociais, dos aspectos culturais e dos hábitos da comuni- dade. Tal abordagem deve alcançar o domicílio, que constitui o local onde o profissional conhece a realidade da família, seu ambiente, seus costumes, crenças e valores. Educação e formação consistem em realizar atividades de educação permanente com vistas a qualificar e instrumentalizar a equipe local para aprimorar a atenção nu- tricional, a partir de metodologia participativa e de troca de conhecimentos entre os profissionais e entre os profissionais e a população, com debates sobre alimentação saudável, principais agravos nutricionais e promoção da saúde. A operacionalização das ações de alimentação e nutrição na Atenção Primária tem ainda na interdisciplinaridade um componente imprescindível, o que pressupõe a interação de saberes e experiências entre profissionais de uma equipe que realizam tarefa conjuntamente. Os espaços interdisciplinares como os grupos de educação em saúde, os atendimentos conjuntos, o apoio matricial, o projeto terapêutico singular, as visitas domiciliares e a educação permanente são oportunidades para os profissionais compartilharem seus conhecimentos específicos com a equipe e a comunidade. A in- tersetorialidade requer dinâmica complexa, uma vez que objetiva articular diferentes setores na resolução de problemas no cotidiano da gestão da atenção em saúde. Dada C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 67 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família a multicausalidade do processo saúde–doença, devem ser consideradas práticas de ges- tão em saúde adequadas que permitam construir espaços compartilhados de decisões e ações entre instituições e diferentes setores de governo. Torna-se necessário, assim, a construção de parcerias locais interinstitucionais e comunitárias, envolvendo escolas, creches, Centros de Referência de Assistência So- cial (Cras), instituições religiosas e outros equipamentos sociais existentes no território. Além disso, o estímulo à participação popular e ao controle social, por meio de reu- niões comunitárias, comitês gestores e conselhos locais de saúde, na construção do Projeto de Saúde no Território (PST), já apresentado na introdução deste Caderno. A resolutividade é outro pressuposto fundamental, assim, quando um indivíduo busca o atendimento ou quando surge um problema de impacto coletivo sobre a saú- de, o serviço correspondente precisa estar capacitado para enfrentá-lo e resolvê-lo até o nível da sua competência. Deve ficar claro, ainda, que as ações de proteção social e segurança alimentar e nutricional devem envolver a capacitação das equipes de SF e demais profissionais do Nasf, por exemplo, na adoção de protocolos de identificação, organização e fortale- cimento das estratégias locais de acompanhamento da população de risco, na adoção de protocolos intersetoriais de encaminhamento de famílias em risco de insegurança alimentar e nutricional, por exemplo, no encaminhamento para programas de assis- tência alimentar, de geração de renda, inclusão social ou assistencial: Programa Bolsa- Família, estratégias ou ações locais de segurança alimentar e nutricional, sejam ou não de iniciativa estatal. Além disso, cabe a toda a equipe do Nasf, não apenas ao nutricionista, conhecer e divulgar entre as equipes de SF as instâncias legais, os mecanismos de exigibilidade concernentes ao Direito Humano à Alimentação Adequada, as normas e protocolos municipais de vigilância e de apoio às famílias e pessoas nas situações de risco social. Diante de tais pressupostos, podem ser enumerados os sujeitos da abordagem no cuidado nutricional. São eles: o indivíduo, a família e a comunidade, explanados com mais detalhe nas linhas abaixo. Sujeito de abordagem: comunidade As ações direcionadas para a comunidade, a serem realizadas em conjunto com as equipes de SF, demandam a utilização de espaços públicos que permitam o desen- volvimento do pensamento crítico para identificação de problemas e a elaboração de estratégias para a superação desses. Implica valorização do debate e estabelecimen- to de parcerias entre profissionais, usuários e comunidade em geral. Nesse sentido, faz-se necessária a interlocução dentro de variados espaços, como creches, escolas, ambientes de trabalho, igrejas, além de meios de comunicação de massa, como rádios comunitárias. É imprescindível, ainda, que o profissional promova e esteja engajado, C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 70 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica O estabelecimento de contato entre as equipes de SF e o nutricionista do Nasf será mediante a combinação de encontros periódicos e regulares, modulados pela realidade local. Nesses encontros, objetivar-se-á discutir os casos ou problemas de saúde que a equipe analisou necessário o apoio do nutricionista, elaborar projetos terapêuticos, ajustar linhas de intervenção para os vários profissionais envolvidos e, principalmente, serem negociados com o sujeito. Se o objetivo é que o projeto terapêutico seja incorporado pelo usuário, a negocia- ção deve ser flexível, sensível às mudanças de curso e atenta aos detalhes. É importante que haja um membro da equipe que se responsabilize pelo vínculo mais direto e acompa- nhe todo o processo. Geralmente essa pessoa deve ser aquela com quem o usuário tem um vínculo mais positivo, destacando-se, especialmente, o papel do ACS. Nos casos imprevistos ou urgentes, em que não seria recomendável aguardar a reunião regular, a equipe poderá acionar o nutricionista por meios diretos de comunicação. • Sobre indicadores Indicadores em saúde são medidas que sintetizam o estado de saúde de um gru- po ou população. Essas informações são de grande importância na tomada de decisão, planejamento e avaliação de metas programadas. Os profissionais do Nasf devem apoiar as equipes SF para a coleta, consolida- ção, análise e avaliação dos dados relativos à alimentação e nutrição na sua área de abrangência. Para tanto é necessário que a equipe de SF se aproprie dos indicadores estabelecidos pela gestão municipal, estadual e federal, nada impedindo também que criem seus próprios indicadores. Os dados devem sempre ser compilados de fontes confiáveis e a sua coleta deve sempre seguir padrões predefinidos por protocolos e parâmetros antes estabelecidos. Todos esses cuidados garantem a qualidade e a veracidade dos indicadores calculados e estabelecidos. A excelência de um indicador pode ser medida por sua validade (ca- pacidade de medir o que se pretende) e confiabilidade (reproduzir os mesmos resul- tados quando aplicado em condições similares). Quando gerados de forma regular e contínua e se manejados por um sistema di- nâmico, os indicadores são instrumentos valiosos para a gestão e avaliação da situação em saúde em todos os níveis de atuação profissional, sendo importante instrumento para se estabelecer prioridades, aplicar políticas e ajustar os programas em execução. Os indicadores sugeridos abaixo já são utilizados e monitorados pelos Sistemas de Informação em Saúde (SIS), o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) Web, o Sistema de Gestão do Programa Bolsa-Família na Saúde, o Sistema de Infor- mação de Atenção Básica (Siab), o Sistema de Gerenciamento do Programa Nacional de Suplementação de Ferro (PNSF) e o Sistema de Gerenciamento do Programa Na- cional de Suplementação de Vitamina A – e podem ser utilizados pelas equipes de saú- de tanto para o planejamento como para a avaliação dos resultados de suas atividades. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 71 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Tabela 1 – Matriz dos Indicadores Básicos da Nutrição OBJETIVO INDICADOR FÓRMULA DE CÁLCULO Considerando a Área de Abrangência do NASF FONTE 1 * Desenvolver ações contínuas voltadas à diminuição da prevalência de desnutrição (déficit de peso para idade) em crianças menores de 5 anos Percentual de crianças menores de 5 anos com baixo peso para idade Número de crianças menores de 5 anos com peso por idade abaixo do percentil 3 / Número total de crianças menores de 5 anos acompanhadas pelo SISVAN x 100 SISVAN 2 * Monitorar e melhorar o acompanhamento das condicionalidades do setor saúde do Programa Bolsa Família (acompanhamento das famílias e crianças beneficiárias) Percentual de famílias com perfil saúde beneficiárias do programa bolsa família acompanhadas pela atenção básica Número de famílias com perfil saúde acompanhadas pela atenção básica / Número total de famílias com perfil saúde cadastradas no Cad-Único x 100 SISVAN 3 Desenvolver ações contínuas voltadas a diminuição da prevalência da desnutrição crônica (déficit estatural para idade) Percentual de crianças menores de 5 anos com déficit estatural para idade Número de crianças menores de 5 anos com altura para idade abaixo do percentil 3/ Número total de crianças menores de 5 anos acompanhadas pelo SISVAN x 100 SISVAN 4 Desenvolver ações voltadas a redução do excesso de peso (Sobrepeso e Obesidade) em crianças Percentual de crianças (< 10 anos) com peso elevado para idade (percentil ≥ 85) Número de crianças (< 10 anos) com peso elevado para idade / Número total de crianças (< 10 anos) acompanhadas pelo SISVAN x 100 SISVAN 5 Desenvolver ações voltadas a redução do excesso de peso (Sobrepeso e Obesidade) em adolescentes Percentual de adolescentes (≥ 10 anos e < 20 anos) com peso elevado para idade (percentil ≥ 85) Número de adolescentes (≥ 10 anos e < 20 anos) com peso elevado para idade (percentil ≥ 85) / Número total de adolescentes (≥ 10 anos e < 20 anos) acompanhados pelo SISVAN x 100 SISVAN 6 Desenvolver ações voltadas a redução do excesso de peso (Sobrepeso e Obesidade) em adultos Percentual de adultos (≥ 20 anos e < 60 anos) com excesso de peso (IMC ≥ 25) Número de adultos (≥ 20 anos e < 60 anos) com excesso de peso (IMC ≥ 25) / Número total de adultos (≥ 20 anos e < 60 anos) acompanhados pelo SISVAN x 100 SISVAN 7 Desenvolver ações voltadas a redução do excesso de peso (Sobrepeso e Obesidade) em idosos Percentual de idosos (60 anos) com excesso de peso (IMC< 27) Número de idosos (≥ 60 anos) com excesso de peso (IMC ≥ 27) Número total de idosos (≥ 60 anos) acompanhados pelo SISVAN x 100 SISVAN 8 Desenvolver ações voltadas a diminuição da prevalência de desnutrição em idosos Percentual de idosos (≥ 60 anos) com baixo peso (IMC ≤ 22) Número de idosos (≥ 60 anos) com baixo peso (IMC ≤ 22 / Número total de idosos (≥ 60 anos) acompanhados pelo SISVAN x 100 SISVAN 9 Promover o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses de idade Percentual de crianças menores de 6 meses em Aleitamento Matermo Exclusivo Número de crianças menores de 6 meses em aleitamento materno exclusivo / Número total de crianças menores de 6 meses na área de abrangência do NASF x 100 SISVAN e SIAB 10 Promover a alimentação complementar saudável para crianças menores de 24 meses Número de atividades educativas em promoção da alimentação complementar de incentivo à alimentação complementar saudável Número de atividades educativas desenvolvidas pelas equipes de SF no período de 12 meses à definir 11 Monitorar a diversidade de consumo alimentar de crianças com idade entre 6 meses e menos de 2 anos Percentual de crianças com idade entre 6 meses e menos de 2 anos com dieta diversificada Número de crianças entre 6 meses e menos de 2 anos que consomem > 4 grupos de alimentos/ Número total de crianças entre 6 meses e menos de 2 anos acompanhadas no SISVAN x 100 SISVAN Web 12 Ampliar a cobertura do Programa de Suplementação da Vitamina A **, em crianças de 6 a 11 meses Percentual de crianças (6 a 11 meses) que recebem Suplementação de vitamina A Número de crianças (6 meses a 11 meses) que recebem suplementação de vitamina A / Número total de crianças (6 meses a 11 meses) x 100 Sistema de gerenciamento do programa 13 Ampliar a cobertura do Programa de Suplementação de Vitamina A, em crianças de 12 a 59 meses Percentual de crianças (12 a 59 meses) que recebem Suplementação de vitamina A Número de crianças (12 a 59 meses) que recebem suplementação de vitamina A / Número total de crianças (12 a 59 meses) x 100 Sistema de gerenciamento do programa 14 Ampliar a cobertura do Programa de Suplementação de Vitamina A, em puérperas Percentual de puêrperas que recebem Suplementação de Vitamina A Número de puérperas que recebem suplementação de vitamina A / Número total de puérperas x 100 Sistema de gerenciamento do programa 15 Ampliar a cobertura do Programa Nacional de Suplementação de Ferro/ PNSF, em crianças Percentual de crianças (6 meses a 18 meses) que recebem Suplementação de Ferro do PNSF Número de crianças (6 meses a 18 meses) que recebem suplementaçao de ferro do PNSF / Número total de crianças (6 meses a 18 meses) x 100 Mapa de acompanhamento do fornecimento de suplemento e SIAB 16 Ampliar a cobertura do Programa Nacional de Suplementação de Ferro/ PNSF, em gestantes Percentual de gestantes que recebem Suplementação de Ferro do PNSF Número de gestantes que recebem Suplementaçao de Ferro do PNSF / Número total de gestantes x 100 Mapa de acompanhamento do fornecimento de suplemento e SIAB 17 Ampliar a cobertura de crianças menores de 5 anos, com registro de consumo alimentar no SISVAN Web Percentual de crianças menores de 5 anos com registro de marcadores de consumo alimentar no SISVAN Web Número de crianças menores de 5 anos com registro de marcadores de consumo alimentar no SISVAN Web / Número total de crianças menores de 5 anos x 100 SISVAN Web 18 Promover atividades educativas de promoção da alimentação saudável Número de atividades educativas de promoção da alimentação saudável realizadas pelas equipes SF com apoio do NASF Número de atividades educativas desenvolvidas pelas equipes de SF no período de 12 meses à definir 19 Promover a alimentação saudável para (reduzir/prevenir complicações) ou melhorar a qualidade de vida dos usuários com doenças crônicas não transmissíveis/DCNT Número de atividades educativas de promoção da alimentação saudável, direcionadas aos usuários com doenças crônicas não transmissíveis/DCNT Número de atividades educativas desenvolvidas pelas equipes de SF no período de 12 meses à definir 20 Promover a articulação entre órgãos municipais da saúde e educação para promover a alimentação saudável no ambiente escolar Número de atividades educativas realizadas pelas equipes de SF e NASF, promovendo a alimentação saudável no ambiente escolar Número de atividades educativas desenvolvidas pelas equipes de SF e NASF no período de 12 meses à definir 21 Promover conjuntamento a prática de atividade física e a promoção da alimentação saudável na prevenção das doenças crônicas não-transmissíveis Número de atividades desenvolvidas que apresentaram os temas (atividade física e alimentação saudável) concomitantemente Número de atividades desenvolvidas pelas equipes de SF e NASF com os / período de 12 meses à definir * Indicadores de Monitoramento e Avaliação do Pacto pela Saúde/2009 ** O programa de suplementação de vitamina A é direcionado para os municípios do Nordeste e de Minas Gerais C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 72 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica Em síntese, o conhecimento técnico relativo às ações de alimentação e nutrição e ao cuidado nutricional deve estar relacionado sempre com a aplicação dos princípios acima descritos, além do domínio das disciplinas que compõe a Ciência da Nutrição, conhecimentos gerais sobre os princípios e normas do SUS e específicos sobre a Aten- ção Primaria em Saúde e a Estratégia de Saúde da Família. 4.5 POSSIBILIDADES DE ATUAÇÃO DO NUTRICIONISTA DA EQUIPE DO NASF O quadro abaixo mostra uma síntese das possibilidades de atuação do nutricio- nista como membro da equipe do Nasf – e em conjunto com ela – na esfera da gest ão de ações de alimentação e nutrição. Quadro 1V: Agenda programática da atenção primária com relação às ações de alimentação e nutrição 1. Participação na elaboração e implementação da Política Municipal de Alimenta- ção e Nutrição e da Política Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional; 2. Participação no planejamento e programação das ações, metas, objeti- vos, indicadores e recursos financeiros que serão aplicados nas ações de diagnóstico e cuidado nutricional na Atenção Básica de Saúde, com base territorial, envolvendo também as equipes de SF; 3. Elaboração, revisão, adaptação e padronização de procedimentos, pro- cessos e protocolos de atenção e cuidado relativos à área de alimenta- ção e nutrição; 4. Fortalecimento e consolidação dos sistemas: Vigilância Alimentar e Nu- tricional, Vigilância Epidemiológica e Vigilância Sanitária, relativos à área de abrangência; 5. Apoio, monitoramento e avaliação dos programas de prevenção de defi- ciência de micronutrientes, como o Programa Nacional de Suplementa- ção de Ferro para gestantes e crianças e o Programa de Suplementação de Vitamina A para crianças e puérperas; 6. Fortalecimento do papel do setor saúde no sistema de segurança ali- mentar e nutricional na área de abrangência, principalmente em relação vigilância alimentar e nutricional, à promoção da alimentação saudável e à vigilância sanitária dos alimentos, em consonância com as orientações municipais, estaduais e federais; 7. Apoio ao gestor municipal na organização do fluxo de referência para programas de assistência alimentar e proteção social e no estabeleci- mento de procedimentos, estratégias e parâmetros de articulação da rede de saúde com a rede de apoio comunitário; continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 75 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família 5 ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA NO NASF 5.1 INTRODUÇÃO A Assistência Farmacêutica (AF) tem por objetivos: assegurar o acesso da po- pulação à farmacoterapia de qualidade, contribuir para o uso racional de medica- mentos, oferecer serviços farmacêuticos aos usuários e à comunidade. Constitui componente essencial nos serviços e programas de saúde e precisa ser realizada plenamente em toda a rede assistencial, para contribuir de maneira efetiva e eficien- te para transformar o investimento em medicamentos em incremento de saúde e qualidade de vida da população. A atuação de farmacêuticos junto ao Sistema Único de Saúde é uma realidade em vários municípios, seja na gestão da AF, seja diretamente no cuidado aos usuários. A inclusão da AF como uma das áreas estratégicas de atuação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família visa assegurar o acesso aos medicamentos com segurança, eficácia e resolubilidade da atenção, por meio da atividade farmacêutica comprometida com os princípios da Atenção Primária. Assim, essa é mais uma forma para o farmacêutico exercer sua profissão de forma integrada às equipes de Saúde da Família e contribuir para a resolutividade das ações em saúde, conforme as diretrizes da Estratégia de Saúde da Família, da Política Nacional de Medicamentos e da Política Nacional de Assistência Farmacêutica. Definida como um conjunto de ações voltadas à promoção, proteção e recupe- ração da saúde, tanto individual como coletiva, tendo o medicamento como insumo essencial e visando o acesso e ao seu uso racional, a AF no Nasf será desenvolvida por meio do apoio aos profissionais da equipe de Saúde da Família e da própria equipe do Nasf, compartilhando as práticas em saúde nos territórios, mediante troca de saberes entre os profissionais envolvidos no cuidado. O profissional farmacêutico no Nasf, atuando de forma integrada a várias equi- pes de Saúde da Família, presta apoio especializado – suporte assistencial e técnico- pedagógico – e dessa forma tem o serviço e os próprios usuários dele sob sua res- ponsabilidade. O processo de trabalho desse profissional precisa ser desenvolvido com enfoque que priorize o cuidado, não se limitando às atividades administrativas e nem se distanciando das assistenciais. Na equipe de saúde o saber específico de cada profissional completa o do outro e suas ações podem ser potencializadas, diante da complementaridade das ações, de forma que um único profissional não o faria melhor. Para tanto, considera-se importante a existência de processo interativo formal e periódico para que as equipes do Nasf e Saúde da Família se reúnam e dialoguem sobre as necessidades assistenciais dos usuá- rios e compartilhem a elaboração e execução de projetos terapêuticos singulares. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 76 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica Para que de fato a atuação do farmacêutico no Nasf contribua para aumentar a qualidade da AF e a resolubilidade das ações de saúde, é fundamental que esse profissional desenvolva habilidades, conhecimentos e atitudes para atuar de forma interdisciplinar, com as equipes de Saúde da Família e do próprio Nasf, no planeja- mento e execução das ações e se corresponsabilize pela saúde da população da área de abrangência, na perspectiva da integralidade do cuidado. 5.2 PLANEJAMENTO DAS AÇÕES DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA NO NASF Os profissionais do Nasf devem desenvolver ações de inserção da AF no coti- diano que atendam às necessidades de saúde da população. Para tanto, precisa co- nhecer a história e o processo de trabalho das equipes, a estrutura do serviço de saúde e da AF no município e nas unidades, o perfil demográfico e as condições de vida e saúde da população do território de abrangência. É fundamental também que o farmacêutico compreenda o entendimento das ações e o significado da AF para os profissionais de saúde e forneça os conhecimentos necessários para transmitir a sua dimensão integral para, em conjunto com a equipe multiprofissional, buscar identificar os problemas, hierarquizá-los, estabelecer priori- dades, definir as estratégicas e ações para intervenção e os obstáculos a serem supe- rados, a fim de atingir a situação ideal.. Definidas as ações, é necessário distribuir as funções, as responsabilidades, a ordem de execução e construir uma agenda para as atividades estabelecidas. É neces- sário, ainda, estabelecer critérios de acompanhamento e avaliação para identificar de forma continuada se os objetivos e metas estão sendo atingidos e, posteriormente, avaliar os resultados por meio de indicadores preestabelecidos. A partir de tais objetivos, pode-se delinear um detalhamento para as ações da assistência farmacêutica no Nasf, nos termos também previstos na Portaria de criação do mesmo. As ações não devem ser interpretadas, entretanto, como específicas do profissional farmacêutico, mas sim como resultado da interação com todos os profis- sionais na sua interface com a área estratégica. A agenda dos profissionais do Nasf, em especial do farmacêutico, deve ser construída de forma a considerar os seguintes grupos de atividades: Reuniões com as equipes de Saúde da Família Reuniões entre a equipe do Nasf Gestão das Farmácias Grupos de educação em saúde/atividades comunitárias Visita domiciliar Atendimento conjunto com outros profissionais de saúde Atendimento familiar e/ou individual Educação permanente C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 77 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Ressaltando aqui, como já relatado na introdução do Caderno, que o processo de trabalho dos profissionais do Nasf devem ser desenvolvidos por meio do apoio matricial, com a criação de espaços coletivos de discussões e planejamento. Organi- zando e estruturando espaços de: (a) ações clínicas compartilhadas; (b) intervenções específicas do profissional do Nasf com os usuários e/ou famílias; (c) ações compar- tilhadas nos territórios de sua responsabilidade. Utilizando ferramentas tecnológicas, das quais são exemplos: o Projeto Terapêutico Singular (PTS), o Projeto de Saúde no Território (PST), Apoio Matricial, a Clínica Ampliada e a Pactuação do Apoio. 5.3 PROMOÇÃO DO USO RACIONAL DE MEDICAMENTOS Os medicamentos constituem importantes ferramentas terapêuticas para ma- nutenção e recuperação da saúde da população, desde que respondam aos critérios de qualidade exigidos e sejam prescritos e utilizados adequadamente. Caso contrário podem ocasionar o desenvolvimento de reações adversas, interações com outros medicamentos e alimentos, redução da efetividade terapêutica, dependência e intoxi- cações, sendo responsáveis por sérios danos à saúde das pessoas. O uso indevido de medicamentos é considerado um problema de saúde pú- blica. Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 50% de todos os medica- mentos são prescritos, dispensados ou usados inadequadamente. A função simbólica que os medicamentos exercem, aliada ao valor comercial que assumem como mercadoria, na ideia de que qualquer estado que fuja daquilo que é instituído como padrão pode ser solucionado com um comprimido, contribui para o uso indevido e indiscriminado dos medicamentos. A promoção do uso racional de medicamentos é um tema complexo e perpassa- do por diversas variáveis. Envolve ações que orientam o setor produtivo farmacêutico, incentivam a prescrição apropriada, a dispensação em condições adequadas, a utilização conforme indicado e o combate ao uso indiscriminado. Há uso racional de medicamen- tos quando os usuários recebem os medicamentos apropriados às suas necessidades clínicas, na dose correta, por um período de tempo adequado e um custo acessível. Assim, é necessário construir uma nova cultura, atribuindo aos medicamentos o seu significado concreto de instrumento tecnológico para a prevenção de doenças e restauração da saúde. Isso significa ampliar o debate por meio da promoção de cam- panhas para o uso racional de medicamentos, bem como da capacitação dos aten- dentes de farmácia, dos agentes comunitários de saúde, dos prescritores e demais profissionais da equipe, como também formar agentes multiplicadores para promover discussões relacionadas ao tema nos grupos e na comunidade. Dessa forma é possível fortalecer a participação social e compor redes de com- promisso e corresponsabilidade para desenvolver a consciência de que os medica- mentos, ao mesmo tempo em que são importantes insumos no processo de atenção C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 80 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica essencialidade e evidência de segurança e eficácia. A atuação do farmacêutico nesse processo pode ocorrer mediante recomendação para substituição, exclusão ou inclu- são de medicamentos (incluindo fitoterápicos e homeopáticos), com fundamento nos dados específicos de morbimortalidade da população do território de atuação. O farmacêutico no Nasf também pode apoiar a equipe de SF no aprimoramen- to do controle de estoque e da programação das UBS, de forma a proporcionar me- lhorias na regularidade do suprimento de medicamentos, bem como nas atividades de armazenamento, distribuição e transporte, aspectos que influenciam a integridade e a qualidade dos medicamentos. Essas atividades convergem para o aperfeiçoamen- to das práticas dos serviços e racionalização dos processos de trabalho. O desenvolvimento pleno das atividades relacionadas à gestão depende do conhecimento do conjunto de políticas, normas e legislações relacionadas à Assis- tência Farmacêutica, inclusive o financiamento estabelecido na Portaria GM/MS nº 204, de 29 de janeiro de 2007, que organiza o bloco da Assistência Farmacêutica nos componentes: Básico, Estratégico e de Medicamentos de Dispensação Excepcional, conforme o quadro seguinte. COMPONENTE BÁSICO DA ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA Destina-se à aquisição de medicamentos e insumos no âmbito da Atenção Primária e àqueles relacionados a agravos e programas de saúde específicos COMPONENTE ESTRATÉGICO DA ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA Destina-se ao financiamento de ações dos seguintes program- as de saúde estratégicos: controle de endemias, tais como a tuberculose, a hanseníase, a malária, a leishmaniose, a doença de chagas e outras doenças endêmicas de abrangência na- cional ou regional; antirretrovirais do programa DST/Aids; sangue e hemoderivados; tabagismo; nutrição e alimentação; e imunobiológicos COMPONENTE MEDICAMENTOSO DE DISPENSAÇÃO EXCEPCIONAL (CMDE) Destina-se ao financiamento para aquisição e distribuição de medicamentos para o tratamento de doenças raras ou de baixa prevalência e doenças prevalentes, com indicação de uso de medicamento de alto valor unitário ou que, em caso de uso crônico ou prolongado, torna-se um tratamento de custo eleva- do, seguindo os critérios estabelecidos nas Portarias GM/MS nº 2.577, de 27 de outubro de 2006, e GM/MS nº 1.869, de 4 de setembro de 2008 A qualificação da gestão contribui para ampliação do acesso da população aos medicamentos, acesso não restrito ao produto, mas com a garantia da qualidade e dos serviços prestados. Requer a reestruturação, tanto física como de recursos humanos, demandando novas formas de pensar, de estruturar, de desenvolver e de produzir serviços e assistência em saúde. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 81 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família 5.6 PARTICIPAÇÃO SOCIAL Na perspectiva da integralidade das ações e serviços de saúde, a AF permeia toda a rede de serviços do SUS. Nesse sentido, é fundamental que esse tema seja pauta de discussão constante nas esferas do controle social para ampliar sua concep- ção, em busca da construção do seu real significado, de sua inserção na atenção à saúde e da promoção do uso racional dos medicamentos. Em 2003, a 1ª Conferência Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêu- tica teve por tema central “Acesso, Qualidade e Humanização da Assistência Farma- cêutica com Controle Social”, sendo de extrema importância a continuidade dessas discussões em âmbito local, sobretudo nas instâncias dos Conselhos de Saúde locais e municipais e também em outros espaços de articulação comunitária. O farmacêutico deve ter como uma de suas atividades precípuas a atuação jun- to aos conselhos de saúde, suprindo os membros desses conselhos com informações que contribuam para o efetivo controle social do financiamento da assistência farma- cêutica, do acesso e do uso racional dos medicamentos. A participação e a ausculta desses espaços de controle social, bem como em outros movimentos populares, permite ao farmacêutico ampliar as fontes de identifi- cação das reais demandas e necessidades locais, entender melhor a dinâmica e o con- texto comunitário, favorecer o estabelecimento de vínculo e a ampliação do debate sobre o tema em torno de um projeto comum para a saúde e para a sociedade, na defesa dos interesses coletivos e construção do SUS. 5.7 ATIVIDADES DE ASSISTÊNCIA À SAUDE Constituem atribuições do farmacêutico no Nasf atuar na respectiva área de abran- gência, a partir da identificação da necessidade junto às equipes de SF, com ações voltadas à intervenção nos problemas/situações de saúde no contexto individual, familiar e cole- tivo, não só na busca de tratamento e cura das doenças, mas também na motivação à modificação de atitudes, em perspectivas promocional e preventiva. Como ponto de partida para a realização de intervenções que propiciem a melhoria dos indicadores de saúde, é necessário identificar os determinantes econô- micos, sociais e culturais dos diversos grupos da população. Todos os procedimentos realizados na assistência farmacêutica precisam ser documentados, incluindo as informações sobre o usuário e farmacoterapia, o que auxilia no acompanhamento, embasando intervenções. As informações geradas no serviço farmacêutico podem servir de subsídio para as ações em saúde e se constitui em indicadores de qualidade dos serviços. Considerando que as doenças crônicas e degenerativas representam uma parcela significativa dos atendimentos na Atenção Primária, demandam número ex- pressivo de medicamentos e requerem cuidados em longo prazo, vislumbra-se a C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 82 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica necessidade dos farmacêuticos no Nasf assumirem a responsabilidade e proporem intervenções, contribuindo com os demais profissionais da equipe na busca de me- lhores resultados farmacoterapêuticos. A não adesão à terapia medicamentosa tem sido identificada como umas das causas para o insucesso do tratamento. Alguns fatores são reportados por seu efeito significativo na redução da adesão à terapia, relacionados à doença, ao tratamento, ao serviço e ao usuário, como os citados no quadro a seguir: 1. Complexidade dos regimes terapêuticos; 2. Linguagem rebuscada utilizada pelos profissionais de saúde, dificultando o entendimento das orientações e da importância da prescrição; 3. Tempo insuficiente dedicado aos usuários nos atendimentos individuais (con- sultas e dispensação); 4. Falta de um atendimento acolhedor e humanizado; 5. Dificuldade de acesso aos medicamentos; 6. Ocorrência de efeitos adversos, bem como o descumprimento da farmaco- terapia mediante a sua interferência no cotidiano do usuário; 7. Entre os fatores relacionados aos usuários, destacam-se a cultura, crença, va- lores e o desconhecimento sobre o seu estado de saúde e da farmacoterapia. Portanto, é a família, o usuário, ou o responsável por ele, o objetivo e o objeto das investigações e das ações para promover a adesão. Os profissionais do Nasf e a equipe, trabalhando de forma interdisciplinar, influenciam na adesão, a partir do con- texto individual, familiar e social, na medida em que atingem o universo cultural do usuário e estabelecem com este comunicação e relacionamentos afetivos. A adesão ao tratamento pode ser motivada por ações educativas nos grupos de educação em saúde, no momento da dispensação, da orientação farmacêutica e por meio do seguimento farmacoterapêutico. No entanto, é fundamental o entendimen- to de que a adesão é acima de tudo um fenômeno multidimensional, singular e de difícil mensuração, cuja intervenção precisa necessariamente a construção de vínculo entre o profissional e o usuário, a compreensão dos fatores que causam a não adesão do tratamento no contexto singular, a negociação com os saberes e práticas populares de saúde, a continuidade do cuidado e o desenvolvimento de autonomia dos usuários no seu cuidado. • Dispensação de medicamentos A dispensação configura um momento de esclarecimento e sensibilização para a importância do tratamento proposto, reafirmando e complementando as orientações de quem prescreve. Para tanto devem ser prestadas informações e esclarecimentos gerais aos usuários e famílias. Assim, a dispensação possibilita relembrar orientações C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 85 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família • Visita domiciliar na assistência farmacêutica A visita domiciliar é um espaço privilegiado para diálogos e produção de saberes e faz parte do processo de trabalho das equipes de SF e em alguns momentos tam- bém do Nasf, na qual os profissionais devem realizar o acompanhamento do usuário, em domicílio, com uma periodicidade a ser definida em conjunto com a equipe. Além disso, ela constitui uma atividade utilizada com o intuito de subsidiar a intervenção no processo de saúde–doença de indivíduos ou no planejamento de ações visando a promoção da saúde da coletividade. A presença do profissional de saúde nos domicílios permite a visualização de condições peculiares de habitação, higiene e hábitos de vida, bem como a dinâmica e o contexto familiar, que auxiliam no planejamento das ações, além de proporcionar a aproximação entre o usuário, a família, a comunidade e o serviço de saúde. Para o sucesso dessa ação, são necessários, além de uma visão interdisciplinar, planejamento, execução, registro de dados e avaliação adequados. A participação do farmacêutico nas discussões dos casos a serem visitados é fundamental para o melhor direcionamento do acompanhamento domiciliar, visando a otimização e racionaliza- ção dos recursos de saúde. Nesse momento, o farmacêutico deve discutir com a equipe de SF para que sejam avaliados os medicamentos prescritos e se os disponibilizados estão sendo corretamente utilizados, deve identificar condições de armazenamento e separar me- dicamentos sem condições de uso ou vencidos, quando houver, procurando reco- lhê-los para descarte adequado. Em casos de falha na adesão ou uso incorreto, o farmacêutico poderá intervir junto ao profissional do SF, a partir da especificidade de cada caso, orientando quanto ao uso correto e propor estratégias para facilitar a ade- são, atentando para o caso de idosos polimedicados, analfabetos, deficientes visuais, entre outros. Também pode compartilhar seus conhecimentos com a equipe de SF, particularmente os ACS e os eventuais cuidadores, procurando levar à informação do usuário de medicamentos. 5.8 PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES Os profissionais do Nasf podem contribuir no planejamento, monitoramento, avaliação e orientação sobre a prática da fitoterapia/plantas medicinais e da homeo- patia, por meio de ações junto às equipes de SF e à população, mediante práticas da educação permanente, por exemplo. Para a implementação de tais Práticas Integrativas e Complementares (PIC) na Estratégia de Saúde da Família, os profissionais necessitam conhecer as práticas existentes no território, respeitando o saber popular; compreender o processo saú- de–doença, na perspectiva da homeopatia; conhecer a cadeia produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos; assim como toda a cadeia de medicamentos homeopáticos e fitoterápicos: produção, controle, armazenamento, distribuição e atenção, o que irá C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 86 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica garantir qualidade, segurança e eficácia desses medicamentos. A regulamentação des- ses produtos e a capacitação/qualificação relativas às PIC merecem especial atenção. A Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (Brasil, 2006d) deve ser implementada em conformidade com a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares – PNPIC (ver capítulo específico no Caderno), ou seja, deve ga- rantir à população o acesso seguro e uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos de forma complementar nas unidades de saúde, utilizando um ou mais dos produtos: planta medicinal in natura, planta medicinal seca (droga vegetal), fitoterápico manipu- lado e fitoterápico industrializado. Sendo importante a orientação e o acompanha- mento do farmacêutico. 5.9 CONSIDERAÇÕES FINAIS No intuito de tornar o sistema de saúde o mais resolutivo possível, além de conhecimentos técnicos, é necessário que o profissional reconheça sua responsabili- dade pelo território de atuação e desenvolva habilidades para atuar de acordo com o paradigma da saúde coletiva e da Saúde da Família. Na atuação, é de suma importância que os profissionais se envolvam com o cotidiano das vidas dos cidadãos, sendo permeável a participação destes, compro- metendo-se com a atenção integral e valendo-se de ações de cuidado individuais e coletivas e da atuação intersetorial. Assim, é importante a formação, atualização e qualificação de profissionais de saúde críticos, reflexivos e comprometidos com a construção do SUS, para a efetivação da assistência farmacêutica na Estratégia de Saúde da Família como forma de ampliar o acesso à farmacoterapia de qualidade e de maior resolubilidade para a Atenção Primária em Saúde. LEITURAS RECOMENDADAS TEMA AUTORES Diretrizes da Estratégia de Saúde da Família BRASIL, 2006 Política Nacional de Medicamentos BRASIL, 1998 Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos Brasil, 2006d Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) BRASIL, 2006e Política Nacional de Assistência Farmacêutica BRASIL, 2004 Processos de trabalho do farmacêutico e outros profission- ais no Nasf CAMPOS, 2007 Fatores do uso indevido e indiscriminado dos medicamen- tos LEFEVRE, 1983 continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 87 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Conceitos relativos ao uso racional de medicamentos WHO, 1985 Práticas e racionalização dos processos de trabalho em as- sistência farmacêutica BRASIL, 2006b MARIN, 2003 Organização do bloco da assistência farmacêutica em com- ponentes diferenciados BRASIL, 2007ª Componente Medicamentoso de Dispensação Excepcional (CMDE) BRASIL, 2006c BRASIL, 2008b Acesso, qualidade e humanização da assistência farmacêu- tica com controle social BRASIL, 2005ª Fatores na adesão à farmacoterapia LEITE; VASCONCELLOS, 2003 WHO, 2003 Técnicas de comunicação e assistência farmacêutica CORDEIRO; LEITE, 2008 Acompanhamento farmacoterapêutico e orientação farmacêutica OPAS, 2002 Conceitos: discussões de casos e projetos terapêuticos OLIVEIRA, 2008 Visitas domiciliares na assistência farmacêutica TAKAHASHI, 2001 continuação C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 90 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica Quadro: Objetivos do serviço social nos NASF 1. Desenvolver ações que garantam a escuta e acolhida dos usuários; 2. Incentivar e contribuir no processo de fortalecimento da autonomia e da organização pessoal do usuário; 3. Apoiar os usuários na construção e ressignificação de seu projeto de vida; 4. Criar espaços grupais que possibilitem a construção de relações humaniza- doras e socializadoras por meio de trocas de experiências e construção de rede de apoio; 5. Desenvolver ações integradas com os profissionais da equipe correlaciona- dos com a área de atuação em atenção à saúde e demais políticas públicas; 6. Socializar informações nas equipes e participar de discussão de situações vivenciadas por usuários e/ou familiares com as demais categorias profissio- nais, valorizando as ações desenvolvidas por eles; 7. Promover a integração dos demais membros da equipe de trabalho; 8. Produzir conhecimento sobre a população atendida na área da saúde, pro- cesso de pesquisa e a especificidade do serviço social; 9. Participar da elaboração conceitual/metodológica para apoiar as práticas educativo-participativas desenvolvidas pela equipe de trabalho, com usuá- rios e população atendida; 10. Construir coletivamente e de forma participativa entre a equipe de saúde, segmentos organizados da comunidade, usuários e demais sujeitos sociais populares envolvidos a organização do trabalho comunitário. 11. Incentivar a participação dos usuários nos fóruns de discussão e delibera- ção, tais como: Conselhos Locais de Saúde, Conselho Distrital de Saúde, Conselhos de Assistência Social, Conselho de Direitos da Criança e do Ado- lescente, Conselhos do Idoso e demais Conselhos de direitos, Reuniões da Comunidade, e outros. A partir de tais objetivos, pode-se delinear um detalhamento para as ações do serviço social nos Nasf, nos termos também previstos na Portaria de criação deles. As ações apresentadas não devem ser interpretadas, entretanto, como específicas do profissional assistente social, mas sim como resultado da interação com todos os profissionais na sua interface com a área estratégica do serviço social. Esse aspecto é sumarizado no quadro a seguir: C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 91 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Quadro: Ações do assistente social nos NASF 1. Coordenar os trabalhos de caráter social adstritos às equipes de SF; 2. Estimular e acompanhar o desenvolvimento de trabalhos de caráter comu- nitário em conjunto com as equipes de SF; 3. Discutir e refletir permanentemente com as equipes de SF a realidade social e as formas de organização social dos territórios, desenvolvendo estratégias de como lidar com suas adversidades e potencialidades; 4. Atenção às famílias de forma integral, em conjunto com as equipes de SF, estimulando a reflexão sobre o conhecimento dessas famílias, como espaços de desenvolvimento individual e grupal, sua dinâmica e crises potenciais; 5. Identificar no território, junto com as equipes de SF, valores e normas cul- turais das famílias e da comunidade que possam contribuir para o processo de adoecimento; 6. Discutir e realizar visitas domiciliares com as equipes de SF, desenvolvendo técnicas para qualificar essa ação de saúde; 7. Possibilitar e compartilhar técnicas que identifiquem oportunidades de ge- ração de renda e desenvolvimento sustentável na comunidade ou de es- tratégias que propiciem o exercício da cidadania em sua plenitude, com as equipes de SF e a comunidade; 8. Identificar, articular e disponibilizar, junto às equipes de SF, rede de prote- ção social; 9. Apoiar e desenvolver técnicas de educação e mobilização em saúde; 10. Desenvolver junto com os profissionais das equipes de SF estratégias para identificar e abordar problemas vinculados à violência, ao abuso de álcool e a outras drogas; 11. Estimular e acompanhar as ações de controle social em conjunto com as equipes de SF; 12. Capacitar, orientar e organizar, junto com as equipes de SF, o acompanha- mento das famílias do Programa Bolsa-Família e outros programas federais e estaduais de distribuição de renda; 13. No âmbito do serviço social, identificar e buscar as condições necessárias para a atenção domiciliar. Na organização do processo de trabalho em Saúde da Família, dentro dos objetivos propostos para a área do serviço social, podem ser enumeradas algu- mas estratégias metodológicas que devem ser vistas como dialeticamente articula- das, relacionando-se intimamente com as demandas de cada realidade, para cada momento histórico e para um agir crítico e reflexivo, conforme se observará no quadro seguinte. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 92 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica ABORDAGEM GRUPAL Define-se como o atendimento para escuta ativa de grupo de usuários que apresen- tam demanda comum, para problematização, sensibilização, informação e/ou esclare- cimento sobre legislação e critérios de inclusão em projetos, programas e serviços sociais ou de saúde. Constitui-se em importante e imprescindível estratégica para po- tencializar a atuação da equipe e viabilizar a resposta à enorme demanda apresentada. A relevância dada às estratégias coletivas de intervenção deve-se ao reconhecimento da efetividade da dinâmica grupal, da possibilidade mais significativa de desenvolver processos sociais a partir de identificações entre sujeitos que vivenciam situações simi- lares, de fortalecer alternativas de organização e enfrentamento conjunto, de possi- bilitar processos de mútua ajuda e de partilhar sofrimentos e estratégias de superação, cooperação, solidariedade, veiculação de informações. ABORDAGEM FAMILIAR Trata-se do atendimento para escuta ativa da família usuária, com problematização, mediação de conflitos, visando a sensibilização, a negociação para a elaboração de plano de cuidados e a realização de encaminhamentos, se necessário, para outras redes assistenciais da saúde e/ou para a rede intersetorial. ABORDAGEM INDIVIDUAL É o atendimento para escuta ativa do usuário, com problematização, informação e/ou esclarecimento relativos à situação/demanda individual identificada, visando a sensibilização, a pactuação de autocuidado e a realização de encaminhamentos para outras redes de atenção à saúde e/ou para a rede intersetorial. Pode ter caráter apenas eventual, em caso de necessidades ditadas pela realidade de cada indivíduo ou família. São levantados dados que fazem parte da história de vida do usuário, vínculos familiares e sociais, ocupação, renda, educação, saúde, entre outras, informações que subsidiam a construção do projeto terapêutico com o usuário, de seu projeto de vida. Ao se buscar conhecer a história de vida dos usuários, deve ser privilegiada não meramente uma reconstituição cronológica, mas a história deles, a partir de fatos significativos, contextualizados, na tentativa de realizar o que se chama de movimento de detour (segundo Lefèvre), ou seja, um retorno ao passado que, reencontrado e reconstruído por sucessivas reflexões, volta mais aprofundado, libertado de suas limitações, superado, no sentido dialético. Assim, o estabelecimento de vínculos, em ambiente de confiança e respeito pelos sujeitos é necessário para que o processo possa se constituir, para que se estabeleçam o diálogo e a reflexão. ABORDAGEM DE REDE SOCIAL Compreende a identificação e a análise das relações da rede social do usuário, para discussão do caso com os membros da rede, ajuste de corresponsabilidade nas ações e enfrentamento da vulnerabilidade social. continua... C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 95 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família Quadro: Oportunidade de ação conjunta Asssitente Social – Equipe- NASF e equipes de Saúde da Família 1. Desenvolver coletivamente, com vistas à intersetorialidade, ações que se integrem a outras políticas sociais (educação, esporte, cultura, segurança, trabalho, lazer); 2. Estreitar a relação entre integralidade da atenção e equidade no acesso às ações e serviços de saúde, de modo que as parcerias com as instâncias e espaços públicos sejam no sentido explícito de diminuir as desigualdades sociais, por exemplo, no que tange às políticas sociais de educação, esporte e lazer, em conjunto com as ações de atividade física/práticas corporais, estimular a qualidade de vida e o auto- cuidado por meio da valorização dos espaços públicos de convivência, destacando sempre que possível o protagonismo dos usuários, das famílias e das comunidades na geração desses espaços sociais; 3. Promover a gestão integrada e a participação dos usuários nas decisões, por meio de organização participativa com os Conselhos Locais e/ou Municipais de Saúde, não deixando de ressaltar a possibilidade de outras formas de controle social, por exemplo: a atuação dos usuários e famílias junto ao Ministério Público, as Ouvido- rias de Saúde, a mídia (rádio, TV, jornais) e os órgãos de defesa do consumidor, já que essas intervenções podem estreitar os laços de solidariedade entre usuários, gestores e políticos, enquanto pertencentes ao mesmo município/estado/localida- de e sujeitos aos mesmos embates na defesa de seus direitos, em vez de ressaltar as divergências entre esses atores sociais no interior do campo da saúde; 4. Em parceria com outros profissionais do Nasf, colaborar para a identificação dos valores e normas das famílias e da comunidade que contribuem tanto para o pro- cesso de adoecimento, quanto para o processo de cura. Por exemplo, em conjunto com as ações de alimentação e nutrição, no sentido do estímulo ao consumo de alimentos saudáveis e ao cultivo de hortas, dar visibilidade às maneiras pelas quais certas formas de subsistência familiar colaboram para uma vida saudável, mas sem deixar de apontar e modificar aquelas formas que não contribuem para a saúde pú- blica, tais como o “pote” (pote d’água, comum em certas regiões do Nordeste) nas residências em épocas de epidemia de dengue ou a venda de certos produtos da economia familiar nas feiras sem o controle da vigilância sanitária, como as carnes; 5. Em parceria com outros apoiadores das equipes de saúde, colaborar para a mobi- lização da comunidade em torno de demandas de transformação do espaço social, por exemplo, em conjunto com as ações das práticas integrativas e complementa- res, no sentido de identificar profissionais e/ou membros da comunidade com po- tencial para o desenvolvimento do trabalho educativo, além de identificar aqueles com potencial para tornar-se representantes da comunidade em questões relativas ao direito à saúde. 6. Em parceria com os demais apoiadores, promover espaços de educação perma- nente abordando: família, valores, violência doméstica, dependência, entre outros, visando o fortalecimento do vínculo e a sensibilização dos profissionais na aborda- gem familiar; 7. Tendo em vista os desafios impostos na atuação interdisciplinar previstas na propos- ta do Nasf, considera-se mister a criação de espaços, no ambiente de trabalho, que possibilitem a discussão e reflexão conjunta dos processos de trabalho das equipes de Saúde da Família e do Nasf, de modo a subsidiar e propiciar avanços efetivos, considerando as especificidades locais, das equipes e dos usuários. C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 96 MINISTÉRIO DA SAÚDE / Secretaria de Atenção à Saúde / Departamento de Atenção Básica 6.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS A atuação da área de serviço social no Nasf apresenta importante contribuição na articulação e formulação de estratégias que busquem reforçar e criar experiências nos serviços de saúde, que efetivem o direito à saúde e a consolidação da cidadania. Os profissionais de saúde, ao trabalhar com a questão social nas suas mais va- riadas expressões cotidianas, têm o desafio de estabelecer muitos olhares para fazer enfrentamentos críticos da realidade, para estabelecer estratégias do agir profissional de forma criativa e inovadora, que se complementam na interlocução com outras catego- rias profissionais, no cotidiano do trabalho e com os demais sujeitos políticos envolvidos. A intervenção profissional, na perspectiva aqui assinalada, aponta para a neces- sidade de uma sólida base de conhecimentos, aliada a uma direção política consisten- te que nos possibilite desvendar adequadamente as tramas conjunturais e as forças sociais em presença. LEITURAS RECOMENDADAS TEMAS AUTOR(ES) – FONTE(S) Participação popular no serviço de saúde comunitária HENK, 23004 O processo social de construção do Sistema Único de Saúde ........, 1993 Atenção Primária à Saúde: conceitos gerais e atributos STARFIELD, 2004 A assistência social na prática profissional YASBEK, 2006 Integralidade nos sistemas de APS: necessidades de saúde e disponibilidade de recursos para abordá-las STARFIELD, B. 2004 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 97 DIRETRIZES DO NASF: Núcleo de Apoio a Saúde da Família 7 ATENÇÃO INTEGRAL à SAUDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO NASF 7.1 INTRODUÇÃO Com a Constituição Federal de 1988, um grande passo foi dado na garantia de proteção à infância e à adolescência, reconhecendo, em seu artigo 227, esse grupo populacional como sujeito de direitos, modificando toda uma legislação anterior que considerava crianças e adolescentes como propriedade dos pais. Em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) regulamentou esse artigo criando as precondições para que crianças e adolescentes fossem criados de forma mais saudável e respeitosa. Assim, com a implantação do ECA, a concepção da atenção a crianças e ado- lescentes avança exigindo prioridade absoluta por parte da família, da sociedade e do Estado, para as necessidades delas. Como sujeito de direitos especiais, esse grupo etário, pela sua condição de pessoa em desenvolvimento físico, moral e psicológico, deve ser obrigatoriamente protegido por todos. Dessa forma, o papel do setor saúde como esfera essencial de proteção rece- be incumbência específica de garantir o direito à vida, o acesso irrestrito de crianças e adolescentes por meio de serviços, ações, programas e projetos que visem garantir ações de promoção, proteção e recuperação da saúde por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), contribuindo para o seu desenvolvimento saudável e harmonioso. De acordo com a Portaria n° 154, de 24 de janeiro de 2008, que cria os Nú- cleos de Apoio de Saúde da Família (Nasf), o trabalho desenvolvido pelos profissio- nais do Nasf– deve ser realizado em conjunto com as equipes de SF às quais estão vinculados, de modo que os núcleos não terão agenda aberta para atendimento, já que não constituem porta de entrada do sistema. A promoção de saúde, a prevenção e a assistência clínica da maioria das neces- sidades de saúde da população de determinado território se produzem em campo de grande complexidade cultural, social, econômica e emocional, no qual as abor- dagens biomédicas e suas respectivas tecnologias não apreendem todos os aspectos necessários. Assim, os novos profissionais do Nasf terão que construir referenciais, métodos e instrumentos capazes de deslocar seus olhares e fazeres do campo indi- vidual para o coletivo, da doença para o da saúde. Tem-se como desafio principal o trabalho interdicisplinar, em vez do simples encaminhamento de problemas para especialistas. A ideia é que as dificuldades e so- luções sejam discutidas e propostas por toda a equipe, para que haja também visão e resolução ampliada dos problemas. Como descrito na introdução deste Caderno, o processo de trabalho dos profissionais do Nasf devem ser desenvolvidos por meio do apoio matricial, com a criação de espaços coletivos de discussões e planejamento. Organizando e estrutu- rando espaços de: (a) ações clínicas compartilhadas; (b) intervenções específicas do
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