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Guias e Dicas
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Os paradoxos das políticas sociais do século xxi, Notas de estudo de Ciências Sociais

Textos descritivos das contradições das políticas sociais na atualidade

Tipologia: Notas de estudo

2011

Compartilhado em 17/02/2011

vilbesousa
vilbesousa 🇧🇷

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Baixe Os paradoxos das políticas sociais do século xxi e outras Notas de estudo em PDF para Ciências Sociais, somente na Docsity! 1 OS PARADOXOS DAS POLÍTICAS SOCIAIS DO SÉCULO XXI: POLÍTICAS DE RENDA MÍNIMA NUMA VISÃO COSMOPOLITA Ms. Claudio Batista1 Dra. Célia Anselmé2 "De cada um de acordo com sua habilidade, para cada um de acordo com suas necessidades".Karl Marx RESUMO, Este artigo reflete o projeto de doutorado que tinha como objetivo de ampliar a análise das políticas sociais contemporâneas e seus paradoxos. Primeiramente foram feitas uma serie de análises e reflexões das políticas sociais, a partir de um prisma que ia além da conjuntura atual e local das questões sociais e ao mesmo tempo as integrava. Adotamos para isso uma perspectiva cosmopolita. Discutimos a interdependência entre os problemas sociais local, regional e global e pontuamos alguns paradoxos decorrente dessas políticas sociais propostas pelo Estado-nação no mundo globalizado. PALAVRAS-CHAVE, Políticas sociais; globalização e cosmopolitismo. ABSTRACT The present paper aims to discuss contemporary social politics and some of its paradoxes. The analysis is done under a prism that goes beyond the local and current conjunctures at the same time that integrates them. For this purpose a cosmopolitan perspective has been adopted. The interdependence between local, regional, and global social problems is discussed and a few paradoxes resulting from the social politics proposed by the state-nation in the globalized world are pointed out. 1 Mestre em Ciência Política -UFF; docente das Faculdades São José – claudiobts@gmail.com 2 Doutora em Psicologia- UFRJ ; docente da Universidade Veiga de Almeida e T.A.E da UFRJ– canselme@cfch.ufrj.com.br 2 KEY WORDS: social politics; globalization, cosmopolitism. Introdução Este artigo surgiu como conseqüência das reflexões desencadeadas na elaboração de um projeto de doutoramento cujo objetivo era ampliar a análise das políticas sociais contemporâneas e seus paradoxos. Os resultados preliminares de nossas pesquisas teóricas e observações desses fenômenos sociais suscitaram uma ponderação sobre os mesmos, culminando no desejo de torná-los públicos. Uma parte desse trabalho foi apresentada no I Encontro Internacional Latino –Americano de Direito- Sociedade e Cultura na SUESC – Sociedade Unificada de Ensino Superior e Cultura - Rio de Janeiro, 2007. Inicialmente, foi feita uma série de análises e reflexões sobre as políticas sociais, a partir de um prisma que ia além da conjuntura atual e local das questões sociais. Adotamos, então, uma perspectiva cosmopolita. Partimos de um ponto de vista mais abrangente que incluiu o panorama da construção do modelo econômico liberal na Europa dos séculos XVIII e XIX e suas transformações e conseqüências na atualidade. Levamos em consideração os problemas sociais de forma global, como também os novos paradoxos decorrentes dos argumentos que buscavam a retomada do Estado do Bem-estar-social. Apontamos soluções cosmopolitas que, a nosso ver, são mais apropriadas para garantir a cidadania das pessoas atomizadas e marginalizadas no atual modelo econômico global, de modo a restaurar o espaço público de debate, que não deve ser restrito ao espaço local e sim incluir o regional, quiçá, o global. Os paradoxos atuais, resultantes dessas políticas sociais, são dinâmicos e mutantes, não permitindo o fechamento definitivo sobre o assunto, assim sendo, apresentamos uma parte da pesquisa que continua em andamento, se desdobrando sobre as questões de Estado-Nação no mundo globalizado Origens das Políticas Sociais A preocupação com a pobreza, resultante das desigualdades sociais e a má distribuição de renda criada pelo modelo liberal, se tornou mundial com a expansão do capitalismo a partir do século XIX (POLANYI3). Embora muitos acreditassem que a auto-regulação levaria o próprio sistema ao equilíbrio e a solução do problema, a falta 3 POLANYI, Karl. A Grande Transformação. As Origens da Nossa Época. 2ª ed. SP: Campus, 2000. 5 compreensão e a solução de problemas locais ou nacionais estão relacionadas a questões mais globais ou transnacionais que estão fora do alcance do que foi diretamente observado. Segundo esse autor, uma refutação da metodologia nacionalista de um viés estritamente empirista é conseqüentemente difícil, quase impossível, visto que muitas categorias e procedimentos estatísticos da pesquisa são baseados nela. Apesar dessa constatação, tal fato não o impede de apontar a necessidade de uma reconstrução e redefinição paradigmática da ciência social, passando da perspectiva nacional à uma perspectiva cosmopolita, ampliando assim, os horizontes da pesquisa social da ciência, visto que atualmente há uma dificuldade em se identificar o que é “o interior” e “exterior” ao Estado Nacional. A definição de uma fronteira entre a "política nacional" e "a política internacional", “a doméstica e a estrangeira” é hoje um desafio do mundo globalizado, principalmente porque este processo vem afetando fortemente as diferentes políticas de bem estar social (HABERMAS8). Por isto, procuramos fazer uma reflexão das políticas de renda mínima no Brasil a partir de uma concepção global da política, da economia e da sociedade. Acreditamos que a identidade do Estado Nacional contemporâneo foi afetada em suas bases, como observa Bauman9, ao afirmar que Estado Moderno que se apoiava no tripé das soberanias militar, econômica e cultural tem sua unidade abalada, sendo que a parte mais estremecida é o suporte econômico. Isso se deve, segundo o autor a inexorável disseminação das regras de livre mercado e, sobretudo, ao livre movimento do capital e das finanças, a “economia” é progressivamente isentada do controle político; com efeito, o significado primordial do termo “economia” é de “área não política”... O Estado não deve tocar em coisa alguma relacionada à vida econômica: qualquer tentativa nesse sentido enfrentaria imediata e furiosa punição dos mercados mundiais... A única tarefa econômica permitida ao Estado e que se espera que ele assuma é a de garantir um “orçamento equilibrado”, policiando e controlando as pressões locais por intervenções estatais mais vigorosas. (BAUMAN, 1999, ) Esta concepção política, social e econômica, a qual alude o autor, é a neoliberal, a “utopia do liberalismo econômico clássico”. Segundo Bresser10 corresponde a meta do 8 HABERMAS, j. “O Estado–nação europeu frente aos novos desafios da globalização.”; in: Novos Estudos – Cebrap; n.43. Campinas, SP. 1995 9 BAUMAN, Zygmunt. Globalização. As Conseqüências Humanas. Jorge Zahar Editora; Rio de Janeiro; 1999. 10 BRESSER PEREIRA, L. C., Crise Econômica e Reforma do Estado Brasileiro. Para uma interpretação da América Latina, São Paulo, Editora 34. 6 Estado Mínimo. Ela surge nos EUA e na Europa, a partir dos anos 70, com o objetivo de substituir as políticas keynesianas. Na América Latina, esta concepção se fortaleceu na década de 80 com o “Consenso de Washington” que receitava reformas liberalizantes como privatização, desburocratização, desregulamentação, ajuste fiscal e desoneração do trabalho. Este modelo foi gradualmente executado no Brasil nos governos Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso, sob a configuração defendida pelo autor acima, como uma concepção de políticas do “Estado Social – liberal em que as políticas sociais - deveriam ser executadas por intermédio de organizações públicas não-estatais competitivas” de modo que o Estado sofresse um enxugamento em suas funções tradicionais: no lugar do Estado do Bem-Estar-Social teríamos, segundo tal proposta econômica, o Estado Mínimo. Não se pode ignorar, na nova fase do capitalismo, que as margens de manobra do Estado Nacional têm se estreitado e que há uma crescente interdependência econômica e financeira entre os países (DINIZ11). Segundo Diniz, hoje se faz necessária a maior integração externa: internacionalização e abertura econômica. Atualmente não é possível se ater, apenas, numa visão meramente dualista e equivocada, na qual se privilegia os fatores internos e desconsidera os imperativos externos. Isso não significa que devamos nos submeter aos imperativos neoliberais do “Consenso de Washington” passivamente, como meros instrumentos. Os governos nacionais podem e devem administrar as pressões e opções externas e internas com maior ou menor grau de independência e eficácia. Deste modo, reconhecendo as coações externas, buscar compreender os problemas sociais e elaborar soluções nos níveis meramente locais é um equivoco que já esta sendo considerado e analisados (MELO12). Verificamos, nas últimas décadas, que o processo de fortalecimento do poder local, com a descentralização política e administrativa, foi implementado como um sinônimo de democratização tanto pelos neoliberais quanto pela nova esquerda democrática. Se por um lado ele permitiu que a tomada de decisões ficasse mais próxima do cidadão - que teria maior possibilidade de participação diretamente nas 11 DINIZ, E. Globalização, Reformas Econômicas e Elites Empresariais, Rio de Janeiro, Editora FGV. 2000. 12 MELO, Marcos André. Crise federativa, guerra fiscal e “hobbesianismo municipal” - efeitos perversos da descentralização? São Paulo em Perspectiva, 10(3) 1996. Disponível in:< www.sead.gov.br> Acessado em 29/05/2007 7 decisões - por outro lado, causou “efeitos perversos”. Este “neolocalismo” permitiu, em muitos casos, o fortalecimento de uma elite local, mais conservadora e corrupta, que capturou o Estado e passou a ter um maior controle nas decisões, por meio de uma burocracia local menos qualificada, tendo sérias conseqüências sobre a cidadania social. Fortalecendo a tradicional dominação patrimonialista13. Suas políticas se concretizam no que Melo14 chama de hobbesianismo muncipal ou guerra fiscal, promovendo investimentos que priorizam os benefícios fiscais e isenções sobre as prioridades sociais, além de desenvolver algumas estratégias de exclusão e apartheid social como, por exemplo, expulsar mendigos da municipalidade. Os investimentos sociais compensatórios locais tendiam a serem pensados como custos e ou desincentivos a atração de empresas na localidade. Nesse contexto, podemos constatar que os problemas considerados locais ou mesmo nacionais - desemprego, desigualdade, analfabetismo e baixa renda - podem ser melhor compreendidos a partir de uma perspectiva cosmopolita e assim indicar soluções mais adequadas, escapando assim da teoria dos jogos de soma zero15 , no qual uns têm sempre que perder para outros ganhem. A alternativa a esse modelo seria o jogo de “soma diferente de zero”, isto é, na qual a união faz a força através da cooperação. Nesse caso as relações local/local ou nacional/transnacional, sem competição fiscal destrutiva, podem formar um mercado de consumo e de trabalho mais amplo que tanto pode se ser regional como global integrados ou seja numa perspectiva cosmopolita na qual todos podem ganhar sem perdedores, como é o caso teoria dos jogos de soma zero. A concepção cosmopolita de globalização amplia algumas das conceitualizações da metodologia nacionalista e permite uma análise mais regional ou global da realidade, como apontado por Beck16. É preciso lembrar, também, que esta teoria pressupõe uma superação de qualquer tipo de "imperialismo ocidental" ou de concepção unidirecional de modernidade (Beck: s/d)17. Cabe ressaltar que a concepção cosmopolita, não 13 WERBER, Max. Economia e Sociedade, Brasília, Ed. UnB, 1999. 14 MELO, Marcos André. Op.cit. 15 Teoria dos jogos de soma zero; ela vem da matemática e depois introduzidas na política e nas empresas; a soma zero exige que alguém perca para outro ganhar; e a soma diferente de zero significa que o ganho de uma jogador não é necessariamente a perda do outro, todos podem ganhar. 16 BECK, U. Toward a new critical theory with a cosmolitan intent – Constellations; volume 10, No 4 , 2003. © Blackwell Publishing Ltd., 9600 Garsington Road, Oxford OX4 2DQ, UK and 350 Main Street, Malden, MA 02148, USA. – Portal Capes 17 BECK, U. - La società globale del rischio: Una discussione fra Ulrich Beck e Danilo Zolo Disponível in: <http://lgxserver.uniba.it/lei/filpol/zolobeck.htm> Acessado em 28/05/2007 10 muito curta e de pouco ou nenhum interesse. Tal fato conduz a uma instabilidade completa das relações sociais de trabalho: a pessoa não é reconhecida pela longa história (narrativas) de contribuição e organização e sim pelos seus resultados imediatos, ou seja, ela é vista por suas habilidades e resultados aqui e agora. Vale destacar a análise de Hobsbawm24 ao afirmar que “a mais perturbadora transformação da década de 1990 foi a desintegração de velhos padrões de relacionamento social humano (...) a quebra dos elos entre as gerações, quer dizer, entre passado e presente. (...) a destruição do passado(...).” O “Mundo-da-vida”, como afirma Habermas25 é colonizado pela “racionalização do mercado”, que pressiona extraordinariamente os relacionamentos profissionais e emocionais e confunde as esferas pessoal, profissional e pública. Cabe lembrar que conceito de “mundo-da-vida”, na teoria de Habermas, se refere a separação dos três aspectos do universo da existência do mundo dos sujeitos, que como resultado da fragmentação desse universo, temos um mundo objetivo, um mundo social e um mundo subjetivo. Cada um deles se refere a totalizações diferentes que abarcam desde o processo de relação formal entre sujeito e instituições formais constituídas até as experiências cognitivas adquiridas pelo sujeito no processo cotidiano de suas relações sociais. A ordem legal moderna que promove a idéia de igualdade foi outro pilar da Social Democracia que serviu ao ideal do capitalismo flexível. O paradoxo se reflete na instrumentação da ordem para ocultar os conflitos hierárquicos no mundo do trabalho (taylorista) e também os concepções de conflito de classe e de interesses. A idéia de igualdade justifica uma organização dita coletiva, cooperativa e colaborativa no espaço de trabalho, aumentando a dependência das pessoas na forma de compromisso aos interesses do capital e enfraquecendo a solidariedade sindical. Finalmente, o último paradoxo analisado por nós se refere ao princípio moderno da realização através do valor real do trabalho para a reprodução social. Acreditamos que a transformação paradoxal deste principio é fundamental para a análise da institucionalização das políticas sociais no Brasil. Hartmann e Honneth26 afirmam que enquanto na Europa a finalidade primeira 24 HOBSBAWM, E. Era dos Extremos. O breve século XX 1914-1991, Rio de Janeiro, Companhia de Letras; 2006. 25 HABERMAS,J. Soberania Popular como Procedimento - Um Conceito Normativo de Espaço Público; in: Novos Estudos - Cebrap, n. 26; São Paulo, 1990 26 HARTMANN, M. e HONNETH. Op.cit. 11 da institucionalização do “Estado-de-bem-estar-social” era e a promover a emancipação e cidadania, desenvolvendo a posteriori o senso de responsabilidade. Hoje, capitalismo flexível e globalizado, esta ordem se inverteu. A responsabilidade passou a ser condição necessária para receber quaisquer benefícios sociais. Isto é, os indivíduos devem comprovar auto-responsabilidade para oferecer contrapartidas, do contrário são ameaçados de perder estes direitos. Tal exigência é justificada como contra-argumento a praticas paternalistas e clientelistas. O que significa, paradoxalmente, exigir a priori, responsabilidade de quem ainda não a constituiu, pois, responsabilidade é um conceito que possuiu originalmente características completamente emancipatórias, as quais se devem esperar a posteriori, como os autores acima citados.. Podemos observar estas exigências em autores como Rosanvallon27 ao afirmar, por um lado, que os beneficiados pelas políticas sociais devem ter responsabilidade para desenvolver qualquer atividade como trabalho, pois os benefícios não compõem um direito do homem/cidadão contemporâneo. E por outro lado, apresenta, paradoxalmente, uma nova interpretação do significado do trabalho como sendo “qualquer atividade” fugindo aos tradicionais conceitos, como por exemplo a definição de Marx28: o trabalho, em primeiro lugar, é um processo em que ambos, o homem e a natureza, participam, e no qual o homem, de sua livre vontade, inicia, regula e controla as relações materiais entre si próprio e a natureza [...] logo, ao atuar no mundo externo e ao modificá-lo ele muda, ao mesmo tempo, a sua própria natureza. Desenvolve as suas forças adormecidas e compele-as a agir em obediência ao seu poder. E, também, Hanna Arent29 ao analisar o trabalho na Historia, afirma que ele deixou de ser apenas uma forma de satisfazer às necessidades (atividade de escravos e pobres) na Grécia Antiga e também não mais se define por uma tortura (tripalium) na Roma Antiga e nem é um castigo como era visto na Idade Média. O trabalho é uma atividade moderna que cria o homem dando-lhe humanidade e emancipação. No século XX, entretanto, o mundo do trabalho tem vivido grandes transformações provenientes, em grande parte, pela revolução técnico-científica que longe de assegurar a qualidade de vida do cidadão, na verdade tem promovido o aumento do tempo de um trabalho alienado para uns e o desemprego para outros. 27 ROSANVALLON, P. A Crise do Estado Providencia. Ed. Unb; 1997 28 MARX, Karl. O Capital, v. I, p. 372 29 ARENDT, Hannah Entre o passado e o futuro. Trad. Mauro W. Barbosa de Almeida. São Paulo: Perspectiva,1997. 12 Surgem assim novos problemas sociais que forçam uma redefinição na agenda das políticas sociais. Em razão dessas transformações, o final do século XX e início do século XXI tem sido marcado pela disseminação de formas não convencionais de trabalho como, por exemplo, “as falsas cooperativas” e a inserção profissional baseada no trabalho autônomo e informal, reduzindo assim os mecanismos tradicionais de proteção social (férias, décimo-terceiro salário, licença médica, assistência médico- social, aposentadoria, etc), em boa parte vinculado à esfera do trabalho assalariado. Registre-se, ainda, um número crescente dos contingentes “condenados” a priori a não entrar no mercado de trabalho. Estes indivíduos, sem renda ou proteção social, são lançados à marginalidade pelo sistema econômico neo-liberal e buscam diariamente oportunidades não oferecidas pela sociedade civil ou pelo Estado. Este processo de exclusão coloca em questão a legitimidade do Estado Nacional (HABERMAS30) e também das outras instituições públicas e privadas, causando um estado de “anomia social”, desencadeando assim um processo de violência generalizada, colocando em risco o Estado democrático de direito e a cidadania, por conseqüência. Nas sociedades contemporâneas globalizadas, a “flexibilização” das relações de trabalho e sua conseqüente precarização colocam como questão social a “individualização negativa”, pois, a ameaça ao fim do emprego formal e à destruição dos direitos sociais conquistados junto ao trabalho, deixam os indivíduos a sua própria sorte, sem as mínimas condições de sobrevivência, como afirma Castel31 (1999). Isto ocorre num contexto global de reorganização da produção que passa a predominar a automatização do trabalho como comprova Gorz (apud SILVA32 ). Ele ao analisar este processo indica que o valor econômico e o poder de compra do trabalho vivo, baseado nos salários tendem a zero, isto é, perde valor, de onde se conclui que no sistema econômico atual a automação, em lugar de contribuir para aumentar o tempo de lazer e cultura do indivíduo, como cria Marx, de fato, a impossibilita. O tempo de trabalho aumenta para alguns e não permite rendimentos a outros que ficam desempregados, à margem do sistema social e trabalhista. A grande contradição que se apresenta é que o 30 HABERMAS,J. O Estado–nação europeu frete aos novos desafios da globalização.”; in: Novos Estudos – Cebrap; n.43. 1995. 31 CASTEL, Robert. As Metamorfoses da Questão Social. Uma Crônica do Salário. Ed. Vozes; Petrópolis; 1999. 32 SILVA, Josué P. “A Crise da Sociedade do Trabalho em Debate”; in: Revista de Cultura e Política – Lua Nova – Desigualdades; Cedec; Campinas; 1995. 15 1- Argumentos políticos-ideológicos: Um programa de distribuição de renda pode criar o desestímulo ao trabalho; ter um caráter reformador e não transformador da sociedade; ter caráter clientelista; 2- Argumentos técnicos: Necessidade de grande volume de recursos necessários para o programa nos diferentes municípios; dificuldades de gestão do programa no que concerne à focalização das famílias necessitadas; e exigência ou não de contrapartidas das pessoas beneficiadas pelo programa. Esta discussão acerca das políticas públicas de proteção social ou de renda mínima pode ser definida a partir de três propostas: uma definida como assistencialista e defendida por Rosanvallon38. Outra condicional-universalista, defendida por Castel39 (1999) e uma terceira defendida por Parijs40, que seria incondicional-universalista. A proposta assistencialista de Rosanvallon41 é constituída pelo autor ao analisar a “crise do Estado - Providência europeu”. Ele contesta o principio de que o indivíduo seja sujeito de direitos assegurados pela letra da lei enquanto cidadão e afirma que idivíduo é apenas objeto de atendimento e proteção e que deve estar apto para cumprir várias funções perante à sociedade, ou seja, prestar contrapartidas pelos serviços recebidos do Estado. A cidadania é entendida, nesta proposta assistencialista, não como um direito do indivíduo à vida digna mas como a obrigatoriedade do “atendido” de fornecer contrapartidas. As políticas sociais devem atender, segundo o autor, apenas aqueles que não podem trabalhar e garantidas por aqueles que podem trabalhar. Rosanvallon entende, de modo muito particular, no capitalismo contemporâneo o processo de acumulação e suas conseqüências no mercado de trabalho, com sendo a introdução das inovações tecnológicas42. Para Rosanvalon43, o atual conceito de trabalho, não inclui apenas as atividades economicamente produtivas e com garantias sociais legais, ele 38 ROSANVALLON, P. A Crise do Estado Providencia. Ed. Unb; 1997 39 CASTEL, Robert. op. cit; 1999 40 PARIJS, Philippe Van. Renda Básica e Renda Mínima. In: Econômica, v. 4, n. 1, p. 75-93, junho 2002 - Impressa em outubro 2003 in: http://www.uff.br/cpgeconomia/v4n1/philippe.pdf Acessado em 21/03/2006. 41 ROSANVALLON, op. cit; 1997 42 “O principal risco para a segurança internacional é o impacto de 1 bilhão de pessoas que estão desempregadas ou em subempregos ou são trabalhadores muito pobres - assegurou Juan Somavía diretor- geral da OIT, na apresentação do estudo, intitulado Uma globalização justa: Criando oportunidades para todos.” Jornal do Brasil. Desemprego é maior ameaça mundial OIT aponta falhas da globalização; RJ; 25 de fev. de 2004. 43 ROSANVALLON, P. A Crise do Estado Providencia. Ed. Unb; 1997 16 incluiu também o emprego precário ou informal. Deste modo, trabalho pode significar qualquer atividade como por exemplo vender suco de laranja na rua, mesmo que isso não lhe garanta assistência social ou qualquer outro direito trabalhista. Contrapondo a esta concepção, Castel44 defende a proteção social como uma conquista histórica do trabalhador assalariado adquirido com emprego formal. A informalidade do trabalho representaria um retrocesso. Ele afirma que o fim do emprego estável e da condição salarial com garantias sociais, substituído pelo trabalho temporário e o trabalho informal deixa a vida dos indivíduos em idade e condição de trabalhar a mercê do aleatório, do imprevisível e da incerteza. Este processo, segundo o autor, agrava as desigualdades sociais e tem como principal conseqüência a “desfiliação” do indivíduo em relação à sociedade, condenando-o ao “individualismo negativo”, egoísta e marginal na tentativa de garantir sua sobrevivência. É exatamente este quadro que podemos observar nas comunidades pobres brasileiras, a partir de nossas experiências como educadores em escolas públicas. Rosanvallon45, por sua vez, entende que deve haver a “participação” da sociedade na discussão dos critérios de inclusão do indivíduo numa política de renda mínima. Contudo, deve-se estar atento, como lembra Castel46, para a crescente heterogeneidade das sociedades contemporâneas compostas por diferentes religiões, identidades étnicas, nacionais, regionais, raciais e de gênero e marcadas por um crescente racismo e xenofobismo explícito e excluidor, que dificulta a formulação de políticas de integração social nestes termos. O propósito de Castel47 ao discutir a natureza das políticas de proteção social do cidadão, é buscar a integração dos indivíduos atomizados e isolados, que não mais compartilham o ideário e os valores construídos socialmente, devido à identificação com um “individualismo negativo” das sociedades capitalistas contemporâneas, desta forma, avaliamos que as atuais políticas sociais implementadas pelo governo brasileiro seguem nesta direção, embora, ainda bastante tímidas. 44 CASTEL, Robert.op. cit; 1999 45 ROSANVALLON, op. cit; 1997 46 47 CASTEL, Robert.op. cit; 1999 17 A proposta de Parijs48 estabelece uma renda básica para todos, de modo a evitar preconceitos e discriminação social. Ela é muito mais radical do que a visão do Estado- de-Bem-Estar-Social europeu, que propõe transferências de renda como direito das pessoas excluídas pelo sistema de mercado, isto é, das pessoas desempregadas; das deficientes, das muito velhas para trabalhar, etc. O autor ao avaliar o sistema tradicional de transferência de renda de tipo clássico, lembra que, embora necessário, ele pode contribuir para aumentar o sentimento de exclusão e, inevitavelmente, levaria a um processo de estigmatização dos beneficiários destas transferências, pois poderiam ser rotulados de pobres; excluídos, inválidos, etc. Além disso, tal modelo traz em si uma contradição, porque neste sistema a saída da exclusão é “castigada” com a perda dos benefícios e isto cria uma armadilha na qual muita gente com poucas qualificações permanece presa. Assim Parijs49 sustenta que: uma renda universal para todos os cidadãos não cria estigmas porque é um direito de todos os cidadãos, não é uma assistência para os indigentes, não cria armadilhas de dependência, de exclusão, de desemprego, porque esta renda básica é uma base, não é uma rede de seguridade. ( Parijs, p.80; 2003) Cabe lembrar que o próprio Parijs reconhece que a viabilização de uma renda universal incondicional que evite a armadilha da dependência é um objetivo para um futuro bastante longínquo, e nos alerta que: nos países como Brasil ou Colômbia não se pode avançar no curto prazo com sistemas completamente universais, com benefícios concedidos tanto aos ricos como aos pobres, um critério que é central na idéia da renda básica mas me parece que se deve avançar com esquemas seletivos. No entanto, o grande problema dos esquemas seletivos é que, inevitavelmente, eles tendem a criar armadilhas de dependência, de desemprego, que ameaçam em parte a viabilidade econômica desses esquemas e sua credibilidade política. ( Parijs, p.88. 2003) Acreditamos que esta proposta seja viável numa concepção cosmopolita de relações, cooperação regional ou global, na qual competições e conflitos sejam regulados e dialéticos. 48PARIJS, Philippe Van. Renda Básica e Renda Mínima. In: Econômica, v. 4, n. 1, p. 75-93, junho 2002 - Impressa em outubro 2003; in: http://www.uff.br/cpgeconomia/v4n1/philippe.pdf Acessado em 21/03/2007. 49PARIJS, Philippe Van. op. cit; 2003 20 partidas (trabalho precário, inseguro e sem garantias mínimas) que se apresenta em Rosanvalon55 mas uma proposta que permita a emancipação através da educação e da saude. O sucesso das experiências realizadas em Brasília pelo governo Cristóvam Buarque (PT) e em Campinas pelo prefeito José Magalhães Teixeira (PSDB) fez com que a Bolsa-Escola se transformasse em referência para vários países como elemento importante no combate à pobreza e na democratização da Educação escolar/formal. A implementação deste programa no plano federal se iniciou em 2001 com a adesão do Presidente da República, à época, Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Os prefeitos dos municípios de menor IDH ou com considerável parcela de população pobre forma instados a participar do programa, selecionando e estimulando as famílias a colocarem as crianças nas escolas de modo a retirá-las das ruas e erradicar o trabalho infantil. O Programa de Erradicação do trabalho Infantil – PETI é um bom, exemplo de transferência direta de renda do Governo Federal para famílias de crianças e adolescentes em situação de trabalho, adicionado à oferta de Ações Socioeducativas e de Convivência, manutenção da criança/adolescente na escola e articulação dos demais serviços da rede de proteção básica e especial. A integração entre o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e o Programa Bolsa Família, regulada pela Portaria GM/MDS nº 666, de 28 de dezembro de 2005, buscou racionalizar a gestão de ambos os programas, com o incremento da intersetorialidade e da potencialidade das ações do Governo, evitando-se a fragmentação, a superposição de funções e o desperdício de recursos públicos. (SUAS 56). A partir de 2003, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva dará maior ênfase aos programas vinculados a questões referentes à Segurança Alimentar, buscando soluções inéditas com fins de erradicação da pobreza e da injustiça social. Com tais objetivos definidos, unificou-se vários programas sociais (Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação) em um único programa: Programa de Bolsa Família, no plano nacional. Para levar adiante essa empreitada, buscou cooperação com as prefeituras 55 ROSANVALLON, op. cit; 1997 56 O Sistema Único de Assistência Social -Disponivel < http://www.mds.gov.br/programas/rede- suas/protecao-social-especial/programa-de-erradicacao-do-trabalho-infantil-peti.> acessado 02/06/2008 21 municipais. Podemos observar essa parceria no termo de cooperação com a prefeitura municipal do Rio de Janeiro (TERMO DE COOPERAÇAO57). O Programa de Bolsa Família58 criado como complementação de renda está aliado à exigência de contrapartidas, como um instrumento de emancipação. São elas: condicionalidades na área da Saúde: pré-natal e puerpério, vacinação e acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil e vigilância alimentar e nutricional de crianças menores de 7 anos; e na área de Educação: freqüência mínima de oitenta e cinco por cento da carga horária escolar mensal, em estabelecimentos de ensino regular, de crianças e adolescentes de 6 a 15 anos de idade. Estas condicionalidades têm por objetivo contribuir para processo de emancipação das famílias excluídas de modo a estimular o uso dos serviços públicos de saúde e educação com objetivos de inclusão social e emancipação. Outros programas complementares e ações coordenadas dos governos e da sociedade civil são implementados tais como geração de empregos e renda, micro-crédito, cooperativas, entre outras. Contudo, faz-se necessário fazer refletir acerca destas “novas” políticas sociais de “empreendimentos” familiares e comunitários, pois, eles são calcados num modo de produção artesanal tradicional das comunidades locais e trazem consigo os paradoxos da pós-modernidade. Estas novas iniciativas, fundadas na cultura tradicional e no trabalho comunitário e familiar local, correm o risco de se instituir, como também é tradicional no Brasil na exploração direta e indireta de trabalho precário, de crianças em idade escolar59, de idosos e mulheres com pelos menos dupla jornada de trabalho como podemos ilustrar neste fragmento de musica dos Titãns: "... Marvin, a vida é pra valer Eu fiz o meu melhor E o seu destino eu sei de cor" E então um dia uma forte chuva veio E acabou com o trabalho de um ano inteiro E aos treze anos de idade eu sentia todo o peso do mundo em minhas costas Eu queria jogar mas perdi a aposta, Trabalhava feito um burro nos campos Só via carne se roubasse um frango 57TERMO DE COOPERAÇAO n. 00/2004 que entre si celebram a União, por intermédio do ministério do desenvolvimento social e combate a fome, e a Prefeitura Municipal do Rio de janeiro. Rio de Janeiro, 2004. 58PROGRAMA Bolsa Família. Orientação para o Ministério Público. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Brasília; 2005. http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/bolsa_familia-livro.pdf Acessado em 18/05/2006. 59 Segundo as estatísticas, há 5,1 milhões de brasileiros entre 5 a 17 anos trabalhando; 1,4 milhões na faixa etária de 5 a 13 anos trabalhando ilegalmente; 1/3 destas trabalham 40 horas semanais; nas tarefas do lar há 22 milhões de menores; ; IBGE: 2006. 22 Meu pai cuidava de toda a família Sem perceber segui a mesma trilha Toda noite minha mãe orava ...” Para concluir, entendemos que é necessário uma séria reflexão sobre os diversos programas sociais do século XXI. Uma leitura superficial desses programas podem não reconhecer os seus paradoxos visto que as intenções podem ser boas, mas devemos reconhecer que nem sempre as conseqüências o serão. Apesar de alguns deles terem sido criados para atender as finalidades básicas do indivíduo: combater a miséria, a exclusão social, o analfabetismo de modo a promover a emancipação das famílias mais pobres; pode, ao contrário, reafirmá-los. Levantamento feito pelo governo federal em 2006, revelou que a inclusão das pessoas marginalizadas, individualizadas negativamente como afirma Castel60, é uma tarefa árdua e leva tempo para que alcance uma mudança das “culturas” negativas. Constatou-se, neste ano, que apenas 2,88% do total de alunos de escolas públicas atendidos pelo Bolsa Família têm freqüência escolar abaixo dos 85% exigidos pelo programa61. Outro dado estatístico importante, apontado na pesquisa, é que dos domicílios sem rendimentos ou com renda per capita inferior a um quarto do salário mínimo, 54,3% já estão sendo atendidas, por outro lado isso significa que 43,7% ainda não estão fora do programa. Assim, o Programa Bolsa-Família implementado hoje no país, apesar de necessário, não é suficiente para resolver os problemas das grandes desigualdades sociais, da exclusão social, da pobreza e da miséria de grande parte da população brasileira. O que nos obriga a uma reflexão mais detida sobre a atual (des)organização da sociedade capitalista e do desemprego estrutural e tecnológico que condena parte da população a ficar excluído do mercado de trabalho e dos benefícios secundários provenientes do mesmo, como o sentimento de bem estar, segurança e pertencimento à sociedade. É claro que muitos destes programas, como o antigo Bolsa-Escola, o atual programa Bolsa-Família e a concessão de micro-créditos, por exemplo, exigem algumas condicionalidades, que determinavam e determinam ainda hoje a seleção dos candidatos. Não é lícito distribuir dinheiro público, isto é, do contribuinte sem critérios 60 CASTEL, Robert. Op. cit. 2001 61 O Globo – 26 de janeiro de 2006 – Caderno O país. 25 diferentes na sociedade globalizada pode apresentar melhores soluções aos problemas locais e nacionais, regional e cosmopolita como exemplo as questões ambientais. Hoje, os atores globais, que se personalizam no mundo virtual ou se materializam nas empresas multinacionais, adquiriram grande poder nos estados nacionais podendo aumentar ou reduzir a oferta de empregos. Diante dessa nova realidade se faz necessário o incremento de novas estratégias para uma organização regional dos Estados Nacionais que poderão pelo menos obter maior legitimidade neste processo, criando estrategicamente, uma economia e um mercado de trabalho, produção e consumo, ainda que apenas a nível regional. A instituição democracia era local na Grécia Antiga, se tornou nacional na época Moderna, e hoje pode se transformar em transnacional. Este novo caráter da democracia pode fortalecer a ação contra as desigualdades sociais do capitalismo flexível, de modo que ao constituir uma “sociedade civil globalizada”, os indivíduos possam agir não apenas como produtores e consumidores, mas como cidadãos regionais ou globais autônomos reflexivos. O novo tipo de capitalismo que se apresenta hoje tem, também, um novo estilo de vida, muito diferentes da denominada “primeira modernização” iniciada com as revoluções políticas e tecnológicas do século XVIII, como afirma Becki67. E é por este motivo que o autor argumenta que ao atingirmos a “segunda modernização”, necessitamos urgentemente de novos quadros de referência, seja no plano sociológico, seja no político. A época da “modernidade iluminista” enfrenta cinco novos desafios da sociedade capitalista: a turbulência dos mercados financeiros globalizados, o desemprego, o subemprego, a individualização e os riscos globais da crise ecológica Soluções à estes desafios serão possíveis se: conseguirmos produzir mais e melhores tecnologias, mais e melhor desenvolvimento econômico, mais e melhor diferenciação funcional. E estas são as condições para vencer o desemprego, a destruição do ambiente natural, o egoísmo social e assim por diante (BECK). Conclusão Buscamos envolver, neste artigo, os entraves filosóficos (paradoxos), políticos (as intransigências), econômicos (rendas) e sociais (marginalização/analfabetismo) no 67 BECK, U. Op.cit. sem data. 26 processo de elaboração e implementação de políticas públicas que buscam garantir uma renda mínima às pessoas ou famílias que ainda não conseguiram alcançar um patamar de sustentabilidade. Ao analisar as possibilidades e limites das políticas públicas que procuram garantir a distribuição de renda, como exemplo o programa de Bolsa Família, para as pessoas em estado de pobreza, buscamos identificar o significado desse programa, em termos de combate às mazelas do Brasil tais como: a desigualdade de renda, a exclusão, a violência o analfabetismo, o desemprego, o subemprego e seu papel na formação de um cidadão autônomo e de uma sociedade mais solidária e justa. Diante do apresentado somos forçados a reconhecer que alguns programas de assistência ou de renda mínima podem causar estigma ou vícios, contudo a implementação de políticas sociais, hoje no Brasil, é uma questão de justiça social, como afirma Parijs68. Entretanto cabe lembrar que Justiça social não se limita a suposta igualdade entre as pessoas, mas igualdade de oportunidades que segundo Rawls69 é uma questão de eqüidade. Portanto, estas políticas devem estar acompanhadas de outras políticas sociais como: educação e saúde com qualidade, urbanização e saneamento básico, oferta de créditos e estimulo a produção de renda e empregos seguros. E finalmente, concluímos que a garantia de uma renda básica ou mínima é necessária, mas não suficiente para garantir a emancipação do cidadão. Bauman70 nos alerta que a esse movimento deve-se ao esforço para se superar a ideologia da sociedade de consumo. Para que isso ocorra o trabalho tem que deixar de ser um ato alienado, repetitivo e um instrumento de exploração da mais-valia e transformar-se num ato criativo, cooperativo e reflexivo que permita ao cidadão agir comunicativamente no espaço público buscando formar consensos democraticamente constituídos, como afirma Habermas (apud VIEIRA71). Com esse objetivo, os atores sociais devem agir, mais que nunca, na retomada do espaço público de debate. A pesar do reconhecimento da existência desse processo de controle e privatização apresentados por Bauman e a constatação do“declínio do homem público” pontuado 68 PARIJS, Philippe Van. Op.cit. 2003 69 RAWLS, John (1997) Uma Teoria da Justiça. Editora Martins Fontes; São Paulo. 70 BAUMAN, Zygmunt; Op.cit. 1999. 71VIEIRA, José Ribas. A cidadania: sua complexidade teórica e o direito. Trabalho apresentado no “Seminário sobre o Espaço Público”, promovido pelo Departamento de Direito da PUC-RIO, em 29 de agosto de 1997. 27 por Senett, ainda assim, acreditamos ser possível a retomada de uma prática política mais participativa, como o era na Grécia antiga entendida como a comunidade organizada, formada pelos cidadãos (no grego “politikos”), com a diferença de agora todos os Homens devem ser considerados, livres e iguais. O que significa o retorno à reflexão crítica e o resgate da consciência da autonomia dos indivíduos na ordenação da sociedade. No entanto, o espaço público, hoje, segundo (Beck72), não pode ser concebido como apenas local ou nacional e sim transnacional ou cosmopolita. 72 BECK, U. Op.cit. sem data.
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