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Guias e Dicas
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Astronomia, Notas de estudo de Física

ASTRONOMIA

Tipologia: Notas de estudo

2010
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Compartilhado em 21/09/2010

marilton-rafael-1
marilton-rafael-1 🇧🇷

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Baixe Astronomia e outras Notas de estudo em PDF para Física, somente na Docsity! 1 ASTRONOMIA GEODÉSICA Posicionamento pelas Estrelas Basílio Santiago Adriano Salviano 2 ÍNDICE NOTA DOS AUTORES CAPÍTULO 1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS E SISTEMAS DE COORDENADAS – Introdução à Astronomia Geodésica – Sistema Horizontal de Coordenadas – Sistema Equatorial de Coordenadas Ângulo horário Precessão – Relação entre os Sistemas Horizontal e Equatorial – Outros sistemas de coordenadas Coordenadas eclíticas Coordenadas Galácticas – Fundamentos de Geodésia História da Geodésia A figura da Terra O Elipsóide de Revolução Geóide Sistema Geodésico de Referência Determinação de Posição pela Astronomia CAPÍTULO 2 ESTUDO ANALÍTICO DO MOVIMENTO DIURNO – Movimento diurno dos astros – Passagem meridiana – Estrelas circumpolares e estrelas invisíveis – Movimento diurno: exemplos do efeito da latitude do observador – Trigonometria Esférica Triângulos Esféricos Fórmulas de Trigonometria Esférica – Astronomia Esférica Situações especiais CAPÍTULO 3 MOVIMENTO ANUAL DO SOL E SISTEMAS DE TEMPO – Movimento Anual do Sol – Estações do ano e eclipses As estações do ano em nosso planeta Eclipses – Sistemas de Medida de Tempo Instante, Hora, Intervalo e Estado de Cronômetro As diferentes definições de hora – Conversão entre Sistemas de Medida de Tempo Conversão de tempo solar em sideral Tabela do Anuário Astronômico do Observatório Nacional Tabela do Astronomical Almanac Conversão de tempo sideral em solar – Equação do Tempo 5 NOTAS DOS AUTORES Este texto tem uma origem curiosa, pois seguiu um caminho possivelmente inverso da maioria. Inicialmente foi produzido em formato de hipertexto a ser acessado pela Internet e somente agora está sendo publicado na forma tradicional. Para os que têm acesso à Internet sempre vale à pena conhecer o material em sua versão eletrônica: http://www.if.ufrgs.br/~santiago/lectures/fis2005, até porque as atualizações se dão mais rapidamente para este último. O endereço do hipertexto dado acima é parte do sítio Internet do Instituto de Física da UFRGS. Este material foi inicialmente confeccionado com o objetivo de ajudar os alunos e professores de disciplinas de Astronomia Posicional, Fundamental e Geodésica. Trata-se, portanto, de material didático concebido como apoio ao ensino universitário. Por outro lado, o leigo interessado em Astronomia e dispondo de conhecimento de matemática elementar como geometria e trigonometria certamente vai se beneficiar deste material. Na elaboração do hipertexto, originalmente foram usados trechos e figuras de alguns livros e sítios disponíveis na Web, incluindo-se sítios do exterior. A tradução do inglês para o português, quando necessária, foi feita por este autor. Os livros e sites da Web de onde foram retiradas partes dos conteúdos que originalmente compunham o hipertexto, são os seguintes: • Boczko, I., “Conceitos de Astronomia”; • Gemael, C., “Astronomia Esférica”; • Hatschbach, F., “Determinações Astronômicas”; • Astronomy 250 lecture notes. Endereço na Web: <http://ircamera.as.arizona.edu/astr_250/class_syl.html>; • Tutorials for Astronomy. Endereço na Web: <http://www.physics.csbsju.edu/astro/>; • Roy Fisher's Earth Rotation and Equatorial Coordinates web page. Endereço na Web: <http://www.gb.nrao.edu/~rfisher/Ephemerides/earth_rot.html>; • Terry Moore's web page on Coordinate Systems, Frames and Datums. Endereço na Web: <http://granby.nott.ac.uk/~iszwww/coord1.htm>; Tanto o hipertexto quanto o livro evoluíram com o tempo, sendo que a elaboração da versão impressa, resultado de um projeto apoiado pelas Pró-Reitorias de Ensino e Pesquisa da UFRGS, foi um dos principais impulsionadores deste processo de aprimoramento. O material aos poucos foi sendo modificado e adaptado por este autor, levando-se em conta os conteúdos da disciplina de Astronomia Geodésica I e II, do curso de Engenharia Cartográfica da UFRGS, além das demais disciplinas oferecidas pelo Departamento de Astronomia desta universidade. Figuras semelhantes às originais, por vezes melhoradas, bem como figuras novas, foram confeccionadas em sua maior parte 6 por Adriano Salviano, formando de Engenharia Cartográfica da UFRGS e co-autor desta versão impressa principalmente na parte de Sistema Geodésico de Referência. Mudanças no texto e no ordenamento da exposição dos tópicos abordados se deveram em parte às novas figuras, mas também ao próprio processo de aprofundamento didático dos autores. Todos os capítulos do texto foram ampliadas com relação à versão original, em especial os capítulos conceituais e o capítulos de problemas com soluções. O Capítulo 5 em diante são, na verdade, um diferencial importante deste livro didático, pois enfatizam a prática astronômica, dando assim maior clareza aos conceitos teóricos apresentados. Basílio Santiago Adriano Salviano 7 CAPÍTULO 1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS E SISTEMAS DE COORDENADAS Introdução à Astronomia Geodésica O simples ato de olhar para o céu noturno, em uma noite sem nuvens e longe das luzes da cidade, e nele identificar o grande número de estrelas de variados brilhos e cores, se constitui em uma forma primitiva de praticar a Astronomia de Posição. Quem não teve a experiência de ver uma "estrela cadente", ou presenciar subitamente algum fenômeno no céu (passagem de um satélite, balão meteorológico ou mesmo um avião, aparente mudança de brilho de uma estrela, etc) e tentar descrever a outra pessoa em que posição do céu isso aconteceu? Em geral, para o leigo, este tipo de experiência leva ao uso das mãos: a primeira reação é apontarmos para a direção onde se deu o fenômeno. Já outras pessoas podem tentar usar estrelas vizinhas ao ponto ou região do céu em questão. O fato é que a necessidade de localizar e identificar objetos no céu acompanha a civilização humana desde o seu início. Na Antigüidade, a identificação de estrelas específicas no céu logo ao anoitecer ou amanhecer, ou mesmo a posição do Sol no céu com relação a marcos de referência em terra eram usados para marcar a sucessão das estações de calor ou frio, de secas ou cheias. Para facilitar seu trabalho, muitos povos usavam as estrelas mais brilhantes do céu, juntamente com um pouco de imaginação, para formar figuras familiares, de animais conhecidos, figuras de sua mitologia, ou cenas cotidianas no céu noturno. Essas figuras, as constelações, já representam um avanço na prática da Astronomia de Posição. Ao invés de apontar o dedo na direção de um certo fenômeno ou objeto celeste, o reconhecimento das constelações no céu permitia localizar este fenômeno ou objeto simplesmente fazendo menção à constelação cujas estrelas o circundavam. Apesar do apelo que têm junto às pessoas (todos nós já ouvimos falar de constelações como o Cruzeiro do Sul, Escorpião, Sagitário, Touro, etc) atualmente a Astronomia de Posição faz pouco uso delas. O motivo para o pouco uso das constelações pode ser conhecido se nos dispusermos a passar uma noite olhando para o céu e tentando identificar as constelações nele presentes com o auxílio de um mapa celeste. No mapa, as estrelas que compõem a figura de cada constelação estão ligadas por linhas, de forma que, com alguma boa vontade, podemos identificar as formas dessas figuras que lhes dão o nome. Mas ao olharmos para o céu noturno a coisa se complica e muito. O que vemos é simplesmente um monte de estrelas, algumas mais brilhantes, outras menos, algumas avermelhadas, outras azuladas ou bem brancas. Aquelas figuras marcadas na carta celeste 10 horizonte do observador, novamente um círculo máximo da esfera celeste. As duas metades da esfera celeste definidas pelo horizonte são o hemisfério visível (acima do horizonte e que contém o zênite) e o hemisfério invisível (abaixo do horizonte). A figura I.1.1, como já dissemos, representa apenas a metade visível da esfera celeste. Como o meridiano astronômico não é todo disponível à observação, alguns autores preferem definir como meridiano astronômico apenas o semicírculo meridiano situado acima do horizonte. Outros fazem referência a este último como sendo o Meridiano Superior ou ainda, Semimeridiano Superior. O plano que contém o observador O, o zênite Z e a estrela E é chamado de Vertical da Estrela. A intersecção do vertical da estrela com a esfera celeste define o Círculo Vertical da mesma. Figura I.1.1 – Sistema de coordenadas horizontais. Pois bem, podemos situar qualquer ponto na esfera celeste com duas coordenadas. No caso do sistema horizontal essas coordenadas são a altura h e o azimute A. Pela figura I.I.1 vemos que a altura é o ângulo entre a direção à estrela (segmento de reta OE) e o plano do horizonte. A altura é arbitrada como sendo positiva para pontos da esfera celeste situados acima do horizonte e negativa para aqueles abaixo do horizonte. Já o azimute é o ângulo, contado ao longo do plano horizontal, entre o plano meridiano e o vertical da estrela. A origem da contagem de A (ou seja, A = 0°) é em geral arbitrada como sendo o ponto cardeal norte (N); mas alguns autores preferem usar o ponto cardeal Sul (S). É comum também se substituir a altura h pela distância zenital z; esta última é o ângulo entre a direção vertical (ou seja, OZ) e a direção à estrela. Fica claro, tanto pelas definições quanto pela figura, que a altura e a distância zenital são ângulos complementares, ou seja: h + z = 90° Azimute e altura geralmente são definidos de forma que seus valores possam variar dentro dos seguintes domínios: 00 3600 ≤≤ A 11 00 9090 ≤≤− h 00 1800 ≤≤ z Valores negativos de altura se aplicam a objetos abaixo do horizonte, sendo z > 90° neste caso. Para fins de fixação, procuremos agora responder às seguintes perguntas: 1 – Qual a altura de um objeto exatamente no horizonte do observador? 2 – Qual a altura de uma estrela que esteja no nadir, ou seja, no ponto da esfera celeste diametralmente oposto ao zênite? 3 – Qual o azimute de um astro que se situa no meridiano astronômico do observador, entre o zênite e o ponto cardeal norte? 4 – Qual a altura de um astro cuja distância zenital é z = 40°? 5 – Qual o azimute de uma estrela cujo vertical contém o ponto cardeal leste (E)? A figura I.1.2 mostra o sistema horizontal por uma outra perspectiva. No painel da direita vemos a definição da altura h do ponto de vista de alguém que se situa no plano do horizonte. Já o painel da esquerda mostra a definição do azimute A partir de uma perspectiva de quem olha para o plano horizontal de cima, ou seja, ao longo da vertical do observador. Figura I.1.2 – definição da altura h e do azimute A. Uma observação importante sobre o sistema horizontal é que as coordenadas de um objeto mudam com o passar do tempo. É fácil constatar isso, pois sabemos que, devido à rotação da Terra, os astros se movem lentamente de leste para oeste. Ao nascer a leste do meridiano astronômico, qualquer estrela terá necessariamente um azimute no domínio 0° A 180°. Já ao se por a oeste do meridiano do observador, seu azimute será 180° A 360°. A altura (ou distância zenital) obviamente também varia: tanto ao subir no horizonte a leste quanto ao baixar a oeste, a altura de uma estrela é nula (h = 0°). No intervalo entre estes dois instantes, o objeto obviamente está acima do horizonte e temos, portanto h > 0°. Na verdade, veremos mais adiante que o movimento diurno de um astro tem a forma de um círculo na esfera celeste. Em geral, parte deste círculo está acima do 12 horizonte e parte abaixo dele. A figura I.1.3 ajuda a visualizar um arco diurno típico descrito por uma fonte celeste. Novamente, vemos apenas a parte do arco diurno que está acima do horizonte do observador. Figura I.1.3 – exemplo de arco diurno descrito por um astro. Note que na Figura I.1.3 os pontos em que o arco diurno cruza com o horizonte não coincidem com os pontos cardeais leste (L) e oeste (W). De fato, veremos mais adiante que poucos astros nascem (se põem) exatamente em L (W). Além de variar com o tempo, as coordenadas horizontais de uma fonte astronômica também dependem da posição do observador na superfície da Terra. O fato de esta última ser de tamanho desprezível comparada com as distâncias às fontes astronômicas implica que a direção à fonte no espaço independe da posição do observador. Por outro lado, a direção da vertical do observador claramente depende de onde na superfície da Terra ele está. A situação é retratada na figura I.1.4, que mostra dois observadores situados em um mesmo meridiano geográfico, mas em pontos distintos da superfície da Terra. A direção à estrela é a mesma independentemente do ponto de observação sobre a Terra, sendo esta direção representada pelas retas paralelas da figura. Mas as verticais dos observadores, que pode ser aproximada como a reta originada no centro da Terra e que passa pelo observador, aponta em direções diferentes. Em outras palavras, os zênites Z1 e Z2 dos observadores claramente correspondem a direções distintas no espaço. O plano horizontal de cada observador é perpendicular à vertical e, portanto também varia de orientação no espaço. Nota-se que a altura da estrela medida pelo observador O1 é bem menor do que aquela medida por O2. Na figura, PNG e PSG correspondem aos pólos norte e sul geográficos, respectivamente. 15 Figura I.1.6 – Sistema de coordenadas equatoriais. Já a ascensão reta, analogamente ao azimute no sistema horizontal, é contada ao longo do plano de referência. Logo a origem da contagem da ascensão reta (α = 0°) é necessariamente um ponto sobre o equador celeste. Este ponto é representado por γna figura I.1.6. O ponto γ (ou Ponto Vernal ou ainda Ponto de Áries) é um dos dois pontos da esfera celeste que pertence tanto ao equador celeste quanto à eclíptica (ver seção sobre movimento anual do Sol). A ascensão reta é definida como o ângulo entre o plano que contém PNC, T e γ e o plano que contém PNC, T e a estrela E (ver figura I.1.6). A intersecção deste último (primeiro) plano com a esfera celeste define um grande círculo chamado de círculo horário da estrela (do ponto vernal). Os pontos sobre o círculo horário da estrela têm o mesmo valor de α. Vemos pela figura que a ascensão reta é contada para leste e pode assumir valores entre 0º  360º. É comum, no entanto, exprimirmos a ascensão reta em unidades de tempo. Se atribuirmos um domínio de 24h ao domínio de valores de α acima, teremos 1h = 15°. Por exemplo, os pontos sobre o círculo horário do ponto γ têm α = 0° = 0h. Esta relação entre ascensão reta e tempo ficará mais nítida adiante, quando discutirmos o conceito de ângulo horário e as diferentes definições de sistemas de tempo. Ângulo horário Ângulo horário H de um astro é o ângulo entre o círculo horário deste astro e o meridiano astronômico do observador. Este ângulo, assim como a ascensão reta, também é contado sobre o equador celeste, variando de 0° H 360°. A figura I.1.7 é muito semelhante à figura I.1.6. A diferença é a inclusão do meridiano astronômico do observador na figura. Conforme explicado anteriormente, o meridiano é o grande círculo no céu que contém o zênite e os pontos cardeais norte 16 e sul. O meridiano necessariamente contém também os pólos celestes norte e sul. Na figura vemos que o ângulo horário cresce, a partir do meridiano, em direção oposta à ascensão reta. H cresce para oeste, acompanhando o movimento diurno dos astros (de leste para oeste). Já α cresce para leste, seguindo o movimento anual do Sol. Note que enquanto a ascensão reta α e a declinação δ formam o sistema de coordenadas equatoriais ou uranográficas, o ângulo horário H, juntamente com a declinação δ forma o sistema horário de coordenadas. Figura I.1.7 – Sistema horário de coordenadas. É precisamente o fato de acompanhar o movimento diurno dos astros que torna H um indicador útil para contagem de tempo. Por exemplo, se num dado instante uma estrela está no meridiano astronômico de um observador, seu ângulo horário é H = 0°. Um dia depois, após a Terra dar um giro completo em torno de seu eixo, a estrela estará novamente passando pelo meridiano do observador. Durante estas duas passagens meridianas, o ângulo horário da estrela terá variado de 0° a 360°. Podemos, portanto, definir a hora do dia com base no ângulo horário do astro. Daí o nome! A verdade é que o céu é um imenso relógio, do qual os astros são os ponteiros. A partir da posição destes ponteiros podemos então obter uma medida da hora. Por exemplo, define-se Hora Sideral (S) como sendo simplesmente o ângulo horário do ponto vernal (ponto γ). Pela figura I.1.7, vemos então que: S = Hγ = H* + α∗ onde H* e α∗ se referem a uma estrela qualquer. Podemos então definir como Dia Sideral o intervalo de tempo necessário para que o ponto vernal passe duas vezes pelo meridiano de um observador qualquer. Em outras palavras, é o intervalo decorrido entre duas passagens meridianas do Ponto γ. 17 Podemos também usar o ângulo horário do Sol como indicador da hora. Uma vantagem óbvia de fazê-lo reside no fato de que o Sol é facilmente localizável no céu, o mesmo não se aplicando ao ponto vernal. A Hora Solar (M) é então dada pela expressão: M = Hsol + 12h onde Hsol é o ângulo horário do Sol em um dado instante. O acréscimo de 12h serve simplesmente para fazer com que a passagem meridiana do Sol (Hsol = 0h) corresponda ao meio-dia (M = 12h) e não à meia-noite. Novamente podemos falar de dia solar como sendo o intervalo de tempo decorrido entre duas passagens consecutivas do Sol pelo meridiano de um observador. Por estar a Terra orbitando em torno do Sol ao mesmo tempo em que gira em torno de seu eixo de rotação, os dias solar e sideral não têm a mesma duração. Como o sentido de ambos os movimentos é o mesmo (anti-horário se visto do norte e horário se olhamos do sul) é fácil provar que o dia solar é um pouco mais longo do que sideral: Dia solar = 24h solares. Dia sideral = 24h siderais = 23h 56min 04s solares. Mais adiante, no Capítulo 3, voltaremos a discutir, em mais detalhe, os sistemas de marcação de tempo usados em Astronomia. Para fins de fixação, veja se consegue responder as perguntas abaixo. 1) Qual o valor de declinação do Pólo Sul Celeste? E qual o valor de δ para o Pólo Norte Celeste? 2) Qual o valor de α de um ponto cujo círculo horário faz um ângulo de 180° com o círculo horário do ponto vernal? 3) Qual o valor de δ de uma estrela situada 45° a sul do equador celeste? 4) Seja um observador situado no pólo norte geográfico da Terra. Que ponto de referência do sistema equatorial se situa no zênite deste observador? Qual a declinação de um ponto cuja distância zenital medida por este observador é 30°? 5) Qual o valor de distância polar de uma estrela de declinação δ = 20°? E de uma estrela com δ = –50°? Precessão Finalmente, cumpre mencionar que o eixo de rotação da Terra muda de direção no espaço. Por conseguinte, mudam no céu as posições dos pólos celestes, do equador celeste e do ponto vernal. A este movimento chamamos de precessão do eixo (ou precessão dos equinócios). Como as coordenadas equatoriais são definidas a partir destes pontos e círculos da esfera celeste, elas também variam com o tempo. Fórmulas para calcular as coordenadas equatoriais de um astro em diferentes épocas são dadas pelo Astronomical Almanac. Essas fórmulas são muito úteis, pois os catálogos astronômicos geralmente listam as coordenadas das estrelas para uma época arredondada, 20 elevado é o sul. Para O2, portanto, a igualdade entre a altura do pólo elevado e a latitude é uma igualdade em módulo, com sinais algébricos opostos. Outros sistemas de coordenadas Coordenadas Eclípticas Este é um sistema cujo plano de referência é o da eclíptica, ou seja, o plano que contém o caminho descrito pelo Sol no céu ao longo de um ano. Este sistema é usado com freqüência em Astronáutica, por exemplo, para expressar e manter a posição e orientação de uma nave com relação ao Sol. Latitude e Longitude Eclípticas são usualmente expressas em graus e são mais comumente usadas em Astronomia do Sistema Solar. A primeira (β) é a altura do astro com relação ao plano da eclíptica (ver figura I.1.10 abaixo). Já a longitude eclíptica (L) é contada ao longo deste plano, com origem no ponto γ. Transformações entre este sistema e os demais podem ser encontradas em Conceitos de Astronomia, de R. Boczko ou em Astrophysical Formulae, de K. Lang, p. 504. Figura I.1.10 – Sistema de Coordenadas Eclípticas Coordenadas Galácticas Mais um sistema de coordenadas esféricas, análogo aos demais. Ele é representado na figura I.1.11. Desta vez o plano de referência é o plano do disco da Via-Láctea, a galáxia a que pertence o nosso Sistema Solar. Este plano faz um ângulo de 62°32' com o plano equatorial. A Longitude Galáctica (l), contada ao longo do plano do disco, tem origem na direção ao centro da Galáxia. Note que é difícil definir o centro da Via-Láctea, o que torna este sistema sujeito a revisões mais freqüentes do que os anteriores. A Latitude Galáctica é usualmente denotada pela letra b, podendo, assim como a declinação, a altura e a latitude eclíptica, assumir valores entre –90° < b < 90°. A direção ao centro da Galáxia (ou seja, l = 0° e b = 0°) situa-se na constelação de Sagitário, ao passo 21 que o pólo norte galáctico (ou seja, b = +90°) fica na constelação da Cabeleira de Berenice. Este sistema de coordenadas é mais aplicado em estudos que envolvem a distribuição de objetos dentro da Via-Láctea. Consulte o livro do Lang para ver transformações entre este sistema e o equatorial. Figura I.1.11 – Sistema de Coordenadas Galácticas. Fundamentos de Geodésia História da Geodésia Nós temos, por séculos, nos preocupado com a Terra sobre a qual vivemos. Em passado remoto, esta preocupação se limitava a mapear a vizinhança imediata de nossas casas; com o tempo, foi se tornando útil, e mesmo necessário, localizar e mapear outras regiões, para fins de rotas comerciais e de exploração. Finalmente, com o aumento da capacidade de se transportar a grandes distâncias, surgiu o interesse em se estabelecer a forma, o tamanho e composição de todo o planeta. Os gregos dos períodos arcaico e clássico tiveram idéias variadas quanto à forma e tamanho da Terra. Homero sugeriu uma forma de um disco plano; Pitágoras e Aristóteles advogavam uma forma esférica. Pitágoras era um matemático que considerava a esfera a figura geométrica mais perfeita, sendo para ele, portanto, natural que os deuses dessem esta forma ao mundo. Já Anaxímenes acreditava que a Terra tinha uma forma retangular. A idéia de uma Terra esférica foi predominante entre os gregos. A tarefa seguinte e que ocupou muitas mentes foi a de determinar seu tamanho. Platão estimou a circunferência da Terra como sendo de umas 40.000 milhas. Arquimedes estimou em 30.000 milhas. Estes valores, contudo, não passavam muito do campo da mera especulação. Coube a Erastóstenes, no século II a.C., determinar o tamanho da Terra usando medidas objetivas. 22 Ele notou que no dia do solstício de verão os raios solares atingiam o fundo de um poço em Siena (atual Assuan, no Egito) ao meio dia. No mesmo instante, contudo, o Sol não estava exatamente no zênite na cidade de Alexandria, a norte de Siena; pelo tamanho da sombra que o Sol projetava, Erastóstenes determinou o ângulo de incidência dos raios solares: 7° 12’, correspondendo a 1/50 de um círculo. Conhecido o arco de circunferência entre as duas cidades, ou seja, a distância entre elas, Erastóstenes pode então estimar a circunferência do globo. A distância era de umas 500 milhas (na direção norte–sul). Se essa distância corresponde a 1/50 da circunferência da Terra, esta deveria ter então 50 x 500 = 25.000 milhas de circunferência. Este é um valor bastante próximo do raio equatorial terrestre (24.901 milhas, valor adotado no World Geodetic System). A figura I.1.12 ilustra o método usado por Erastóstenes. Nela vemos raios solares paralelos incidindo sobre as duas cidades, sendo que em Alexandria o ângulo com relação à vertical não é nulo, mas de 7°12’. Figura I.1.12 – método de Erastóstenes para medir a circunferência da Terra. A precisão de medida de Erastóstenes é incrível considerando-se todas as aproximações embutidas no seu cálculo. Siena na verdade não está exatamente no trópico de Câncer (ou seja, os raios solares não são estritamente perpendiculares à superfície no solstício de verão), sua distância a Alexandria é de 453 milhas (ao invés de 500 milhas) e as duas cidades não estão alinhadas na direção norte–sul; todos estes fatores contribuem para diminuir a precisão da medida. Outro Grego antigo a estimar o tamanho do globo foi Posidônio. Ele utilizou uma estrela que era circumpolar, ou seja, que estava sempre acima do horizonte, quando vista da cidade de Rodes, tangenciando o horizonte no instante da culminação inferior (ver Capítulo 2). Esta mesma estrela teve então sua altura medida em Alexandria e, conhecida, a distância entre as duas cidades, foi possível a Posidônio determinar um valor de 24.000 milhas para a circunferência da Terra. Outro filósofo grego revisou o método de Posidônio e encontrou um valor substancialmente menor: 18.000 milhas. Este valor foi o adotado por Ptolomeu, cujo trabalho e modelo de cosmos foi adotado na Europa ao longo da Idade Média. Foi possivelmente graças a esta subestimava da circunferência do globo que Cristóvão Colombo foi levado a crer que o Extremo Oriente estaria a 25 Figura I.1.14 – elipses com diferentes achatamentos. Geóide Sabemos que as medidas em Geodésia são feitas sobre a superfície aparente ou topográfica da Terra e que os cálculos teóricos assumem um modelo, geralmente elipsoidal. Há uma outra superfície também envolvida nos cálculos: O Geóide. Em levantamentos geodésicos, a computação das coordenadas geodésicas de pontos é feita em um elipsóide que aproxima com precisão o tamanho e a forma da Terra na região considerada. As medidas, por seu turno, feitas na superfície da Terra com determinados instrumentos se referem ao geóide, tal como explicado abaixo. O elipsóide é uma superfície regular definida matematicamente e com dimensões especificadas. O geóide, por seu turno, coincide com a superfície média que os oceanos descreveriam se fossem livres para se ajustar ao efeito combinado da atração gravitacional causada pela distribuição de massa da Terra e pela força centrífuga resultante de sua rotação. Devido à distribuição irregular da massa da Terra, a superfície do geóide é irregular e, como o elipsóide é regular, essas superfícies não são coincidentes. As diferenças são usualmente chamadas de ondulações geoidais, alturas geoidais ou separações geoidais. O geóide é uma superfície ao longo da qual o potencial gravitacional é em todo lugar igual (ou seja, é uma superfície de isopotencial). Assim, a aceleração gravitacional é sempre perpendicular à superfície geoidal. Esta última característica é particularmente importante, pois instrumentos óticos que contém mecanismos de nivelamento são comumente usados em medições geodésicas. Quando ajustadas de maneira apropriada, o eixo vertical do instrumento coincide com a direção da gravidade e é, por conseguinte, perpendicular ao geóide. O ângulo entre a linha de prumo que é perpendicular ao geóide (por vezes chamada simplesmente de vertical) e a perpendicular ao elipsóide (por vezes chamada de normal) é definida como o desvio da vertical. 26 Na figura I.1.15 vemos representada a superfície da Terra, com seu relevo irregular, um elipsóide que lhe serve de modelo e o geóide. Vemos também as perpendiculares ao elipsóide a ao geóide, e a medida do desvio, ou deflexão, da vertical mais exatamente pela sua componente meridiana . Figura I.1.15 – Representações da superfície da Terra: o elipsóide de revolução e o geóide, com suas respectivas perpendiculares em um dado ponto. Sistema Geodésico de Referência Sistema Geodésico de Referência (SGR) é o elipsóide de revolução, acompanhando nosso planeta em seu movimento de rotação adequando-se à representação dos pontos terrestre. Podem ser geocêntricos conforme a origem do terno cartesiano coincida com o centro de gravidade da Terra ou topocêntrico quando o elipsóide de revolução geocêntrico translada até um ponto da superfície do elipsóide tangenciar um ponto do Geóide. É definido pelo: • Eixo Z coincidente com o eixo de rotação terrestre médio, sentido positivo para o CTP (Conventional International Pole – Pólo Terrestre Convencional); • Eixo X no plano do equador terrestre médio, e paralelo ao plano do Meridiano de Greenwich; • Eixo Y a 90º de X, de modo a tornar o sistema dextrógiro. Caracterizado por cinco parâmetros: • Dois parâmetros definidores do elipsóide de referência: o Semi-eixo maior a; o Achatamento f. 27 • Três parâmetros definidores da orientação desse elipsóide em relação ao corpo terrestre: o Latitude Geodésica φ é o ângulo que a normal do elipsóide, passante pelo ponto, forma com a sua projeção equatorial; o Longitude geodésica λ é o ângulo λ que mede o diedro formado pelos meridianos geodésicos do ponto considerado e de Greenwich, contada a partir deste, positivamente por leste; o Altura Geométrica h é o segmento da normal compreendido entre o ponto considerado e o elipsóide. Em primeira aproximação por não serem h e a altitude ortométrica H (altura em relação ao geóide) colineares. ou Três Coordenadas Cartesianas terrestres médias do Centro do Elipsóide (X0, Y0, Z0). Na figura 1.1.16, podemos observar as coordenadas geodésicas, cartesianas e as alturas elipsoidal, ortométrica e Normal, assim definido: h = PB – altura elipsoidal; H = PA – altitude ortométrica; N = AB – Normal. Z Y X P C B A Elipsó ide de Re volu çã o O λ φ Da b Geóide Superf. Terra Figura I.1.16 – Coordenadas Geodésicas e Cartesiana no elipsóide de revolução e as superfícies do Geóide e da Terra. As coordenadas astronômicas de um ponto na superfície da Terra diferem-se das coordenadas geodésicas com relação a altura, a primeira se refere a altitude ortométrica e a segunda a altura elipsoidal, devido a direção da vertical (levantadas para as coordenadas astronômicas através de transporte da diferença de nível em relação ao datum vertical) diferir da direção da altura 30 Podemos então definir latitude astronômica como sendo o ângulo entre a perpendicular ao geóide no ponto considerado e o plano do Equador terrestre. Já longitude astronômica é definida como o ângulo entre o plano do meridiano de Greenwich e o plano do meridiano que contém o ponto considerado. A figura I.1.19 ilustra estas definições. Figura I.1.19 – latitude e longitude astronômicas. A latitude astronômica pode ser determinada pela medida da altura de uma estrela na sua culminação superior, ou seja, sua altura máxima. Há métodos mais sofisticados que fazem uso de mais de uma estrela. Alguns destes métodos serão apresentados neste livro, usando conceitos que serão apresentados no Capítulo 2. Quanto à longitude astronômica, sua determinação está intimamente associada à medidas de tempo. Como veremos em mais detalhe no Capítulo 3, a longitude astronômica de um ponto é medida pela determinação da diferença de tempo (em horas, minutos e segundos) entre o instante em que uma estrela específica faz sua passagem pelo meridiano de Greenwich e o instante em que ela passa pelo meridiano do ponto considerado. Há técnicas variadas para determinação da longitude, algumas das quais serão discutidas posteriormente. Estas técnicas combinam medidas de tempo, em diversos sistemas de tempo (Capítulo 3), com as informações de anuários e efemérides, do local. Outra determinação astronômica importante é a do azimute de uma mira. Medidas azimutais de alta precisão são usadas no método de triangulação. Novamente usando-se a figura I.1.19, o azimute astronômico de um ponto Q com relação ao ponto P é definido como o ângulo entre o plano meridiano que contém P e o plano que contém tanto Q quanto a perpendicular ao geóide passando por P. Este ângulo, em geral, tem origem no ponto cardeal norte e é contado de 0° a 360° no sentido leste. 31 Observações astronômicas são feitas com instrumentos óticos, como o teodolito, a câmara zenital ou o astrolábio, todos contendo mecanismos de nivelamento da base do instrumento. Quando nivelados de forma adequada, o eixo vertical desses instrumentos (que é perpendicular à sua base) coincide com a direção da aceleração gravitacional, sendo, portanto, perpendicular ao geóide naquele ponto. Dessa forma, determinações astronômicas sempre se referem ao geóide. Como o geóide é uma superfície irregular, as posições assim determinadas para diferentes pontos são independentes umas das outras. 32 CAPÍTULO 2 ESTUDO ANALÍTICO DO MOVIMENTO DIURNO Movimento diurno dos astros As estrelas visíveis no céu noturno variam com a época do ano, a hora do dia e com a latitude do observador. A dependência com a época do ano é causada pelo fato de o Sol se mover com relação às estrelas, ao longo do ano. Este movimento anual do Sol , como veremos no próximo capítulo, é o resultado do movimento orbital da Terra em torno do Sol. O caminho do Sol no céu em seu movimento anual se chama eclíptica. Dessa forma, as estrelas que aparecem no céu noturno, ou seja, que estão longe da posição do Sol na esfera celeste, mudam lentamente ao longo do ano. A dependência com a hora do dia se deve à rotação da Terra. De maneira geral, os astros nascem e se põem no céu à medida que a Terra gira em torno de seu eixo. Como esse movimento faz com que um observador fixo na superfície da Terra descreva um círculo no espaço, os astros, vistos por este observador, descrevem também um círculo na esfera celeste. A este movimento chamamos de movimento diurno. A rotação se dá de oeste para leste; logo, o movimento diurno dos astros no céu se dá no sentido inverso, de leste para oeste. O movimento de um ponto fixo na superfície da Terra é paralelo ao equador, mantendo-se constante, portanto, a latitude do ponto. Da mesma forma, o círculo descrito por uma estrela em seu movimento diurno é paralelo ao equador celeste. Portanto, não se altera a declinação δ da mesma (ou a sua distância polar p). Como o ponto γ é fixo com relação às estrelas, também ele se move no céu ao longo do dia. A ascensão reta então é mantida constante. Essa é a grande vantagem das coordenadas equatoriais sobre as horizontais: enquanto a altura h e o azimute A de um astro variam ao longo do dia, devido ao movimento diurno, a ascensão reta α e a declinação δ são fixas. Essas últimas variam apenas em escalas de tempo muito mais longas, devido aos efeitos de precessão, nutação, aberração, paralaxe e movimento próprio, que veremos em maior detalhe no Capítulo 4. Passagem meridiana Em geral, parte do círculo descrito por um astro no céu ao longo de um dia estará acima do horizonte do observador e parte dele estará abaixo. No instante em que o astro está no plano que contém o meridiano astronômico do observador, sua altura no céu é um extremo. Isso acontece duas vezes em um dia sideral; na culminação superior (ângulo horário H = 0°) a altura do astro é máxima, na culminação inferior (H = 180°) sua altura é mínima. A culminação superior é a melhor 35 Figura I.2.3 – diagrama do plano meridiano de um observador de latitude φ > 0°, agora mostrando as culminações de duas estrelas: EK e EV, culminando respectivamente a norte e a sul do zênite (Z). Estrelas circumpolares e estrelas invisíveis Consideremos agora o efeito da latitude do observador sobre a visibilidade das estrelas. Por exemplo, estrelas muito próximas do pólo norte celeste, por exemplo, estão sempre acima (abaixo) do horizonte de observadores situados em latitudes norte (sul). Estrelas sempre acima do horizonte são chamadas de circumpolares. Estrelas sempre abaixo do horizonte de um observador são simplesmente chamadas de invisíveis. Para que uma estrela seja circumpolar, a altura mínima que ela atinge durante todo o dia tem que ser positiva, ou seja, hmin > 0°. A altura mínima de qualquer astro ocorre na sua culminação inferior. Pela figura I.2.4 podemos ver que a condição de circumpolaridade de uma estrela para um observador no hemisfério norte é dada por: p = 90° – δ < φ δ > 90° – φ. Figura I.2.4 – Diagrama do plano meridiano mostrando a região onde se situam as estrelas circumpolares (mais escura). 36 Na figura I.2.4, o semicírculo que passa pelos pontos cardeais Norte (N) e Sul (S) e também pelo zênite é o meridiano astronômico do observador. O pólo celeste elevado é o pólo celeste norte (PNC), cuja direção é perpendicular ao equador celeste. Este último cruza o meridiano do observador no ponto EC. A altura do pólo celeste visível é igual à latitude do observador, sendo que a direção de PNC é bissetriz do arco mostrado em tonalidade escura na figura. Este arco representa a zona ocupada pelas estrelas circumpolares para o observador em questão. Podemos determinar nossa latitude pela observação do movimento diurno de estrelas circumpolares. O método é ilustrado na figura I.2.5. Figura I.2.5 – Relação entre a latitude φ do observador e as alturas de uma estrela circumpolar nas culminações inferior (hi) e superior (hs). Nela vemos novamente uma representação do plano meridiano de um observador. Vemos o pólo elevado (PNC), de altura igual à latitude φ do observador. Vemos também as posições de uma estrela circumpolar nos momentos da culminação superior (C.S.) e inferior (C.I.). Como a declinação da estrela não muda ao longo de um dia, sua distância polar p também se mantém constante. Assim, podemos ver facilmente pela figura que as alturas máxima (hs) e mínima (hi) da estrela durante seu movimento diurno podem ser expressas em função de φ e p: hi = φ − p hs = φ + p Logo, eliminando p do sistema de equações acima, teremos: 2 is hh +=φ Para um observador no Hemisfério Sul da Terra, a fórmula é praticamente a mesma. A única diferença é que temos que lembrar que, neste caso, convenciona-se que a latitude é negativa, enquanto que as alturas de uma estrela circumpolar serão sempre positivas. Assim temos apenas que mudar um sinal algébrico: 2 is hh +−=φ φ 37 Note que o pólo sul celeste está sempre abaixo do horizonte do observador em questão. Estrelas suficientemente próximas a ele estarão sempre invisíveis a este observador. A situação é retratada na figura I.2.6, onde vemos o valor de declinação mínimo (em módulo) necessário para que uma estrela seja invisível para um observador de latitude φ. A condição para uma estrela nunca nasça (seja invisível) é (hmax < 0°): δ < – (90°– φ) Figura I.2.6 – Diagrama do plano meridiano mostrando a condição de invisibilidade para um observador no hemisfério norte terrestre. Assim, no caso de um observador cuja latitude é φ = 45°, por exemplo, estrelas com δ > 45° são circumpolares e estrelas com δ < − 45° são invisíveis. As condições de circumpolaridade e invisibilidade acima se aplicam para o caso em que o observador está no hemisfério norte da Terra (ou seja, φ > 0°). Para o hemisfério sul (φ < 0°) teremos: Circumpolaridade: δ < – (90 + φ) Ιnvisibilidade: δ > (90 + φ) Tente desenhar diagramas do plano meridiano de um observador, semelhantes aos diagramas das figuras I.2.4 e I.2.6 acima, mas para o caso de um observador no hemisfério sul terrestre. Ao desenhá-los, lembrando das definições de pólo e equador celestes e lembrando que a altura do pólo sul celeste será sempre igual ao módulo da latitude do observador, você deverá ser capaz de deduzir as expressões acima. Movimento diurno: exemplos do efeito da latitude do observador Diferentes pontos na superfície da Terra vêem diferentes partes da esfera celeste. As próximas 5 figuras representam, respectivamente, situações de observadores no pólo norte da Terra (figura I.2.7), a uma latitude norte intermediária (figura I.2.8), no equador da Terra (figura I.2.9), a uma latitude sul intermediária (figura I.2.10) e no pólo sul (figura I.2.11). Em cada uma das cinco 40 Figura I.2.9 – Arcos diurnos vistos por um observador situado sobre o equador geográfico da Terra (φ = +0°). Seja agora um ponto a uma latitude intermediária sul (φ = –45°, figura I.2.10): a situação é análoga ao caso da latitude intermediária norte. Mas desta vez é o PSC que está a uma altura de 45°. Novamente, algumas estrelas são circumpolares (aquelas com δ < –45°) e outras nunca nascem (δ > +45°). As demais estrelas nascem e se põem a cada dia, passando parte do dia acima e parte do dia abaixo do horizonte. O Sol novamente nasce e se põe todos os dias. Mas agora, ele fica mais da metade do dia acima do horizonte nos meses próximos a dezembro, resultando no verão no hemisfério sul. Próximo a junho, seu caminho no céu ao longo do dia está majoritariamente abaixo do horizonte. Os pontos de nascer e ocaso do Sol novamente estão a norte ou sul dos pontos cardeais E e W, dependendo também da época do ano. Figura I.2.10 – Arcos diurnos vistos por um observador situado em latitude sul intermediária (φ = –45°) . No pólo sul (latitude φ= –90°, figura I.2.11), a situação é também análoga ao caso correspondente a norte. O PSC agora coincide com o zênite e o equador celeste coincide com o horizonte. Assim, o céu visível é exatamente o hemisfério sul celeste. À medida que a Terra gira, todas as estrelas descrevem círculos em torno de PSC, ou seja, neste caso em torno do zênite. Os círculos por elas descritos são novamente almucântares e nenhuma estrela nasce ou se põe no céu: todas as estrelas do hemisfério sul celeste são circumpolares. e todas as estrelas com δ > 0° são 41 sempre invisíveis. O Sol fica o dia inteiro acima do horizonte entre os dias 21/09 e 21/03, passando a ficar sempre abaixo do horizonte entre 21/03 e 21/09. Figura I.2.11 – Aarcos diurnos para um observador situado no pólo sul geográfico (φ = –90°) . Trigonometria Esférica Já estudamos qualitativamente o movimento diurno, concluindo que todos os astros completam diariamente um círculo paralelo ao equador celeste. Estudamos o caso particular em que um objeto atravessa o meridiano astronômico de um observador e vimos que nesta situação a sua altura no céu atinge um valor extremo (máximo na culminação superior e mínimo na culminação inferior). Além disso, estabelecemos relações matemáticas entre a latitude do observador e a declinação e altura da estrela na passagem meridiana. Na verdade, as coordenadas de uma estrela no céu estão associadas à posição do observador na superfície da Terra em qualquer instante, mesmo fora da passagem meridiana. Há relações matemáticas bem mais gerais envolvendo coordenadas horizontais, horárias e equatoriais de uma estrela e a latitude e longitude do observador. Para deduzirmos essas relações, contudo, faz-se necessário estudarmos um ramo da Trigonometria chamado de Trigonometria Esférica, cuja aplicação à Astronomia constitui-se no que chamamos de Astronomia Esférica. Esta não é a mais excitante das disciplinas, mas é muito importante para a prática da Astronomia, pois o céu tem geometria esférica e não plana. A Trigonometria Esférica é análoga à trigonometria plana, mas com a diferença muito importante de ser aplicada a triângulos esféricos. Triângulos Esféricos Um triângulo esférico é uma figura sobre uma superfície esférica que resulta quando consideramos três grandes círculos (ou círculos máximos) sobre essa superfície. Um grande círculo é qualquer círculo sobre a superfície esférica que a divida em dois hemisférios. Um plano que contém um grande círculo necessariamente contém também o centro da esfera. A figura I.2.12 42 mostra um triângulo esférico. Vemos uma esfera com centro em O e três pontos em sua superfície: A, B e C. Ao unirmos estes três pontos, dois a dois, através de círculos máximos, formamos uma figura ABC que se assemelha a um triângulo, mas que se situa sobre a esfera: um triângulo esférico, portanto. Figura I.2.12 –Representação de um triângulo esférico (de vértices A, B e C) sobre a superfície de uma esfera. Note que um triângulo esférico não é qualquer figura de três vértices desenhada sobre uma esfera; para ser um triângulo esférico esta figura tem que ter lados que sejam arcos de grande círculo. Outra observação importante sobre triângulos esféricos é que tanto os seus ângulos quanto os seus lados são medidos em unidades angulares. Os lados de um triângulo esférico são arcos de círculo máximo que, divididos pelo raio da esfera nos dão o ângulo, com vértice no centro da esfera, entre os pontos que eles ligam. Já os ângulos em cada vértice do triângulo esférico representam a separação angular entre os planos dos grandes círculos que se interceptam naquele vértice. Os triângulos esféricos têm algumas características que os distinguem dos triângulos planos. Neste último, por exemplo, a soma dos seus ângulos internos é sempre igual a 180°. No caso dos esféricos, a soma dos ângulos é sempre compreendida entre 180° e 540°. Existem vários livros que abordam a Trigonometria Esférica de uma perspectiva mais geral e aprofundada, discutindo e apresentando vários teoremas e resultados de interesse geral sobre os triângulos esféricos. Exemplos são as apostilas sobre Trigonometria e Astronomia Esférica de C. Gemael (UFPR) e o livro Conceitos de Astronomia, de R. Boczko. Aqui vamos adotar uma abordagem mais objetiva, voltando-nos diretamente para situações de interesse Geodésico e Astronômico. Na figura I.2.13 vemos um exemplo geográfico de um triângulo esférico. Trata-se do triângulo que tem como vértices o pólo sul geográfico e as cidades de Rio de Janeiro e Cape Town 45 segmentos OB e OC. Ao tomarmos estas retas, formamos na figura vários triângulos (planos) retângulos: ANP, AMP, ONP, OMP e OAP. Além desses, são também triângulos retângulos OAN e OAM. Usando todos estes triângulos poderemos então deduzir várias fórmulas. Considere o triângulo OAN, por exemplo. O ângulo com vértice em O deste triângulo mede a separação entre o cateto ON e a hipotenusa OA. Mas este ângulo é o lado b do triângulo esférico. Logo podemos escrever: cos(b) = OA ON ; sen(b) = OA AN Analogamente, considerando o triângulo OAM, cuja hipotenusa é OA (o raio da esfera), teremos: cos(c) = OA OM ; sen(c) = OA AM Sejam agora os triângulos ONP e OMP, cuja hipotenusa é OP. E sejam novamente os ângulos com vértice em O, representados pelas letras gregas α e β. Podemos escrever: cos(α) = OP OM ; sen(α) = OP MP cos(β) = OP ON ; sen(β) = OP NP Podemos então escrever que OM = OP cos α. Substituindo esta relação na expressão para cos c acima e lembrando que α + β = a, temos: OM = OA cos(c) = OP cos(a – β) = OP [cos(a)cos(β) + sen(a)sen(β)]   OA cos(c) = OP (cos(a) OP ON + sen(a) OP NP ) = ON cos(a) + NPsen(a)   OA cos(c) = OA cos(b)cos(a) + NP sen(a) Esta última linha resulta da expressão para ON usando o triângulo OAN, dada anteriormente. Precisamos agora encontrar uma expressão para NP. Usando o triângulo ANP (retângulo em P e com hipotenusa AN), temos: NP = AN cos( N̂ )= AN cos(C)= OA sen(b)cos(C) onde N̂ é o ângulo, com vértice em N, entre os segmentos AN e NP. Mas este ângulo é igual ao ângulo C do triângulo esférico, ou seja, o ângulo entre os planos OAC e OBC. Substituindo na expressão anterior temos então: OA cos(c) = AO cos(b)cos(a) + NP sen(a) = OA cos(b)cos(a) + OA sen(b)cos(C)sen(a) Resulta finalmente em: cos(c) = cos(a)cos(b) + sen(a)sen(b)cos(C) Esta é a chamada fórmula dos 4 elementos, em que os 3 lados do triângulo esférico são associados a um de seus ângulos. Note que o lado cujo co-seno aparece no lado esquerdo é aquele 46 oposto ao ângulo que entra na fórmula. Podemos escrever outras duas fórmulas análogas (cuja dedução também é inteiramente análoga): cos(a) = cos(b)cos(c) + sen(b)sen(c)cos(A) cos(b) = cos(a)cos(c) + sen(a)sen(c)cos(B) Há também as fórmulas dos 4 elementos aplicadas a ângulos: cos(A) = – cos(B)cos(C) + sen(B)sen(C)cos(a) cos(B) = – cos(A)cos(C) + sen(A)sen(C)cos(b) cos(C) = – cos(A)cos(B) + sen(A)sen(B)cos(c) Pelas fórmulas aplicadas aos triângulos OAN, OAM, ANP e AMP acima, podemos também deduzir a analogia dos senos. AM = OA sen(c) = )(Bsen AP AN = OA sen(b) = )(Csen AP Logo: OA AP = sen(b) sen(C) = sen(c) sen(B)   )( )( )( )( )( )( Asen asen Csen csen Bsen bsen == Astronomia Esférica Apliquemos agora as fórmulas de Trigonometria Esférica, deduzidas anteriormente, ao triângulo de posição de uma estrela, representado na figura I.2.16 pelo triângulo esférico E–Z–PNC. Os lados deste triângulo, conforme indicado, são o complemento da latitude do observador (90° – φ), a distância zenital z (90° – h) e a distância polar p (p = 90° – δ). Além do ângulo Q, com vértice em E e mostrado na figura, ou outros ângulos do triângulo de posição são o ângulo horário H, com vértice em PNC (pois é o ângulo entre o plano meridiano e o círculo horário da estrela) e 360° – A, com vértice no zênite. Este último é o ângulo entre o plano meridiano e o vertical da estrela, estando obviamente ligado ao azimute. O fato de seu valor ser 360° – A se deve à escolha particular da origem do azimute na direção norte e crescendo para leste–sul–oeste. A analogia dos senos nos dá então: )( )( )( )cos( )360( )cos( 0 Hsen zsen QsenAsen == − φδ   )( )( )( )cos( )( )cos( Hsen zsen QsenAsen ==− φδ 47 Figura I.2.16 – Triângulo de posição de um astro. Já as fórmulas dos 4 elementos nos dão: cos(z) = sen(δ)sen(φ) + cos(δ)cos(φ)cos(H) sen(δ) = sen(φ)cos(z) + cos(φ)sen(z)cos(A) sen(φ) = sen(δ)cos(z) + cos(δ)sen(z)cos(Q) Situações especiais Existem algumas situações especiais nas quais as fórmulas se simplificam bastante. Essas situações se caracterizam pelo fato de um ou mais dos lados ou ângulos do triângulo de posição se tornarem nulos ou retos. A situação mais simples é a da passagem meridiana. Neste caso o ângulo horário é H = 0°. Pela analogia dos senos vê-se imediatamente que os senos dos demais ângulos do triângulo de posição também têm que se anular, ou seja, o azimute, por exemplo, assume os valores A = 0° ou A = 180°. Estes dois casos se aplicam a culminações a norte e a sul do zênite, respectivamente. É fácil ver também, pela primeira fórmula dos 4 elementos acima, que: cos(z) = sen(δ)sen(φ) + cos(δ)cos(φ) = cos(δ − φ)   z = δ − φ (quando A = 0°) ou  z = φ − δ (quando A = 180º) Essas expressões já haviam sido deduzidas na seção sobre o movimento diurno, usando os diagramas do plano meridiano. O leitor cuidadoso e metódico vai notar que as mesmas relações deveriam ser também obtidas no caso da culminação inferior, quando H = 180°. Mas, de fato, se fizermos esta substituição nas equações deduzidas acima, teremos: cos(z) = sen(δ)sen(φ) − cos(δ)cos(φ) = – cos(δ + φ)  z = 180º − |δ + φ| 50 CAPÍTULO 3 MOVIMENTO ANUAL DO SOL E SISTEMAS DE TEMPO Movimento Anual do Sol As estrelas que vemos à noite têm posições fixas no céu umas com relação às outras (exceto pelos efeitos secundários de aberração, paralaxe e movimento próprio, que discutiremos mais adiante). O Sol, contudo se move por entre as estrelas a uma taxa de 1° por dia aproximadamente. Assim, ao final de um ano, terá descrito um grande círculo no céu, a que chamamos de eclíptica. O movimento anual do Sol no céu é causado pelo movimento orbital da Terra em torno deste. A figura I.3.1 mostra a variação da posição do Sol no céu com relação às estrelas mais distantes à medida que a Terra se move em sua órbita anual. A órbita corresponde à elipse mais interna da figura. A esfera maior, mostrada em quatro diferentes posições da órbita, representa a Terra, enquanto que a esfera central representa o Sol. A elipse mais externa da figura é a eclíptica. Figura I.3.1 – Movimento orbital da Terra, resultando no movimento anual do Sol na esfera celeste, sobre a eclíptica. As estrelas formam figuras imaginárias no céu, a que chamamos de constelações. As constelações atravessadas pela eclíptica são chamadas de constelações zodiacais. A faixa do céu coberta por estas constelações é chamada de zodíaco. Por entre as estrelas do zodíaco move-se não apenas o Sol, mas também os demais astros do sistema solar, como a Lua e os planetas. Em torno do dia 21 de março o Sol, em seu caminho sobre a eclíptica, atravessa o equador celeste. Este ponto de intersecção entre os dois grandes círculos é o ponto vernal (ou ponto γ). Neste dia, chamado de Equinócio de março, o Sol cruza o equador celeste de sul para norte, marcando então o fim do verão no hemisfério sul da Terra e o fim do inverno no hemisfério norte. Pela 51 definição de ascensão reta, neste dia seu valor para o Sol é α = 0h. Como está sobre o equador celeste, a declinação do Sol no equinócio de março também é nula. Pela figura acima, vemos que o Sol, visto da Terra, é projetado na eclíptica na direção da constelação de Peixes nesta época. Uns 3 meses depois, em torno de 21 de junho, o Sol alcança seu maior valor de declinação: δ = 23½°. Nesta época ele é visto sobre a constelação de Gêmeos. A partir deste instante, o Sol começa a se mover em direção ao sul, de volta ao equador celeste. Este dia é chamado de Solstício de junho, marcando o início do verão (inverno) no hemisfério norte (sul). Neste dia, α = 6h para o Sol. Em torno do dia 21 de setembro, o Sol volta a cruzar o equador celeste, mas desta vez do hemisfério norte para o hemisfério sul. É o Equinócio de setembro, fim do inverno (verão) no hemisfério sul (norte) terrestre. O Sol está agora em Virgem. Coordenadas equatoriais do Sol: α = 12h ; δ =0°. Finalmente, uns 3 meses depois, o Sol atinge seu ponto mais a sul na esfera celeste: δ = – 23½°, α = 18h . Este é o Solstício de dezembro, sempre em torno do dia 21/12. É o início do verão (inverno) no hemisfério sul (norte). A partir deste dia, o Sol começa a se mover para norte até reatingir o ponto vernal no dia 21/3 do ano seguinte. Figura I.3.2 – Representação da eclíptica (curva mais fina) sobre a esfera celeste, com a posição do Sol nos equinócios e solstícios. Em resumo, em sua jornada anual ao longo da eclíptica, o Sol percorre 24h de ascensão reta, a uma taxa média de 2h por mês. Note que este movimento anual é independente do movimento diurno, compartilhado por todos os astros e causado pela rotação da Terra. O movimento diurno é mais facilmente notável, pois se dá a velocidade bem maior, de 24h por dia. A figura I.3.2 mostra uma espécie de “mapa mundi” da esfera celeste, no qual vemos toda a região com |δ|  47° projetada em um plano. O equador celeste é a linha horizontal que corta a figura em duas metades. As demais linhas horizontais são paralelos de declinação, ou seja, círculos (pequenos) contendo todos os pontos de declinação constante, no caso, com δ = +/–23,5°. Estes paralelos de declinação sobre a abóbada celeste são as projeções no céu dos Trópicos de Câncer (latitude φ = 23,5°) e de Capricórnio (latitude φ = –23,5°), tal como indicado. As retas verticais representam os círculos horários, de ascensão reta constante. A eclíptica é a linha curva e mais fina, 52 sendo que os dois pontos em que ela cruza o equador celeste, no meio e no extremo direito figura, são, respectivamente, os pontos γ e Ω. Já a tabela abaixo mostra as coordenadas equatoriais do Sol nos equinócios e solstícios. Posições Especiais do Sol na Eclíptica Coords. Sol Nome Data Aprox. α δ Equinócio março 21/03 0h 0° Solstício junho 21/06 6h 23½° Equinócio setembro 21/09 12h 0° Solstício dezembro 21/12 18h –23½° Estações do Ano e Eclipses As estações do ano em nosso planeta As estações do ano resultam do fato de que o eixo de rotação da Terra está inclinado por uns 23,5° com relação à normal ao seu plano orbital (plano da eclíptica). A este ângulo chamamos de obliqüidade da eclíptica, sendo comumente representado pela letra grega epsilon (ε). O eixo aponta sempre na mesma direção no espaço (exceto pelos efeitos secundários de precessão e nutação, que discutiremos mais adiante), de forma que o pólo norte geográfico está por vezes inclinado na direção do Sol (de junho a agosto) e por vezes na direção oposta (de dezembro a março). Estas duas situações, obviamente, caracterizam o inverno e verão no Hemisfério Sul da Terra, sendo a situação inversa no Hemisfério Norte. A figura I.3.3 procura ilustrar a situação: o Sol é representado pela esfera no centro da figura. A linha horizontal pertence ao plano da órbita da Terra em torno do Sol (este plano é perpendicular à figura). A Terra (esfera menor) é mostrada em duas situações distintas: à esquerda, vemos a Terra no dia do solstício de dezembro. Nesta situação, os raios solares incidem perpendicularmente sobre o Trópico de Capricórnio (= paralelo de latitude, φ = –23,5°). Outra maneira de dizer a mesma coisa é que a declinação do Sol é δ = –23,5°. Pelo fato do Sol iluminar mais o Hemisfério Sul, as noites são mais curtas e os dias mais longos neste hemisfério do que no Norte. A incidência mais perpendicular dos raios solares sobre o Hemisfério Sul também ajuda a aquecer as regiões a sul do Equador; inicia-se, portanto, o verão (inverno) no Hemisfério Sul (Norte) geográfico. Já na posição à direita, a Terra está no extremo oposto de sua órbita anual, sendo este então o solstício de junho. A declinação do Sol é agora δ = +23,5° e os raios solares 55 Lua cheia é representada à direita da Terra. No painel superior, as fases cheia e nova não levam os eclipses, pois o cone de sombra da Lua (da Terra) não se projeta sobre a Terra (Lua). Essas fases estão ocorrendo fora dos nodos orbitais, quando, portanto, o Sol não se situa ao longo da reta que liga a Terra à Lua. No painel do meio, por outro lado, os três astros estão alinhados, fazendo com que a sombra da Lua Nova se projete sobre uma pequena região da superfície da Terra (causando um eclipse do Sol nesta região) e com que a sombra da Terra se projete sobre a Lua Cheia (causando um eclipse lunar). Figura I.3.6 – Situações favoráveis e desfavoráveis à ocorrência de eclipses. Painéis superiores: jogo de sombras; painel inferior: elementos orbitais e jogo de sombras. Já a painel inferior da figura I.3.6 combina os elementos orbitais e o jogo de sombras para mostrar a situação favorável à ocorrência de eclipses. A linha dos nodos orbitais da Lua é a linha vertical que corta o centro da figura. Ao longo dela vemos que as fases nova e cheia da Lua acarretam eclipses. Já quando o Sol está fora da linha dos nodos (situações mostradas nas partes à esquerda e à direita da figura), as fases nova e cheia não levam aos eclipses, pois o cone de sombra da Lua (da Terra) não é projetado sobre a Terra (a Lua). A ocorrência de eclipses solares é devida a uma coincidência: o fato de que os diâmetros angulares da Lua e do Sol, vistos da Terra, são quase iguais. Mas note que o diâmetro aparente da Lua varia ao longo do mês, pois sua órbita em torno da Terra é uma elipse moderadamente excêntrica; no apogeu (ponto da órbita em que a distância é 56 máxima) a Lua parece ser 15% menor do que no perigeu (ponto de maior aproximação à Terra). Se um eclipse solar ocorre na primeira situação, a Lua não cobrirá todo o Sol, ocasionando um eclipse anular. Sistemas de Medida de Tempo Nas próximas seções vamos estudar em mais detalhe as diferentes formas de se medir o tempo com base no movimento diurno dos astros. Veremos que o movimento anual do Sol, que acabamos de estudar, leva a diferentes definições de hora solar. Veremos também a relação entre a hora local e a longitude do observador. Mas para atingirmos estes objetivos, faz-se necessário definirmos alguns conceitos que parecem e são simples, mas por vezes resultam em alguma confusão. Instante, Hora, Intervalo e Estado de Cronômetro Uma possível fonte de confusão está em saber diferenciar conceitos como instante, hora e intervalo de tempo e compreender exatamente o que se quer dizer com essas definições. Todos nós temos uma noção cotidiana do tempo. Podemos ordenar, de acordo com nossa capacidade de memória, fatos e acontecimentos em seqüência no tempo. Esta noção do tempo, baseada na nossa experiência do dia a dia, nos faz “sentir” o tempo como algo que “passa” ininterruptamente, levando a uma sucessão constante e linear de instantes. Não abandonemos, pois esta noção. Assim, definimos de forma genérica o tempo como uma variável cujo valor cresce de forma uniforme e que pode ser representada em um eixo. Um instante então pode ser entendido como um ponto ao longo do eixo do tempo. O valor numérico desta variável, o tempo, correspondente a cada instante nós chamamos de hora. Colocado de outra maneira, podemos identificar qualquer instante no eixo do tempo atribuindo-lhe um valor numérico que corresponde à hora naquele instante. Mas há diferentes formas (ou sistemas) que podemos usar para atribuir uma hora a um dado instante. Ou seja, um determinado instante no tempo pode ser e é caracterizado por diferentes valores de hora. No Capítulo 1 definimos pelo menos dois sistemas de tempo, a cada um dos quais associamos uma determinada definição de hora: hora solar e hora sideral. Qualquer instante então é caracterizado por valores, em geral diferentes, de hora solar e de hora sideral. Consideremos agora um outro conceito extremamente importante: o intervalo. Intervalo de tempo é a distância ao longo do eixo do tempo entre dois instantes. O valor do intervalo depende do sistema que estamos usando para marcar hora. O quê veremos neste capítulo são justamente diferentes definições de hora (ou dizendo em outras palavras, diferentes sistemas de tempo) e como converter um intervalo de tempo de um sistema para outro. Como marcamos a hora associada a um dado instante? Em geral, usa-se um cronômetro. Existem tanto cronômetros siderais, que marcam a hora sideral, quanto cronômetros comuns, marcando a hora solar. Nem sempre a leitura do cronômetro nos dá exatamente a hora nestes 57 sistemas. E isso nem é necessário, desde que saibamos converter a leitura feita no cronômetro em um dado instante (chamada de instante cronométrico, I) em hora sideral ou solar. A diferença entre a hora e o instante cronométrico é chamado de estado do cronômetro, E. Hora = I + E Por exemplo, S = IS + ES, onde S é a hora sideral num dado instante, IS é a leitura feita em um cronômetro sideral neste instante e ES é o estado deste cronômetro. Como determinar o estado de um cronômetro? Basta fazermos a leitura do instante cronométrico em um instante para o qual saibamos com precisão a hora. Por exemplo, ao observarmos uma estrela passar pelo nosso meridiano, sabemos que a hora sideral neste instante é igual à ascensão reta α da estrela: S = α. Se neste instante o cronômetro indica IS, seu estado será E = S – IS = α – IS. Conhecido o estado do cronômetro em um dado instante, espera-se que ele se mantenha constante, pelo menos por algum tempo. Este certamente seria o caso de um cronômetro perfeito. Na prática, há variações em E ao longo do tempo, que quantificam aquilo que chamamos de marcha (m) de um cronômetro: m = Hora E ∆ ∆ Quanto menor a marcha, mais regular é o cronômetro, mais fácil, portanto será usá-lo para determinar a hora. Como veremos neste capítulo, a marcha de um relógio de césio, que mede o tempo atômico, é da ordem de m = 1 / 1.000.000.000 = 10–9. As Diferentes Definições de Hora Vimos que, através da observação do movimento diurno dos astros, em especial pela determinação do ângulo horário, podemos medir o tempo. Vimos os conceitos de hora sideral e solar, baseadas, respectivamente, nos ângulos horários do ponto vernal (ponto γ) e do Sol. S = Hγ M = Hsol + 12h Ou seja, à medida que a Terra rotaciona, variam os valores de ângulo horário tanto do ponto vernal quanto do Sol, variando, portanto os valores de hora sideral e solar. A cada instante no tempo, portanto, podemos atribuir um valor de cada uma destas definições de hora. Nós já vimos também que, pelo fato de o Sol mover-se por entre as estrelas, ao longo da eclíptica e de oeste para leste, a uma taxa média de 360/365,25 = 0,9856° por dia, o dia solar é mais longo do que o dia sideral. Ou seja, o intervalo entre duas culminações superiores sucessivas do Sol é de 3min 56,04s mais longo do que o intervalo entre duas culminações superiores sucessivas de uma estrela, pois o Sol está constantemente se deslocando no sentido contrário ao movimento diurno. Note que a hora que marcamos no relógio, como veremos a seguir, é ligada (mas não é 60 ∆S = S2 – S1 = λ1 − λ2 = Η2 − Η1 = Μ2 − Μ1 = ∆Μ A inversão na posição das longitudes na expressão acima faz com que uma diferença positiva de hora (meridiano λ2 a leste de λ1) corresponda a uma diferença positiva em longitude. Dessa forma, podemos estabelecer uma relação simples entre a hora solar média M de um local cuja longitude é λ e a hora universal TU: ∆Μ = M – TU = 0° – λ = – λ Logo, M = TU – λ O sinal negativo resulta dessa nossa convenção de contar a longitude positivamente para oeste, de forma que pontos de longitude λ > 0° estão atrasados com relação ao meridiano de Greenwich. Por exemplo, se são 9h solares médias em Greenwich, TU = 9h, qual o valor de M no meridiano de longitude λ = –75° = –5h? Trata-se de um meridiano a leste de Greenwich (longitude negativa), de forma que sua hora solar média tem que ser adiantada com relação a este último. Pela expressão acima, de fato teremos: M = TU + 75° = 9h + 5h = 14h Qual a hora que marcamos no relógio? Essa pergunta procede, principalmente à medida que introduzimos cada vez mais sistemas de contagem do tempo. Resposta: a hora do relógio é a Hora Legal (HL). A Hora Legal é baseada no movimento do Sol Médio, mas obedece a várias conveniências geopolíticas. A hora solar média M varia continuamente com a longitude. Em outras palavras, a hora solar média no Rio de Janeiro é diferente da de São Paulo por alguns minutos, pois esta é a diferença de longitude entre os meridianos que passam pelas duas cidades. Não seria conveniente para o comércio, indústria, política, etc que os cariocas acordassem um pouco mais cedo, e começassem a e terminassem de trabalhar também um pouco mais cedo, simplesmente por que o Sol passa pelo seu meridiano astronômico alguns minutos antes do que pelo meridiano dos paulistas. Necessidades de se padronizar a hora em grandes regiões unidas econômica, cultural e politicamente levaram à definição de grandes faixas de longitude, chamadas de fusos horários (F), que compartilham de uma mesma hora legal. Pela convenção dos fusos horários, a superfície da Terra é dividida em 24 fusos, compreendendo um domínio de 15° de longitude cada. O primeiro fuso (F = 0h) é aquele cujo centro contém o meridiano de Greenwich (λ =  0º). Contrariamente ao que fazemos com a longitude, a oeste (leste) de Greenwich os fusos são contados negativamente (positivamente). Uma representação esquemática dos fusos horários é dada pela figura I.3.9. Nela vemos, em linhas tracejadas, o meridiano de Greenwich, correspondente ao fuso F = 0h. Na direção leste temos contados os fusos positivos, até F = +12h, junto à linha de mudança de data. A oeste, temos os fusos negativos, sendo que novamente F = –12h encontra-se imediatamente a leste da 61 linha internacional de mudança de data. São mostrados também na figura I.3.9 os valores de longitude dos meridianos centrais de cada fuso. Figura I.3.9 – Fusos horários e seus valores centrais de longitude. A maior parte da população brasileira está dentro do fuso F = –3h, cujo meridiano central é, portanto, o de longitude λ = 3h x 15°/h = +45°. O domínio de valores de longitude contidos neste fuso horário é 37,5° < λ < 52,5º. Já o primeiro fuso, cujo centro é o meridiano de Greenwich, contém o domínio –7,5° < λ < +7,5º. Qual a relação entre a hora legal, que marcamos no relógio, e a hora solar média M? Trata- se de uma relação muito simples, que apenas reflete a definição de hora legal como sendo a hora solar média no meridiano central de um fuso. Logo, M – HL = ∆M = – ∆λ M = HL – ∆λ onde ∆λ neste caso é simplesmente a diferença de longitude entre o meridiano do observador e o meridiano central do fuso horário em que este observador se situa. Considere o caso de um observador em Porto Alegre, cuja longitude é aproximadamente λPOA = 51° (lembre-se que estamos sempre considerando longitudes como positivas a oeste de Greenwich). Como vimos, o centro do fuso F = –3h corresponde a λ = 45°. Logo, ∆λ = 51° – 45° = 6°. Esta diferença positiva em longitude significa que Porto Alegre está a oeste do meridiano central do fuso F= –3. Assim, a hora solar média em Porto Alegre está atrasada com relação a este último: M = HL – 6° = HL – 24 min. 62 Se em um dado instante a hora legal no fuso de –3h é HL = 15h, sabemos que a hora solar média no meridiano de Porto Alegre é MPOA = 14h36min. O ângulo horário do Sol médio com relação a este meridiano será então HM,POA = MPOA – 12h = 2h36min. Qual a relação entre hora legal HL em um dado meridiano de longitude λ e o tempo universal ? Esta relação é igualmente simples: HL = TU + F onde F é o fuso onde se situa o meridiano de longitude λ. Também é fácil provar esta expressão, lembrando que a diferença HL – TU nada mais é do que a diferença de hora solar média entre dois meridianos centrais, um no fuso F (de longitude λc) e outro em Greenwich (λ = 0°). Logo: ∆Μ = HL – TU = 0° – λc = F Ou seja, no instante em que são 15h no fuso que contém a maior partes do território brasileiro (F = –3h), a hora universal será TU = HL – F = 15h + 3h = 18h. O tempo sideral também pode ser definido de mais de uma maneira. Veremos mais adiante que a posição do ponto γ não é rigorosamente fixa entre as estrelas, devido a vários efeitos seculares como a precessão e a nutação. Se considerarmos apenas a variação de posição do ponto vernal causada pela precessão, falamos em ponto vernal médio. Se incorporarmos os efeitos de nutação, teremos então o ponto vernal verdadeiro ou aparente. Assim, podemos falar de hora sideral média ou verdadeira. A diferença entre ambas é chamada de equação dos equinócios (q): q = SV – SM = HγV – HγM Tanto a hora solar quanto a sideral são exemplos de sistemas de medida de tempo baseados no movimento de rotação da Terra. São, portanto, chamados de sistemas rotacionais de medida de tempo. Mas existem maneiras de se contar o tempo que não dependem da posição de algum astro no céu com relação ao meridiano do observador. O tempo atômico, por exemplo, não é rotacional, já que é baseado nas transições atômicas de átomos de Césio 133. No intervalo de um segundo de tempo atômico ocorrem 9.192.631.770 transições de átomos de Ce133 entre dois níveis hiperfinos de sua energia interna. Essa é a definição mais moderna de 1s. Os sistemas rotacionais sofrem de algumas irregularidades, algumas delas previsíveis outras não. O movimento do pólo, por exemplo, afeta a longitude de qualquer ponto na superfície da Terra, o que se reflete no ângulo horário do Sol ou do ponto vernal (ver Capítulo 4). Além disso, a velocidade angular de rotação da Terra não é uniforme. Há uma lenta tendência de desaceleramento da rotação, causada pelo atrito da massa líquida do planeta, que tende a se alinhar com a Lua e o Sol devido às marés, com a parte sólida. Além disso, há variações sazonais, provavelmente causadas por mudanças meteorológicas, na rotação do planeta. Finalmente há componentes irregulares na variação da rotação, ainda não explicados de maneira satisfatória. 65 µ = 25,366 1 = 0,00273043359. O mesmo fator de conversão pode ser obtido lembrando que um dia sideral tem 24h siderais, mas apenas 23h 56min 04,090538s solares médios. Logo, temos a regra de proporcionalidade: η+=== ∆ ∆ 160027379092,1 04min5623 24 sh h M S onde: η = 0,00273790926. Note que é válida a relação: (1 + η)(1 – µ) = 1 Assim, se conhecemos a hora sideral em um dado meridiano em um determinado instante, S0, e desejamos conhecer a hora sideral S no mesmo meridiano decorrido um intervalo em hora solar igual a ∆Μ, teremos: MSSS M S ∆+=−=∆→+= ∆ ∆ )1(1 0 ηη S = S0 + (1 + η)∆Μ É comum, por exemplo, querermos conhecer a hora sideral S às M horas solares médias locais em um determinado meridiano de longitude λ. Sabemos que se são M horas solares médias locais a esta longitude, o tempo universal neste instante será TU = (M+λ) (como de hábito adotamos a convenção de que λ > 0º a oeste de Greenwich e λ < 0º a leste de Greenwich). Das efemérides (do ON ou do Astronomical Almanac, por exemplo) podemos ler a hora sideral S0 em Greenwich correspondente a TU = 0h para o dia em questão. Em unidades solares médias, ter-se-ão decorrido (M+λ) horas desde este instante. O intervalo em horas siderais correspondente será, portanto: ∆S = ∆Μ (1 + η) = (Μ + λ) (1 + η) A hora sideral em Greenwich, SG, no instante desejado será, portanto: SG = S0 + ∆S = S0 + (Μ+λ)(1+η) Mas queremos a hora sideral S no meridiano de longitude λ e não em Greenwich ( λ = 0°). Precisamos então subtrair a diferença em longitude: S = SG – λ = S0 + (Μ+λ)(1+η) − λ = S0 + (Μ+λ)η + Μ equação (1) A expressão acima nos dá exatamente o que queríamos: a hora sideral em um meridiano de longitude dada e no instante em que a hora solar média local é M. Como já mencionado, o valor de S0, a hora sideral em Greenwich (λ = 0°) à TU = 0h é listada, dia a dia no ano, no Anuário Astronômico do Observatório Nacional (ON) ou no Astronomical Almanac. 66 Tabela do Anuário Astronômico do Observatório Nacional Na figura I.3.11 vê-se que a primeira coluna da esquerda lista o mês e o dia do ano. A coluna seguinte lista o valor da hora sideral para λ = 0° (Greenwich) à TU = 0h, a que chamamos de S0. São mostradas tanto as horas siderais aparente quanto a média. A diferença entre as duas, chamada de equação dos equinócios é dada a seguir. Seguem-se então o valor da obliqüidade da eclíptica e os termos de nutação de longo e curto período, tanto perpendicular quanto ao longo da eclíptica (ver Capítulo 4). Figura I.3.11 – Tabela do Anuário Astronômico do Observatório Nacional Tabela do Astronomical Almanac Na figura I.3.12 vê-se que a primeira coluna da esquerda lista o mês e o dia do ano. A coluna seguinte lista a data Juliana. O valor da hora sideral para λ = 0° (Greenwich) à TU = 0h vem em seguida. São mostradas tanto as horas siderais aparente quanto a média. A diferença entre as 67 duas, chamada de equação dos equinócios é dada a seguir. O valor de hora universal no instante em que o equinócio médio cruza o meridiano de Greenwich a cada dia é listado na última coluna à direita. Figura I.3.12 – Tabela do Astronomical Almanac. A fórmula acima é bastante geral. Suponha que queiramos simplesmente a hora sideral em Greenwich a uma hora solar média local M. Como se trata do meridiano de Greenwich, a hora solar média local é também a hora universal: TU = M. Além disso, λ = 0h. Logo, a hora sideral desejada será: S = S0 + M(1+η) onde S0 é a hora sideral em Greenwich à 0h TU (que pode ser encontrada em Efemérides) e η = 0,00273790926. Outro exemplo: provar que a hora sideral S em um meridiano de longitude λ à M = 0h solar média local é dada por: 70 Na verdade, de acordo com esta definição, o gráfico acima representa –E, pois quando o Sol verdadeiro cruza o meridiano mais cedo (antes do meio-dia, M=12h), sabemos que Hsol ver > Hsol med. A segunda igualdade acima resulta do fato de que a hora sideral pode ser expressa tanto com o Sol Médio quanto com o Verdadeiro: S = Hsol ver + αsol ver = H solmed + αsol med. Os valores de E também podem ser encontrados nas efemérides astronômicas: Tabela do Anuário Astronômico do ON contendo os valores da Equação do Tempo Na Figura I.3.14, a primeira coluna lista o mês e o dia do ano. Seguem-se a ascensão reta e declinação do Sol verdadeiro, sua distância à Terra e seu raio angular. A equação do tempo é dada indiretamente pela última coluna, a qual lista a hora solar média (TU) em que o Sol verdadeiro cruza o meridiano de Greenwich (λ = 0º). O valor de E para este instante, portanto, será a diferença entre o valor listado e 12h. Figura I.3.14 – Tabela do Anuário Astronômico do ON contendo os valores da Equação do Tempo. 71 Tabela do Astronomical Almanac contendo os valores da Equação do Tempo Na Figura I.3.15, a primeira coluna lista o mês e o dia do ano. A penúltima coluna lista o raio angular do Sol. A equação do tempo é dada indiretamente pela última coluna, a qual lista a hora solar média (TU) em que o Sol verdadeiro cruza o meridiano de Greenwich (λ = 0°). O valor de E para este instante, portanto, será a diferença entre o valor listado e 12h. Figura I.3.15 – Tabela do Astronomical Almanac contendo os valores da Equação do Tempo. 72 Equação do Centro Além do Sol Médio, os astrônomos conceberam um outro sol imaginário, o Sol Fictício. O Sol Fictício percorre a eclíptica, assim como o Sol Verdadeiro. A diferença é o que o primeiro o faz a velocidade angular constante. Se os dois partem juntos do periélio (que atualmente ocorre em torno do dia 04/01), o Sol Verdadeiro inicialmente terá uma dianteira, já que no periélio sua velocidade é máxima. Assim, entre o periélio e o afélio (que ocorre no início de julho), o Sol Verdadeiro percorre a eclíptica à frente do Sol Fictício. Este intervalo de tempo inclui a passagem pelo ponto γ, em março. Os dois sóis chegam juntos ao afélio e, a partir daí e até o próximo periélio, o Sol Fictício caminha na frente, já que no afélio a velocidade do Sol Verdadeiro é mínima. A situação é representada na figura I.3.16. Nela Sf e Sv representam as posições do Sol Fictício e do Verdadeiro, respectivamente. P' e A' são os pontos da órbita da Terra correspondentes ao periélio e ao afélio. Os pontos marcados por β, representam os solstícios de dezembro e de junho. Define-se como equação do centro (U) a diferença entre as longitudes eclípticas do Sol Verdadeiro e do Sol Fictício: U = λsol ver – λsol fic Figura I.3.16 – Progressão do Sol verdadeiro e do Sol fictício ao longo da eclíptica durante o ano. Assim, λsol ver > λsol fic entre o periélio e o afélio (de janeiro a julho) e λsol ver < λsol fic entre afélio e o periélio (de julho a janeiro). Redução ao Equador Outra definição importante é a chamada redução ao equador (Q). Esta é definida como a diferença entre a ascensão reta do Sol Verdadeiro e sua longitude eclíptica. Q = αsol ver – λsol ver 75 sempre perpendicular ao eixo de rotação e este muda sua orientação constantemente, a posição do Ponto vernal no céu também muda com relação às estrelas. Na prática, as coordenadas celestes estão amarradas a objetos observáveis, pois é muito difícil determinar observacionalmente a posição do ponto vernal e, por conseguinte, a posição de qualquer astro no céu relativamente a este último. Assim sendo, o sistema de coordenadas associadas à época 1950 é definido a partir de posições de estrelas publicadas no quarto Catálogo Fundamental, o FK4, enquanto que o sistema de 2000 é baseado no quinto Catálogo Fundamental, o FK5. Estes catálogos listam estrelas que, em sua maioria, são próximas, de forma que quaisquer sistemas de coordenadas definidas a partir das posições destas estrelas estão sujeito a erros causados pelos movimentos dessas estrelas na esfera celeste (movimentos próprios, ver próximas seções). Atualmente sabemos que o equinócio obtido a partir do FK4 se desloca com relação ao do FK5 por 0,085” por século. Atualmente, a definição mais estável de coordenadas para a época 2000 é baseada em 608 rádio-fontes extragalácticas que compõem o International Celestial Reference Frame (ICRF). Este sistema de referência é extremamente estável, deslocando-se a menos de 0,020” por século. O ICRF se tornou o sistema de referência fundamental adotado pela União Astronômica Internacional (IAU) em 01/1998. Por motivos que são em parte históricos e em parte práticos, a variabilidade temporal da direção do eixo de rotação da Terra e da posição de um observador na superfície da Terra com relação a ele é dividido em 4 fatores: precessão, nutação, deslocamento do pólo celeste e deslocamento do pólo. Por definição, precessão e nutação são expressas matematicamente, usando- se equações matemáticas apropriadas. Os outros dois fatores de variabilidade são desvios observados (ou seja, medidos) com relação ao esperado pelas fórmulas matemáticas que descrevem os dois primeiros. Assim sendo, a amplitude destes dois últimos não é previsível para períodos muito longos. Todos os 4 componentes de variabilidade são discutidos com mais detalhe abaixo. Precessão Nem o plano orbital da Terra, cuja intersecção com o céu define a eclíptica, nem o plano do equador terrestre são fixos com relação a objetos muito distantes, como as fontes extragalácticas do ICRF. O principal movimento é a precessão do eixo de rotação em torno da normal ao plano da órbita (pólo eclíptico). Este movimento de precessão é causado por torques gravitacionais devidos à Lua e ao Sol e é chamado de precessão luni-solar. O eixo de rotação da Terra varre um cone no espaço de ângulo de vértice igual a 23,5° uma vez a cada 26.000 anos. Há ainda a precessão planetária, causada pelas perturbações gravitacionais combinadas dos outros planetas do Sistema Solar. Esta causa uma mudança no plano da órbita da Terra. O pólo 76 eclíptico, contudo, se move bem mais lentamente. Se imaginarmos seu movimento com relação às fontes extragalácticas, o eixo de rotação muda de posição a uma taxa de 20” por ano, enquanto que a normal ao plano da órbita varre apenas 0,5” no céu. Ambos os movimentos combinados formam o que chamamos de precessão geral. Há desvios com relação à precessão geral, de curto período, que também são previsíveis e expressos por fórmulas matemáticas, aos quais chamamos de nutação, que será discutida na próxima seção. Equações para o efeito da precessão, de precisão da ordem de 1”, sobre as coordenadas equatoriais são dadas abaixo. Elas se aplicam para qualquer data dentro de um intervalo de uns 20 anos, centrado no ano 2000. )cos(αδ n t = ∂ ∂ )δαα ()(. tansennm t += ∂ ∂ onde m = 3,07419 s/ano e n = 20,0383”/ano ou 1,33589s/ano. Estes valores, como já mencionado, são válidos por uns 20 anos, centrados no ano 2000. A variação das coordenadas ascensão reta (α) e declinação (δ) são expressas em segundos de tempo e segundos de arco, respectivamente. As fórmulas, como as acima, para calcular as correções sobre as coordenadas equatoriais de um astro em diferentes épocas e para intervalos de tempo, são dadas pelo Astronomical Almanac. Essas fórmulas são muito úteis, pois os catálogos astronômicos geralmente listam as coordenadas das estrelas para uma época arredondada, como 1950,0 ou 2000,0. Se quisermos localizar com precisão um objeto no céu em uma época arbitrária, teremos necessariamente que corrigir as coordenadas catalogadas para a precessão. Vemos pelas fórmulas acima que a precessão do eixo é muito lenta. De maneira aproximada, a variação de α é da ordem de 3s por ano e a de δ de uns 20” por ano. A figura I.4.1 mostra a variação da posição dos pólos celestes devida à precessão. O painel da esquerda mostra a situação no presente, em que o pólo norte celeste coincide aproximadamente com a estrela Polaris. Daqui a milhares de anos, o pólo celeste coincidirá aproximadamente com a estrela Vega (painel da direita). 77 Figura I.4.1 – Precessão do eixo de rotação terrestre em torno da normal à eclíptica. Segue um exemplo de como calcular as correções para o efeito da precessão usando a fórmula dada acima e que repetimos abaixo: )cos(αδ n t = ∂ ∂ )δαα ()(. tansennm t += ∂ ∂ Computemos a precessão do núcleo da Galáxia de Andrômeda durante 10 anos, conhecidas suas coordenadas equatoriais no ano 2000. α(2000) = 0h 42min 44,32s; δ(2000) = +41° 16’ 08,5” O primeiro passo é converter ambas para graus decimais: 3600 32,44 60 42 0 ++=α º68467,10)71231,0(15 ==α 269028,41 3600 5,8 60 16 41 =++=δ Cálculo da precessão: "91,16'3"9088,19610).68467,10cos(."0383,20 / ===∂ anos anoδ ssenanosanosanos 915,32)]269028,41tan()68476,10(33589,107419,3[10 // =+=∂α Para computar as coordenadas para o ano 2010, essas correções devem ser adicionadas às coordenadas do ano 2000. Nutação Movimentos previsíveis do eixo de rotação terrestre em escalas de tempo (períodos) de 300 anos ou menos são combinados para formar o que chamamos de nutação. Esta pode ser tomada como uma correção de primeira ordem à precessão. De acordo com o modelo de nutação mais atual, este efeito é composto de 106 termos harmônicos envolvendo senos e co-senos com diferentes freqüências, em sua maioria efeitos secundários de torque gravitacional do Sol e da Lua, mais 85 correções devidas a efeitos planetários. Os principais termos de nutação são: um termo de período igual a 18,6 anos (período de precessão da órbita da Lua), um termo de 182,6 dias (meio ano), um outro de 13,7 dias (meio mês) e um de 9,3 anos (período de rotação do perigeu lunar). As correções para nutação dadas abaixo têm uma precisão da ordem de 1”: ∆α = [cos(ε) + sen(ε)sen(α)tan(δ)]dλ – cos(α)tan(δ)dε ∆δ = sen(ε)cos(α)dλ + sen(α)dε 80 Figura I.4.3 – Tabela do Apparent Places of Stars. Para ajudar a visualizar em separado os efeitos da precessão e da nutação podemos fazer uso da figura I.4.4. Nela, vemos a posição da Terra (T), a direção do pólo da eclíptica (PE), e a direção do pólo celeste (PC), ou seja, do eixo de rotação em duas épocas diferentes. A variação no espaço da direção do eixo de rotação da Terra sem alterar-se a obliqüidade da eclíptica é a precessão luni- solar, representada pelo cone maior da figura. Superposto a este há um cone menor, que representa a variação ondular do eixo causada pela nutação. 81 Figura I.4.4 – Cones descritos pelo eixo de rotação da Terra devido à precessão e à nutação. Deslocamento do Pólo Celeste Este efeito é a parte imprevisível da nutação. Os valores desse efeito são publicados pelo IERS Bulletin A com componentes em separado em longitude (dλ) e obliqüidade (dε). Movimento do Pólo Devido a movimentos internos e deformações na forma da Terra, uma linha que interliga as posições de diferentes observadores na sua superfície não é fixa com relação ao eixo de rotação. A variação na posição relativa de um observador com relação a este eixo é o que chamamos de movimento do pólo. Para um observador qualquer, este movimento tem o efeito de mudar sua latitude e sua longitude, que por seu turno é necessária nas transformações de coordenadas terrestres para celestes. O International Earth Rotation Service (IERS) define um sistema de referência terrestre baseado em um eixo de referência, chamado de IERS Reference Pole (IRP). As fórmulas abaixo nos dão a variação de latitude, longitude e do azimute de uma mira em função dos valores médios das próprias coordenadas (φmed, λmed) e das coordenadas desse pólo médio expressas em um sistema cartesiano, (x,y). ∆φ = φmed − φobs = xcos(λ) + ysen(λ) ∆λ = λmed − λobs = −[xsen(λ) + ycos(λ)] tan(φ) ∆Α = Αmed − Αobs = −[xsen(λ) + ysen(λ)] sec(φ) O componente dominante do movimento do pólo, chamado de oscilação de Chandler, é um movimento aproximadamente circular do pólo de referência em torno do pólo celeste, de amplitude de cerca de 0,7” e um período de uns 14 meses aproximadamente. Irregularidades em escalas de tempo mais curtas e também mais longas, devidas a movimentos no interior do planeta, são imprevisíveis e tem que ser monitoradas por observações. A soma do componente de Chandler com 82 os componentes irregulares são publicados semanalmente no IERS Bulletin A, juntamente com previsões para vários meses de antecipação. Astrometria Nas seções anteriores, tratamos de algumas perturbações na posição de um astro, tais como as devidas à precessão, à nutação e ao movimento do pólo. Estas perturbações se devem a variações na orientação do sistema de coordenadas equatoriais como um todo. Vimos que a maior parte destes efeitos pode ser explicada por modelos de perturbação gravitacional exercida sobre a Terra pelo Sol, pela Lua e pelos planetas do Sistema Solar. Em outras palavras, podemos descrever de forma matemática a mudança sistemática das coordenadas equatoriais de uma estrela qualquer devido à precessão, à nutação, etc. Nestas próximas seções veremos alguns outros efeitos que afetam a posição de um objeto no céu. São eles: aberração, paralaxe, refração e movimento próprio. Todos são conceitualmente simples e também podem ser quantificados por expressões matemáticas. Uma diferença importante com relação aos efeitos já discutidos é que as variações causadas na posição de um astro agora não resultam da mudança na orientação do sistema equatorial de coordenadas como um todo no espaço, mas sim de efeitos físicos associados aos próprios objetos ou à luz que eles emitem. Estes efeitos são também, em geral, de menor amplitude do que os anteriores, em especial se comparados à precessão, tendo sido medidos e adequadamente descritos somente a partir do século XIX. Isso porque, como já dissemos, medidas astrométricas evoluíram muito nos últimos tempos, sendo este um assunto da Astrometria. • Há um século atrás, praticava-se a Astronomia de Posição com um instrumento que só se movia ao longo do meridiano astronômico do local, o círculo meridiano. • Satélites no espaço estão começando a fazer medidas com muito mais precisão do que as feitas em solo, sob a turbulenta atmosfera da Terra. A figura I.4.5 mostra a evolução da precisão das medidas astrométricas ao longo da História. A linha do tempo flui da esquerda para a direita, desde a época do astrônomo grego Hiparco (século II AC) até a época do Satélite Astrométrico Hipparcos (época atual). Na parte inferior da figura, vemos o menor ângulo que o homem era capaz de medir em cada época. Este ângulo, além de indicado explicitamente, é também representado pela máxima distância a que uma pessoa de estatura mediana (em torno de 1,7m) poderia estar de forma que tamanho angular pudesse ser medido com os instrumentos da época. Assim, na Grécia antiga medidas angulares se limitavam a 1° de precisão, o que corresponde à abertura angular subentendida por uma pessoa a 100m de distância do observador. 85 No caso da aberração anual, o deslocamento aparente na posição de uma estrela é devido ao movimento orbital da Terra em torno do Sol. A fórmula que nos dá o valor do deslocamento aparente é a mesma que antes. O que muda é o valor da velocidade v. A velocidade orbital da Terra varia ao longo do ano, pois a órbita é uma elipse. Um valor médio neste caso seria v = 30 km/s. Aplicando-se a expressão para o efeito da aberração, tem-se então α = 20,6”. Nota-se, portanto, que a aberração anual é maior do que a aberração diurna por quase duas ordens de grandeza. Assim, a aberração anual é mais relevante, sendo imprescindível a correção da posição de uma estrela para este efeito, se estamos interessados em determinações astronômicas de precisão da ordem de 1”. Note ainda que o efeito da aberração da luz, tanto diurna quanto anual, é periódico, repetindo-se em escalas de tempo de 1 dia e 1 ano, respectivamente. Refração A direção de propagação da luz sofre um desvio ao atravessar a atmosfera terrestre. Este efeito é cromático, ou seja, varia com o comprimento de onda da luz; ele é mais pronunciado para luz azul do que para luz vermelha. O efeito sempre faz com que a altura (h) observada de um objeto no céu seja maior do que ela realmente é. Um exemplo de refração ocorre com o Sol todos os dias. Quando o vemos se por no horizonte, ele na verdade já está fisicamente abaixo deste último. Mas sua imagem refratada pela atmosfera se projeta acima do horizonte. Em outras palavras, a refração neste caso é da ordem de 35’, aproximadamente, o diâmetro angular do Sol no céu, visto da Terra. A figura I.4.8 mostra o efeito da refração sofrida pela luz de um objeto ao incidir na atmosfera da Terra, fazendo com que sua distância zenital observada seja menor do que a verdadeira (ou aparente). Figura I.4.8 – Efeito da refração da luz pela atmosfera. A luz sofre um desvio em seu caminho ao entrar na atmosfera, fazendo com que a distância zenital medida seja menor do que a verdadeira. A figura I.4.9 é semelhante à anterior, mas mostra a situação específica do Sol quando visto no horizonte de um observador. O observador se situa no ponto P sobre a superfície da Terra. Ele vê 86 a imagem refratada do Sol no seu horizonte, na direção PO’. Mas, na verdade, o Sol já está fisicamente abaixo do horizonte de P, na direção dada pelo segmento OP, que faz um ângulo Rm (refração média) com PO’. Devido ao efeito da refração, os raios do Sol que se propagam ao longo da direção OP, ao encontrarem a atmosfera da Terra em P’, desviam-se continuamente até atingir o observador em P. Figura I.4.9 – Refração sofrida pela luz do Sol quando este está nascendo ou se pondo. O Sol é visto por uns 2 minutos, mesmo estando fisicamente abaixo do horizonte. Como já mencionado, o por do Sol visto por um observador ocorre quando o primeiro se encontra fisicamente 35’ abaixo do horizonte segundo. O desvio na posição do objeto é, portanto, maior do que 0,5°. O valor do desvio causado pela refração depende da altura verdadeira do objeto, sendo uma função decrescente da mesma. Isso é mostrado na figura I.4.10, onde vemos o valor do desvio no eixo vertical e o valor da altura verdadeira no eixo horizontal Figura I.4.10 – Variação do efeito médio de refração em função da altura do objeto. Valores médios de refração também podem ser encontrados nas efemérides. Tabela do Anuário Astronômico do ON com valores de refração média para diferentes distâncias zenitais Na Figura I.4.11, a coluna da esquerda são dados valores de distância zenital, na do meio o valor correspondente de Rm e na da direita a diferença em Rm para um intervalo de 10’ em torno do valor de z dado. 87 Figura I.4.11 – Tabela do Anuário Astronômico do ON com valores de refração média para diferentes distâncias zenitais. Note que além de variar com a freqüência da luz e com a altura, a refração também depende da densidade do ar (variando, portanto com a altitude do observador) e das condições atmosféricas, como a temperatura e a pressão. Em geral, a refração média é aquela esperada em condições padrão, em que estas variáveis termodinâmicas têm valores específicos. Fatores de correção a serem aplicados à refração Rm também são tabelados no Anuário Astronômico do ON. Tabela do Anuário Astronômico do ON com os fatores de correção de Rm para T e P Na Figura I.4.12, a coluna à esquerda temos listados os valores de temperatura (t) e na primeira linha no alto valores da pressão (em mm de Hg). O miolo da tabela contém os valores dos fatores de correção a serem multiplicados por Rm. 90 de base usada para medi-lo. E, mantida a linha de base, o paralaxe decresce com a distância ao objeto. Uma unidade de distância bem maior do que a unidade astronômica, o parsec (pc), é definida como a distância à qual um segmento de reta de 1 UA (o sistema Terra-Sol, por exemplo) cobre um ângulo de 1” no céu. Novamente podemos exprimir o parsec usando unidades mais mundanas: 1 pc = 3,086x1013 km. Note que a definição do parsec está intimamente ligada ao conceito de paralaxe heliocêntrico, pois 1 pc na verdade é a distância à qual está um objeto cujo paralaxe heliocêntrico é π = 1”. O próprio nome parsec representa abreviação das palavras paralaxe e segundo. A partir do parsec podem-se definir unidades ainda maiores de distância, como o kiloparsec (1 kpc = 103 pc) ou o megaparsec (1 Mpc = 106 pc). Estas são também usadas em Astronomia, principalmente em Astronomia Galáctica e Extragaláctica. O ano-luz (AL), a distância percorrida pela luz em um ano, às vezes é usada, principalmente em divulgação astronômica. Mas raramente se vê distâncias expressas em anos-luz em trabalhos profissionais da área. 1 AL = 9,46x1012 km ~ 1/3 parsec. Na figura I.4.15 vemos representado o efeito de paralaxe heliocêntrico. Analogamente ao paralaxe horizontal, o paralaxe heliocêntrico é o deslocamento angular de uma estrela com relação às outras ao fundo, quando a posição desta é anotada de dois pontos da órbita da Terra diametralmente opostos. Figura I.4.15 – Representação do paralaxe π de uma estrela (E) em função da distância Terra–Sol (1 UA) e da distância à estrela. Representando novamente o paralaxe heliocêntrico por π, vemos que existe uma expressão bem simples relacionando-o com a distância à estrela. tan(π) = 1 d UA Como para ângulos pequenos (<< 1 rad) a tangente é numericamente igual ao próprio ângulo expresso em radianos, temos que: 91 tan(π) = π (rad) = 1 d UA . Como antecipado, a definição de paralaxe dada acima usa como linha de base o diâmetro da órbita da Terra em torno do Sol. Se usarmos a definição de parsec, a expressão acima se simplifica ainda mais: p (seg. arco) = d 1 (pc) Vale notar que o valor de π acima representa o deslocamento da estrela quando observada em dois dias do ano separados por 6 meses. De um dia para o outro o deslocamento na posição de um astro devido ao movimento orbital da Terra é muito menor. Na verdade, como esta última descreve uma elipse em torno do Sol, o reflexo deste movimento na posição de estrelas próximas será também uma elipse cujo eixo maior é dado por 2π. A posição da estrela, portanto, varia continuamente e com periodicidade de um ano. Movimentos Próprios Embora as estrelas pareçam estar fixas no céu, elas na verdade se movem no espaço com velocidades altas, da ordem de dezenas ou centenas de km/s. Suas distâncias gigantescas fazem com que estes movimentos sejam quase imperceptíveis a um observador na Terra. O movimento aparente das estrelas no céu, reflexo de seu movimento no espaço, embora pequeno, é mensurável. A ele chamamos de movimento próprio e o representamos pela letra grega µ. Para melhor entendermos o que é o movimento próprio, consideremos a figura I.4.16. Nela temos representado as posições de um observador em O e de uma estrela em E. Também está representado, por uma seta, o vetor velocidade espacial da estrela (V). O comprimento da seta é uma medida do módulo da velocidade, sendo que a seta aponta a direção de movimento da estrela. Este movimento é devido ao campo gravitacional interno da nossa Galáxia, a Via-Láctea, que impõe a cada estrela ou objeto a ela pertencente uma aceleração e uma velocidade resultantes. Figura I.4.16 – Decomposição do movimento espacial de uma estrela em seus componentes radial e tangencial. 92 A velocidade da estrela, conforme mostrado na figura, pode ser então decomposta em um componente ao longo da linha de visada, a velocidade radial (Vr) e um componente perpendicular à linha de visada, a velocidade tangencial ou transversal (Vt) Ambos os componentes são mensuráveis e muito importantes para se determinar a forma como as estrelas se movem no interior da Galáxia e, a partir daí, estudar a dinâmica da Via-Láctea e mesmo determinar sua massa. O componente radial da velocidade leva a uma alteração na distância que separa o observador da estrela. Vr pode ser medido pelo Efeito Doppler, pelo qual a freqüência das ondas de luz aumenta (diminui) quando a fonte que as emite se aproxima (afasta) do observador. Note que este componente, não leva a uma mudança na direção no espaço na qual se encontra a fonte. Assim, o componente mais relevante para a Astronomia de Posição é o tangencial, que dividido pela distância à fonte, resulta na velocidade angular com que esta se desloca na esfera celeste. Ou seja, o movimento próprio pode ser matematicamente expresso como µ = Vt / R . Figura I.4.17 – Dependência do movimento próprio com a distância: objetos mais distantes têm valores menores de µ se fixada a velocidade tangencial. As estrelas mais próximas apresentam em geral movimentos próprios maiores. A figura I.4.17 reflete este fato. Para uma mesma velocidade tangencial, o movimento próprio será tanto maior quanto mais próxima estiver a estrela. Naturalmente isso também pode ser entendido matematicamente, levando-se em conta a fórmula para µ dada acima. A estrela com maior movimento próprio é a estrela de Barnard. Ela se desloca no céu por um ângulo de 10” a cada ano. Trata-se também de uma das estrelas mais vizinhas ao Sistema Solar. Somente algumas estrelas possuem movimentos próprios maiores do que 1” ao ano. Assim, a forma das constelações que as estrelas delineiam no céu pouco se altera com o tempo. No diagrama abaixo (figura I.4.18) vemos a forma de uma constelação boreal, a Ursa Maior, no presente (parte superior) e daqui a 10.000 anos. 95 a = n m + sen(α) tan(δ) b = cos(α)tan(δ) c = cos(α)sec(δ) d = sen(α)sec(δ) a’ = cos(α) b’ = – sen(α) c’ = tan(α)cos(δ) − sen(δ)sen(α) d’ = cos(α)sen(δ) Os números Besselianos variam com o dia do ano e são tabelados no Astronomical Almanac. Tabela do Astronomical Almanac com os números Besselianos Na Figura I.4.19, a data (dia e mês) é dada na 1ª coluna. Os termos de correção para nutação (dε e dλ) são listados em seguida. A obliqüidade da eclíptica é dada na 4ª coluna e os números Besselianos A, B, C, D, e E se seguem. Finalmente, a última coluna lista a fração do ano decorrida com relação ao equinócio médio. 96 Figura I.4.19 – Tabela do Astronomical Almanac com os números Besselianos. Tabela com valores dos números Besselianos de 2ª ordem Na Figura I.4.20, os valores de J (ou J’) são dados no miolo da tabela. Dia e mês são listados na 1ª coluna, à esquerda, em intervalos de 10 dias. A hora do dia é dada na 1a linha. As unidades em que são expressos os valores e a expressão em que eles entram são dados no final da tabela. 97 Figura I.4.20 – Tabela com valores dos números Besselianos de 2ª ordem. As fórmulas acima incorporam apenas correções para precessão residual, nutação e aberração anual. Os coeficientes m e n no cálculo de a são aqueles que entram na correção da ascensão reta para precessão, dada no início deste capítulo; seus valores são m = 3,075 s/ano e n = 1,336 s/ano. Já ε na expressão para c’ acima é o valor da obliqüidade da eclíptica. O componente de paralaxe é dado pela fórmula: ∆α = πXd – πYc ∆δ = πXd’ – πYc’ onde X e Y são coordenadas cartesianas da Terra com origem no Baricentro do Sistema Solar e π é o paralaxe heliocêntrico da estrela. Obviamente, à medida que a Terra órbita em torno do Sol, X e Y variam; assim seus valores são também listados diariamente pelo Astronomical Almanac.
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