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Toxicologia, Notas de estudo de Farmácia

Toxicologia 1

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 09/11/2010

andre-tomaz-terra-junior
andre-tomaz-terra-junior 🇧🇷

4.5

(34)

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Baixe Toxicologia e outras Notas de estudo em PDF para Farmácia, somente na Docsity! Noções Básicas de Toxicologia 1 - CONCEITOS BÁSICOS. 1.1 - Toxicologia É a ciência que tem como objeto de estudo o efeito adverso de substâncias químicas sobre os organismos vivos, com a finalidade principal de prevenir o aparecimento deste efeito, ou seja, estabelecer o uso seguro destas substâncias químicas. A toxicologia se apoia, então, em 3 elementos básicos: 1) O agente químico (AQ) capaz de produzir um efeito; 2) O sistema biológico (SB) com o qual o AQ irá interagir para produzir o efeito; 3) O efeito resultante que deverá ser adverso para o SB. Torna-se necessário, também, a existência de um meio adequado através do qual o SB e o AQ possam interagir. Assim: Efeito adverso ou tóxico Nos últimos anos tem sido aceito que, efeitos adversos provocados por agentes físicos, sejam parte, também, da Toxicologia. I.2 - Toxicologista É o profissional treinado ou capacitado a estudar os efeitos nocivos produzidos pelos agentes químicos e avaliar a probabilidade do aparecimento destes efeitos. As tarefas principais do toxicologista são: a) Avaliar o risco no uso de substâncias químicas. b) Estabelecer os limites de segurança para o uso das mesmas. c) Realizar análises toxicológicas que permitam a monitorização e o controle dos limites de segurança estabelecidos I.3 - Áreas da Toxicologia A toxicologia é uma ciência multidisciplinar, que abrange uma vasta área de conhecimento, relacionando-se estritamente com diversas outras ciências, pois sem os conhecimentos interrelacionados, dificilmente poderá atingir seus objetivos: prevenir, diagnosticar e tratar. A toxicologia é desenvolvida por especialistas com diferentes formações profissionais, oferecendo cada um contribuições específicas em uma ou mais áreas de atividade permitindo assim, o aperfeiçoamento dos conhecimentos e o desenvolvimento das áreas de atuação. No âmbito da toxicologia, distinguem-se várias áreas, de acordo com a natureza do agente ou a maneira como este alcança o organismo. Destacam-se entre outras: Toxicologia Ambiental: que estuda os efeitos nocivos produzidos por substâncias químicas presentes no macro ambiente dos seres vivos. Toxicologia Ocupacional: que estuda os efeitos nocivos produzidos pelas substâncias químicas presentes no meio ocupacional (micro ambiente) do homem. Toxicologia de Alimentos: que estuda os efeitos adversos produzidos por agentes químicos presentes nos alimentos, sejam estes de origem biogênica ou antropogênica. É a área da toxicologia que estabelece as condições nas quais os alimentos podem ser ingeridos sem causar danos à saúde. Toxicologia de Medicamentos: que estuda os efeitos adversos decorrentes do uso inadequado de medicamentos, da interação medicamentosa ou da susceptibilidade individual. Toxicologia Social: estuda o efeito nocivo dos agentes químicos usados pelo homem em sua vida de sociedade, seja sob o aspecto individual, social (de relação) ou legal. Toas estas áreas poderão ser estudadas sob três aspectos distintos: o clínico, o analítico e o experimental. I.4 - Agente Tóxico (AT), Xenobiótico, Toxicante Qualquer substância química (ou agente físico, para alguns cientisyas) que, interagindo com um organismo vivo, é capaz de produzir um efeito tóxico seja este uma alteração funcional ou a morte. No entanto, desde a idade média, já se sabe que :Todas as substâncias são venenos, não há uma que não seja. A dose correta é que diferencia um veneno de um remédio ( PARACELSUS-1493-1541). Assim, o conceito de agente tóxico apresentado acima torna-se pouco útil, do ponto de vista prático, posto que, qualquer substância química tem a capacidade potencial de produzir um efeito deletério, se presente em dose ou concentração suficientes. Assim, intimamente relacionado com o conceito de agente tóxico, existem dois outros conceitos de extrema importância: o de Toxicidade e o de Risco, que serão detalhados mais tarde. A maioria das substâncias químicas, consideradas como agentes tóxicos, são substâncias exógenas aos organismos, conhecidas como xenobióticos. O termo xenobiótico, derivado do grego xeno que significa estranho, é usado para indicar uma substância estranha ao organismo. Os xenobióticos podem produzir efeitos benéficos, como por exemplos os medicamentos, ou adversos (toxicante ou agente tóxico). Mais recentemente, surgiu no glossário toxicológico protugues, o termo Toxicante (resultado do “aportuguesamento” do temo inglês, toxicant ) que representa o agente químico já absorvido, apto e atuar em seu sítio de ação no organismo. I.4.1 - Classificação dos Agentes Tóxicos Os AT podem ser classificados de diversas maneiras dependendo dos critérios utilizados. A seguir são apresentadas algumas destas classificações: • Quanto à natureza: 2 Drugs, ou seja, os fármacos essenciais à vida e não serem aceitáveis no uso de aditivos de alimentos, por exemplo. Alguns fatores a serem considerados na determinação de um Risco aceitável são: Necessidade do uso da substância; Disponibilidade e a adequação de outras substâncias alternativas para o uso correspondente; Efeitos sobre a qualidade do ambiente; Considerações sobre o trabalho (no caso dela ser usada no meio ocupacional); Avaliação antecipada de seu uso público (ou seja, o que ela poderá causar sobre a população em geral, onde existe, por exemplo, crianças, velhos, doentes, etc.); Considerações econômicas. Geralmente associado ao conceito de Risco tem-se o conceito de Segurança (probabilidade de uma substância química não provocar um efeito adverso, em condições específicas de uso) e ao conceito de Agente Tóxico (AT), o de Xenobiótico (qualquer substância química, quali ou quantitativamente estranha ao organismo) e o de Toxicante (agente químico que está exercendo a ação tóxica no organismo). I.8 - Intoxicação É um conjunto de efeitos adversos produzidos por um agente químico (ou físico), em decorrência de sua interação com o sistema biológico. É, em outras palavras, o desequilíbrio orgânico ou o estado patológico provocado pela interação entre o agente químico e o organismo, sendo, via de regra, revelados clinicamente por um conjunto de sinais e sintomas tóxicos. Logicamente, o efeito tóxico só será produzido, se a interação com o receptor biológico apropriado ocorrer em dose e tempo suficientes para quebrar a homeostasia do organismo. Existem, então, na grande maioria das vezes, uma série de processos envolvidos, desde o contato do agente tóxico com o organismo, até o aparecimento dos sintomas clínicos que revelam esta interação. Isto permite dividir a intoxicação em 4 fases distintas, a saber: Fase de Exposição: corresponde ao contato do agente tóxico com o organismo. Fase Toxicocinética: consiste no movimento do AT dentro do organismo. É formada pelos processos de Absorção, Distribuição e Eliminação (Bio-transformação e Excreção). Fase Toxicodinâmica: corresponde à ação do AT no organismo. Fase Clínica: corresponde à manifestação clínica dos efeitos resultantes da ação tóxica. I.9 - Classificação dos Efeitos Tóxicos Inicialmente deve-se diferenciar efeito indesejável de efeito adverso e tóxico. Efeitos indesejáveis: O espectro de efeitos indesejáveis é amplo. Por exemplo, na terapêutica, cada droga produz um número de efeitos, mas apenas um está relacionado com o papel terapêutico procurado. Todos os outros efeitos são indesejáveis, para aquela indicação terapêutica. No entanto, estes efeitos indesejáveis podem se tornar desejáveis para uma outra indicação terapêutica da droga. Exemplo: a secura da boca é um efeito desejado da atropina, quando ela é usada como medicação pré-anestésica, mas passa a ser indesejável, quando a atropina é usada no tratamento da úlcera péptica. Efeitos Adversos ou nocivos: 5 Os efeitos adversos são aqueles que: • Ocorrem com uma exposição intermitente ou continuada e que dão lugar à diminuição da capacidade funcional (determinada por parâmetros anatômicos, fisiológicos e bioquímicos ou de comportamento) ou a uma diminuição da capacidade para compensar tensões adicionais; • São reversíveis durante a exposição ou logo cessada esta, quando tais alterações causam diminuições detectáveis da capacidade do organismo para manter a homeostase; e • Realçam a suscetibilidade do organismo aos fatores nocivos de outras influências ambientais. Podem ser causados por fatores químicos, físicos, biológicos ou mecânicos. Efeitos Tóxicos: São os efeitos adversos causados por substâncias químicas e são, na maioria das vezes, dose-dependentes. Todo o efeito tóxico é indesejável e adverso, mas nem todo efeito adverso é tóxico. I.9.1 - Reações Idiossincráticas ou Idiossincrasias Químicas São respostas quantitativamente anormais a certos agentes tóxicos provocados, geralmente, por alterações genéticas. O indivíduo pode ter uma resposta adversa com doses baixas (não-tóxicas) ou então ter uma resposta extremamente intensa com doses mais elevadas. Exemplo: sensibilidade anormal aos nitritos e outros metemoglobinizantes, devido à deficiência, de origem genética, na NADH- metemoglobina redutase. I.9.2 - Reações Alérgicas ou Alergia Química São reações adversas que ocorrem somente após uma prévia sensibilidade do organismo ao AT, ou a um produto quimicamente semelhante. Na primeira exposição, a substância age como um hapteno e promove a formação dos anticorpos, que em 2 ou 3 semanas estão em concentrações suficientes para produzir reações alérgicas em exposições subsequentes. Alguns toxicologistas não concordam que as alergias químicas sejam efeitos tóxicos, já que elas não obedecem ou apresentam uma curva dose-resposta (elas não são dose dependente como a grande maioria dos efeitos tóxicos). Entretanto, como a alergia química é um efeito indesejável e adverso ao organismo, pode ser reconhecido como efeito tóxico. I.9.3 - Efeito Imediato, Crônico e retardado Imediatos ou agudos são aqueles que aparecem imediatamente após uma exposição aguda, ou seja, exposição única ou que ocorre, no máximo, em 24 horas. Efeitos crônicos são aqueles resultantes de uma exposição crônica, ou seja, exposição a pequenas doses, durante vários meses ou anos. O efeito crônico pode advir de dois mecanismos: a) somatória ou acúmulo do agente tóxico no organismo: a velocidade de eliminação é menor que a de absorção, assim ao longo da exposição o AT vai sendo acumulado no organismo, até alcançar um nível tóxico. b) somatória de efeitos: ocorre quando o dano causado é irreversível e, portanto, vai sendo aumentado a cada exposição, até atingir um nível 6 detectável; ou, então, quando o dano é reversível, mas o tempo entre cada exposição é insuficiente para que o organismo se recupere totalmente. • Efeitos retardados são aqueles que só ocorrem após um período de latência, mesmo quando já não mais existe a exposição. O exemplo mais conhecido é o efeito carcinogênico, sendo que alguns deles podem ter um período de latência entre 20-30 anos. I.9.4 - Efeitos Reversíveis e Irreversíveis A manifestação de um ou outro efeito vai depender, via de regra, da capacidade do tecido lesado em se recuperar. Assim, lesões hepáticas são geralmente reversíveis, já que este tecido tem grande capacidade de regeneração, enquanto as lesões no sistema nervoso central (SNC) tendem a ser irreversíveis, uma vez que as células nervosas são pouco renovadas. I.9.5 - Efeitos Locais e Sistêmicos O efeito local refere-se àquele que ocorre no local do primeiro contato entre o AT e o organismo. Já o sistêmico exige uma absorção e distribuição da substância, de modo a atingir o sítio de ação, onde se encontra o receptor biológico. Existem substâncias que apresentam os dois tipos de efeitos. (Ex.: benzeno, chumbo tetraetila, etc). Algumas vezes uma lesão local intensa pode levar ao aparecimento de um efeito sistêmico. Ex.: queimaduras intensas com ácidos podem levar a uma lesão renal, devido à perda excessiva de líquidos. I.9.6 - Efeitos Resultantes da Interação de Agentes Químicos O termo interação entre substâncias químicas é utilizado todas as vezes que uma substância altera o efeito de outra. A interação pode ocorrer durante as fases de exposição, toxicocinética ou toxicodinâmica. Como conseqüência destas interações podem resultar diferentes tipos de efeitos: I.9.6.1 - Efeito Aditivo ou Adição É aquele produzido quando o efeito final dos dois agentes é igual à soma dos efeitos individuais, que aparecem quando eles são administrados separadamente (1 + 1 = 2). Ex.: inseticidas organofosforados. I.9.6.2 - Efeito Sinérgico ou Sinergismo Ocorre quando o efeito dos agentes químicos combinados é maior do que a soma dos efeitos individuais (1 + 1 = 10). Ex.: a hepatotoxicidade resultante da interação entre tetracloreto de carbono e álcool é muito maior do que aquela produzida pela soma das duas ações em separado, uma vez que o etanol inibe a biotransformação do solvente clorado. I.9.6.3 – Potenciação Ocorre quando um agente químico, que não tem ação sobre um determinado órgão, aumenta a ação de um outro agente sobre este órgão (0 + 1 = 10). Ex.: o isopropanol, que não é hepatotóxico, aumenta excessivamente a hepatotoxicidade do tetracloreto de carbono. I.9.6.4 - Efeito Antagônico ou Antagonismo 7 Os dados de toxicidade obtidos durante as etapas de desenvolvimento de um processo tecnológico podem ser fontes de dados a respeito dos perigos sobre a saúde, não somente das matérias primas, mas também de outras substâncias utilizadas ou produzidas, como produtos intermediários, no processo tecnológico. Além disso, a avaliação toxicológica pode facilitar a seleção de um processo tecnológico substitutivo que seja menos nocivo para a saúde. Na definição de normas ambientais e sanitárias é necessário dar preferência ‘as substâncias químicas que manifestem um grau significativo de toxicidade e constituem um perigo de saúde, as quais serão utilizadas amplamente na Indústria, na agricultura e os produtos de consumo. É importante considerar que, as mudanças e a evolução dos processos industriais, a formulação de novas substâncias químicas e as modificações no emprego das substâncias químicas conhecidas podem propor novos e maiores perigos. E isso requer uma constante reavaliação das prioridades. 2.4 - Relação dose - efeito e relação dose - resposta Os estudos das alterações causados pelas substâncias químicas têm por objetivo estabelecer as relações dose-efeito e dose-resposta que fundamentam todas as considerações toxicológicas necessárias para avaliação do risco à saúde. Nos estudos relativos à exposição química objetivando medidas de prevenção dos efeitos nocivos à saúde é necessário existir disponível uma medida quantitativa da relação entre a magnitude da exposição ao agente químico e o tipo e grau de resposta numa população exposta a esse agente. É somente com base nessa relação que se pode, seguramente, permitir uma dose tolerável do agente nocivo, em algum nível acima do zero, de tal modo que uma fração significativa do grupo exposto não experimente um indesejável efeito sobre a saúde. Para uma melhor compreensão da diferença entre os dois tipos de relações, torna-se necessário conceituar dose, efeito e resposta. A expressão Dose se emprega para especificar a quantidade de uma substância química administrada, a qual pode não ser idêntica à dose absorvida. Nas exposições ambientais pode-se estimar a dose com base na medição das concentrações ambientais em função do tempo. E a dose nos órgãos e tecidos que interessam, pode-se estimar com base na quantidade administrada ou ingerida; ou na medida da concentração em amostras biológicas. A informação para estimar a dose nos tecidos ou órgãos requer dimensionar os processos de absorção, distribuição, armazenamento, biotransformação e excreção da substância química ou seus metabólitos, em função do tempo. Quando a ação tóxica se manifesta no local de introdução ou muito próximo deste (por exemplo, a pele) a estimativa da dose no tecido pode ser muito confiável. Entretanto, quando a ação tóxica se manifesta em algum outro sítio distante do primeiro contato (por exemplo, células hepáticas), a estimativa da dose toxicologicamente significativa é menos confiável. Os termos Efeito e Resposta, muitas vezes podem ser usados como sinônimos para denominar uma alteração biológica, num indivíduo ou numa população em relação a uma exposição ou dose. Contudo, na Toxicologia se diferenciam, utilizando o termo “efeito” para denominar uma alteração biológica e o termo “resposta” para indicar a proporção de uma população que manifesta um efeito definido. Segundo esta terminologia, a resposta é a taxa de incidência de um efeito. Por exemplo, se pode dizer que o valor de DL50 é a dose que causará uma resposta de 50% em uma população em que se estuda o efeito letal de uma substância química. Alguns efeitos podem ser medidos em uma escala graduada de intensidade ou gravidade, relacionando sua magnitude diretamente com a dose e por isso são 10 denominados Efeitos Graduados. Certos efeitos, no entanto, não permitem gradação e se podem expressar somente dizendo que estão “presentes” ou “ausentes”. Estes efeitos se denominam Efeitos Quânticos, como por exemplo, a morte ou ocorrência de um tumor. As relações dose-efeito e dose-resposta são representadas pelas curvas correspondentes. A curva dose-efeito demonstra a relação entre a dose e a magnitude de um efeito graduado, em um indivíduo ou em uma população. Estas curvas podem adotar distintas formas, lineares ou não. Exemplo: relação entre a porcentagem de carboxiemoglobina no sangue e a intensidade dos sinais e sintomas da intoxicação. A curva dose-resposta representa a relação entre a dose e a proporção da população que responde com um efeito quântico. Em geral estas curva são sigmóides. Uma forma de explicar a configuração das curvas de dose-resposta é dizer que cada indivíduo de uma população tem uma “tolerância” própria e requer uma certa dose antes de responder com um efeito. A princípio, existe tanto uma dose baixa, à qual ninguém responderá, como uma dose alta a qual todos responderão. A razão deve-se à variabilidade biológica, isto é, à diferente sensibilidade dos indivíduos (ou animais) à ação de determinada substância química. É importante mencionar que, para cada efeito haverá, então, uma curva dose- resposta distinta. Além disso, a configuração de uma curva dose-resposta de uma substância química em uma mesma mesma espécie animal pode variar com as mudanças das condições experimentais, por exemplo, as mudanças na forma de distribuição da dose no tempo (freqüência). Para a construção da relação dose-resposta são necessários um grande número de animais experimentais para se obter dados estatisticamente confiáveis. A Figura 1 ilustra o diagrama desta relação, onde estão representadas as doses de uma substância versus a porcentagem de animais mortos (o efeito quântico medido foi a letalidade). Importante ressaltar que neste tipo de curva dose/resposta, avalia-se uma freqüência acumulativa de resposta, ou seja, a freqüência de indivíduos reativos a uma dose elevada determinada inclui todos aqueles que respondem a essa dose e a todas as doses inferiores. Figura 1 - Relação dose/resposta para uma substância hipotética em uma população homogênea (efeito medido: letalidade). A relação dose/resposta é sempre obtida em uma população uniforme, no entanto, a curva sigmóide não é a maneira mais freqüente de se representar esta relação, já que é necessário um número elevado de animais e de doses, para definir adequadamente esta curva. Uma outra maneira de expressar a relação dose/resposta é através da curva gaussiana, onde se observa a distribuição da freqüência da resposta com a dose em uma escala logarítmica. Isto porque, observando-se um dado efeito em uma população, pode-se notar que nem todos os membros dela, responderão de maneira uniforme a uma dose x. Esta ausência de uniformidade é devida às diferenças na susceptibilidade individual, ou seja, à variação biológica dentro de uma espécie animal. Pela relação dose/freqüência de resposta pode-se observar a distribuição normal da freqüência, ou 11 seja, que existe um grande número de animais que respondem à dose x com o efeito y, um pequeno número que responde a uma dose menor de x com o mesmo efeito e outro pequeno número que só responderá com este efeito Y a uma dose maior de x. Estes extremos são os indivíduos hipersensíveis (ou hipersuscetíveis) e os resistentes (hiposensíveis ou hiposucetível). É a representação da relação dose/ resposta através da distribuição gaussiana ou Curva de Gauss (Figura 2). Figura 2 - Relação dose/freqüência de resposta para uma substância hipotética em uma população homogênea A curva sigmóide, como expresão gráfica da relação dose/resposta (acúmulo de resposta versus dose), dificulta a visualização da mencionada relação o o manuseio das equações matemáticas correspondentes, assim é frequente utilizar-se, na construção da mesma, valores log da dose. Com esse artifício, a curva sigmóide obitida se aproxima bastante da linearidade, facilitando sua interpretação (entre 16 e 84% de resposta a curva sigmóide é, praticamente linear). log dose (mg/kg) Figura 3 - Relação dose/resposta de três substâncias diferentes. Uma segunda maneira, embora menos frequente nos dias de hoje, de expressa a relação dose/resposta de uma foram linear, é expressar a resposta em “unidades de probabilidade” ou seja, o eixo dos Y é contruído na escala de “probito” . Na forma linear a curva dose-resposta permite avaliar de manera mais clara, a resposta da população estudada a partir das doses, às quais 20%, 70%, 84% ou qualquer outra porcentagem da população reage a um determinado efeito. Essa confecção linear da relação dose/resposta permite também, além da visualização mais nítida da DL50, comparar as inclinações das retas. Por exemplo, duas substâncias podem ter a mesma DL50, como mostrado na Figura 3, mas qualquer afirmação a respeito da igualdade relativa de toxicidade seria válida somente pra essa dose específica, uma vez que as inclinações das retas A e B apresentam perfis distintos. 12 Após o “episódio” da Talidomida (epidemia de má formação congênita, 1959-1961, em crianças cujas respectivas mães haviam feito uso da talidomida no início da gravidez), as Instituições Governamentais, em diversos países, exigiram um maior rigor na realização dos testes toxicológicos objetivando acabar ou minimizar a ocorrência das chamadas reações adversas aos medicamentos. Não se tratando de medicamento, estes testes devem ser realizados para cada substância química produzida e comercializada, de acordo com os critérios já vistos anteriormente. Os tipos de testes a serem realizados, podem variar de um país para outro, no entanto devem considerar os principais critérios de avaliação de toxicidade: • exame anatomo-patológico (aspectos macro e microscópico) • peso dos órgãos • crescimento do animal • exames fisiológicos • exames bioquímicos • estudos do comportamento • efeito sobre a fertilidade e feto • DE50 e DL50 • CE50 e CL50 No Brasil, a Resolução 1/78 (D.O. 17/10/78) do Conselho Nacional de Saúde, estabelece 5 tipos de ensaios de toxicidade: Aguda, Sub-aguda, Crônica, teratogênicidade, embriotoxicidade e estudos especiais (estudos de comportamento, carcinogênicidade e outros). 3.1- Teste de toxicidade aguda Este estudo é caracterizado pela administração ou exposição da substância química numa dose única (ou múltipla num espaço de 24 horas), utilizando pelo menos duas espécies. A DL50 (e CL50) é a prova mais comum de toxicidade aguda. Os principais objetivos deste estudo são: • avaliar a toxicidade intrínseca do Agente Toxico ou Substância Química. • avaliar a suscetibilidade das espécies • identificar órgãos alvo • promover informações para o delineamento e seleção dos níveis de dose para estudos mais prolongados (toxicidade crônica) 3.2- Testes de toxicidade sub-crônica O tempo de exposição deste estudo é de 1 a 3 meses. São usadas 3 doses experimentais (mínima, intermediária e máxima). Sendo que a dose máxima não deve produzir um índice de letalidade acima de 10% (para que não inviabilize as avaliações histopatógicas e bioquímicas). Os principais objetivos deste estudo são: • determinar a dose de nenhum efeito observado – DNEO (que significa a dose máxima na qual não se observa efeito). • estudar mais efetivamente órgãos alvos e determinar aqueles com mais suscetibilidade. • prover dados sobre dosagens seletivas para estudo de toxicidade crônica. 3.3 -Testes de Toxicidade Crônica Este estudo é semelhante ao sub-crônico, porém o período de exposição é de 2 anos ou quase toda a vida do anima. Como no teste anterior, este também não procura 15 letalidade e utiliza 3 níveis de dose pela via de administração segundo a via de uso prescrita. O protocolo experimental compreende as observações e alterações especificadas no estudo de toxicidade sub-crônica e outros parâmetros bioquímicos que permitem uma melhor avaliação de todos os órgãos e funções, principalmente função renal e hepática. Os principais objetivos deste estudo são: • Verificar as concentrações/doses máximas das substâncias que não produzem efeitos discerníveis de doença, quando administradas durante a maior parte da vida do animal. • verificar os efeitos tóxicos que não são resultados dos estudos de toxicidade sub- crônica • procura-se determinar o mecanismo de ação tóxica das substâncias químicas. 3.4- Testes de Carcinogenicidade: As evidências primárias que podem apontar o potencial carcinogênico das substâncias químicas são de origem epidemiológica ou experimental em roedores. Esses efeitos devem ser observados em pelo menos, duas espécies de animais de laboratório, com uma duração máxima de 130 semanas em ratos, 120 semanas em camundongos e 130 semanas em hamsters. São utilizadas, no mínimo, 2 doses da substância. A maior dose é a dose máxima tolerada (DMT), definida como sendo aquela que não provoca no animal uma perda de peso superior a 10% e não induz mortalidade ou sinais clínicos de toxicidade. A menor dose corresponde à metade da DMT. Cada grupo experimental é constituído de, pelo menos, 50 animais. Todos animais utilizados no experimento são submetidos à necropsia completa. A avaliação final do risco de carcinogenicidade para o homem, além das evidências primárias, é obtida pela execução de testes de curta duração (evidências secundárias). Estes testes podem ser agrupados em 3 categorias gerais: • Testes que detectam lesão do DNA, incluindo o estudo da formação de ligações entre o DNA e os produtos ativos formados na biotransformação do agente tóxico, quebra de fitas, indução de profagos e reparo do DNA • Testes que evidenciam alterações dos produtos gênicos ou das funções celulares • Testes que avaliam alterações cromossômicas. A evidência de carcinogenicidade é considerada limitada nas seguintes situações: • números reduzidos de experimentos • impropriedade de dose e vias de administração • emprego de uma única espécie animal • duração imprópria do experimento; • número reduzido de animais e • dificuldade em diferenciar as neoplasias malígnas e benígnas. A evidência inadequada é indicada nas seguintes situações: • a não exclusão do acaso nos estudos realizados; • a existência de vícios no delineamento experimental; • a existência de outros estudos que demonstrem a ausência de carcinogenicidade. 3.5 - Testes de Mutagenicidade 16 Os efeitos mutagênicos das substâncias químicas podem ser avaliados através de ensaios como microorganismos e em organismos superiores, inclusive o homem. Os ensaios com microorganismos, realizados "in vitro", são indicados na triagem rotineira dos agentes tóxicos. Os ensaios com microorganismos avaliam basicamente o dano provocado ao DNA pela substância química estudada ou seu produto de biotransformação No estudo do potencial mutagênico de um composto, os ensaios com animais de laboratório oferecem grandes vantagens, especialmente a de reproduzir as condições de exposição do homem. Nestes ensaios, as alterações cromossômicas são identificadas na medula óssea do fêmur de ratos e camundongos expostos experimentalmente ao agente tóxico. 3.6 - Testes de Teratogenicidade A avaliação do efeito teratogênico de um composto químico, através de métodos experimentais em animais de laboratório é executada num complexo protocolo envolvendo 3 fases distintas. A primeira fase tem por objetivo avaliar o potencial tóxico do composto químico sobre a fertilidade e o desempenho reprodutivo. Compreende o tratamento dos animais, machos e fêmeas, durante um período de no mínimo 60 dias antes do acasalamento e, depois, para as fêmeas durante a gestação e lactação. Ao meio termo da gravidez procede-se o sacrifício da metade doas animais do grupo experimental para a constatação de anormalidades uterinas. Ao final, são observados o número, sexo, peso corpóreo e anormalidades externas em todos os filhotes. Na segunda fase, as informações são obtidas a partir da administração de doses diárias da substância química na dieta de animais fêmeas grávidas no período da organogênese. Neste estudo é feita uma avaliação minuciosa e detalhada da mão e filhotes. Os estudos da terceira fase avaliam os efeitos as substância sobre o desenvolvimento peri e pós natal. A administração da substância química é feita durante o período que compreende o último terço da gestação até o desmame. Neste estudo é avaliado o desenvolvimento somático, neromotor, sensorial e comportamento da prole. 3.7 - Testes comportamentais Devido uma maior preocupação da população relacionada os efeitos neurocomportamentais e os poluentes ambientais, o desenvolvimento de testes comportamentais em animais de laboratórios têm alcançado maior relevância. Temos o exemplo do chumbo, que foi proibido sua adição na gasolina não pela incidência de encefalopatias e sim pelos estudos no comportamento. Atualmente 25% dos limites de segurança para substâncias químicas derivam de estudos no comportamento. 3.8 - Estudos observados no homem São estudos que se realizam com o devido respeito pelos direitos da dignidade humana e submetidos a códigos de ética específicos estabelecidos por organizações nacionais e internacionais. EX: O instrumento internacional relativo a essa questão é a Declaração de Helsinki e o artigo 7 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos adotados pela Assembléia Geral da ONU em 1966 Estes estudos geralmente estão relacionados à uma simulação de exposição ocupacional à agentes químicos, ou mesmo um estudo clínico desta exposição. 17 - exposição sub-crônica: aquela que ocorre durante alguns meses (geralmente por 3 meses) - exposição crônica: ocorre durante toda a vida. Quanto à freqüência da exposição observa-se que, geralmente, doses ou concentrações fracionadas podem reduzem o efeito tóxico, caso a duração da exposição não seja aumentada. Assim, uma dose única de um agente que produz efeito imediato e severo, poderá produzir menos do que a metade ou nenhum efeito, quando dividida em duas ou mais doses, administradas durante um período de várias horas ou dias. No entanto, é importante ressaltar que a redução do efeito provocado pelo aumento de freqüência (ou seja, do fracionamento da dose) só ocorrerá quando: - a velocidade de eliminação é maior do que a de absorção, de modo que os processos de biotransformação e/ou excreção ocorram no espaço entre duas exposições; - o efeito tóxico pela substância é parcial ou totalmente revertido antes da exposição seguinte. Se nenhuma destas situações ocorrerem, o aumento de freqüência resultará em efeitos tóxicos crônicos. 3.2- Fase Toxicocinética Nesta fase tem-se a ação do organismo sobre o agente tóxico, procurando diminuir ou impedir a ação nociva da substância sobre ele. É de grande importância, porque dela resulta a quantidade de AT disponível para reagir com o receptor biológico e, consequentemente, exercer a ação tóxica. A fase toxicocinética é constituída dos seguintes processos: - absorção - distribuição - eliminação: biotransformação e excreção Pode-se notar que nesta fase o agente tóxico deverá se movimentar pelo organismo e para tal terá que, freqüentemente, transpor membranas biológicas. Assim, é muito importante o conhecimento dos fatores que influem no transporte das substâncias químicas pelas membranas. 3.2.1 - Fatores que influem no transporte por membranas Estes fatores podem ser agrupados em duas classes distintas: Fatores relacionados com a membrana - Estrutura da membrana - Espessura da membrana - Área da membrana Destes 3 fatores, destaca-se a estrutura da membrana. Sabe-se que a membrana biológica é constituída de camada lipídica bimolecular, contendo em ambos os lados, moléculas de proteínas que penetram e às vezes transpõem esta camada. Os ácidos graxos presentes na camada lipídica não possuem uma estrutura cristalina rígida, ao contrário, na temperatura fisiológica eles tem características quase fluídas. Portanto, o caráter fluído das membranas (e portanto sua permeabilidade) é determinado principalmente pela estrutura e proporção relativa de ácidos graxos insaturados presentes na região. Este modelo denominado de “mosaico fluído”, foi proposto por SINGER & NICOLSON em 1972 e é o mais aceito atualmente. 20 Fatores relacionados com a substância química Lipossolubilidade Devido à constituição lipoprotéica das membranas biológicas, as substâncias químicas lipossolúveis, ou seja, apolares, terão capacidade de transpo-la facilmente, pelo processo de difusão passiva. Já as substâncias hidrossolúveis não transporão estas membranas, a não ser que tenham pequeno tamanho molecular e possam ser filtradas, através dos poros aquosos. Coeficiente de partição óleo/água É o parâmetro que permite avaliar o grau de lipossolubilidade das substâncias químicas. Este coeficiente é obtido ao se agitar um agente químico em uma mistura de solvente orgânico e água (em condições de pH e temperatura controladas). As substâncias polares, hidrossolúveis, se concentram na fase aquosa e as apolares, lipossolúveis, na fase orgânica. Quanto maior for a concentração da substância na fase orgânica, maior será a sua lipossolubilidade. Ex.: coeficiente de partição n-octanol/água a 37o C e pH 7,4 de algumas substâncias: clorpromazina = 79,7; AAS = 11,7; paracetamol = 1,79. Grau de ionização ou de dissociação Os agentes tóxicos são, em sua maioria, ácidos fracos ou bases fracas que possuem um ou mais grupos funcionais capazes de se ionizarem. A extensão desta ionização dependerá do pH do meio em que a substância está presente e do seu próprio pKa. É importante relembrar que a forma ionizada é polar, hidrossolúvel e com pouca ou nenhuma capacidade de transpor membranas por difusão passiva. O grau de ionização das substâncias, em diferentes pH, poderá ser obtido através da aplicação da fórmula de Henderson-Hasselbach, para ácidos fracos e bases fracas. [HA] HA H+ + A- F 0A E pKa = pH + log F 0 B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E assim, F 05 BH+ F 0 5 D F 0 5 BA- F 0 5 D F 05 BHA F 0 5 D F 0B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E = 10 pKa-pH F 05 BH+ F 0 5 D F 0 5 BA- F 0 5 D Bases: F 0 5 BRNH2 F 0 5 D F 0 5 BH+ F 0 5 D R - NH3+ RNH2 + H+ F 0A E pKa = pH + log F 0 B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E assim, F 05 BRNH3 +F 0 5 D 21 F 0 5 B RNH2] F 0 5 BH+ F 0 5 D F 0B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E F 0 B E--- = 10 pKa - pH F 05 B RNH3 +F 0 5 D Quando o pH do meio é igual ao pKa de um composto, a metade deste estará na forma ionizada e a outra metade na forma não-ionizada. Importante ressaltar que o pKa sozinho não indica se um composto tem caráter ácido ou básico, já que os ácidos fracos tem pKa elevado, mas as bases fortes também o tem. Da mesma maneira os ácidos fortes tem pKa baixo assim como as bases fracas. 3.2.2 - Absorção É a passagem do AT do meio externo para o meio interno, atravessando membranas biológicas. O meio externo na absorção pode ser o estômago, os alvéolos, o intestino, ou seja, dentro do organismo, mas fora do sangue. Existem três tipos de absorção mais importantes para a Toxicologia. 3.2.2.1 - Absorção pelo trato gastrintestinal (TGI) ou Oral Uma vez no TGI, um agente tóxico poderá sofrer absorção desde a boca até o reto, geralmente pelo processo de difusão passiva. São poucas as substâncias que sofrem a absorção na mucosa bucal, principalmente porque o tempo de contato é pequeno no local. Estudos feitos experimentalmente, no entanto, mostram que cocaína, estricnina, atropina e vários opióides podem sofrer absorção na mucosa bucal. Esta absorção é dependente, principalmente, do coeficiente de partição óleo/água (quanto maior este coeficiente mais fácil a absorção) e resulta em níveis sangüíneos elevados, já que as substâncias não sofrerão a ação dos sucos gastrintestinais. Não sendo absorvido na mucosa bucal, o AT tenderá a sofrer absorção na parte do TGI onde existir a maior quantidade de sua forma não-ionizada (lipossolúvel). Para se conhecer a fração de AT não ionizado, ou aquela apta a sofrer absorção por difusão passiva, é importante a utilização da fórmula de Handerson-Hasselbach. De maneira geral, os ácidos fracos não se ionizam em meio ácido, como o do estômago, sendo assim absorvidos na mucosa gástrica, enquanto as bases fracas por não se ionizarem no pH intestinal, serão absorvidas no local. Exemplo: salicilatos e barbitúricos são absorvidos, principalmente, no estômago e aminopirina, quinina, anilina, serão absorvidos no intestino. Embora a grande maioria dos AT sofram absorção no TGI por difusão passiva, existem alguns que serão absorvidos por processo especial, mais precisamente por transporte ativo. Exemplo: o chumbo é absorvido por transporte ativo e utiliza o sistema que transporta o cálcio; o tálio é transportado pelo sistema carregador responsável pela absorção de Fe, etc. Fatores que influem na absorção pelo TGI Além das propriedades físico-químicas dos AT, outros fatores poderão influir na absorção: administração de EDTA: parece que este quelante altera a permeabilidade da membrana, por seqüestrar o cálcio presente na sua estrutura, facilitando assim, de maneira inespecífica, a absorção de ácidos, bases e substâncias neutras. Existe sempre entretanto, no caso da ingestão de minerais, a possibilidade do EDTA quelar o AT, o que resultaria em uma menor absorção do mesmo 22 Superfície corpórea: a superfície corpórea total no homem é maior do que na mulher (média de 1,70 a 1,77 m2 no homem e de 1,64 a 1,73 m2 na mulher). Este fato pode aumentar a absorção transepidérmica no homem (maior superfície de contato com o xenobiótico). Volume total de água corpórea: Quanto maior o volume aquoso corpóreo, maior a hidratação da pele e consequentemente, a absorção pela pele. Quando comparado à mulher, o homem possui maior volume aquoso total, extra e intracelular o que favoreceria a absorção cutânea. Este fato deve ser considerado, também, quando se compara mulheres grávidas e não grávidas. As gestantes apresentam maior volume aquoso corpóreo e, em conseqüência, maior hidratação do extrato córneo. Isto possibilita maior absorção cutânea de xenobióticos. Abrasão da pele: com a descontinuidade da pele, a penetração torna-se fácil; Fluxo sangüíneo através da peIe: estudos demonstram que, em média, 5% do sangue bombeado pelo coração passa pela pele, em um fluxo em torno de 120 mL/kg/min. Inflamação ou fatores que levam à hiperemia aumentarão a absorção cutânea. Um fato a ser considerado é a gravidez. Durante a gestação ocorre alterações significativas no fluxo sangüíneo das mãos (aumentam 6 vezes) e pés (aumentam 2 vezes). Esse aumento no fluxo sangüíneo poderá influir na absorção cutânea de xenobióticos nas gestantes expostas. Não foi detectada diferença entre o fluxo sangüíneo cutâneo de homens e mulheres não gestantes. Um fator a ser considerado é a vascularização das áreas expostas, uma vez que, quanto mais vascularizada a região, maior o fluxo sangüíneo no local. Queimaduras químicas e/ou térmicas: apenas as leves ou moderadas, já que as severas destroem totalmente o tecido, formando uma crosta de difícil penetração; Pilosidade: nas áreas em que existem pêlos, a absorção cutânea pode ser 3,5 a 13 vezes maior do que nas regiões glabras; Fatores ligados ao agente químico: Volatilidade e viscosidade; Grau de ionização; Tamanho molecular. Fatores ligados à presença de outras substâncias na pele: Vasoconstritores: estes vão reduzir a absorção cutânea, devido à diminuição da circulação sangüínea. Veículos: podem auxiliar na absorção, mas não promovem a penetração de substâncias que, normalmente, não seriam absorvidas pela pele íntegra. Alguns veículos podem, também, absorver o ar de dentro dos folículos e da mesma maneira aumentar a absorção transfolicular. Água: a pele tem normalmente 90 g de água por grama de tecido seco. Isto faz com que a sua permeabilidade seja 10 vezes maior do que aquela do extrato totalmente seco. O contato prolongado com água pode aumentar a hidratação da pele em 3 a 5 vezes, o que resultará em um aumento na permeabilidade cutânea em até 3 vezes. 25 Agentes tenso-ativos: os sabões e detergentes são substâncias bastante nocivas para a pele. Eles provocam alteração na permeabilidade cutânea, mesmo quando presentes em pequenas concentrações. Alteram principalmente a absorção de substâncias hidrossolúveis, devido a modificações que provocam na estrutura do filamento de queratina. Estes agentes tensoativos se ligam à queratina e com isto provocam a sua reversão de F 06 1 para F 0 6 2 hélice. Solventes orgânicos: estes aumentam a absorção cutânea para qualquer tipo de agente químicos, pois removem lípides e lipoproteínas presentes no extrato córneo, tornando-o poroso e menos seletivo. Os solventes mais nocivos são aqueles com características hidro e lipossolúveis. Destaca-se, como um dos mais nocivos, a mistura clorofórmio: metanol (2:1). Fatores ligados às condições de trabalho (quando se tratar de exposição ocupacional): tempo de exposição; temperatura do local de trabalho: pode haver um aumento de 1,4 a 3 vezes na velocidade de penetração cutânea de agentes químicos, para cada 10oC de aumento na temperatura. Como citado anteriormente, o sexo e o estado gestacional podem alterar parâmetros fisiológicos importantes e, consequentemente, a intensidade da absorção cutânea (Tabela 2). Tabela 2: Diferenças fisiológicas entre homens e mulheres que podem afetar a absorção de agentes tóxicos pela pele. Parâmetro Diferença fisiológica Diferença na absorção hidratação cutânea > nas gestantes > absorção área dérmica > na superfície corpórea homem > absorção espessura dérmica > no homem < absorção fluxo de sangue/pele > nas gestantes > absorção 3.2.2.2.3 - Ação dos agentes tóxicos sobre a pele No contato dos agentes químicos com a pele podem ocorrer: Efeito nocivo local sem ocorrer absorção cutânea. Ex.: ácidos e bases fortes. Efeito nocivo local e sistêmico. Ex.: o arsênio, benzeno, etc. Efeito nocivo sistêmico, sem causar danos no local de absorção: é o caso, por exemplo, dos inseticidas carbamatos (exceção feita ao Temik que é um carbamato com potente ação local). 3.2.2.3 - Absorção pelo trato pulmonar 26 A via respiratória é a via de maior importância para Toxicologia Ocupacional. A grande maioria das intoxicações ocupacionais é decorrente da aspiração de substâncias contidas no ar ambiental. A superfície pulmonar total é de aproximadamente 90 m2, a superfície alveolar de 50 a 100 m2 e o total de área capilar é cerca de 140 m2. O fluxo sangüíneo contínuo exerce uma ação de dissolução muito boa e muitos agentes químicos podem ser absorvidos rapidamente a partir dos pulmões. Os agentes passíveis de sofrerem absorção pulmonar são os gases e vapores e os aerodispersóides. Estas substâncias poderão sofrer absorção, tanto nas vias aéreas superiores, quanto nos alvéolos. 3.2.2.3.1 - Gases e Vapores Vias Aéreas Superiores (VAS) Geralmente não é dada muita atenção para a absorção destes compostos nas vias aéreas superiores. Deve-se considerar, no entanto, que muitas vezes a substância pode ser absorvida na mucosa nasal, evitando sua penetração até os alvéolos. A retenção parcial ou total dos agentes no trato respiratório superior, está ligada à hidrossolubilidade da substância. Quanto maior a sua solubilidade em água, maior será a tendência de ser retido no local. Visto sob este ângulo, a umidade constante das mucosas que revestem estas vias, constitui um fator favorável. Há, no entanto, a possibilidade da ocorrência de hidrólise química, originando compostos nocivos, tanto para as vias aéreas superiores quanto para os alvéolos. Ex.: tricloreto de fósforo + H2O F 0 A E HCl + CO2; dióxido de enxofre (SO2) + H2O F 0 A E F 0 A E F 0 A E ácido sulfúrico. Isto é importante porque estes produtos formados, além dos efeitos irritantes, favorecem também a absorção deles ou de outros agentes pela mucosa já lesada. Assim, nem sempre, a retenção de gases e vapores nas vias aéreas superiores é sinônimo de proteção contra eventuais efeitos tóxicos. Alvéolos Nos alvéolos pulmonares duas fases estão em contato: - uma gasosa formada pelo ar alveolar; e - outra líquida representada pelo sangue. As 2 fases são separadas por uma barreira dupla: o epitélio alveolar e o endotélio capilar. Diante de um gás ou de um vapor, o sangue pode se comportar de duas maneiras diferentes: como um veículo inerte, ou como meio reativo. Em outras palavras, o agente tóxico pode dissolver-se simplesmente por um processo físico ou, ao contrário, combinar-se quimicamente com elementos do sangue. No primeiro caso tem- se a dissolução do AT no sangue e no segundo caso a reação química. Dissolução do AT no sangue Deve-se, neste caso, considerar o agente químico como o soluto e o sangue como solvente. Em relação ao soluto, o fator que influi na absorção pulmonar é a sua concentração no ar alveolar (pressão parcial). Na verdade se estabelece uma troca de moléculas entre o ar alveolar e o sangue, no sentido do local onde a pressão parcial é menor. Assim, se a pressão parcial no ar alveolar for maior que no sangue, ocorrerá absorção e se for maior no sangue do que no ar alveolar, haverá excreção. É evidente, portanto, a importância de fatores ambientais, tais como temperatura e pressão, já que estes fatores vão influir na pressão parcial de gases e vapores. Em relação ao solvente, deve-se considerar a constituição do sangue. Este tecido orgânico apresenta tanto uma característica aquosa (3/4 do sangue é água) quanto orgânica (proteínas, lípides, etc.). Sendo assim, mais do que a lipo ou 27 pequenas), os aerodispersóides, devido ao movimento browniano, vão se chocando com as partículas dos gases presentes nos alvéolos (O2 e CO2) e assim difundem-se até às paredes, onde se depositam. Mecanismos de Remoção dos Aerodispersóides do Trato Pulmonar Nem todas partículas que se depositam no aparelho pulmonar serão retidas nele. Se assim fosse, calcula-se que, após 20-30 anos de trabalho, os mineiros deveriam ter cerca de 1 kg de partículas retidas em seus pulmões. No entanto, os estudos detectaram apenas cerca de 20g o que demonstra um eficiente sistema de remoção ou de “clearence” pulmonar. Os mecanismos de remoção vão depender do local de deposição. Assim: Região nasofaríngea: as partículas são removidas pelo muco, associado ao movimento dos cílios, que vibram em direção à faringe. É o chamado movimento mucociliar. Região traqueobronquial: o processo de remoção é o mesmo anterior (movimento mucociliar), sendo que a tosse, ocasionada pela presença de corpo estranho na região, pode auxiliar nesta remoção. Algumas substâncias tais como o SO2, amônea e também a fumaça de cigarro diminuem a velocidade de remoção nesta região. Região alveolar: os epitélios dos bronquíolos e dos alvéolos são desprovidos de cílios. O muco está presente devido à secreção das células epiteliais. Esse muco se move em direção ao epitélio ciliado, através de um processo de migração, ainda bastante discutido. Sabe-se que este mecanismo é capaz de remover as partículas em direção às vias aéreas superiores e que ele é estimulado pela presença das próprias partículas nos alvéolos. Outro mecanismo de remoção é a fagocitose, realizada pelos macrófagos presentes em grande número na região. Os fagócitos contendo as partículas podem migrar em duas direções: - até aos brônquios onde são eliminados pelo movimento mucociliar (que é o mais comum); - até ao sistema linfático, através da penetração pelas paredes dos alvéolos. A fagocitose pode remover até 80% das partículas presentes nos alvéolos. A velocidade do clearence no trato pulmonar pode variar também de acordo com a região: Na região nasofaríngea a velocidade é muito rápida. A remoção ocorre em minutos. Na região traquebronquial a velocidade é rápida e a remoção ocorre em minutos ou horas. Em regiões mais profundas dos brônquios esta velocidade de remoção é moderada (cerca de horas). Na região alveolar a velocidade de clearence é lenta, podendo levar de dias até anos para ocorrer. Ela vai depender do tipo de partícula e do mecanismo de remoção. As partículas presentes nos alvéolos, que não foram removidas ou absorvidas, podem ficar retidas na região, causando as chamadas Pneumoconioses. 1.3.2.3 - Distribuição Após a entrada do AT na corrente sangüínea, seja através da absorção ou por administração direta, ele estará disponível para ser distribuído pelo organismo. Normalmente a distribuição ocorre rapidamente e a velocidade e extensão desta dependerá principalmente do: Fluxo sangüíneo através dos tecidos de um dado órgão; Facilidade com que o tóxico atravessa a membrana celular e penetra nas células de um tecido. Assim, aqueles fatores que influem no transporte por membranas, discutidos anteriormente, serão importantes também na distribuição. Alguns agentes tóxicos não 30 atravessam facilmente as membranas celulares e por isto tem uma distribuição restrita enquanto outros, por atravessá-las rapidamente, se distribuem através de todo organismo. Durante a distribuição o agente alcançará o seu sítio alvo, que é o órgão ou tecido onde exercerá sua ação tóxica, mas poderá, também, se ligar a outros constituintes do organismo, concentrando-se em algumas partes do corpo. Em alguns casos, estes locais de maior concentração são também os sítios de ação e disto resulta efeitos altamente prejudiciais. É o caso do monóxido de carbono (CO), para o qual o sangue representa, tanto o local de concentração quanto o de ação tóxica. Felizmente para o homem, no entanto, a grande maioria dos AT atingem seus maiores níveis em locais diferentes do sítio alvo (exemplo: Pb é armazenado nos ossos e atua nos tecidos moles). Este acúmulo do AT em outros locais que não o de ação, funciona como uma proteção ao organismo, uma vez que previne uma elevada concentração no sítio alvo. Os agentes tóxicos nos locais de concentração estão em equilíbrio com sua forma livre no sangue e quando a concentração sangüínea decai, o tóxico que está concentrado em outro tecido é liberado para a circulação e daí pode atingir o sítio de ação. A importância do sangue no estudo da distribuição é grande, não só porque é o principal fluído de distribuição dos AT, mas também por ser o único tecido que pode ser colhido repetidamente sem distúrbios fisiológicos, ou traumas orgânicos. Além disto, como o sangue circula por todos os tecidos, algum equilíbrio pode ser esperado entre a concentração do fármaco no sangue e nos tecidos, inclusive no sítio de ação. Assim, a concentração plasmática fornece melhor avaliação da ação tóxica do que a dose (a não ser quando a concentração plasmática é muito baixa em relação à concentração nos tecidos). A distribuição do AT, através do organismo ocorrerá de maneira não uniforme, devido a uma série de fatores que podem ser reunidos em dois grupos: Afinidade por diferentes tecidos Ligação às proteínas plasmáticas e elementos figurados do sangue; Ligação celular, especialmente no fígado e rins; Armazenamento. Presença de membranas Barreira hemato-encefálica “Barreira” placentária O papel da ligação às proteínas plasmáticas e do armazenamento na distribuição desigual dos xenobióticos são, dentre os supracitados, os mais estudados, atualmente 3.2.3.1 - Ligação às proteínas plasmáticas (PP) Várias proteínas do plasma podem se ligar à constituintes do corpo (ex.: ácidos graxos, triptofano, hormônios, bilirrubinas, etc.) e também aos xenobióticos. A principal proteína, sob o ponto de vista da ligação a xenobióticos, é a albumina. Algumas globulinas tem também papel relevante na ligação aos agentes estranhos, especialmente àqueles de caráter básico. Destaca-se aqui a F 06 11 glicoproteína ácida. Com exceção das substâncias lipossolúveis de caráter neutro, que geralmente se solubilizam na parte lipídica das lipoproteínas, a ligação de fármacos às proteínas plasmáticas é feita, usualmente, pela interação de grupos polares ou não polares dos AT com o(s) grupamento(s) protéico(s). Ex.: os fármacos de caráter ácido, se ligam em um único sítio de albumina, possivelmente ao nitrogênio do aminoácido terminal, que é no homem, o ácido aspártico. 31 O elevado peso molecular das proteínas plasmáticas impede que o complexo AT- PP atravesse pelas membranas dos capilares restringindo-o ao espaço intravascular. Assim, enquanto ligado às proteínas plasmáticas, o AT não estará disponível para a distribuição no espaço extravascular. Deve-se observar, no entanto, que esta ligação é reversível (geralmente feita por pontes de hidrogênio, forças de van der Waals, ligação iônica), e a medida que o agente livre se difunde através da membrana capilar, a fração ligada se dissocia das proteínas tornando-se apta para ser distribuída. Esta ligação atua, portanto, graduando a distribuição dos xenobióticos e, consequentemente, a chegada ao sítio de ação. Efeitos tóxicos severos pode aparecer, quando há um deslocamento anormal dos xenobióticos de seus sítios de ligação protéica. Alguns dos fatores que influem nesta ligação são: Competição entre fármacos: as proteínas plasmáticas não possuem sítios específicos de ligação e duas ou mais substâncias que se ligam ao mesmo sítio protéico, irão competir entre si por esta ligação. Esta competição pode ocorrer entre dois ou mais xenobióticos ou entre xenobióticos e substratos endógenos. Como conseqüência ocorrerá um aumento na concentração livre de um dos fármacos e, portanto, o risco de intoxicação. Ex.: sulfonamidas e bilirrubina competem pelo mesmo sítio da albumina; o warfarin (anticoagulante) é geralmente deslocado pelo AAS. Condições patológicas: algumas doenças alteram a conformação do sítio de ligação na proteína, outras alteram o pH do plasma e podem provocar a ionização do complexo agente-proteína e outras, ainda, modificam a quantidade de proteínas plasmáticas. Ex.: a síndrome nefrótica, que permite a eliminação da albumina através da urina, causando hipoalbuminemia. Concentração do agente: quanto maior a concentração do fármaco no plasma, maior a ligação protéica. Ex.: fenitoína. Se a concentração deste anticonvulsivante for muito elevada no plasma a ligação protéica aumenta mais do que o esperado e a fração livre disponível para a distribuição e ação é pequena. Neste caso o efeito terapêutico pode nem ser alcançado. Concentração protéica: o aumento das proteínas plasmáticas resulta em maior ligação plasmática dos xenobióticos. Ex.: aumento de lipoproteína implica em maior ligação da imipramina. pH: para alguns fármacos o pH do plasma altera a ligação às proteínas. Ex.: a teofilina terá uma maior ligação às proteínas plasmáticas quando o pH do sangue está aumentado. Idade: a concentração de algumas proteínas plasmáticas é alterada com a idade. Ex.: as crianças tem uma quantidade de albumina menor do que o adulto. Consequentemente, os fármacos que se ligam essencialmente à albumina estarão mais livres e podem ser mais rapidamente distribuídos, causando efeitos tóxicos mais severos, mesmo com doses não muito grandes. Espécie e variedade 3.2.3.2 - Ligação Celular Embora não tão estudado como a ligação às proteínas plasmáticas, a ligação a outros tecidos exerce um papel muito importante na distribuição desigual dos agentes pelo organismo. Sabe-se a quantidade total de albumina plasmática no homem de 70kg é cerca de 120g e a albumina intersticial total é em torno de 156g, logo a quantidade de albumina total no corpo é aproximadamente 276g, ou seja, cerca de 0,4% do peso corpóreo. A água corpórea total corresponde a 60% do peso corpóreo, logo pode-se deduzir que os restantes 40% do peso corpóreo é de tecido não hidratado. 32 Durante anos, o termo “barreira” placentária demonstrou o conceito que a principal função da placenta era proteger o feto contra a passagem de substâncias nocivas provenientes do organismo materno. Sabe-se hoje que ela possui funções mais importantes, tais como a troca de nutrientes (O2, CO2,etc.). Este material vital necessário para o desenvolvimento do feto é transportado por processo ativo, com gasto de energia. Já a maioria dos xenobióticos que se difundem através da placenta o fazem por difusão passiva. Atualmente sabe-se que a placenta não representa uma barreira protetora efetiva contra a entrada de substâncias estranhas na circulação fetal. Anatomicamente a placenta é o resultado de várias camadas celulares interpostas entre a circulação fetal e materna. O número de camadas varia com a espécie e com o período de gestação e isto provavelmente afeta a sua permeabilidade. Na espécie humana ela possui ao todo seis camadas, três de origem materna e três de origem fetal. Poderia se pensar que as espécies que apresentam placenta com maior número de camadas são mais protegidas contra agentes tóxicos durante a gestação. Entretanto, a relação entre o número de camadas e a permeabilidade placentária não está suficientemente estudada. Embora não totalmente efetiva na proteção do feto contra a entrada de AT, existem alguns mecanismos de biotransformação de fármacos, que podem prevenir a passagem placentária de alguns xenobióticos. 3.3.2.4 - Eliminação Aceita-se, atualmente, que a eliminação é composta de dois processos distintos: a biotransformação e a excreção. 3.3.2.4.1 - Biotransformação O organismo vivo apresenta mecanismos de defesa, que buscam terminar ou minimizar a ação farmacológica ou tóxica de um fármaco sobre ele, destacando-se o armazenamento, a biotransformação e a excreção. A intensidade e duração de uma ação tóxica é determinada, principalmente, pela velocidade de biotransformação do agente no organismo. Segundo alguns autores, se não existisse a biotransformação, o organismo humano levaria cerca de 100 anos para eliminar uma simples dose terapêutica de pentobarbital, que é um fármaco muito lipossolúvel. Pode-se conceituar Biotransformação como sendo o conjunto de alterações maiores ou menores que um agente químico sofre no organismo, visando aumentar sua polaridade e facilitar sua excreção. 3.3.2.4.1.1 - Mecanismos da Biotransformação A biotransformação pode ocorrer através de dois mecanismos: o chamado Mecanismo de Ativação da Biotransformação, que produz metabólitos com atividade igual ou maior do que o precursor. Ex.: a piridina é biotransformada ao íon N- metil piridínico que tem toxicidade cinco vezes maior que o precursor. O mesmo ocorre com o inseticida parathion que é biotransformado a paraoxon, composto responsável pela ação tóxica do praguicida e o Mecanismo de Desativação, quando o produto resultante é menos ativo (tóxico) que o precursor. É o mais comum de ocorrer para os xenobióticos. É comum encontrar-se na literatura científica, os termos Metabolização e Detoxificação, como sinônimos de biotransformação. Hoje, no entanto, se guarda o termo metabolização para os elementos essenciais endógenos do organismo e sabe-se que detoxificação não é sinônimo de Biotransformação. Isto porque detoxificação 35 significa diminuição de toxicidade e nem todas as reações de biotransformação, como citado acima, produzirão metabólitos menos tóxicos ou ativos que o seu precursor. É importante ressaltar que, na maioria das vezes: Nenhum fármaco deixará de ser, no mínimo, parcialmente biotransformado; Nenhum fármaco sofrerá apenas um tipo de biotransformação; Duas espécies animais não biotransformarão um fármaco de maneira idêntica; Nenhuma biotransformação permanecerá inalterada com doses repetidas do fármaco. A biotransformação pode ocorrer em qualquer órgão ou tecido orgânico como por exemplo no intestino, rins, pulmões, pele, etc. No entanto, a grande maioria das substâncias, sejam elas endógenas ou exógenas serão biotransformadas no FÍGADO. O fígado é o maior órgão humano, tendo diversas e vitais funções, destacando- se entre elas, as transformações de xenobióticos e nutrientes. A biotransformação é executada geralmente por enzimas, principalmente aquelas existentes nos chamados microssomas hepáticos, que são vesículas presentes no sistema retículo endotelial liso (REL). Algumas reações de biotransformação não são microssômicas, embora sejam enzimáticas e um número ainda menor pode ocorrer sem o envolvimento de enzimas. 3.2.4.1.2 - Fases da Biotransformação As reações envolvidas na biotransformação dos xenobióticos podem ser agrupadas em duas fases distintas: - Fase Pré-Sintética ou Fase I, onde ocorrem reações de oxidação, redução e hidrólise. - Fase Sintética, de Conjugação ou Fase II, onde ocorrem reações de conjugação. Fase Pré-Sintética Oxidação A essência bioquímica de vida animal é a oxidação e qualquer xenobiótico que possa ser modificado por via idêntica ou análoga será facilmente biotransformado no organismo, embora nem sempre o produto resultante seja menos tóxico. As oxidações são, geralmente, catalisadas por uma classe de enzima denominada oxidase de função mista, que são enzimas complexas, inespecíficas (oxidam diferentes tipos de compostos) e que necessitam de NADPH e O2 para agirem. Durante a oxidação elas exigem uma molécula de oxigênio para cada molécula de fármaco a ser oxidado (um átomo de oxigênio é incorporado ao fármaco ocorrendo a oxidação e outro é, geralmente, combinado com H2, formando água). A enzima ou sistema enzimático principal na oxidação de xenobióticos é o chamado Citocromo P450. Esta enzima é um citocromo (complexo de proteína e heme) chamado de P450 porque em sua forma reduzida é ligado ao monóxido de carbono, terá um pico (P) de absorbância no comprimento de onda de 450nm. O cit P450 parece estar localizado nas camadas profundas na membrana do retículo endotelial liso (REL), mais especificamente, nos microssomas hepáticos. Esta enzima é a oxidase terminal do sistema de oxidases mistas. Ela recebe os elétrons provenientes de outras fases da reação, se reduz e se liga ao O2 e ao fármaco, promovendo de fato a oxidação do composto. Isto é demonstrado na Figura 4 apresentada a seguir: 36 NADPH CitP450 redutase e- NADPH P450++ e- e- NADPH Cit b5 Cit b5 redutase e- NADPH .oxigênio super reativo Figura 4: Oxidação dos xenobióticos através do sistema microssômico Citocromo P450 Outras enzimas estão presentes nos microssomas hepáticos e, embora menos conhecidas e importantes que o Cit P450 podem, também, biotransformar xenobióticos. É o caso por exemplo do citocromo b5, que está localizado fora das membranas do REL. O sistema enzimático Cit P450 é influenciado por uma série de substâncias, que podem induzir ou inibir a sua atividade, alterando a biotransformação de determinados compostos. Ex.: a) fenilbutazona (antiinflamatório e antireumático) e o cloranfenicol podem inibir a biotransformação enzimática da tolbutamida, medicamento antidiabético. Com isto, uma dose terapêutica deste medicamento poderá causar crises de hipoglicemia sérias, devido à diminuição excessiva do açúcar no sangue; b) Fenobarbital e álcool são exemplos de indutores enzimáticos, que aumentam a biotransformação de outros fármacos como a metadona, fenilbutazona, etc. Parece que nestes casos tanto o fenobarbital como o álcool, aumentam a concentração do Cit P450 e, consequentemente, aumenta a biotransformação dos fármacos. Outros fatores que influem na biotransformação serão discutidos posteriormente. 37 Além da indução e inibição enzimática estudada anteriormente, outros fatores podem alterar a biotransformação dos xenobióticos. São eles: Dose e Freqüência: A dose geralmente altera a via de biotransformação. Certas enzimas possuem elevada afinidade, mas baixa capacidade para biotransformar substâncias exógenas. Por isto, serão rapidamente saturadas, quando doses elevadas do tóxico são administradas e outras vias secundárias passam a ter um papel mais importante. Exemplo: o acetaminofem em doses baixas (15 mg/Kg) é 90% biotransformado através da conjugação com sulfato. Em doses elevadas (300 mg/kg) apenas 43% será excretado como tal, passando a ser significativa, as excreções como glicuronídeo e ácido mercaptúrico (conjugação com glutation). Em relação à freqüência, ela pode levar a uma sensibilização ou indução de receptores enzimáticos, aumentando a biotransformação. Dieta e estado nutricional: O estado nutricional é bastante importante para a biotransformação; podendo alterar a atividade do Cit P450 (oxidase ou redutase). As deficiências em vitaminas, especialmente a C, E e do complexo B, reduzem a velocidade de biotransformação. Elas estão direta ou indiretamente envolvidas na regulação do Cit P450. Além disto, suas deficiências podem alterar a energia e o estado redox das células, diminuindo a produção de cofatores, necessários para a fase de conjugação. Uma dieta rica em lípides diminui, geralmente, a biotransformação, uma vez que estes podem aumentar a suscetibilidade à peroxidação lipídica. Esta maior suscetibilidade pode se estender aos lípides das membranas biológicas, e com isto destruir os sistemas enzimáticos intracelulares levando a um aumento da toxicidade dos fármacos. Este papel é desenvolvido, também, pelas dietas pobres em proteínas, visto que a menor concentração protéica diminuirá a síntese enzimática e, consequentemente, a biotransformação. Algumas substâncias naturalmente presentes nos alimentos podem aumentar a biotransformação dos xenobióticos. É o caso dos compostos indólicos e dos hidrocarbonetos policíclicos aromáticos; estes últimos presentes em carnes assadas, que induzem à Fase I da biotransformação. Sexo, Idade, Peso: Já foi demonstrado que, para algumas substâncias, existem diferenças entre as respostas tóxicas de animais macho e fêmea. Estudos feitos em ratos demonstraram que as fêmeas são mais suscetíveis a uma dose de hexobarbital do que os machos (elas dormem por um tempo maior). Este fato é explicado pela menor capacidade do fígado das fêmeas em biotransformar xenobióticos tornando-as mais suscetíveis à ação da maioria dos agentes tóxicos. A menor atividade hepática destes animais fêmeas no entanto, irá diminuir a ação de fármacos que são biotransformados pelo mecanismo de ativação (ex.: o tetracloreto de carbono e halotano). Acredita-se que estas diferenças entre sexo sejam causadas pelos hormônios sexuais, posto que, ao se administrar testosterona às fêmeas, houve aumento na capacidade de biotransformação e com a castração de machos ocorreu diminuição desta capacidade. A influência do sexo sobre a biotransformação ocorre também em processos que ocorrem em outros órgãos como por exemplo nos rins. Ex.: animais machos são mais suscetíveis à ação tóxica do clorofórmio, provavelmente, por biotransformar mais rapidamente este solvente, originando o fosgênio, metabólito intermediário ativo. Embora as diferenças entre sexo sejam mais pronunciadas em ratos, outras espécies entre elas o homem, também apresentam estas modificações (ex.: nicotina, ácido acetilsalicílico, heparina, etc.). Idade: tanto os animais jovens, quanto os velhos, apresentam menor capacidade de biotransformar xenobióticos e, consequentemente, são mais suscetíveis aos seus efeitos tóxicos. Geralmente, o Cit P450 dos recém-nascidos tem apenas 20% a 50% da 40 atividade observada em adultos. Em relação aos idosos, não só a atividade diminuída do Cit P450, mas também outros fatores, tais como menor fluxo sangüíneo, menor eficiência no sistema da excreção renal e biliar, contribuem para a menor biotransformação dos xenobióticos. 3.2.4.1.4 - Importância da Biotransformação para as Análises Toxicológicas Esta reside no fato de que a forma mais comum de se encontrar o agente tóxico em material biológico é como produto biotransformado. Assim, conhecendo a biotransformação do AT, sabe-se o que procurar na amostra enviada ao laboratório. Além disto, conhecendo-se a biotransformação e os metabólitos formados, fica mais fácil saber que tipo de amostra é a mais indicada para ser requisitada. Exemplo: a metanfetamina, um anorexígeno do grupo anfetamínicos usado como “bolinha” é biotransformada no organismo, produzindo anfetamina, que é excretada pelos rins. Assim, quando da ingestão ou intoxicação com a metanfetamina, o produto principal a ser pesquisado na urina deverá ser a anfetamina. Os solventes clorados do tipo CHCl3 e CCl4 são muito pouco biotransformados no organismo e quando isto ocorre o produto formado é geralmente o CO2, que será, assim como os precursores, eliminados pelo ar expirado. Logo não adianta solicitar ou receber amostras de urina para serem analisadas. Já um outro solvente clorado, o tricloretileno, é muito biotransformado no organismo produzindo principalmente ácido tricloacético (TCA) e tricloetanol (TCE), eliminados na urina. Para este xenobiótico a urina é amostra biológica adequada. III.2.4.2 - Excreção Este processo é, muitas vezes, denominado Eliminação, embora pelo conceito atual a eliminação é também o processo de biotransformação. A excreção pode ser vista como um processo inverso ao da absorção, uma vez que os fatores que influem na entrada do xenobiótico no organismo, podem dificultar a sua saída. Basicamente existem três classes de excreção: eliminação através das secreções, tais como a biliar, sudorípara, lacrimal, gástrica, salivar, láctea. eliminação através das excreções, tais como urina, fezes e catarro. eliminação pelo ar expirado. O processo mais importante para a Toxicologia e a excreção urinária. III.2.4.2.1 - Excreção Urinária Sabe-se que a capacidade de um órgão em realizar uma determinada função está intimamente relacionada com sua anatomia e que os rins possuem um elevado desenvolvimento anatômico, voltado para a excreção de substâncias químicas. Os glomérulos renais filtram cerca de 20% do fluxo cardíaco (os rins recebem 25% deste fluxo) e apresentam poros bastantes largos (cerca de 40 Aº enquanto o de outros tecidos medem cerca de 4 Aº). Assim, os glomérulos filtram substâncias lipossolúveis ou hidrossolúveis, ácidas ou básicas, desde que tenham PM menor do que 60.000. A filtração glomerular é um dos principais processos de eliminação renal e está intimamente ligado a um outro processo que é a reabsorção tubular. As substâncias, após serem filtradas pelos glomérulos, podem permanecer no lúmem do túbulo e ser eliminada, ou então podem sofrer reabsorção passiva através da membrana tubular. Isto vai depender de alguns fatores, tais como o coeficiente de partição óleo/água; o pKa da substância e pH do meio. De modo geral, as substâncias de caráter alcalino são 41 eliminadas na urina ácida e as substâncias ácidas na urina alcalina. Isto porque nestas condições as substâncias se ionizarão, tornando-se hidrossolúveis e a urina é, em sua maior parte, formada de água. Outro processo de excreção renal é a difusão tubular passiva. Substâncias lipossolúveis, ácidas ou básicas, que estejam presentes nos capilares que circundam os túbulos renais, podem atravessar a membrana por difusão passiva e caírem no lúmem tubular. Dependendo do seu pKa e do pH do meio, elas podem, ou não, se ionizarem e, consequentemente, serem excretadas ou reabsorvidas. O terceiro processo de excreção renal é a secreção tubular ativa. Existem dois processos de secreção tubular renal, um para substâncias ácidas e outro para as básicas estando estes sistemas localizados, provavelmente, no túbulo proximal. A secreção tubular tem as características do transporte ativo, ou seja, exige um carregador químico, gasta energia, é um mecanismo competitivo e pode ocorrer contra um gradiente de concentração. Algumas substâncias endógenas, tais como o ácido úrico, são excretadas por este mecanismo e a presença de xenobióticos excretados ativamente, pode interferir com a eliminação de substratos endógenos. A Penicilina é um exemplo de xenobiótico secretado ativamente pelos túbulos. O uso de Probenecid (fármaco excretado pelo mesmo sistema) evita que este antibiótico seja secretado muito rapidamente do organismo. Geralmente, o que ocorre no organismo é uma combinação dos três processos de excreção renal, para permitir uma maior eficácia na eliminação dos xenobióticos. III.2.4.2.2 - Excreção Fecal e Catarral Não são processos muito importantes para a Toxicologia. Os AT encontrados nas fezes correspondem à fração ingerida e não absorvida ou então ao AT que sofreu secreção salivar, biliar ou gástrica. As partículas que penetram pelo trato pulmonar podem ser eliminadas pela expectoração no TGI e, se não forem reabsorvidas, serão, também, excretadas pelas fezes. III.2.4.2.3 - Secreção Biliar Dentre as secreções orgânicas, a mais significativa para a excreção de xenobióticos é a biliar. O fígado tem uma posição vantajosa na remoção de substâncias exógenas do sangue, principalmente daquelas absorvidas pelo trato gastrintestinal. Isto porque, o sangue proveniente do TGI, através da circulação porta, passa inicialmente pelo fígado, e somente depois entra na circulação sistêmica. No fígado parte do xenobiótico pode ser biotransformado e os metabólitos ou mesmo o produto inalterado podem ser secretados pela bile no intestino. Existem, sabidamente, três sistemas de transporte ativo para a secreção de substâncias orgânicas na bile, a saber, para substâncias ácidas, básicas e neutras. É quase certa a existência de um outro sistema para os metais. Uma vez secretado no intestino, os xenobióticos podem sofrer reabsorção ou excreção pelas fezes. Não se conhece o mecanismo que determina se a excreção será urinária ou biliar. Esquematicamente temos: estômago F 0A E fígado F 0 A E circulação sistêmica F 0 A D F 0 A F intestino F 0D F bile 42 Assim, há formação de um substrato anormal, tóxico, que impede o desenvolvimento do ciclo do ácido cítrico, indispensável para o suprimento de energia de quase todos os organismos vivos. III.3.1.4 - Seqüestro de metais essenciais Vários metais atuam como cofatores em vários sistemas enzimáticos, como por exemplo os citocromos, envolvidos nos processos de oxi-redução. Destacam-se o Fe, Cu, Zn, Mn e Co. Alguns agentes tóxicos podem atuar como quelantes, ou seja, se ligam ou seqüestram os metais, impedindo que eles atuem como cofatores enzimáticos. Desta maneira, o processo biológico, no qual estas enzimas atuam, ficará prejudicado ou mesmo interrompido. É o caso dos ditiocarbomatos. Eles se complexam com metais, formando complexos lipossolúveis e impedindo a ação enzimática. Este é o mecanismo de ação do Antabuse, medicamento usado, por muitos, no tratamento do alcoolismo. III.3.2 - Interferência com o transporte de oxigênio A hemoglobina (Hb), pigmento responsável pelo transporte de O2 dos alvéolos para os tecidos e da retirada de CO2 dos tecidos para os pulmões, é constituída de uma parte protéica (globina) e outra não protéica (heme). No heme tem-se basicamente, uma molécula de Fe2+ ligada a quatro moléculas de protoporfirina. Este complexo ferroprotoporfirínico é o responsável pela coloração vermelha da Hb. Quimicamente o ferro possui 6 valências de coordenações, portanto no heme restam ainda 2 coordenações livres. Uma delas é ligada à globina formando a hemoglobina e a outra (a 6a) é ligada ao O2, dando origem a oxemoglobina (HbO2), que é o pigmento normal do sangue. Existem alguns agentes tóxicos que alteram a hemoglobina e, consequentemente, impedem o transporte de oxigênio. São três os pigmentos anormais do sangue, ou seja, formas de Hb que são incapazes de transportar O2. -Carboxemoglobina (HbCO) que pode ser causada pelo CO, diclorometano, etc) - Metemoglobina (MeHb) resultante, por exemplo da exposição a anilina, acetaminofeno, nitritos,etc; - Sulfemoglobina (SHb), a droga oxidante metaclorpramida é exemplo de um agente sulfemoglobinizante. No caso de carboxemoglobina, o monóxido de carbono, que tem 210 vezes mais afinidade pela Hb do que o O2, liga-se à sexta coordenação do Fe2+, deslocando o O2. Esquematicamente, tem-se: HbO2 + CO HbCO + O2 A HbCO é incapaz de exercer a função respiratória e efeitos decorrentes desta hipoxia vão aparecer no indivíduo exposto. Existem vários xenobióticos tais como os nitritos, anilina e acetaminofem, que uma vez no sangue, oxidam os íons Fe2+ da hemoglobina, formando a chamada metemoglobina. O Fe3+ da MeHb perde a capacidade de se ligar na 6a coordenação com o O2 e, assim, este pigmento não cumprirá, também, a função respiratória. Dentro deste grupo de agentes tóxicos, que agem interferindo com o transporte de O2, estão, ainda, os agentes que provocam a lise das hemácias. Com a hemólise, a hemoglobina é extravasada para o meio extracelular, onde é desnaturada. Haverá assim menor quantidade de Hb e logicamente menor transporte de O2 para os tecidos. 45 III.3.3 - Interferência com o sistema genético III.3.3.1 - Ação citostática Alguns agentes tóxicos impedem a divisão celular e, consequentemente, o crescimento do tecido. Esta ação pode ser desenvolvida através de distintos mecanismos, tais como a inibição enzimática (já estudada) ou o encaixe entre as duplas hélices do DNA. Neste último caso estão as substâncias denominadas de Alquilantes, que ao se intercalarem entre as base de cada hélice, inibem o crescimento celular. São usadas no tratamento do câncer, mas não tem ação seletiva. III.3.3.2 - Ação mutagênica e carcinogênica Certas substâncias químicas têm a capacidade de alterarem o código genético, ou seja, de produzirem um erro no código genético. Se esta alteração ocorrer nos genes de células germinativas, ou seja, que serão enviadas à próxima geração (células hereditárias), pode ocorrer um efeito mutagênico. Este efeito possui um período de latência relativamente grande, se manifestando apenas algumas gerações após a ação. Isto porque, geralmente, a mutação ocorre em genes recessivos e só será manifestada se houver o cruzamento com outro gen recessivo que tenha a mesma mutação. Logicamente, os estudos que comprovam esse efeito (e não a ação, que é relativamente frequente) são bastante difíceis de serem realizados e avaliados, o que faz com que, atualmente, poucas substâncias provoquem, comprovadamente, o efeito mutagênico. O mais comum existir substâncias com ação mutagênica mas incapazes de provocarem o aparecimento de mutações. A ação carcinogênica vem sendo mais intensamente estudada nos últimos anos. Nesta ação os xenobióticos provocam alterações cromossômicas que fazem com que as células se reproduzam de maneira acelerada. Esta reprodução incontrolável não produzem células harmônicas e perfeitas. Embora o mecanismo exato de desenvolvimento do câncer não seja totalmente conhecido, aceita-se que esta ação ocorra em duas fases distintas: a conversão neoclássica ou fase de iniciação e o desenvolvimento neoclássico ou promoção. Na fase de iniciação, um xenobiótico ou produto de biotransformação promove a alteração a nível do DNA. Esta lesão origina a chamada célula neoplástica, que através da interferência de outras substâncias químicas e/ou fatores, muitas vezes desconhecidos, sofre processo de crescimento, originando o neoplasma e o câncer instalado. Entre as duas fases do processo carcinogênico existe, geralmente, um período de latência que pode variar de meses a anos. A teratogênese resulta de uma ação tóxica de xenobióticos sobre o sistema genético de células somáticas do embrião/feto, levando ao desenvolvimento defeituoso ou incompleto da anatomia fetal. (NOTA: neoplasma: massa ou colônia anormal de células. A neoplasia pode ser benigna (tumor não invasivo) ou maligna). III.3.4 - Interferência com as funções gerais das células III.3.4.1 - Ação anestésica Um dentre os vários mecanismos que podem resultar em efeito anestésico, é a interferência com o transporte de oxigênio e nutrientes para as células biológicas. O xenobiótico se acumula na membrana de certas células, impedindo que 46 haja a passagem destes nutrientes. As células mais sensíveis à essa deficiência são as do SNC, por necessitarem de maior quantidade destes compostos essenciais. III.3.4.2- Interferência com a neurotransmissão Na realidade, muitos dos mecanismos agrupados aqui podem decorrer de inibição enzimática, ou seja poderiam ser classificados no primeiro grupo de ação tóxica citadas no item 3.3.1. Vários agentes tóxicos atuam alterando a transmissão neurológica através da interferência com os neurotransmissores envolvidos. esta interferência pode ocorrer a nível pré-sináptico, sináptico e/ou pós-sináptico. Exemplos: bloqueio dos receptores de diferentes sinapses (curare); inibição do metabolismo dos neurotransmissores (praguicidas organofosforados); bloqueio na síntese ou metabolismo de neurotransmissores (mercúrio); inibição da liberação da liberação pré-sináptica dos neurotransmissores (toxina botulínica - Clostridium botulinum); estimulação da liberação de neurotransmissores (anfetamina) bloqueio da recaptura dos neurotransmissores para as células pré-sinápticas (imipramina, anfetamina). III.3.5 - Irritação direta dos tecidos Os xenobióticos que tem ação irritante direta sobre os tecidos, reagem quimicamente, no local de contato, com componentes destes tecidos. Dependendo da intensidade da ação pode ocorrer irritação, efeitos cáusticos ou necrosantes. Os sistemas mais afetados são pele e mucosas do nariz, boca, olhos, garganta e trato pulmonar. Destaca-se neste grupo, a ação dos gases irritantes (fosgênio, gás mustarda, NO2, Cl) e lacrimogênicos (acroleína, Br, Cl). Outra ação irritante de tecidos é a dermatite química. Os xenobióticos que apresentam esta ação tóxica (substâncias vesicantes como as mustardas nitrogenadas ou agentes queratolíticos como o fenol), lesam a pele e facilitam a penetração subsequente de outras substâncias químicas. III.3.6 - Reações de hipersuscetibilidade Corresponde ao aumento na suscetibilidade do organismo. Aparece após exposição única ou após meses/anos de exposição; os efeitos desta ação diferem essencialmente daqueles provocados pelo xenobiótico originalmente. Os principais tipos de reações de hipersuscetilidade são: III.3.6.1 - Alergia química (sulfonamidas) Este tipo de ação tóxica, só é desenvolvida após absorção do xenobiótico pelo organismo e ligação com a proteína formando o antígeno (o agente tóxico funciona como hapteno). Com a formação do antígeno, ocorre, consequentemente, o desenvolvimento de anticorpos e do complexo antígeno/anticorpo. Este complexo se liga às células teciduais ou basófilos circulantes, sensibilizando-as, ou seja desenvolvendo grânulos internos, contendo histamina, bradicinina, etc. Quando ocorre uma segunda exposição do organismo ao mesmo xenobiótico, os anticorpos previamente desenvolvidos promovem a alteração da superfície celular com conseqüente desgranulização celular. Estes grânulos secretam na corrente sangüínea histamina e bradicinina, que são os responsáveis pela sintomatologia alérgica. Esta 47
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