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[0] Ponto dos Concursos - Direito Constitucional - Vicente Paulo, Provas de Direito Constitucional

Direito Constitucional

Tipologia: Provas

2010

Compartilhado em 05/09/2010

daiana-machado-8
daiana-machado-8 🇧🇷

4.6

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Baixe [0] Ponto dos Concursos - Direito Constitucional - Vicente Paulo e outras Provas em PDF para Direito Constitucional, somente na Docsity! CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br AULA 0: APLICABILIDADE DE UMA NOVA CONSTITUIÇÃO Bem, na aula de hoje, trataremos de um assunto de suma importância para o estudo do Direito Constitucional para o fim de concurso público, não só por ser ele muito cobrado pelas bancas examinadoras, mas, também, por ser requisito indispensável para o entendimento de outros tópicos da disciplina, especialmente para a compreensão do tópico controle de constitucionalidade das leis. A questão discutida será, basicamente, a seguinte: o que acontece num dado ordenamento jurídico quando é promulgada uma nova constituição? O que acontece com a constituição pretérita? O que acontece com todas as demais leis antigas, editadas na vigência de constituições pretéritas? O que acontece com os contratos em andamento no momento da promulgação da nova constituição? Será que estes contratos serão afetados pela nova constituição, caso esta traga alguma nova disposição sobre a matéria neles pactuada? Ou será que a nova constituição só terá aplicação aos futuros contratos, pactuados a partir de sua entrada em vigor? Essas são apenas algumas das dúvidas que podem surgir no momento em que é promulgada a nova constituição de um dado País. Antes de começarmos efetivamente a examinar todas essas questões, uma sugestão de amigo, de quem se sente concursando até hoje, depois de oito anos de estrada na preparação de candidatos (a única distinção entre mim e vocês é que eu já ralei mais, devo ter estudado um pouco mais, só isso!), e, especialmente, de quem já estudou muito Direito na vida, sem possuir formação jurídica, sem ser bacharel em Direito. Digo sempre em sala de aula que a maior dificuldade que os candidatos têm no estudo do Direito Constitucional é que eles não conseguem trazer os assuntos ministrados nas aulas para o cotidiano, para o dia a dia; ficam estudando tópicos e mais tópicos do Direito Constitucional em abstrato, como se eles fossem uma nuvem, muito longe do alcance; aprendem tudo sobre ADIN, sobre princípio da razoabilidade etc., memorizam que a decisão proferida em ADIN é dotada de efeitos ex tunc e vinculantes, mas não se preocupam em saber, em imaginar, de fato, o que isso significa, ou que poderá significar no nosso dia a dia; moral da história: chega o dia da prova, o examinador muda um pouquinho a maneira de cobrar a matéria, ou cobra a aplicação dos conceitos numa situação hipotética, e pronto, todos aqueles conceitos memorizados não servirão para nada, para absolutamente nada... Então, vamos começar da maneira correta: tentem trazer os assuntos que serão por nós estudados para o dia a dia, para o seu cotidiano, mesmo você não sendo bacharel em Direito isso não será difícil, pois, na verdade, todos esses assuntos jurídicos poderão nos afetar amanhã ou depois; ao estudar mandado de segurança, pense que amanhã você poderá necessitar ajuizar essa ação em seu favor, contra uma ilegalidade praticada na realização de um concurso público, e até para conversar com o advogado será interessante você conhecer um pouco do assunto; ao estudar ADIN, pense que amanhã ou CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br depois você poderá ser beneficiado (ou prejudicado) por uma decisão do STF nessa espécie de ação, mesmo você não tendo tomado nenhuma iniciativa, mesmo você não tendo autorizado ninguém a ajuizar a ação em seu nome (agora mesmo, nesses dias - maio de 2004 -, o STF começou a apreciar duas ADIN contra a cobrança da contribuição previdenciária dos servidores públicos inativos e dos pensionistas, criada pela Emenda Constitucional nº 41/2003, e a decisão do STF provavelmente afetará o nosso futuro enquanto servidores públicos ou pensionistas); ora, não vamos mais ficar estudando Direito Constitucional como “aquela nuvem que passa, ao longe”, senão no dia da prova você também voará, como a nuvem... Nesse assunto de hoje, vamos pensar assim: o que aconteceu no Brasil em 05/10/1988, data em que foi promulgada a vigente Constituição Federal? O que aconteceu com a Constituição pretérita, de 1969? O que aconteceu com o Código Penal, com o Código Civil, com o Código Comercial antigos? Enfim, o que aconteceu com todas as espécies normativas editadas em data anterior à 05/10/1988, sob a vigência de constituições pretéritas? Ou, se você for futurista, pode também pensar assim: o que acontecerá com a atual Constituição de 1988 e com todas as demais leis hoje existentes se no ano de 2006 for promulgada uma nova constituição no Brasil? Bem, vamos então analisar todas essas situações, começando com o confronto entre a constituição nova e a constituição pretérita. 1) CONSTITUIÇÃO NOVA (X) CONSTITUIÇÃO ANTIGA O confronto entre constituição nova e a constituição pretérita não oferece maiores problemas, o entendimento é simplório: a nova constituição revoga integralmente a constituição antiga, independentemente da compatibilidade entre os seus dispositivos. Muito fácil: promulgada a nova constituição, a antiga é retirada do ordenamento jurídico, globalmente, ainda que supostamente haja compatibilidade entre os seus dispositivos, ainda que não haja conflito entre os dispositivos das duas constituições. A revogação é completa, global. Não vamos nem perder tempo analisando se os artigos da constituição antiga são compatíveis (ou não) com a nova constituição; promulgada a nova, a antiga é retirada integralmente do ordenamento jurídico. Super tranqüilo, não? Nada mais cristalino: promulgada uma nova constituição, fica automaticamente revogada a constituição antiga. Essa a posição dominante no nosso País, e que é adotada, sem maiores discussões, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), órgão do Poder Judiciário que dispõe da competência para ditar a última palavra quando o assunto é Direito Constitucional. Entretanto (e é melhor vocês irem acostumando com isso, infelizmente Direito não é como matemática, em que 2 + 2 são sempre 4!), nem toda a doutrina aceita essa posição, há uma corrente doutrinária minoritária que defende, no confronto entre constituição nova e constituição pretérita, a aplicação da “tese da desconstitucionalização”, explicada a seguir. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br sentido contrário. A lei “K” não seria revogada pela constituição “Y”; a lei “K” tornar-se-ia inconstitucional frente à constituição “Y”. Porém, essa tese – ocorrência da inconstitucionalidade superveniente – não é aceita pelo Supremo Tribunal Federal, para o qual teremos na situação descrita uma mera revogação da lei “K” pela constituição “Y”. Para o STF, não se pode falar em inconstitucionalidade nessa situação (confronto de uma lei antiga com uma nova constituição), porque “o juízo de constitucionalidade pressupõe contemporaneidade entre a lei e a constituição, isto é, pressupõe lei e constituição de uma mesma época”. Assim, uma lei só poderá ser considerada inconstitucional em confronto com a constituição de sua época, em vigor no momento de sua publicação; não poderá uma lei ser considerada inconstitucional em confronto com uma constituição futura, pelo seguinte fundamento: inconstitucionalidade nada mais é do que um desrespeito à constituição, e o legislador, ao editar a lei “K”, não tinha como desrespeitar a constituição “Y”, pela razão óbvia de que ela ainda não existia. Portanto, fixe o seguinte: (a) uma lei só poderá ser considerada inconstitucional (ou constitucional) em confronto com a constituição de sua época; (b) o confronto entre uma lei e constituição futura não se resolve pelo juízo de constitucionalidade, mas sim pela revogação (se a lei pretérita for incompatível com a nova constituição) ou pela recepção (se a lei pretérita for compatível com a nova constituição). 2.2) NOVA CONSTITUIÇÃO (X) DIREITO ORDINÁRIO ANTERIOR COMPATÍVEL Se as leis antigas forem compatíveis com a nova constituição, se não entrarem em conflito com o texto e princípios da nova constituição, serão recepcionadas por esta, ganharão nova vida no ordenamento constitucional que se inicia. Pelo até aqui estudado, podemos concluir o seguinte a respeito do confronto entre o direito pré-constitucional e a nova constituição: (a) no caso de compatibilidade, será ele recepcionado pela nova constituição; (b) no caso de incompatibilidade, será ele revogado pela nova constituição. Resta-nos avaliar, ainda, como se dá, efetivamente, esse confronto, como se chega a uma conclusão a respeito dessa compatibilidade ou incompatibilidade. Estudaremos esses pontos a partir da elaboração de respostas a algumas relevantes indagações. Pergunta 1: Quais os critérios são levados em conta, quais os aspectos são considerados e quais são desconsiderados nesse confronto entre norma antiga e a nova constituição? O que se leva em conta para se chegar à conclusão de que uma norma pré-constitucional é compatível ou incompatível com a nova constituição? Resposta: No confronto entre norma antiga e uma nova constituição, só se leva em conta a denominada “compatibilidade material”, isto é, o conteúdo da norma. Se o conteúdo da norma antiga for compatível com a nova constituição, será ela recepcionada; se o conteúdo da norma antiga for incompatível com a nova constituição, será ela revogada. Enfim: no caso de CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br compatibilidade material, teremos recepção; no caso de incompatibilidade material, teremos revogação. Significa dizer que não nos interessa em nada, em absolutamente nada, a chamada “compatibilidade formal”, que diz respeito aos aspectos formais de elaboração da norma. Esses, os aspectos formais, são absolutamente irrelevantes para a realização desse confronto entre norma antiga e a nova constituição. Eventual incompatibilidade formal não prejudicará, em nada, a recepção da norma, desde que haja compatibilidade material entre a norma antiga e a nova constituição. Assim, não nos interessa, por exemplo, saber se há ou não correspondência entre o processo legislativo da época em que foi elaborada a norma antiga e o processo legislativo de elaboração da mesma espécie hoje, na vigência da nova constituição. Uma norma pré-constitucional que tenha sido elaborada na vigência da Constituição Imperial de 1824 poderá ser recepcionada pela Constituição Federal de 1988, ainda que os processos legislativos dessas duas épocas sejam absolutamente distintos. Diga-se de passagem, o Código Comercial atualmente em vigor (recepcionado pela CF/88) foi elaborado na fase imperial do Brasil (Lei nº 556, de 26/06/1850). Não nos interessa, também, saber se existe ou não, na nova constituição, a espécie normativa antiga, que disciplinava a matéria. Não é por outro motivo que temos atualmente diversos decretos-leis em pleno vigor, mesmo sabendo que essa espécie normativa não integra mais o nosso processo legislativo, na vigência da Constituição Federal de 1988 (como se sabe, os decretos-leis foram substituídos pelas malsinadas medidas provisórias!). Finalmente, não nos interessa saber se houve (ou não) mudança na exigência de formalidade para o tratamento da matéria. O fato de a constituição antiga exigir lei ordinária para o tratamento da matéria e a nova constituição só permitir que a mesma matéria seja disciplinada por meio de lei complementar não prejudicará em nada a recepção da norma antiga (ou vice-versa). Pergunta 2: Qual será a força (status) da norma antiga no novo ordenamento constitucional? Será que as leis ordinárias antigas, quando recepcionadas, continuarão, necessariamente, com força de lei ordinária no novo ordenamento constitucional? Será que as leis complementares antigas continuarão, necessariamente, com status de lei complementar no novo ordenamento constitucional que as recepcionou? Resposta: As normas pré-constitucionais não continuarão, necessariamente, com a mesma força (status) no novo ordenamento constitucional que as recepcionou. A força da norma pré-constitucional no novo ordenamento constitucional será determinada pela nova constituição, de acordo com o tratamento por ela dado à matéria. Só ela, a nova constituição, determinará qual será o novo status da norma pré-constitucional. Assim, se na vigência da constituição antiga a matéria era disciplinada por lei ordinária, e a nova constituição passou a exigir lei complementar para o tratamento da mesma matéria, esse fato não prejudicará em nada a recepção da norma antiga, se houver compatibilidade material entre elas. O que CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br teremos, no caso, é que a lei ordinária antiga adquirirá, na vigência da nova constituição, status de lei complementar, vale dizer, será recepcionada com força de lei complementar, significando dizer que, no novo ordenamento constitucional, só poderá ser alterada ou revogada por outra lei complementar (ou por norma de superior hierarquia, como uma emenda à constituição, por exemplo). Foi o que aconteceu, por exemplo, com a Lei Ordinária nº 5.172, de 1966 (Código Tributário Nacional), que, embora editada à época como lei ordinária, possui hoje, na vigência da Constituição Federal de 1988, força de lei complementar, pelo simples fato de que esta CF/88 exige lei complementar para dispor sobre normas gerais em matéria de legislação tributária (CF, art. 146, III). Poderemos ter, também, perda de status: se a constituição antiga exigia lei complementar para o tratamento da matéria e a nova constituição permite que a matéria seja disciplinada por lei ordinária, a lei complementar será recepcionada com status de lei ordinária, podendo, no novo ordenamento constitucional, ser alterada ou revogada por lei ordinária. Poderemos ter, ainda, mudança de competência do ente federado para o tratamento da matéria, sem prejuízo para a recepção da lei. Assim, se na vigência da constituição pretérita a competência para o tratamento da matéria pertencia à União e a nova constituição outorgou essa competência para os Estados ou para os Municípios, a lei federal pretérita poderá ser recepcionada com força de lei estadual ou municipal, conforme o caso. Exemplificando: uma lei federal pré-constitucional aprovada, à época, com base na competência da União definida na constituição pretérita é considerada recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com status de lei estadual ou municipal se a matéria por ela disciplinada passou, segundo esta nova Constituição de 1988, para o âmbito de competência dos Estados ou dos Municípios, conforme o caso. A simples mudança de competência do ente federado não prejudicará a recepção da norma antiga, se houver compatibilidade material entre esta e a nova constituição. Na hipótese, os entes federados, Estados e Municípios, continuarão dando aplicação à lei federal antiga (agora com status de norma estadual ou municipal, conforme o caso), até que editem suas próprias leis sobre a matéria (alterando ou revogando a antiga lei federal recepcionada). Ainda a respeito, considere a seguinte situação hipotética: na vigência da constituição pretérita a competência para legislar e explorar o gás canalizado pertencia à União, que havia editado a norma federal, que se encontrava em pleno vigor no momento da promulgação da Constituição Federal de 1988. Nessa situação, como a Constituição Federal de 1988 outorgou essa competência para os Estados-membros (CF, art. 25, § 2º), a lei federal pretérita sobre o assunto seria recepcionada com força de lei estadual (para evitar a descontinuidade jurídica, os Estados-membros continuariam aplicando a lei federal pretérita sobre o assunto até editarem suas próprias leis). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br há dois dias. Então, nessa situação, é que se faz a pergunta: a nova constituição restaurará automaticamente essa lei? Nessa situação, teremos o seguinte: (a) se a nova constituição nada disser a respeito, não haverá a restauração da vigência da lei (não haverá repristinação tácita); (b) a nova constituição poderá restaurar a vigência da lei, desde que o faça expressamente (poderá ocorrer repristinação expressa). Note-se que nesse caso não há que se falar em recepção, e sim em repristinação. Só há que se falar em recepção (ou em revogação) se a norma antiga estiver no ordenamento jurídico na data da promulgação da nova constituição. Se a norma não estiver no ordenamento jurídico no momento da promulgação da nova constituição, a situação há que ser resolvida levando-se em conta o fenômeno da repristinação, que, conforme visto, só ocorrerá se houver disposição expressa na nova constituição (na situação descrita, nada impede que a nova constituição possua um artigo especifico que estabeleça “fica restaurada a vigência da lei “X”, de 1980). 3) APLICABILIDADE IMEDIATA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS (RETROATIVIDADE MÍNIMA) Um outro ponto ainda merece ser estudado nesse assunto: a denominada aplicabilidade imediata das normas constitucionais, ou, em outras palavras, a retroatividade mínima das normas constitucionais. O enfoque aqui é um pouco diferente: qual a incidência das novas normas constitucionais sobre os contratos em curso? Quando é promulgada uma nova norma constitucional, tem ela incidência sobre os contratos em curso, celebrados em data anterior, ou será que ela só atingirá os novos contratos, celebrados a partir da entrada em vigor da nova regra constitucional? Em 05/10/1988, quando foi promulgada a Constituição Federal de 1988, os dispositivos desta passaram a regular, de imediato, os contratos então em andamento, ou será que os novos ditames constitucionais só foram aplicáveis aos novos contratos, celebrados daí por diante? Para bem entendermos essa questão, teremos que obter uma breve noção sobre os diferentes graus de retroatividade que poderão ser atribuídos às normas em geral, de acordo com a opção de cada País. Assim, temos os seguintes graus de retroatividade das normas: a) retroatividade máxima: quando a nova norma alcança atos constituídos, já consolidados no passado, podendo atingir, até mesmo, a coisa julgada (exemplo: uma nova norma que determine o refazimento de partilhas já encerradas, para o fim de inclusão de novos sucessores); b) retroatividade média: quando a nova norma alcança as prestações pendentes de fatos celebrados no passado (exemplo: uma nova norma que determine o pagamento das prestações vencidas e não pagas de determinado contrato celebrado no passado de acordo com um novo índice de reajuste por ela estabelecido); c) retroatividade mínima: quando a nova norma alcança as prestações futuras de fatos celebrados no passado (exemplo: uma nova norma que determine o CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br pagamento das prestações futuras, vencíveis a partir da sua entrada em vigor, de acordo com o novo índice de reajuste por ela estabelecido). Em vez de adotar um desses graus de retroatividade, poderá o legislador optar por outorgar às normas a chamada “irretroatividade”, significando dizer que as novas leis somente serão aplicadas aos novos negócios jurídicos, celebrados após a sua vigência. Uma consideração relevante: não se trata de afirmar que um desses graus de retroatividade seja o correto, e que os demais sejam inválidos; significa que cada ordenamento constitucional poderá optar por conferir às suas normas um desses graus, de acordo com suas tradições; por exemplo: a Itália poderá adotar para suas leis o grau de retroatividade média; a Alemanha, querendo, poderá adotar para suas leis o grau de retroatividade mínima e assim por diante. No Brasil, o Supremo Tribunal Federal fixou entendimento de que as normas constitucionais, salvo disposição expressa em sentido contrário, são dotadas de retroatividade mínima, isto é, que elas se aplicam, de imediato, às prestações futuras de contratos celebrados no passado. Entre nós, a regra geral de aplicabilidade das normas constitucionais, portanto, é a chamada “retroatividade mínima”. Entretanto, nada impede que a Constituição Federal adote, em situações específicas, outros graus de retroatividade para suas normas (retroatividade média ou máxima). Por exemplo: o art. 51 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) é norma constitucional dotada de “retroatividade máxima”, porque determina a revisão de todas as vendas, doações e concessões de terras públicas com área superior a três mil hectares realizadas no período de 1º de janeiro de 1962 a 31 de dezembro de 1987. No silêncio da Constituição Federal de 1988, seus dispositivos serão dotados da retroatividade mínima, incidindo, de imediato, sobre os efeitos futuros de fatos celebrados no passados. Um bom exemplo para visualizarmos a aplicação desse entendimento do STF é o disposto no art. 7º, IV, da Constituição Federal, que veda a vinculação do salário mínimo para qualquer fim. Como se sabe, essa vedação constante da parte final do artigo 7º, IV, da Constituição visa evitar que ele seja usado como fator de indexação, para que, evitando essa utilização, não se crie empecilho ao aumento do salário mínimo em face da cadeia de aumentos que daí decorrerão se admitida essa vinculação. Enfim: a utilização do salário mínimo como fator de indexação de reajuste tornaria mais difícil a concessão de aumento ao seu valor, pois toda vez que fosse aumentado o valor do salário mínimo, teríamos uma cadeia de aumentos na economia do País (em razão da vinculação). A cláusula impede, por exemplo, que salários, pensões etc. sejam vinculados ao salário mínimo, como se estabelecer que o salário de certo trabalhador será o de "valor correspondente a algumas vezes o salário mínimo", ou que alguma pensão será equivalente “a seis vezes o salário mínimo”, pois implicaria dizer CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br que o salário mínimo seria utilizado para o aumento automático do salário / pensão em causa sempre que houvesse majoração de seu valor. Pois bem, com fundamento nesse entendimento – de que as normas constitucionais são dotadas de retroatividade mínima -, o STF fixou a seguinte orientação a respeito da aplicabilidade do disposto no art. 7º, IV, da CF às situações constituídas em data anterior à promulgação do atual texto constitucional (RE 143812-6/GO, rel. Min. Ilmar Galvão, 27/08/1996): “A vedação da vinculação do salário mínimo, constante do inciso IV do art. 7º da Carta Federal, que visa impedir a utilização do referido parâmetro como fator de indexação para obrigações, aplica-se imediatamente sobre as pensões que anteriormente foram estipuladas, não havendo que se falar em direito adquirido”. Significa dizer, em simples palavras, que a vedação de vinculação do salário mínimo teve aplicabilidade imediata, incidindo sobre os efeitos futuros (prestações futuras) de fatos celebrados no passado (na hipótese, pensões estipuladas com base no salário mínimo em período anterior à promulgação da CF/88). Mesmo as pensões (e demais negócios jurídicos, como o pagamento de salários, aluguéis etc.) celebradas no passado com vinculação ao salário mínimo foram automaticamente atingidas pela nova regra constitucional, no que se refere às prestações futuras, vencíveis a partir de 05/10/1988, data de promulgação da CF/88 (a partir dessa data, houve uma desvinculação, uma desindexação automática desses negócios em relação ao salário mínimo, por força da retroatividade mínima do art. 7º, IV, da CF/88). Por último, quero ressaltar que o STF fixou entendimento de que a retroatividade mínima só alcança as normas da Constituição Federal de 1988, não contemplando as normas das constituições dos Estados-membros, visto que estas estão sujeitas à vedação do artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal (irretroatividade, não podendo atingir o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada). Da mesma forma, tal aplicabilidade imediata não alcança as normas infraconstitucionais (leis e atos normativos em geral), visto que estas também se submetem à regra geral da irretroatividade (admitidas certas exceções, que serão por nós estudadas no momento oportuno), prescrita no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal. 4) DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE EM FACE DE CONSTITUIÇÃO PRETÉRITA Assunto de altíssimo nível este que agora estudaremos: seria possível hoje, sob a vigência da Constituição Federal de 1988, requerer perante o Poder Judiciário a declaração da invalidade de uma lei antiga em confronto com a constituição antiga, da época em que tal lei foi editada? Seria possível hoje, sob a vigência da Constituição Federal de 1988, discutir perante o Poder Judiciário a validade de uma lei de 1970, em confronto com a constituição de sua época (Constituição de 1969, neste caso)? A resposta é afirmativa. Mesmo quando promulgada uma nova constituição continua sendo possível a discussão da validade das leis antigas em confronto CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 11) Dá-se o nome de repristinação ao fenômeno da novação de fontes, que garante a continuidade da vigência, sob certas condições, do direito ordinário em vigor imediatamente antes da nova Constituição. 12) (ESAF/AFRF/2001) A lei ordinária anterior à nova Constituição, que com esta é materialmente incompatível, continua em vigor até que seja revogada por outra lei do mesmo status hierárquico. (CESPE/DELEGADO/PF/2002) Considere que a Constituição da República de 1988, em relação a determinada matéria, tenha passado a exigir regulação por lei complementar, ao passo que a Constituição anterior previa que a mesma matéria fosse disciplinada por lei ordinária, que fora editada e encontrava-se vigente e eficaz ao tempo da promulgação da nova Constituição. À luz dessa situação hipotética, julgue os dois itens a seguir (13 e 14), relativos ao direito constitucional. 13) Na hipótese proposta, não há possibilidade de recepção formal da lei ordinária, porque o quórum qualificado da lei complementar é maior. 14) Em hipótese inversa - a Constituição anterior requerendo lei complementar e a atual exigindo lei ordinária -, poderia ser recepcionada a legislação preexistente, mas as alterações posteriores deveriam ser procedidas por meio de lei complementar. 15) As normas da Constituição de 1967/1969, que não entram, quanto ao seu conteúdo, em linha colidente com a Constituição de 1988, são consideradas como recebidas pela nova ordem, com status de lei complementar. 16) Todo Decreto-Lei editado antes da Constituição de 1988 perdeu eficácia depois da promulgação desta, uma vez que a ordem constitucional em vigor não previu tal instrumento normativo. 17) Lei ordinária anterior à Constituição de 1988, com ela materialmente compatível, é tida como recebida pela nova ordem constitucional, mesmo que esta exija lei complementar para regular o assunto. 18) (Esaf/Bacen/2001) Uma norma do poder constituinte originário pode afetar efeitos ainda por ocorrer de fato ocorrido no passado. 19) O instituto da desconstitucionalização das normas da Constituição anterior é pacificamente aceito pela doutrina brasileira. 20) Uma norma editada em data anterior à atual Constituição poderá ser declarada inconstitucional em face desta, caso venha a ferir um de seus preceitos fundamentais. 21) Substituída uma Constituição por outra, as normas da Constituição antiga que não forem, no seu conteúdo, incompatíveis com o novo Texto Magno, continuam em vigor, mas com hierarquia de lei ordinária. 22) Normas da Constituição pretérita continuam valendo como normas constitucionais, naquilo que não contrariarem a nova Lei Maior, em face do mecanismo conhecido como recepção. GABARITO OFICIAL CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 1) ERRADO; no confronto entre norma pré-constitucional e a nova constituição só nos interessa a compatibilidade material, sendo irrelevante a compatibilidade formal; assim, a incompatibilidade formal não prejudica, em nada, a recepção da norma. 2) CERTO; temos diversos decretos antigos do Presidente da República que foram recepcionados pela atual Constituição Federal de 1988 com força de lei; foram recepcionados porque são materialmente compatíveis com a nova constituição; ganharam força de lei no novo ordenamento porque a nova constituição passou a exigir lei para o tratamento da matéria. 3) ERRADO; conforme dito antes, no confronto entre norma pré-constitucional e a nova constituição só nos interessa a compatibilidade material; portanto, não se exige a compatibilidade formal, como dito no enunciado. 4) CERTO; perfeito o enunciado, ao afirmar que no confronto entre norma pré- constitucional e a nova constituição só nos interessam os aspectos materiais (conteúdo da norma, a chamada compatibilidade material). 5) CERTO; a constituição pretérita disciplinava a matéria por meio de lei ordinária; a nova constituição exige lei complementar para a disciplina da mesma matéria; logo, a lei ordinária antiga será recepcionada, mas com status de lei complementar. 6) ERRADO; se determinada lei tornar-se incompatível materialmente com o novo texto constitucional, em face da promulgação de uma Emenda à Constituição, referida lei será revogada por essa Emenda à Constituição; não há que se falar, no Brasil, na figura da “inconstitucionalidade superveniente”; uma lei só pode ser considerada inconstitucional em face de texto constitucional de sua época, e não de texto constitucional futuro (introduzido pela Emenda à Constituição, neste caso). 7) ERRADO; se o conteúdo do decreto-lei é compatível com a nova constituição, será ele recepcionado por esta, mesmo sabendo que não mais existe essa figura legislativa no atual processo legislativo; essa questão formal (não existência da espécie decreto-lei na atual Constituição) não prejudicará em nada sua recepção. 8) ERRADO; o enunciado reproduz o conceito de desconstitucionalização, que, conforme vimos, não é aceita no Brasil; entre nós, o entendimento válido é que a nova constituição revoga integralmente a constituição antiga, mesmo aqueles dispositivos supostamente compatíveis com o novo texto constitucional. 9) ERRADO; as normas ordinárias anteriores à nova constituição, com ela materialmente compatíveis, são recepcionadas pela nova constituição, pouco importando o procedimento pelo qual elas foram elaboradas (não nos interessa a compatibilidade formal). 10) CERTO; a promulgação de uma nova norma constitucional (nova constituição ou emenda) materialmente incompatível com o direito anterior opera a revogação deste; não podemos falar, nessa situação, que o direito CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br anterior tornou-se inconstitucional frente ao novo texto constitucional, pela não aceitação, no Brasil, da tese da inconstitucionalidade superveniente. 11) ERRADO; dá-se o nome de recepção ao fenômeno que garante a continuidade da vigência do direito ordinário em vigor antes da nova constituição; repristinação seria o revigoramento do direito anterior que não integrasse o ordenamento jurídico no momento da promulgação da nova constituição, fenômeno que, como estudado, só ocorrerá se a nova constituição trouxer dispositivo expresso nesse sentido (não haverá repristinação tácita; poderá ocorrer repristinação expressa). 12) ERRADO; lei ordinária anterior à nova constituição com esta materialmente incompatível é tácita e automaticamente revogada pela nova constituição, na data de sua promulgação; cuida-se de fenômeno tácito, imediato: promulgada uma nova constituição, neste exato momento as normas anteriores incompatíveis são revogadas e as normas anteriores compatíveis são recepcionadas, independentemente de qualquer ato expresso nesse sentido. 13) ERRADO; a mudança de status no tratamento da matéria (aspecto meramente formal) não prejudicará em nada a recepção da norma: se a lei ordinária for materialmente compatível com a nova constituição, será ela recepcionada com status de lei complementar. 14) ERRADO; se na vigência da constituição antiga a matéria era disciplinada por lei complementar e a nova constituição passou a permitir que a matéria seja disciplinada por lei ordinária, a norma será recepcionada com status de lei ordinária, podendo, daí por diante, ser alterada por outras normas diversas de mesma hierarquia (lei ordinária, medida provisória, lei delegada, lei complementar) ou de superior hierarquia (emenda à Constituição) – e não necessariamente por meio de lei complementar, como diz o enunciado. 15) ERRADO; as normas da Constituição de 1967/1969 são consideradas integralmente revogadas pela Constituição de 1988, independentemente da compatibilidade entre os seus dispositivos; o texto enuncia, novamente, a tese da desconstitucionalização, que, conforme vimos, não é aceita entre nós. 16) ERRADO; a não existência da espécie normativa decreto-lei no atual ordenamento constitucional (aspecto formal) não prejudica em nada a recepção dos decretos-leis antigos, desde estes sejam materialmente compatíveis com a Constituição Federal de 1988. 17) CERTO; se a lei ordinária anterior é materialmente compatível com a nova constituição, será ela recepcionada pela nova constituição, ainda que esta passe a exigir lei complementar para o tratamento da matéria; o que teremos, nessa situação, é que a lei ordinária anterior será recepcionada com status de lei complementar. 18) CERTO; as normas constitucionais, salvo disposição expressa em contrário, são dotadas de retroatividade mínima, isto é, afetam efeitos futuros de fato ocorrido no passado. 19) ERRADO; o instituto da desconstitucionalização não é aceito entre nós pela doutrina e jurisprudência dominantes. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Constituição o expediente para formalização de seus valores ideológicos, políticos, doutrinários e filosóficos, ou seja, para a defesa dos seus interesses concretos. Num período seguinte, o Direito Constitucional foi, aos poucos, se desprendendo, se separando dos ideais do Estado liberal e começou a firmar- se como elemento de organização do Estado e de proteção dos direitos humanos, independentemente da forma de organização política adotada. Assim, deixou o Direito Constitucional de representar exclusivamente a forma de organização política liberal e passou a ser o núcleo de garantia de um Estado de Direito, estabelecendo as regras fundamentais de estruturação, funcionamento e organização do poder em toda e qualquer forma de organização política. Mais recentemente, as pressões e os conflitos sociais levaram à constatação da necessidade de uma maior intervenção do Estado em favor dos hipossuficientes, fazendo surgir o denominado Estado social, em substituição ao pensamento individualista do Estado liberal. Assim, o constitucionalismo da sociedade liberal (Estado liberal) abre passagem para o constitucionalismo social e político (Estado social). 1.2) CONTEÚDO CIENTÍFICO O Direito Constitucional contempla três diferentes ciências jurídicas, que integram o elenco de matérias que se ocupam do ordenamento constitucional do Estado, a saber: o Direito Constitucional Especial, o Direito Constitucional Comparado e o Direito Constitucional Geral. Para facilitar o entendimento, vamos pensar assim: são três frentes distintas de atuação do Direito Constitucional, a partir de diferentes critérios. O Direito Constitucional especial (particular, positivo ou interno) é o que estuda os princípios e normas de uma Constituição concreta, de um determinado Estado, nacional ou estrangeiro (estudo do vigente Direito Constitucional brasileiro; ou do vigente Direito Constitucional italiano; ou do vigente Direito Constitucional argentino etc.). O Direito Constitucional comparado tem por fim o estudo comparativo de uma pluralidade de Constituições, destacando os contrastes e semelhanças entre elas. Esse confronto entre diferentes constituições pode ser realizado a partir de um dos seguintes critérios: (a) critério temporal, pelo qual são confrontadas diferentes constituições de um mesmo Estado, isto é, realiza-se o estudo das normas constitucionais de um mesmo Estado em diferentes momentos histórico-temporais (estudo comparativo das constituições brasileiras, da época imperial até a vigente Constituição de 1988; estudo das diferentes constituições vigentes na Itália no último século etc.). (b) critério espacial, pelo qual são comparadas constituições de diferentes Estados, vinculando estes, de preferência, a áreas geográficas contíguas (confronto da Constituição do Brasil com as Constituições dos demais países integrantes da América Latina; estudo comparativo dos textos constitucionais CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br dos países que integram o MERCOSUL; ou estudo comparativo das Constituições dos países que integram a União Européia etc.). c) critério da mesma forma de Estado, pelo qual confrontam-se constituições de países que adotam a mesma forma de Estado (estudo comparativo das Constituições de países que adotam a forma federativa de Estado, por exemplo). O Direito Constitucional geral (ou comum) tem por fim delinear, sistematizar e dar unidade aos princípios, conceitos e instituições que se acham presentes em vários ordenamentos constitucionais. Sua função é, portanto, sistematizar e reunir, numa visão unitária, os princípios, conceitos e instituições presentes em diferentes ordenamentos constitucionais, tais como: conceito de Direito Constitucional; fontes do Direito Constitucional; conceito de Constituição; classificação das Constituições; conceito de poder constituinte; métodos de interpretação da Constituição etc. Importante destacar que o Direito Constitucional especial, o Direito Constitucional comparado e o Direito Constitucional geral não atuam de maneira isolada. Ao contrário, estão eles em constante convívio, guardando entre si vários pontos de contato, de interconexão. Assim, o Direito Constitucional comparado, ao realizar o confronto de constituições de diferentes países, contribui para o aperfeiçoamento do Direito Constitucional especial de determinado país, bem assim para o enriquecimento do Direito Constitucional geral. O Direito Constitucional geral, partindo do estudo comparativo realizado pelo Direito Constitucional comparado, contribui para a formação do Direito Constitucional especial, e assim por diante. 2) CONSTITUIÇÃO A Constituição, objeto de estudo do Direito Constitucional, deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que tem por fim estabelecer o conteúdo referente à composição e ao funcionamento da ordem política desse Estado (organização do poder, distribuição da competência, exercício da autoridade, direitos fundamentais etc.). O alargamento do âmbito de ação do Estado tem levado ao considerável aumento da importância do Direito Constitucional nos estudos jurídicos, bem assim à tendência de ampliação de seu conteúdo material. No seu conceito clássico, marcado pelas ideologias liberais, a constituição tinha por fim determinar, estritamente, a forma de Estado, a forma de Governo e o reconhecimento dos direitos fundamentais do homem. No Estado moderno, de cunho marcadamente social, a doutrina constitucionalista aponta o fenômeno da expansão do objeto das constituições, que têm passado a tratar de temas cada vez mais amplos, estabelecendo, por exemplo, finalidades para a ação estatal (conteúdo programático das constituições). Por isso, a tendência contemporânea de elaboração de constituições de conteúdo extenso (analíticas ou prolixas) e preocupadas com os fins estatais, com o estabelecimento de programa e linha de direção para o futuro (constituições dirigentes ou programáticas). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Importante fixar esta idéia: a tendência contemporânea é de ampliação do objeto das constituições, que passaram a estabelecer novas finalidades para a atuação estatal (normas programáticas), resultando em constituições de conteúdo extenso (analíticas ou prolixas). 2.1) ANTECEDENTES DA CONSTITUIÇÃO ESCRITA A idéia de constituição escrita não surgiu como um evento isolado, mas como uma criação coletiva, apoiada em precedentes históricos e doutrinários, que floresceram a partir da idade média. Esses antecedentes é que fizeram surgir a idéia da necessidade de um texto escrito, para maior garantia dos direitos individuais frente ao Estado. Assim, historicamente, a idéia de uma Constituição escrita, consagrada após o sucesso da Revolução Francesa, tem entre seus antecedentes históricos os pactos, os forais, as cartas de franquia, os contratos de colonização e os pactos sociais. Os pactos eram acordos entre o rei e a nobreza ou representantes do burgo, em que se limitava a atuação do monarca frente aos seus súditos. Advindos da tradição inglesa, os pactos funcionavam como convenções entre o monarca e seus súditos, gerindo o modo de governo e as garantias dos direitos individuais. O mais conhecido dos pactos ingleses é a Magna Carta Libertatum, Concordiam inter regem Johannem et Barones pro concerssione libertatum ecclesiae et regni Angliae (Carta Magna das Liberdades, ou Concórdia entre o rei João e os Barões para outorga das liberdades da igreja e do reino inglês), um acordo entre João Sem Terra e seus súditos, que assegurou direitos e garantias para os cidadãos ingleses, ao limitar o poder do rei com relação aos súditos. Os forais, encontrados em toda a Europa medieval, foram documentos que permitiam aos burgos se auto-governarem. As cartas de franquia eram documentos que asseguravam às corporações independência para exercer suas atividades. Os contratos de colonização surgiram na América do Norte, com as colônias que lá se formaram e que traziam a idéia de que é preciso estabelecer uma ordem (estes contratos, celebrados consensualmente pelos colonos, de regra, recebiam, ainda, uma sanção dos reis). Chegados ao Novo Mundo, os peregrinos, mormente puritanos ingleses, imbuídos de igualitarismo, não encontrando na nova terra Poder estabelecido, decidiram fixar, por mútuo consenso, as regras por que haveriam de se governar, fazendo então surgir tais contratos de colonização. Outro importante antecedente próximo da constituição escrita foi a doutrina do Pacto Social, que floresceu na idade média, sob a idéia de que a autoridade dos governantes se fundava num contrato com os súditos - o pactum subjectionis. Por este pacto, o povo se sujeitava a obedecer ao príncipe enquanto este se comprometia a governar com justiça, ficando Deus como árbitro fiel do cumprimento do contrato. Assim, violando o príncipe a obrigação de justiça, exoneravam-se os súditos da obediência devida, pela intervenção do Papa, representante da divindade sobre a Terra. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Enfim, como para Kelsen é impossível derivar a norma jurídica da realidade social, política ou filosófica, deve-se examinar a validade das normas a partir da hierarquia existente entre elas. Assim, uma norma inferior tem fundamento na norma superior, e esta tem fundamento na constituição positiva. Esta, por sua vez, se apóia na norma básica fundamental, que não é uma norma positiva (posta), mas uma norma hipotética, pressuposta, pensada. Em sentido jurídico-positivo, constituição corresponde à norma positiva suprema, conjunto de normas que regulam a criação de outras normas, lei nacional no seu mais alto grau; ou certo documento solene, conjunto de normas jurídicas que somente podem ser alteradas observando-se certas prescrições especiais. 2.3) FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO (KONRAD HESSE) Conforme vimos antes (no subitem “Constituição em sentido sociológico”), a visão sociológica de Ferdinand Lassalle negava força normativa à constituição jurídica, pois, no seu entender, caberia a esta, tão-somente, a representação dos fatores reais do poder que regem a nação. Contrapondo-se à tese defendida por Ferdinand Lassalle, o constitucionalista Konrad Hesse desenvolveu importante estudo no intuito de realçar a denominada “força normativa” da constituição. Hesse concorda com Lassalle no tocante ao fato de ser a constituição jurídica condicionada pela realidade histórica, não podendo ser separada da realidade concreta do seu tempo. Concorda, também, que a pretensão de eficácia da constituição somente pode ser realizada se se levar em conta essa realidade. Entretanto, não concorda com Lassalle quando este conceitua a constituição jurídica como “pedaço de papel”, pois, para Hesse, é inconcebível reduzir a constituição jurídica à mísera função – indigna de qualquer ciência – de justificar as relações de poder dominantes. Com efeito, segundo Hesse, a constituição jurídica não configura apenas a expressão de uma realidade, dos fatores reais do poder. Ela significa mais do que o simples reflexo das condições fáticas de sua vigência, das forças sociais e políticas. Ainda que não de forma absoluta, a constituição jurídica possui significado próprio, autônomo. Graças ao elemento normativo, ela ordena e conforma a realidade política e social. Ela logra conferir forma e modificação à realidade, bem assim despertar “a força que reside na natureza das coisas”, tornando-a ativa. Assim, ela própria, a constituição jurídica, converte-se em força ativa que influi e determina a realidade política e social. Para Hesse, a constituição contém, ainda que de forma limitada, uma força própria, motivadora e ordenadora da vida do Estado (força normativa da constituição). Assim, a constituição jurídica logra converter-se, ela mesma, em força ativa. Embora não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de concretizar essa ordem. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Em síntese, podemos afirmar que Hesse não nega a influência dos fatores reais do poder na realização da constituição jurídica, visto que esta não está – e nem poderia estar – desvinculada da realidade histórica e concreta do seu tempo. Todavia, ela não está condicionada, simplesmente, por essa realidade. A constituição jurídica e a constituição real estão em relação de coordenação, condicionando-se mutuamente. Assim, em caso de eventual conflito, a constituição jurídica não deve ser considerada, necessariamente, a parte mais fraca, pois existem pressupostos realizáveis que, mesmo no caso de confronto, permitem assegurar a força normativa da constituição jurídica. Ferdinand Lassale Konrad Hesse A Constituição consiste na soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada nação A Constituição, embora influenciada pelos fatores reais do poder, possui força normativa própria No caso de conflito entre a Constituição real (“fatores reais de poder”) e a Constituição jurídica (“folha de papel”), esta sempre sucumbirá frente àquela No caso de conflito entre a Constituição real e a Constituição jurídica, não se pode afirmar que esta necessariamente sucumbirá Visão sociológica da Constituição Visão sobre a força normativa da Constituição 3) CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES As constituições, de acordo com as características que assumem, recebem da doutrina uma classificação, conforme exposto nos itens seguintes. 3.1) QUANTO À ORIGEM Quanto à origem, as constituições podem ser outorgadas ou democráticas (estas últimas também denominadas populares ou promulgadas). As constituições outorgadas são aquelas que nascem sem a participação popular, por meio da imposição do poder. São resultado de um ato unilateral de vontade do detentor do poder político, que resolve estabelecer certas limitações ao seu próprio poder absoluto, por meio da outorga de um texto constitucional. As constituições democráticas são elaboradas com a participação popular, na forma de democracia direta (plebiscito ou referendo) ou de democracia representativa, em que o povo escolhe seus representantes – Assembléia Constituinte – e estes elaboram a constituição. Na história do constitucionalismo brasileiro, tivemos constituições democráticas (1891, 1934, 1946 e 1988) e constituições outorgadas (1824, 1937 e 1967/1969). Alguns doutrinadores (Paulo Bonavides, Alexandre de Moraes) referem-se, também, à existência das denominadas “constituições Pactuadas”, que são aquelas em que se efetiva um compromisso entre o Rei e o Poder Legislativo, CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br sujeitando-se o monarca aos esquemas constitucionais, e resultando a constituição de dois princípios: o monárquico e o democrático. Essa Constituição pactuada seria, assim, o resultado da relação entre a Monarquia debilitada de um lado, e a nobreza e a burguesia de outro, estabelecendo-se um pacto de governabilidade entre essas duas forças rivais. 2) QUANTO À FORMA Quanto à forma, as constituições podem ser escritas ou não escritas. Constituição escrita é aquela formalizada num determinado momento, por um órgão que tenha recebido a incumbência especial para o desempenho dessa tarefa, sendo codificada num documento escrito e único (são chamadas por alguns doutrinadores de “constituição instrumental”). Nas constituições não escritas, as normas constitucionais não são elaboradas num determinado e específico momento, por um órgão especialmente encarregado desta tarefa, tampouco estão codificadas num documento único. Tais normas são baseadas em leis esparsas, costumes, jurisprudência e convenções, como é o caso da Constituição inglesa, em que parte das normas sobre organização do Estado é consuetudinária. Importante deixar claro que tanto nos Estados que adotam constituição escrita quanto nos Estados que adotam constituição não-escrita existem normas constitucionais escritas (na Inglaterra, que adota constituição do tipo não- escrita, parte das normas constitucionais é escrita: leis esparsas, convenções, jurisprudência). A distinção é que num regime de constituição escrita as normas constitucionais são elaboradas, num determinado momento, por um órgão que tenha recebido essa incumbência, que as codifica num documento único. Ao invés, nos regimes de constituição não-escrita, as normas constitucionais, quando escritas, estão cristalizadas em leis e outras espécies normativas esparsas, que surgiram ao longo do tempo e que, dada a sua dignidade, adquiriram status constitucional; não foram elas elaboradas por um órgão especial, tampouco por processo específico, criado para a produção de normas constitucionais – são normas que a prática ou o costume sancionaram ou impuseram. 3) QUANTO AO MODO DE ELABORAÇÃO Quanto ao modo de elaboração, as constituições podem ser dogmáticas ou históricas (estas últimas também denominadas costumeiras ou consuetudinárias). As constituições dogmáticas são aquelas elaboradas num dado momento, por um órgão constituinte, segundo as idéias, os dogmas reinantes nesse momento. A Constituição da República de 1988 é tipicamente dogmática, eis que elaborada num dado momento, segundo as idéias nele reinantes (o fato de a nossa constituição ter sido elaborada num período em que o Estado brasileiro deixava a triste realidade de um regime de exceção fez com que, entre outros aspectos, resultasse ela num documento extenso, analítico, muitas vezes prolixo). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br tipo formal, contendo algumas normas formal e materialmente constitucionais e outras apenas formalmente constitucionais. Sob o ponto de vista material, podemos afirmar que todo Estado possui constituição, visto que, para se falar em Estado temos que pressupor uma organização básica das instituições, mínima que seja. Essa organização básica, formalizada ou não num documento escrito, constituirá a constituição material desse Estado. Porém, não podemos dizer o mesmo sob o enfoque formal, pois nessa visão só possui Constituição aquele Estado que formalizou suas normas constitucionais num texto escrito e rígido (anote-se que, sob a ótica formal, a Inglaterra, que não adota constituição escrita e rígida, não possui normas constitucionais). Segundo a concepção material, podem existir normas constitucionais fora do texto escrito da constituição, pois, nesta concepção, o que determina a identificação da norma constitucional é o seu conteúdo (e não o processo de elaboração da norma). Assim, sob a ótica material, caso o Estado possua constituição escrita, poderemos: (a) ter dispositivos no texto desta constituição que não são normas constitucionais (por tratarem de matérias que nada têm a ver com organização do Estado); (b) ter normas constitucionais fora do texto dessa constituição escrita (quaisquer outras normas, fora do texto da constituição, que tratarem dos elementos de organização básica do Estado serão consideradas constitucionais, devido a esse conteúdo). Assim, na visão material de constituição, é possível, em tese, o reconhecimento da invalidade de uma norma em face de outra, embora nenhuma delas integre o texto da constituição escrita. Poderá, por exemplo, uma Lei “A” (ordinária, de conteúdo não-constitucional) vir a ser declarada inválida em face de uma Lei “B” (de conteúdo substancialmente constitucional), mesmo sabendo que ambas estão situadas fora do texto escrito da constituição. Ao contrário, na visão formal, todas as normas constitucionais integram a constituição escrita, solenemente elaborada (rígida). Nessa visão formal, não é juridicamente possível se declarar a inconstitucionalidade de uma lei em confronto com alguma norma que não integre o texto da constituição escrita (exatamente porque, nessa concepção, o que caracteriza uma norma como constitucional é justamente o fato dela integrar o texto escrito de uma constituição solenemente elaborada, rígida). Essas duas visões acerca das normas constitucionais (formal e material) fizeram surgir os conceitos de supremacia material (ligada ao conteúdo das normas constitucionais) e supremacia formal (ligada ao processo legislativo distinto para elaboração das normas constitucionais). Numa constituição escrita, rígida, todas as normas constitucionais são dotadas de supremacia formal, visto que foram elaboradas segundo um procedimento mais solene do que aquele de elaboração das demais leis. Assim, num sistema de constituição formal, podemos afirmar que todas as normas constitucionais se equivalem em termos de hierarquia e, também, que todas elas são dotadas de supremacia formal em relação às demais leis do ordenamento. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Ao contrário, se estamos diante de uma constituição não escrita, flexível, não podemos falar em supremacia formal, porque não há distinção entre os processos legislativos de elaboração das normas constitucionais e das leis ordinárias. Num sistema de constituição não-escrita, flexível, as normas constitucionais são dotadas, tão-somente, de supremacia material (devido à dignidade de seu conteúdo). Cabe assinalar, ainda, que essa distinção entre norma formal e materialmente constitucional, num Estado de constituição escrita e rígida, como o nosso, não possui significativa relevância jurídica, visto que, nesse tipo de Estado, todas as normas que integram o texto constitucional têm o mesmo valor, pouco importando sua dignidade, isto é, se são normas materialmente constitucionais, ou apenas formalmente constitucionais. Assim, todas as normas integrantes de uma constituição formal, rígida, têm o mesmo valor, têm status constitucional e, como tais, deverão ser respeitadas – independentemente da natureza do seu conteúdo. É o caso da nossa Constituição Federal de 1988, em que o artigo 5º, que versa sobre os direitos e deveres individuais e coletivos (dispositivo formal e materialmente constitucional) tem o mesmo valor e força hierárquica do artigo 242, § 2º, que estabelece que “o Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal” (dispositivo apenas formalmente constitucional). Enfim, num sistema de constituição rígida, como o nosso, todo o processo de fiscalização da validade das leis leva em conta a supremacia formal da constituição, vale dizer, todo o controle de constitucionalidade das leis é realizado sob o enfoque estritamente formal. Se a norma integra o texto da constituição rígida, seja qual for o seu conteúdo, será dotada de supremacia e, portanto, não poderá ser desobedecida pelo legislador infraconstitucional. Por outro lado, num sistema de constituição do tipo não escrita, flexível, aí sim, torna-se relevante o conhecimento da noção de norma materialmente (substancialmente) constitucional, visto que nessa espécie de ordenamento jurídico todas as leis (constitucionais e ordinárias) são elaboradas segundo o mesmo procedimento, pelo mesmo processo legislativo. Logo, a distinção entre uma e outra – leis constitucionais e leis ordinárias – só é possível levando-se em conta o conteúdo abordado pela norma: serão constitucionais as leis que tiverem conteúdo substancialmente constitucional; as demais serão leis ordinárias. Finalmente, é importante ter em mente que não há um rol taxativo de normas consideradas materialmente constitucionais, e daquelas que são apenas formalmente constitucionais, tampouco há unanimidade doutrinária a respeito dessa separação. São conceitos abertos, dinâmicos, que aceitam – e acompanham – a evolução social do Estado. São conceitos abertos, que admitem mutações no tempo e no espaço: uma norma considerada apenas formalmente constitucional no Brasil poderá ser considerada materialmente constitucional na Itália, a depender da organização política daquele Estado (mutação no espaço); ou, uma norma que hoje é considerada apenas formalmente constitucional no Brasil poderá, no amanhã, ser tida por substancialmente constitucional entre nós (mutação no tempo). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Ademais, no constitucionalismo moderno há uma reconhecida tendência de as constituições tratarem cada vez mais de novos temas, ampliando seu conteúdo, de passarem a preocupar-se com o estabelecimento de fins, programas e diretrizes para a atuação futura dos órgãos estatais (tendência atual de constituições analíticas e dirigentes, conforme veremos adiante). 5) ESTABILIDADE A classificação das constituições quanto ao grau de estabilidade leva em conta a maior ou a menor facilidade para a modificação do seu texto, dividindo-as em: imutáveis, rígidas, flexíveis ou semi-rígidas. A constituição imutável é aquela que não admite modificação do seu texto (essa espécie de constituição está em pleno desuso, em razão da impossibilidade de sua atualização, em face da evolução política e social do Estado). A constituição rígida é aquela que exige um processo especial para modificação do seu texto, mais difícil do que o processo de elaboração das demais leis do ordenamento. A constituição flexível é aquela que permite sua modificação pelo mesmo processo legislativo de modificação das demais leis, como ocorre na Inglaterra, em que as partes escritas de sua constituição podem ser juridicamente alteradas pelo Parlamento com a mesma facilidade com que se altera a lei ordinária. A constituição semi-rígida é aquela que exige um processo mais difícil para alteração de parte de seus dispositivos e permite a mudança de outros dispositivos por procedimento simples, de elaboração das demais leis. No Brasil, tivemos um exemplo de constituição semi-rígida, que foi a Constituição de 1824, da época imperial. A rigidez tem como decorrência imediata o denominado “princípio da supremacia formal da constituição”, significando dizer que a rigidez situa a constituição numa posição de superioridade formal em relação às demais leis, posicionando-a no ápice do ordenamento jurídico do Estado. A partir dessa supremacia formal, decorrente da rigidez, todas as demais normas do ordenamento jurídico para terem validade deverão estar de acordo com o que prescreve o texto constitucional. Em caso de conflito, as leis inferiores deverão ser declaradas inconstitucionais, para o fim de serem retiradas do ordenamento, prevalecendo a supremacia da constituição. Assim, a rigidez é apontada como o pressuposto para o surgimento do denominado “controle de constitucionalidade das leis”, visto que, pelo fato de a constituição ser rígida e, por isso, ocupar o ápice do ordenamento jurídico, há que se verificar quais as leis desse ordenamento estão de acordo com as suas prescrições (e, portanto, são constitucionais) e quais as leis estão em desacordo com os seus comandos (e, são, pois, inconstitucionais, devendo ser retiradas do ordenamento jurídico); Em face dessa realidade, a doutrina moderna assenta que o surgimento da técnica “controle de constitucionalidade” deu-se em razão do desenvolvimento CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br meio da imposição de limites à atuação deste e do estabelecimento de direitos fundamentais em favor daqueles. Constituição dirigente, de texto extenso (analítica), é aquela que define fins e programas de ação futura, apresentando em seu texto programas, planos e diretrizes para a atuação futura dos órgãos estatais. O termo “dirigente” significa que o legislador constituinte “dirige” a atuação futura dos órgãos governamentais, por meio do estabelecimento de programas e metas a serem perseguidos por estes. O conceito de constituição dirigente está diretamente relacionado à existência, no texto constitucional, das denominadas “normas programáticas”, que são aquelas que requerem dos órgãos estatais uma determinada atuação, na consecução de um objetivo traçado pelo legislador constituinte. As normas programáticas, como o próprio termo indica, estabelecem um programa, um rumo inicialmente traçado pela constituição – e que deve ser perseguido pelos órgãos estatais. São normas que têm como destinatários os órgãos estatais, requerendo destes uma atuação numa determinada direção, apontada pelo legislador constituinte. Não são normas voltadas para o indivíduo – e sim para os órgãos estatais, exigindo destes a consecução de determinados programas traçados pela constituição. Assim, pode-se concluir que o fato caracterizador de uma constituição como dirigente (ou programática) é a existência, no seu texto, de normas programáticas. 9) CLASSIFICAÇÃO DA CF/88 A Constituição Federal de 1988 é classificada como: escrita; democrática; dogmática; rígida; formal; analítica; dirigente e normativa. EXERCÍCIOS DE CONCURSOS. 1) (Cespe/TCU/2003) As constituições classificadas como não escritas, produto de lenta síntese histórica, são compostas exclusivamente por normas costumeiras, jurisprudências e convenções. 2) (Esaf/AFC/CGU/2003) Um dos objetos do Direito Constitucional Comparado é o estudo das normas jurídicas positivadas nos textos das Constituições de um mesmo Estado, em diferentes momentos histórico-temporais. 3) (Esaf/AFC/CGU/2003) A concepção de constituição, defendida por Konrad Hesse, não tem pontos em comum com a concepção de constituição defendida por Ferdinand Lassale, uma vez que, para Konrad Hesse, os fatores históricos, políticos e sociais presentes na sociedade não concorrem para a força normativa da constituição. 4) (Esaf/AFT/2003) Para Hans Kelsen, a norma fundamental, fato imaterial instaurador do processo de criação das normas positivas, seria a constituição em seu sentido lógico-jurídico. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 5) O conceito sociológico de Constituição considera-a como a norma fundamental de um Estado, destinada a regular a produção de outras normas jurídicas, que regerão a sociedade. 6) Para o direito, o sentido relevante de Constituição é o jurídico, que trata do efetivo poder social em um determinado Estado, isto é, o que busca definir os chamados fatores reais de poder. 7) (Esaf/AFT/2003) A constituição, na sua concepção formal, seria um conjunto de normas legislativas que se distinguem das não constitucionais em razão de serem produzidas por processo legislativo mais dificultoso, o qual pode se materializar sob a forma da necessidade de um órgão legislativo especial para elaborar a Constituição – Assembléia Constituinte – ou sob a forma de um quorum superior ao exigido para a aprovação, no Congresso Nacional das leis ordinárias. 8) (Esaf/AFC/CGU/2003) Em sua concepção materialista ou substancial, a Constituição se confundiria com o conteúdo de suas normas, sendo pacífico na doutrina quais seriam as matérias consideradas como de conteúdo constitucional e que deveriam integrar obrigatoriamente o texto positivado. 9) (Esaf/AFC/CGU/2003) A existência de supremacia formal da constituição independe da existência de rigidez constitucional. 10) (Esaf/AFC/CGU/2003) Na história do Direito Constitucional brasileiro, apenas a Constituição de 1824 pode ser classificada, quanto à estabilidade, como uma constituição semi-rígida. 11) (Esaf/AFC/CGU/2003) As constituições outorgadas, sob a ótica jurídica, decorrem de um ato unilateral de uma vontade política soberana e, em sentido político, encerram uma limitação ao poder absoluto que esta vontade detinha antes de promover a outorga de um texto constitucional. 12) (Esaf/AFC/CGU/2003) Segundo a melhor doutrina, a tendência constitucional moderna de elaboração de Constituições sintéticas se deve, entre outras causas, à preocupação de dotar certos institutos de uma proteção eficaz contra o exercício discricionário da autoridade governamental. 13) (Esaf/AFC/CGU/2003) Segundo a classificação das Constituições, adotada por Karl Lowenstein, uma constituição nominativa é um mero instrumento de formalização legal da intervenção dos dominadores de fato sobre a comunidade, não tendo a função ou a pretensão de servir como instrumento limitador do poder real. 14) Conhece-se como constituição-dirigente aquela que atribui ao legislador ordinário, isto é, infraconstitucional, a missão de dirigir os rumos do Estado e da sociedade. 15) Uma das classificações das constituições leva em consideração os mecanismos previstos para a mudança delas, do que resultam as categorias de constituições rígidas, flexíveis e semi-rígidas; as flexíveis são aquelas que não exigem mecanismos especiais de alteração, mais CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br solenes e complexos que os aplicados à produção do direito infraconstitucional; em todas essas espécies, devido à supremacia formal da Constituição, deve haver mecanismos adequados de controle de constitucionalidade. 16) Toda constituição escrita é rígida. 17) Toda norma constitucional, qualquer que seja o tipo de Constituição, é dotada de supremacia sobre as demais, em todos os aspectos. 18) A rigidez das constituições é o pressuposto do controle de constitucionalidade. 19) Considerando a classificação das normas constitucionais em formais e materiais, seriam dessa última categoria, sobretudo, as normas concernentes à estrutura e à organização do Estado, à regulação do exercício do poder e aos direitos fundamentais. Desse ângulo, outras normas, ainda que inseridas no corpo da Constituição escrita, seriam constitucionais tão-somente do ponto de vista formal. 20) A Supremacia material e formal das normas constitucionais é atributo presente tanto nas constituições rígidas quanto nas flexíveis. 21) O princípio da supremacia formal da Constituição é a primordial conseqüência da rigidez constitucional. 22) Apenas as normas das constituições escritas possuem supremacia. 23) Considerando a noção de constituição material, o ato de um agente público pode ser considerado inconstitucional, mesmo que afete norma não-constante do texto da Constituição escrita. 24) Em relação à supremacia material e formal das constituições, podemos afirmar que a material está relacionada à produção de um documento escrito. 25) Numa Constituição classificada como dirigente, não se encontram normas programáticas. 26) (Esaf/AFT/2003) A idéia de Constituição escrita, consagrada após o sucesso da Revolução Francesa, tem entre seus antecedentes históricos os pactos, os forais, as cartas de franquia e os contratos de colonização. GABARITOS 1) ERRADO; numa constituição do tipo não escrita, além de normas costumeiras, jurisprudenciais e convenções, temos, também, normas escritas, formalizadas em leis esparsas – como acontece na Inglaterra. 2) CERTO; o enunciado refere-se, corretamente, ao estudo do Direito Constitucional comparado segundo o critério temporal (estudo de Constituições de um mesmo Estado, em diferentes momentos histórico-temporais). 3) ERRADO; a concepção de Constituição defendida por Konrad Hesse tem pontos em comum com a concepção defendida por Ferdinand Lassalle, uma vez que ambos reconhecem a influência dos fatores reais de poder que regem uma sociedade na construção da Constituição de um Estado. Este, portanto, o ponto de convergência entre Hesse e Lassalle: ambos reconhecem a CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 19) CERTO; o enunciado traz uma ótima e irretocável síntese das concepções materialista e formalista de Constituição. 20) ERRADO; não há supremacia formal em constituição do tipo flexível. 21) CERTO; a decorrência imediata da rigidez constitucional é situar a Constituição num patamar de superioridade formal em relação a todas as demais normas, significando que a Constituição é o fundamento de validade de todas as demais normas do ordenamento; essa idéia é consagrada no denominado “princípio da supremacia da Constituição”. 22) ERRADO; podemos afirmar que apenas as normas das constituições escritas (e rígidas) possuem supremacia formal sobre as demais leis; mas as normas das constituições não escritas também são dotadas de supremacia, só que de índole material; como o enunciado não especificou, está incorreto. 23) CERTO; conforme visto, na concepção material de constituição, poderemos ter normas constitucionais fora do texto da constituição escrita; logo, uma norma ordinária (de conteúdo não constitucional) poderá ser declarada inconstitucional frente a uma norma constitucional (de conteúdo substancialmente constitucional), mesmo sabendo-se que ambas não integram o texto da constituição escrita. 24) ERRADO; a supremacia material não tem nada, absolutamente nada a ver com o processo de elaboração da norma, se escrita ou não escrita; a supremacia material tem a ver, unicamente, com o conteúdo das normas. 25) ERRADO; o que caracteriza uma constituição como dirigente é, exatamente, a presença nela de normas programáticas. 26) CERTO; conforme vimos, os pactos, os forais, as cartas de franquia e os contratos de colonização foram antecedentes importantes, que levaram à consagração da idéia da necessidade de se formalizar as regras constitucionais em documentos escritos, dando origem às Constituições escritas. Um forte abraço – e até a próxima semana, se Deus quiser. Vicente Paulo CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 1 AULA Nº 2: CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS QUANTO AO GRAU DE EFICÁCIA E APLICABILIDADE Na aula de hoje, discorreremos a respeito dos diferentes graus de eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais, segundo os ensinamentos doutrinários dominantes no nosso País. Antes de passarmos à classificação propriamente dita, quero chamar atenção para um ponto importantíssimo: não estaremos, nesse tópico, classificando o texto constitucional em “normas constitucionais eficazes” e “normas constitucionais ineficazes”, isto é, em normas constitucionais dotadas de eficácia jurídica e normas constitucionais desprovidas de eficácia jurídica. Não. Não se cuida disso. O constitucionalismo moderno refuta a idéia da existência de normas constitucionais desprovidas de eficácia jurídica. Enfim, “não existe letra morta na Constituição”. Todas as normas constitucionais, qualquer que seja o seu conteúdo, são dotadas de eficácia jurídica. O que se admite é que nem todas as normas constitucionais possuem o mesmo grau de eficácia; embora todas sejam possuidoras de eficácia jurídica, o grau dessa eficácia poderá variar de norma para norma: algumas normas constitucionais produzirão seus plenos efeitos com a simples entrada em vigor da Constituição, outras não etc. É, portanto, sob este enfoque que temos que estudar esse assunto: todas as normas constitucionais são dotadas de eficácia jurídica; porém, nem todas possuem o mesmo grau de eficácia, surgindo, por esta razão, a classificação que será apresentada nas próximas linhas. Esse assunto – grau de eficácia das normas constitucionais - é debatido em todo o mundo, e não são poucos os doutrinadores que elaboraram suas classificações para os diferentes graus de eficácia das normas constitucionais. No Brasil, merecem especial destaque as classificações elaboradas pelos constitucionalistas Ruy Barbosa e José Afonso da Silva (em verdade, para o fim de concurso público, toda a ênfase deve ser dada à classificação do Prof. José Afonso da Silva, pois é esta que tem sido, reiteradamente, cobrada pelas bancas examinadoras). 1) CLASSIFICAÇÃO DE RUY BARBOSA A tradicional classificação do jurista Ruy Barbosa, inspirada na doutrina americana, divide as normas constitucionais em dois grupos: (a) normas “auto-executáveis” (self-executing; self-enforcing; self- acting); CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 2 (b) normas “não auto-executáveis” (not self-executing; not self- enforcing provisions ou not self-acting). As normas constitucionais auto-executáveis (self-executing; self- enforcing; self-acting) são preceitos constitucionais completos, que produzem seus plenos efeitos com a simples entrada em vigor da constituição. As normas constitucionais não auto-executáveis (not self-executing; not self-enforcing provisions ou not self-acting) são normas indicadoras de princípios, sem estabelecerem normas que lhes dêem plena eficácia. Exigem atuação legislativa posterior para efetivação, possibilitando, só então sua plena execução. Observa-se que essa classificação Ruy Barbosa divide as normas constitucionais em apenas dois grupos: normas constitucionais auto- aplicáveis (que produzem seus plenos efeitos com a simples entrada em vigor da Constituição, imediata e diretamente, sem necessidade de quaisquer regulamentações por lei) e as não auto-aplicáveis (que, para produzirem seus plenos efeitos, exigem uma posterior regulamentação legislativa). 2) CLASSIFICAÇÃO DE JOSÉ AFONSO DA SILVA O Professor José Afonso da Silva formulou uma classificação própria e autônoma das normas constitucionais, hoje largamente adotada pela doutrina e jurisprudência do nosso País. Para José Afonso da Silva, as normas constitucionais não podem ser classificadas em apenas dois grupos, pois há uma terceira espécie de normas que não se encaixa, propriamente, em nenhum dos dois grupos da doutrina americana. Assim, as normas constitucionais, quanto ao grau de eficácia, são classificadas em: (a) normas constitucionais de eficácia plena; (b) normas constitucionais de eficácia contida; (c) normas constitucionais de eficácia limitada. 2.1) NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA PLENA As normas constitucionais de eficácia plena são aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 5 (b) por outras normas constitucionais (exemplos: artigos 136 a 141, que, diante do estado de defesa e estado de sítio, impõem restrições aos direitos fundamentais); (c) por certos conceitos jurídicos amplamente aceitos, tais como ordem pública, segurança nacional ou pública, integridade nacional, bons costumes, necessidade ou utilidade pública, perigo público eminente (pois, ao fixar esses conceitos, o Poder Público poderá limitar o alcance de normas constitucionais, como é o caso do art. 5º, XXV). As normas de eficácia contida são, assim, normas constitucionais dotadas de aplicabilidade direta, imediata, mas não integral, porque sujeitas a restrições que limitem sua eficácia e aplicabilidade (impostas por lei, por outras normas constitucionais ou por certos conceitos jurídicos amplamente aceitos). 2.3) NORMAS CONSTITUCIONAIS DE EFICÁCIA LIMITADA As normas constitucionais de eficácia limitada são aquelas que não produzem, com a simples entrada em vigor da Constituição, os seus efeitos essenciais, porque o legislador constituinte, por qualquer motivo, não estabeleceu, sobre a matéria, uma normatividade para isso bastante, deixando essa tarefa ao legislador ordinário ou a outro órgão do Estado. São de aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente após uma legislação ordinária ulterior que lhes desenvolva a eficácia. Vejamos, então, as distinções entre normas constitucionais de eficácia contida e normas constitucionais de eficácia limitada: (a) com a promulgação da Constituição, a força de tais normas é distinta: as normas de eficácia contida são de aplicabilidade direta e imediata, vale dizer, o direito nelas previsto é imediatamente exercitável, desde a promulgação da Constituição; as normas de eficácia limitada são de aplicabilidade indireta e mediata, vale dizer, não produzem seus plenos efeitos desde a promulgação da Constituição, ficando o exercício do direito nelas previsto dependente da edição de regulamentação ordinária; (b) ambas requerem normatização legislativa, mas a finalidade dessa normatização ordinária é distinta: nas normas de eficácia contida, a norma regulamentadora virá para restringir, para impor limites ao exercício do direito (que, até então, desde a promulgação da Constituição, era amplamente exercitável); nas normas de eficácia limitada, a norma regulamentadora virá para assegurar, para tornar viável o exercício do direito (cujo exercício, até então, estava impedido); CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 6 (c) a ausência de regulamentação implica conseqüências distintas: em se tratando de norma de eficácia contida, enquanto não houver regulamentação ordinária, o exercício do direito é amplo (a legislação ordinária virá para impor restrições ao exercício desse direito); em se tratando de norma de eficácia limitada, enquanto não houver regulamentação ordinária, o exercício do direito permanece obstado, impedido (a legislação ordinária virá para tornar viável o exercício desse direito). Pensem no direito de greve assegurado constitucionalmente ao servidor público, dependente de regulamentação por lei ordinária específica (CF, art. 37, VII: “o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”). De acordo com as considerações acerca das normas constitucionais de eficácia contida e limitada, acima expendidas, podemos afirmar o seguinte: (a) se o direito de greve dos servidores públicos for norma de eficácia contida, diante da falta de norma regulamentadora (lei específica) os servidores poderão exercer amplamente tal direito; (b) se o direito de greve dos servidores públicos for norma de eficácia limitada, diante da falta de norma regulamentadora (lei específica) os servidores não poderão realizar movimentos grevistas, haja vista que, nesta espécie de normas constitucionais, o direito só poderá ser exercido após a devida regulamentação. Moral da história: como o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou entendimento de que o direito de greve dos servidores públicos (CF, art. 37, VII) é norma constitucional de eficácia limitada, dependente de regulamentação para a produção de seus plenos efeitos, e até hoje a lei específica ainda não foi editada, o fato é que os servidores públicos permanecem impedidos de exercerem o direito de greve (só poderão exercê-lo após a publicação da requerida lei específica regulamentadora). O Professor José Afonso da Silva divide as normas de eficácia limitada em dois grupos distintos: (a) definidoras de princípio institutivo ou organizativo; (b) definidoras de princípio programático. As normas definidoras de princípio institutivo ou organizativo são aquelas pelas quais o legislador constituinte traça esquemas gerais de estruturação e atribuições de órgãos, entidades ou institutos, para que o legislador ordinário os estruture em definitivo, mediante lei. São exemplos: “a lei disporá sobre a organização administrativa e judiciária dos Territórios” (art. 33); “a lei disporá sobre a criação, estruturação e atribuições dos Ministérios” (art. 88); “a lei regulará a organização e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional” (art. 91, § 2º); “a lei CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 7 disporá sobre a constituição, investidura, jurisdição, competência, garantias e condições de exercício dos órgãos da Justiça do Trabalho” (art. 113). Essas normas constitucionais definidoras de princípio institutivo podem ser impositivas ou facultativas. São impositivas aquelas que determinam ao legislador, em termos peremptórios, a emissão de uma legislação integrativa, isto é, que estabelecem uma obrigação para o legislador. Exemplos: “a faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei” (art. 20, § 2º); “lei federal disporá sobre a utilização, pelo Governo do Distrito Federal, das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros militar” (art. 32, § 4º); “a lei disporá sobre a organização administrativa e judiciária dos Territórios” (art. 33); “a lei disporá sobre a criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública” (art. 88); “a lei regulará a organização e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional” (art. 91, § 2º). São facultativas ou permissivas quando não impõem uma obrigação, mas limitam-se a dar ao legislador ordinário a possibilidade de instituir ou regular a situação nelas delineada, isto é, quando estabelecem uma mera faculdade para o legislador. Exemplos: “lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre...” (art. 22, parágrafo único); “a lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual...” (art. 125, § 3º); “os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas...” (art. 25, § 3º); “a União poderá instituir, mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior...” (art. 154, I). As normas constitucionais definidoras de princípios programáticos são aquelas pelas quais o constituinte, em vez de regular, direta e imediatamente, determinados interesses, limitou-se a lhes traçar os princípios para serem cumpridos pelos seus órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos), como programas das respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do Estado. Constituem programas a serem realizados pelo Poder Público, disciplinando os interesses econômico-sociais, tais como: realização da justiça social; valorização do trabalho; amparo à família; combate à ignorância etc. Esse grupo de normas consubstancia o que a doutrina constitucional denomina “normas programáticas”, como são exemplos: “proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei” (art. 7º, XX); “proteção em face da CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 10 b) impedimento à produção de novas leis e/ou atuação do Estado em sentido contrário (embora atualmente o servidor público não possa deflagrar um movimento grevista, seria flagrantemente inconstitucional a publicação de uma lei que vedasse ao servidor público o direito à greve, por contrariar o disposto na norma programática, isto é, por ser contrária ao programa estabelecido pela Constituição Federal). Além dessa eficácia negativa, a norma programática também serve de parâmetro para interpretação do texto constitucional, uma vez que o intérprete da constituição deve levar em conta todos os seus comandos, com o fim de estabelecer uma harmonia e unidade de todos os valores constitucionais. EXERCÍCIOS DE CONCURSOS. 1) (Esaf/AFT/2003) Segundo a melhor doutrina, as normas de eficácia contida são de aplicabilidade direta e imediata, no entanto, podem ter seu âmbito de aplicação restringido por uma legislação futura, por outras normas constitucionais ou por conceitos ético- jurídicos. 2) (Esaf/AFT/2003) Segundo a melhor doutrina, as normas constitucionais de eficácia limitada são do tipo normas declaratórias de princípios institutivos quando: determinam ao legislador, em termos peremptórios, a emissão de uma legislação integrativa; ou facultam ao legislador a possibilidade de elaborar uma lei, na forma, condições e para os fins previstos; ou possuem esquemas gerais, que dão a estrutura básica da instituição, órgão ou entidade a que se referem, deixando para o legislador ordinário a tarefa de estruturá-los, em definitivo, mediante lei. 3) As normas programáticas são, na sua maioria, normas auto- aplicáveis. 4) Normas constitucionais programáticas somente se tornam normas jurídicas depois de reguladas por lei, uma vez que, antes disso, não são capazes de produzir efeito jurídico. 5) Um direito previsto numa norma constitucional de eficácia contida pode ser restringido por meio de lei ordinária. 6) Uma lei ordinária que destoa de uma norma programática da Constituição não pode ser considerada inconstitucional. GABARITO 1) CERTO; o enunciado aponta as duas características das normas constitucionais de eficácia contida, quais sejam: (a) são dotadas de aplicabilidade direta e imediata; (b) podem ser objeto de restrições impostas por lei, por outras normas constitucionais ou por conceitos ético-jurídicos geralmente aceitos. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 11 2) CERTO; o enunciado apresenta, literalmente, a definição dada pelo Prof. José Afonso da Silva às normas constitucionais de eficácia limitada definidoras de princípios institutivos. 3) ERRADO; as normas programáticas, conforme vimos, são espécie do gênero normas constitucionais de eficácia limitada (normas constitucionais de eficácia limitada definidoras de princípios programáticos) e, como tais, não são normas auto-aplicáveis. 4) ERRADO; vimos que a tese segundo a qual as normas programáticas são desprovidas de eficácia enquanto não regulamentadas por lei não é aceita modernamente, pois, com a simples promulgação da Constituição, elas já produzem os seguintes efeitos jurídicos: (a) revogam as disposições anteriores em sentido contrário; (b) impedem a futura produção de normas em sentido contrário; (c) servem de parâmetro de interpretação do texto constitucional. 5) CERTO; norma constitucional de eficácia contida, por definição, é justamente aquela que admite a imposição de restrição ao direito nela previsto, seja por meio de lei, por meio de outras normas constitucionais ou por meio da fixação de conceitos ético-jurídicos geralmente aceitos. 6) ERRADO; uma lei ordinária que contraria uma norma programática é inconstitucional, pois, como vimos, a norma programática impede a produção de leis em sentido contrário, contrárias aos seus programas. Pois é, fácil, super tranqüila essa aula de hoje, para compensar o cansaço da semana passada - e guardar fôlego para as próximas (que serão imensas, tratando dos assuntos “Modificação da Constituição Federal de 1988” e “Direitos Fundamentais”). Um forte abraço – e até a próxima semana. Obs: Àqueles que desejarem um estudo mais aprofundado sobre esse assunto recomendo a leitura da obra “Aplicabilidade das Normas Constitucionais”, do Prof. José Afonso da Silva (Editora Malheiros), que foi a base para a elaboração dessa minha breve aula. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 1 AULA Nº 3: MODIFICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Na aula de hoje, de conteúdo extenso, estudaremos os processos de modificação da nossa Constituição Federal de 1988 – e eu quero todo mundo animado, apaixonado por esse assunto! Este é um assunto em relação ao qual eu não admito preguiça, desinteresse por parte do aluno, por dois motivos: primeiro, porque ele é um dos tópicos mais exigidos em concursos públicos; segundo, porque só o fato de termos a oportunidade de estudar um tema como este, de tamanha grandiosidade, já é estímulo mais do que suficiente para um bom estudo! Direito Constitucional, acredite, é uma disciplina apaixonante, é a disciplina, ao lado do Direito Penal, que mais desperta no candidato a paixão pelo estudo do Direito. Então, se você ainda não se despertou para isso, se ainda não “rolou esse sentimento”, é porque você não está estudando de coração aberto, não está pensando na grandiosidade dessa missão lhe foi confiada, de estudar Direito Constitucional para concurso público! E esse ponto, então, é uma paixão! Pare e pense no que vamos fazer nas próximas páginas: estudar como se modifica a Constituição Federal de 1988, a Lei Maior do nosso País! Ao final, saberemos como poucas pessoas no País sobre o processo legislativo de aprovação de uma emenda constitucional; o que pode e o que não pode ser suprimido da Constituição por meio de emenda; como pode ser fiscalizado pelo Poder Judiciário o processo de modificação da Constituição etc. Caramba, sinta a emoção: estaremos “modificando” a obra da Assembléia Nacional Constituinte de 1988! Bem, contenha um pouco dessa emoção e vamos aos estudos. (risos) 1) RIGIDEZ / PODER CONSTITUINTE Vimos em aula pretérita que a nossa Constituição Federal de 1988 é do tipo rígida, pois exige um processo especial para modificação de seu texto, mais dificultoso do que aquele de elaboração das demais normas. Assim, num Estado como o nosso, que adota Constituição do tipo rígida, temos dois processos legislativos distintos: um processo legislativo solene, para elaboração das normas constitucionais; um processo legislativo simples, para elaboração das normas infraconstitucionais. Surgem, também a partir dessa distinção, dois legisladores distintos: o legislador constituinte, competente para a elaboração de normas constitucionais; e o legislador ordinário, que elabora as normas ordinárias, infraconstitucionais. No Brasil, por exemplo, o Congresso Nacional ora atua como legislador constituinte (quando elabora emendas à Constituição), ora atua como legislador ordinário (quando elabora as normas infraconstitucionais, tais como: leis, decretos legislativos, resoluções etc.). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 4 Esse procedimento de modificação da Constituição ocorreu, de fato, em 1993/1994, momento em que foram aprovadas seis emendas constitucionais de revisão (ECR), alterando alguns poucos dispositivos constitucionais. São as seguintes as características do procedimento de revisão constitucional: a) procedimento simplificado: exigia, apenas, maioria absoluta do Congresso Nacional, em sessão unicameral, para a modificação da Constituição (bem mais simples do que as exigências para a reforma constitucional, que é a aprovação, em dois turnos de votação em cada Casa Legislativa, de três quintos de seus membros); Cabe destacar que sessão unicameral do Congresso Nacional não é o mesmo que sessão conjunta do Congresso Nacional. Na sessão conjunta, a discussão da matéria é em conjunto (deputados e senadores), mas a votação é em separado (apura-se a maioria absoluta entre os integrantes das duas Casas Legislativas, separadamente). Na sessão unicameral, como a própria denominação indica, temos o Congresso Nacional atuando como uma só Casa, isto é, a discussão e a votação são realizadas em conjunto, desconsiderando-se a condição de deputado e senador (a apuração da maioria absoluta não será em separado, em cada uma das Casas Legislativas, mas em conjunto). Assim, serão necessários 298 votos para se atingir a maioria absoluta (primeiro número inteiro após a metade de 513 deputados mais 81 senadores). b) procedimento único: só foi prevista uma revisão constitucional, cinco anos após a promulgação da CF/88; ocorrida esta, em 1993/1994, não poderá ser realizada outra, com base na autorização do art. 3º do ADCT; Da mesma forma, não poderá ser criado outro procedimento simplificado de revisão, mesmo que por meio de emenda constitucional aprovada nos termos do art. 60 da CF. Assim, ocorrida a revisão constitucional em 1993/1994, enquanto tiver vigência a Constituição Federal de 1988 o seu texto somente poderá ser modificado por meio do procedimento de reforma, rígido e dificultoso, previsto no art. 60 da CF. c) vedação aos Estados-membros: os Estados-membros não podem criar um procedimento simplificado de revisão para modificação do texto de suas Constituições; Segundo orientação do Supremo Tribunal Federal, o processo de modificação da Constituição do Estado-membro há que observar o procedimento rígido de reforma, previsto no art. 60 da Constituição Federal, não podendo esses entes federados estabelecer um processo simplificado de revisão, nos moldes daquele previsto para a Constituição Federal, no art. 3º do ADCT. d) promulgação das emendas: as emendas constitucionais aprovadas durante a revisão constitucional são denominadas “emendas constitucionais de revisão (ECR)”, e foram promulgadas pela Mesa do Congresso Nacional (visto que estas foram aprovadas pelo Congresso Nacional, em sessão unicameral); CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 5 Anote-se que essa promulgação é distinta da promulgação das emendas constitucionais resultantes de reforma constitucional, com fundamento no art. 60 da CF/88, pois estas são promulgadas pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal (CF, art. 60, § 3º), uma vez que são aprovadas em separado, pelas duas Casas do Congresso Nacional (CF, art. 60, § 2º). 4.1) REFORMA CONSTITUCIONAL O processo de reforma constitucional está previsto no art. 60 da Constituição Federal, e é um procedimento bem mais dificultoso do que aquele acima estudado, de revisão constitucional. São características da reforma constitucional (CF, art. 60): a) procedimento árduo, rígido: exige-se discussão e votação em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, devendo ser aprovada, em ambos os turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros (bem mais difícil do que o procedimento de revisão, que exigia, apenas, maioria absoluta do Congresso Nacional, em sessão unicameral); b) procedimento permanente, perene: ao contrário da revisão constitucional (procedimento único), o processo de reforma é permanente, isto é, enquanto vigente a atual Constituição o seu texto poderá ser modificado por meio de reforma, segundo o procedimento estabelecido no art. 60 da CF/88; c) vinculação dos Estados-membros: ao contrário do procedimento simplificado de revisão (que não pode ser copiado pelos Estados-membros), o procedimento de reforma, previsto no art. 60 da CF/88, é de observância obrigatória por parte dos Estados-membros, no tocante à modificação de suas constituições; Assim, os Estados-membros, ao estabelecerem o procedimento de reforma de suas constituições, deverão observar as regras estabelecidas pelo art. 60, para modificação da Constituição Federal, inclusive no tocante à deliberação para aprovação, que deverá ser, necessariamente, de três quintos (o Estado não poderá adotar deliberação mais flexível – maioria absoluta, por exemplo -, tampouco mais rígida – quatro quintos, por exemplo). d) promulgação das emendas: as emendas constitucionais resultantes de reforma constitucional são promulgadas pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal (CF, art. 60, § 3º), ao contrário das emendas constitucionais de revisão (ECR), resultantes do procedimento de revisão, que foram promulgadas pela Mesa do Congresso Nacional (visto que estas foram aprovadas pelo Congresso Nacional, em sessão unicameral). As orientações doutrinárias e jurisprudencias a respeito do procedimento de reforma constitucional serão apresentadas mais adiante (item 6), no momento em que examinaremos todos os dispositivos do art. 60 da Constituição Federal. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 6 QUADRO COMPARATIVO Modificação da Constituição Federal de 1988 Revisão (ADCT, art. 3º) Reforma (CF, art. 60) Procedimento único Procedimento permanente Procedimento simplificado Procedimento árduo, rígido Não pode ser criado novo por EC Não pode ser prejudicado por EC Não extensível aos Estados Vinculante para os Estados ECR promulgadas pela Mesa do Congresso Nacional EC promulgadas pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal 5) LIMITAÇÕES AO PODER CONSTITUINTE DERIVADO NA CF/88 Conforme vimos antes, o poder constituinte derivado é um poder limitado, condicionado, isto é, sujeito às limitações impostas pelo poder constituinte originário. Como em Direito “dá-se nome a tudo”, a doutrina estabeleceu uma classificação para essas limitações, dividindo-as em quatro grupos distintos: a) limitações temporais; b) limitações circunstanciais; c) limitações processuais ou formais; d) limitações materiais. 5.1) LIMITAÇÕES TEMPORAIS Temos limitações temporais quando a Constituição estabelece um prazo durante o qual o seu texto não poderá ser modificado. Ao estabelecer limitações temporais, o poder constituinte originário assegura um período de absoluta imutabilidade para sua obra. Seria o caso, por exemplo, de a Constituição estabelecer que não admitiria nenhuma mudança no seu texto nos primeiros dez anos após a sua promulgação. Na Constituição Federal de 1988 não há limitações temporais, vale dizer, o legislador constituinte originário não impôs à atuação do legislador constituinte derivado limitações de ordem temporal. Significa dizer que não houve, na vigência da atual Constituição, nenhum período durante o qual ela não pudesse ser modificada. Desde a data de sua promulgação o texto constitucional sempre pôde ser modificado, desde que obedecido o procedimento de reforma constitucional, previsto no art. 60 da CF. Embora a revisão constitucional tenha sido estabelecida para ocorrer somente cinco anos após a promulgação da Constituição, durante esse qüinqüênio o texto constitucional poderia ser modificado, desde que pelo procedimento rígido de reforma constitucional, estabelecido no art. 60 da Constituição CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 9 A última limitação processual ou formal está prevista no § 5º do art. 60, que estabelece que “a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa”. Cuida-se da chamada irrepetibilidade, na mesma sessão legislativa, de PEC rejeitada ou havida por prejudicada. Anote-se que essa irrepetibilidade é absoluta: não há possibilidade da matéria rejeitada ou havida por prejudicada constituir nova PEC na mesma sessão legislativa. Mais uma vez, tem-se aqui uma distinção em relação ao processo legislativo das leis, pois a matéria constante de projeto de lei rejeitado poderá constituir objeto de novo projeto, na mesma sessão legislativa, desde que mediante proposta da maioria absoluta dos membros de qualquer das Casas do Congresso Nacional (CF, art. 67). Assim, podemos resumir dizendo o seguinte: a irrepetibilidade de proposta de emenda constitucional rejeitada ou havida por prejudicada é absoluta (CF, art. 60, § 5º); ao contrário, a irrepetibilidade de projeto de lei rejeitado é relativa (CF, art. 67). 5.4) LIMITAÇÕES MATERIAIS Temos limitações materiais quando a Constituição estabelece certas matérias, certos conteúdos que não poderão ser abolidos por meio de emenda, isto é, por obra do poder constituinte derivado. O legislador constituinte resolve, para manter a integridade/unidade de sua obra, estabelecer um núcleo essencial que não poderá ser afastado, suprimido, por ação do poder constituinte derivado. A doutrina divide as limitações materiais em dois grupos: (a) explícitas ou expressas, quando constam expressamente do texto da Constituição; (b) implícitas ou tácitas, quando não constam expressamente do texto da Constituição. No Brasil, temos tanto limitações materiais expressas ou explícitas, como limitações materiais implícitas ou tácitas. As limitações materiais explícitas ou tácitas estão previstas no § 4º do art. 60, que estabelece que “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes e os direitos e garantias individuais”. Essas matérias expressamente apontadas pelo § 4º do art. 60 são denominadas “cláusulas pétreas expressas” e representam o núcleo insuscetível de abolição da nossa Constituição. As limitações materiais implícitas ou tácitas não constam expressamente do texto da Constituição Federal de 1988. Se não constam do texto da Constituição, significa dizer que são resultado de criação doutrinária, obra dos estudiosos do Direito. A idéia desenvolvida pela doutrina foi mais ou menos a seguinte: além daquelas matérias apontadas expressamente na Constituição CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 10 como insuscetíveis de abolição, há outras que, embora não tenha havido uma vedação expressa nesse sentido, também não poderão ser suprimidas por obra do poder constituinte derivado, sob pena de fraude completa à obra do poder constituinte originário. Segundo a doutrina dominante, essas limitações implícitas seriam as seguintes: a) a titularidade do poder constituinte originário; Sabe-se que a titularidade do poder constituinte pertence ao povo, vale dizer, somente o povo tem o poder de decidir o momento e como elaborar uma nova Constituição. Então, seria flagrantemente inconstitucional a aprovação, pelo Congresso Nacional, de uma emenda à Constituição que retirasse essa soberania do povo e outorgasse a um órgão constituído o poder de elaborar a nova Constituição brasileira. Imagine-se uma emenda constitucional outorgando essa competência ao Presidente da República, ato que seria flagrantemente inconstitucional por afrontar uma limitação material implícita ou tácita. b) a titularidade do poder constituinte derivado; Pelas mesmas razões apontadas acima, seria flagrantemente inconstitucional uma emenda à Constituição em que o Congresso Nacional repassasse a sua competência para modificar a Constituição a outro órgão do Estado (ao Presidente da República, por exemplo). Ora, a competência para modificar a Constituição Federal de 1988 foi fixada pelo poder constituinte originário (afinal, a Constituição é obra dele, só ele pode fixar a competência para sua modificação!) e qualquer tentativa de alterar essa competência será inválida, por esbarrar numa limitação material implícita ou tácita. c) o próprio procedimento de revisão constitucional (ADCT, art. 3º) e de reforma constitucional (CF, art. 60); Sem dúvida, essa é a limitação material implícita que mais nos interessa para o fim de concurso público, por ser reiteradamente cobrada em provas e mais provas. Vamos estudá-la com muita atenção, a coisa é sutil, exige concentração e mente ligada (se você estiver com a mente cansada ou com preguiça, melhor ir dar uma volta, fazer um intervalo primeiro!). Pense assim: (1) em 1988, ao elaborar a Constituição Federal e prever o procedimento para sua modificação, o legislador constituinte originário impôs certas limitações ao poder constituinte derivado na execução dessa tarefa, dessa tarefa de modificar o texto constitucional, prescrevendo dois procedimentos para tal modificação – um de revisão (ADCT, art. 3º) e outro de reforma (CF, art. 60); (2) esses procedimentos contêm certas limitações que deverão, obrigatoriamente, ser observadas pelo poder constituinte derivado, sob pena de invalidade da modificação efetivada; (3) enfim, o legislador constituinte originário chegou e prescreveu o seguinte ao poder constituinte derivado: “olha, você poderá modificar a minha obra, mas deverá, necessariamente, observar os procedimentos e limitações impostos pelos artigos 60 da CF e 3º do ADCT; não os desobedeça, senão a modificação não será válida”. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 11 Pois é, agora pense assim: se o poder constituinte derivado pudesse, ele próprio, afastar as limitações que lhe foram impostas pelo poder constituinte originário, o valor dessas limitações seria zero, não adiantariam nada, absolutamente nada! Imagine: se “A” impõe limitações a “B”, mas se “B” pode, por ato próprio, afastar essas limitações, que força terão tais limitações? Mais uma: se o pai impõe limitações ao filho, e se o próprio filho pode afastar, por sua conta, essas limitações, que força terão tais restrições? Nenhuma, absolutamente nenhuma! Ele simplesmente afastará tais limitações e estará livre, para fazer o que quiser! Esta, portanto, a razão do surgimento dessa limitação material implícita: se o poder constituinte derivado pudesse, por ato próprio, modificar as regras para sua atuação no tocante à modificação da Constituição, estaria ele fraudando a obra do poder constituinte originário; teríamos, nesse caso, a criatura (poder constituinte derivado) modificando a obra do criador (poder constituinte originário); não pode o destinatário das limitações afastá-las, por ato próprio, sob pena de absoluta desvalia destas. Dessa forma, os procedimentos de revisão (ADCT, art. 3º) e de reforma (CF, art. 60) não poderão ser objeto de modificações substanciais por meio de emenda à Constituição, que afastem, que prejudiquem, que alterem substancialmente as regras ali estabelecidas pelo poder constituinte originário. Conforme dito antes, enquanto tiver vida a vigente Constituição, o seu texto somente poderá ser modificado de acordo com os procedimentos e requisitos estabelecidos no art. 60 da Constituição Federal (haja vista que o procedimento de revisão já se esgotou); qualquer tentativa de prejudicá-lo, de modificá-lo substancialmente, ou de criar outro procedimento qualquer, será flagrantemente inconstitucional, por esbarrar numa limitação material implícita. Citarei, a seguir, exemplificativamente, dez exemplos de emendas à Constituição que seriam inconstitucionais por afrontar uma limitação material implícita (todos os dez exemplos estão corretos; se você não os entender, tampouco entender as minhas explicações constantes dos gabaritos das questões de concursos, envie sua dúvida para o fórum): (1) Seria inconstitucional, por afrontar uma limitação material implícita, uma emenda à Constituição Federal que estabelecesse um novo procedimento simplificado de revisão, a ser realizado no ano de 2006. (2) Seria inconstitucional, por afrontar uma limitação material implícita, uma emenda à Constituição Federal que suprimisse do texto constitucional a vedação de sua reforma durante o estado de defesa. (3) Seria inconstitucional, por afrontar uma limitação material implícita, uma emenda à Constituição Federal que alterasse a exigência de deliberação para aprovação da reforma, de três quintos dos membros das Casas Legislativas para maioria absoluta desses mesmos membros. (4) Seria inconstitucional, por afrontar uma limitação material implícita, uma emenda à Constituição Federal que alterasse o atual texto constitucional, de CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 14 6) CONSIDERAÇÕES DIVERSAS Para concluirmos o estudo do processo de modificação da Constituição Federal de 1988, apresentarei a seguir breves comentários acerca das disposições do artigo 60 da Constituição Federal. 6.1) SOBRE A INICIATIVA A respeito da iniciativa, destaco três pontos importantes: a) inexistência de iniciativa popular: ao contrário do processo legislativo das leis, em que há iniciativa popular nas três esferas de governo (CF, artigos 27, § 4º; 29, XIII; 61, § 2º), não há previsão para que o cidadão apresente proposta de emenda à Constituição Federal (iniciativa popular); b) inexistência de iniciativa reservada: ao contrário do processo legislativo das leis, em que há reserva de iniciativa para diversas autoridades e órgãos (exemplo: art. 61, § 1º; art. 93 etc.), não há iniciativa reservada, exclusiva ou privativa em se tratando de emenda à Constituição; assim, aquelas matérias que são de iniciativa privativa quando tratadas em texto de lei, não serão de iniciativa privativa se tratadas em emenda à Constituição (exemplo: o Presidente da República não mantém a sua iniciativa privativa de lei, prevista no art. 61, § 1º, se aquelas matérias ali previstas forem tratadas em emenda à Constituição); c) inexistência de participação dos Municípios: os Municípios não participam, em momento algum, do processo de modificação da Constituição Federal, pois eles não dispõem de iniciativa em PEC, tampouco participam das discussões e deliberações sobre a PEC, haja vista que os Municípios não têm representação no Legislativo Federal; os Estados e o Distrito Federal participam, tanto na apresentação de PEC, por meio de suas Casas Legislativas (CF, art. 60, III), quanto nas discussões e deliberações sobre a PEC, haja vista que o Senado Federal representa os Estados e o DF; portanto, repito, os Municípios não participam da formação da vontade nacional, da ordem jurídica nacional, visto que eles não atuam, em momento algum, no processo de modificação da Constituição Federal. 6.2) SOBRE O CONTROLE JUDICIAL DA REFORMA Estabelece a Constituição Federal que não será objeto de deliberação a emenda tendente a abolir cláusula pétrea (CF, art. 60, § 4º). Em face desse dispositivo, e considerando que o processo legislativo – de elaboração de emendas e de leis – deve fiel observância às normas constitucionais, entende o Supremo Tribunal Federal que uma emenda tendente a abolir cláusula pétrea, ou que desrespeite as prescrições constitucionais pertinentes (CF, art. 60), não pode, sequer, ser objeto de deliberação no Congresso Nacional, pois, nesse caso, o próprio processo legislativo, a própria tramitação da proposta no Congresso Nacional já desrespeita flagrantemente a Constituição Federal. Desse modo, a simples tramitação de uma PEC que afronte o art. 60 da Constituição Federal já implica desrespeito à Constituição Federal e, como tal, já poderá ser fiscalizada, combatida pelo Poder Judiciário. Iniciada a CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 15 tramitação da PEC, o Poder Judiciário já poderá ser chamado para fiscalizar, para impedir que haja deliberação sobre a matéria no Congresso Nacional. Esse controle, porém, só poderá ser exercido se observados os seguintes requisitos: a) instauração por um congressista; Segundo o STF, só os congressistas podem dar início a esse controle, pois só eles dispõem de direito líquido e certo nessa situação, que é o direito líquido e certo de não participar de uma deliberação que desrespeita a Constituição. Terceiros (que não sejam congressistas), portanto, não podem instaurar esse controle. b) via do mandado de segurança; O STF firmou entendimento de que a ação cabível para esse controle é o mandado de segurança, que protegerá o direito líquido e certo do congressista, de não participar de uma deliberação que afronta a Constituição Federal. c) ajuizamento exclusivamente perante o STF. O mandado de segurança será ajuizado exclusivamente perante o STF, visto que esse Tribunal é o foro que aprecia, originariamente, os atos emanados dos órgãos do Congresso Nacional, de suas Casas e de suas Comissões. Assim, nenhum outro juiz ou tribunal do País dispõe de competência para realizar esse excepcional controle. Se antes do julgamento do mandado de segurança a EC é promulgada, o mandado restará prejudicado, por perda de objeto, vale dizer, o STF não mais o apreciará. Isso porque o mandado foi ajuizado com o fim de fiscalizar/sustar o processo legislativo de tramitação da PEC, que não mais existe, se esta já foi aprovada/promulgada. Em suma, podemos afirmar que o controle judicial da modificação da Constituição Federal, enquanto proposta de emenda à Constituição (PEC), é um controle restrito: só por congressista, só por mandado de segurança e só perante o STF. Situação bem distinta é quando a emenda é promulgada, isto é, quando a proposta deixa de ser proposta e passa a ser uma emenda à Constituição (EC). A partir daí, a partir da promulgação da emenda constitucional, o controle judicial passa a ser amplo, vale dizer, a emenda poderá ser questionada perante o Poder Judiciário tanto na via concreta quanto na via abstrata, caso se vislumbre ofensa a algum dos dispositivos do art. 60 da Constituição Federal. Após a promulgação da emenda constitucional, a fiscalização do Poder Judiciário poderá ocorrer: a) em concreto, a partir da iniciativa de qualquer pessoa prejudicada pelos termos da emenda constitucional, perante qualquer juiz ou tribunal do País; nesse caso, a decisão do Poder Judiciário, por si só, somente alcançará as partes do processo (eficácia inter partes); CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 16 b) em abstrato, a partir da iniciativa de um dos legitimados pela Constituição Federal, perante o Supremo Tribunal Federal; nesse caso, a decisão do STF reconhecendo a inconstitucionalidade retira a norma do ordenamento jurídico (eficácia erga omnes). Para examinarmos essa distinta atuação do Poder Judiciário – antes e depois da promulgação da emenda constitucional -, vejamos o que aconteceu com a PEC 41, que resultou na Emenda Constitucional nº 41, de 19/12/2003 (Reforma da Previdência). Fiscalização da PEC nº 41 (enquanto proposta, antes da promulgação): durante sua tramitação no Congresso Nacional, a PEC nº 41 já sofreu fiscalização pelo Supremo Tribunal Federal, por meio de vários mandados de segurança ajuizados por congressistas, no intento de sustar a sua tramitação. Por que, então, não foi sustada a sua tramitação? Porque o Supremo Tribunal Federal indeferiu todos os pedidos de medida liminar nos citados mandados de segurança (aliás, que fique claro: afirmar que nessa fase de tramitação poderá ser ajuizado mandado de segurança perante o STF, com o fim de sustar o processo legislativo, não significa dizer que o pedido do congressista, necessariamente, será deferido pelo STF; o congressista, ao ajuizar o mandado de segurança, defenderá a tese de que a PEC desrespeita a Constituição Federal e por isso deve ser sustada a sua tramitação, mas o STF poderá entender que não, e indeferir o pedido). Fiscalização da EC nº 41, de 19/12/2003 (emenda já promulgada): após a promulgação, a EC nº 41 tem sido objeto de diversas ações judiciais, tanto no âmbito do controle difuso, quanto em sede de controle concentrado. Assim, servidores públicos, ativos e inativos, e pensionistas de várias localidades do País que foram atingidos pelos termos da EC nº 41 já ajuizaram mandado de segurança pleiteando o afastamento da aplicação, em relação a eles (eficácia inter partes), das novas regras constitucionais (teto de remuneração, contribuição previdenciária etc.). Da mesma forma, legitimados pela Constituição Federal já ajuizaram perante o STF ações diretas de inconstitucionalidade (ADIN), requerendo a declaração da inconstitucionalidade de alguns dispositivos da EC nº 41 (contribuição previdenciária dos servidores inativos e pensionistas, por exemplo), com o fim de retirá-los do ordenamento jurídico (eficácia erga omnes). Vejamos, a seguir, um quadro comparativo entre esses dois momentos de fiscalização judicial do processo de elaboração de emenda à Constituição (antes e depois da promulgação): CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 19 O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que a cláusula pétrea “direitos e garantias individuais” protege direitos e garantias dispersos ao longo do texto constitucional, e não somente aqueles enumerados no artigo 5º da Constituição Federal. Ao firmar esse entendimento, o STF considerou cláusula pétrea o princípio da anterioridade tributária (CF, art. 150, III, “b”), por representar uma garantia individual do contribuinte. Portanto, não são somente os direitos e garantias individuais previstos no artigo 5º da Constituição Federal que estão gravados como cláusula pétrea; outros direitos e garantias individuais previstos em outros dispositivos constitucionais também são protegidos pela cláusula da não-abolição. 6.5) SOBRE O MECANISMO “DUPLA REVISÃO” Alguns autores não aceitam a idéia de que uma cláusula pétrea não possa, nunca, ser suprimida, a não ser por obra do poder legislador constituinte originário, na elaboração de uma nova Constituição. Defendem eles que a Constituição tem por fim último regular a vida política do Estado e, sendo esta dinâmica, mutável, não se pode falar em texto definitivo, que não possa ser suprimido numa Constituição. Assim, para esses doutrinadores, as cláusulas pétreas poderiam ser superadas, afastadas do texto constitucional, desde que por meio de um procedimento especial de “dupla revisão”, isto é, desde que por meio da aprovação de duas emendas constitucionais seqüenciais. Enfim, as cláusulas pétreas não poderiam ser superadas por meio da aprovação de uma emenda constitucional, mas poderiam ser superadas por meio da aprovação de duas emendas seqüenciais. Dessa forma, se o Congresso Nacional pretendesse, hoje, retirar o direito de voto do analfabeto por meio da promulgação de uma emenda constitucional, não poderia fazê-lo, pois essa emenda esbarraria numa cláusula pétrea, que é o direito de voto universal (CF, art. 60, § 4º, II). Entretanto, poderia o Congresso Nacional suprimir o direito de voto do analfabeto, desde que por meio da efetivação da “dupla revisão”, isto é, por meio da aprovação de duas emendas constitucionais, da seguinte maneira: (1) na primeira emenda, seria suprimida da Constituição Federal a cláusula pétrea “voto direto, secreto, universal e periódico”, isto é, a primeira emenda revogaria o inciso II do § 4º do art. 60 da CF; (2) num segundo momento, já com base no novo texto constitucional (sem a cláusula pétrea do voto), aprovar-se-ia uma segunda emenda constitucional abolindo o direito de voto do analfabeto. Anote-se que, se seguido esse procedimento, restar-se-ia superada a cláusula pétrea, por meio da realização da “dupla revisão” (aprovação de duas emendas seqüenciais). Esse entendimento, contudo, não é aceito pela doutrina e jurisprudência dominantes no nosso País, pois, na dupla revisão, a primeira emenda à Constituição, que revogaria a limitação prevista no texto constitucional, seria CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 20 flagrantemente inconstitucional, por violar uma limitação material implícita ou tácita, que impede alterações prejudiciais no procedimento de modificação da Constituição Federal. Portanto, no Estado brasileiro não se admite a superação de uma cláusula pétrea por meio do procedimento de dupla revisão. 6.6) SOBRE A IRREPETIBILIDADE DE PEC REJEITADA Dispõe a Constituição Federal que a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa (CF, art. 60, § 5º). Essa regra, conhecida como “irrepetibilidade de proposta de emenda rejeitada”, é de natureza absoluta: matéria de proposta rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa em hipótese alguma, não há exceção para essa situação (não confundir a irrepetibilidade de PEC, aqui prevista, que é absoluta, com a irrepetibilidade de projeto de lei, prevista no art. 67, que é relativa). Para melhor entendermos o ponto aqui discutido, faz-se necessária uma breve recordação da disciplina das sessões legislativas no texto da Constituição Federal. Em suma, em termos de sessão legislativa, temos o seguinte: a) de 15/02 até 30/06 (ou até que seja aprovada a Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO) temos o primeiro período legislativo; de 1º/08 a 15/12 temos o segundo período legislativo; esses dois períodos legislativos formam a Sessão Legislativa Ordinária (SLO) do respectivo ano civil; b) nos intervalos da Sessão Legislativa Ordinária, isto é, nos períodos de recesso do Congresso Nacional, poderá ser convocada Sessão Legislativa Extraordinária (SLE), desde que atendidas as prescrições constitucionais sobre a matéria, estabelecidas no art. 57, § 6º, da Carta Política. Vê-se, assim, que sessão legislativa extraordinária (SLE) é sessão legislativa distinta da ordinária (SLO). Percebe-se, também, que poderemos ter, no mesmo ano civil, sessões legislativas de natureza distinta (ordinária, que se instala automaticamente; e extraordinária, se houver convocação). Em face dessa realidade – SLE e SLO são sessões legislativas distintas -, surgiu a seguinte dúvida: a matéria constante de PEC rejeitada numa SLE pode constituir nova PEC no mesmo ano civil, em sessão legislativa distinta (SLO)? A resposta dada pelo Supremo Tribunal Federal foi positiva. Assim, considere a seguinte situação hipotética: em 15 de setembro de 2004 é apresentada uma PEC, durante o período de SLO; em face da não conclusão do processo legislativo até 15/12/2004, é convocada uma SLE para esse fim específico, isto é, para concluir a apreciação da PEC; encerra-se o ano civil de 2004 e a PEC é rejeitada no início de 2005, digamos em 15/01/2005, portanto, durante a SLE. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 21 Pergunta-se: a partir de quando essa matéria poderá constituir nova PEC? Somente no ano civil de 2006, ou já em 2005 mesmo, desde que no período de SLO? Resposta: o entendimento é de que a matéria poderá constituir nova PEC no mesmo ano civil de 2005, desde que em sessão legislativa distinta, isto é, desde que no período de SLO (a partir de 15/02/2005, portanto). Portanto, prevaleceu o entendimento de que a matéria rejeitada ou havida por prejudicada poderá ser objeto de nova proposta no mesmo ano civil, desde que em sessão legislativa diferente. A idéia central é a seguinte: poderemos ter duas sessões legislativas distintas num mesmo ano civil (SLO e SLE); como a Constituição Federal, no art. 60, § 5º, foi genérica, vedando apenas a reapresentação da matéria “na mesma sessão legislativa”, concluiu-se que a matéria poderá retornar no mesmo ano civil, desde que em sessão legislativa distinta (SLE é distinta de SLO). 6.7) REFORMA DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, o processo legislativo federal, previsto na Constituição Federal, obriga os Estados-membros. Assim, as regras básicas de reforma da Constituição Federal são de observância obrigatória pela Constituição do Estado (deliberação de 3/5, promulgação pelo Legislativo, não sujeição à sanção ou veto do Chefe do Executivo etc.). Há que se ressalvar, apenas, o bicameralismo, haja vista que no âmbito estadual o Poder Legislativo é unicameral, composto de uma só Câmara (Assembléia Legislativa), não se podendo falar, por conseguinte, em aprovação nas “duas Casas Legislativas”, como ocorre no Congresso Nacional. EXERCÍCIOS DE CONCURSOS: 1) Segundo a melhor doutrina, a aprovação de emenda constitucional, alterando o processo legislativo da própria emenda, ou revisão constitucional, tornando-o menos difícil, não seria possível, porque haveria um limite material implícito ao poder constituinte derivado em relação a essa matéria. 2) Segundo a melhor doutrina, o art. 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988 (CF/88), que previa a revisão constitucional após cinco anos, contados de sua promulgação, é uma limitação temporal ao poder constituinte derivado. 3) Segundo o STF, é possível a declaração de inconstitucionalidade de normas constitucionais resultantes de aprovação de propostas de emenda à constituição, desde que o constituinte derivado não tenha obedecido às limitações materiais, circunstanciais ou formais, estabelecidas no texto da CF/88, pelo constituinte originário. 4) A distinção doutrinária, entre revisão e reforma constitucional, materializou-se na CF/88, uma vez que o atual texto constitucional brasileiro diferencia tais processos, ao estabelecer entre eles distinções quanto à forma de reunião do Congresso Nacional e quanto ao quorum de deliberação. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 24 29) A Constituição vigente é rígida, pois impede deliberação sobre proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos Poderes e os direitos e garantias individuais. 30) Seria inconstitucional uma emenda à CF para suprimir a vedação de sua reforma na vigência do estado de sítio. 31) Emenda à Constituição não pode abolir o dever fundamental de votar. 32) Os direitos individuais estão garantidos contra o poder de reforma, mas não contra o poder de revisão constitucional. GABARITOS: 1) CERTO; conforme vimos, não se admite modificações prejudiciais no processo legislativo da própria emenda, em face da existência de uma limitação material implícita nesse sentido. 2) ERRADO; não há, na vigência da atual Constituição, limitações temporais ao poder constituinte derivado, pois, desde a sua promulgação, ela sempre pôde ser alterada, desde que pelo procedimento rígido de reforma, previsto no art. 60 da CF. 3) CERTO; uma emenda à Constituição, por ser obra do poder constituinte derivado, que é um poder limitado, condicionado, pode ser declarada inconstitucional, tanto materialmente (por versar sobre matéria vedada à emenda, ofendendo uma cláusula pétrea), quanto formalmente (descumprimento de uma regra do processo legislativo de sua elaboração). 4) CERTO; vimos, num quadro comparativo apresentado, todas as distinções entre os procedimentos de revisão e reforma. 5) CERTO; muito boa essa questão, cobrada pelo Cespe no último concurso de Auditor-Fiscal da Previdência Social; as cláusulas pétreas são limitações impostas pelo poder constituinte originário à atuação do poder constituinte derivado; não são elas imposições ao próprio poder constituinte originário; vale dizer, o próprio poder constituinte originário não deve observância às cláusulas pétreas por ele estabelecidas; logo, não é possível a declaração da inconstitucionalidade de uma norma constitucional originária (não cláusula pétrea) por desrespeitar outra norma constitucional originária que tenha sido gravada como cláusula pétrea. 6) ERRADO; essa emenda seria flagrantemente inconstitucional, por violar uma limitação material implícita, que veda a aprovação de emendas que venham abrandar, tornar menos difícil a reforma da Constituição. 7) ERRADO; os artigos que tratam das matérias gravadas como cláusulas pétreas não poderão ser abolidos, tampouco o próprio artigo 60 da Constituição Federal, que estabelece o procedimento da própria reforma constitucional. 8) ERRADO; somente um terço dos membros da Câmara dos Deputados ou dos Senadores (CF, art. 60, II). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 25 9) CERTO; essa emenda seria tendente a abolir a universalidade do voto, cláusula pétrea estabelecida no art. 60, § 4º, II, da CF. 10) ERRADO; não há iniciativa popular no processo de reforma da Constituição Federal; a iniciativa popular existente no texto constitucional é para o processo legislativo de elaboração de leis. 11) ERRADO; não há vedação para que uma emenda constitucional venha dispor sobre tributos, como tem sido feito nos últimos anos (IPMF, CPMF, contribuição de iluminação pública etc.). 12) CERTO; as cláusulas pétreas podem ser objeto de emenda, de modificações, desde que tais modificações não sejam tendentes à sua abolição. 13) CERTO; cuida-se de disposição expressa da Constituição Federal (art. 60, § 4º); tanto não pode que, conforme vimos, um congressista poderá recorrer ao STF, por meio de mandado de segurança, para tentar sustar a tramitação da PEC. 14) ERRADO; depois de promulgada, uma EC pode ser objeto de controle em abstrato perante o STF, por iniciativa de um dos legitimados pela Constituição Federal (um dos legitimados pelo art. 103 da Constituição poderá ajuizar perante o STF uma ADIN, por exemplo). 15) ERRADO; conforme vimos, não existe iniciativa privativa em se tratando de emenda à Constituição Federal; as iniciativas privativas estabelecidas na Constituição são para o tratamento das matérias em texto de lei, vale dizer, as iniciativas privativas são para apresentação de projeto de lei, e não para apresentação de proposta de emenda à Constituição. 16) CERTO; conforme vimos, é possível a existência de duas sessões legislativas diferentes num mesmo ano (SLO e SLE); logo, PEC rejeitada numa dessas sessões legislativas (SLE) poderá retornar na outra (SLO), no mesmo ano. 17) ERRADO; as cláusulas pétreas podem ser objeto de emenda à Constituição, desde que essa emenda não tenda à sua abolição. 18) CERTO; além dos direitos e garantias previstos no art. 5º da Constituição Federal, outros, dispersos ao longo do texto constitucional, também estão protegidos como cláusula pétrea. 19) CERTO; segundo o STF, o princípio da anterioridade tributária (CF, art. 150, III, “b”) é cláusula pétrea, por representar uma garantia individual do contribuinte. 20) ERRADO; não há vedação à modificação de normas constantes do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT); aliás, o ADCT já foi objeto de várias emendas constitucionais (sobre CPMF, precatórios etc.). 21) ERRADO; segundo orientação do STF, somente os congressistas poderão ajuizar esse mandado de segurança, com o fim de sustar o trâmite de PEC perante o Congresso Nacional. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 26 22) ERRADO; segundo orientação do STF, os Estados estão vinculados ao processo legislativo federal, devendo estabelecer, obrigatoriamente, a deliberação de três quintos. 23) ERRADO; matéria constante de PEC rejeitada ou havida por rejeitada não pode constituir nova proposta, em hipótese alguma, na mesma sessão legislativa (CF, art. 60, § 5º); é possível o retorno de projeto de lei rejeitado, se houver solicitação de maioria absoluta dos membros de uma das Casas do Congresso Nacional, nos termos do art. 67 da CF. 24) ERRADO; emenda à Constituição Federal não se sujeita à sanção ou veto do Chefe do Poder Executivo. 25) ERRADO; a emenda seria tendente a abolir cláusula pétrea (forma federativa de Estado e direito de voto dos cidadãos nos Estados-membros). 26) ERRADO; a emenda seria tendente a abolir cláusula pétrea (separação dos poderes, com o enfraquecimento do Legislativo frente ao Poder Executivo). 27) ERRADO; os Estados podem propor PEC, por meio de suas assembléias legislativas (CF, art. 60, III), e, também, participam da deliberação no Congresso Nacional, por meio de seus representantes no Senado Federal; os Municípios é que não participam, em momento algum, do procedimento de modificação da CF. 28) CERTO; PEC não se sujeita à sanção ou veto do Chefe do Executivo em momento algum, nem antes, nem depois de ser promulgada. 29) ERRADO; a Constituição Federal de 1988 é rígida, mas não pelo fato de possuir cláusula pétrea; é rígida em razão de exigir um processo especial, dificultoso, para a sua modificação. 30) CERTO; essa emenda seria flagrantemente inconstitucional por afrontar uma limitação material implícita ou tácita. 31) ERRADO; suprimir da Constituição Federal o dever (obrigatoriedade) de votar não desrespeita cláusula pétrea, pois tal medida não tende a abolir o direito de voto. 32) ERRADO; os direitos e garantias individuais são cláusulas pétreas e, como tais, não podem ser abolidos, nem por revisão constitucional (ADCT, art. 3º), nem por reforma constitucional (CF, art. 60), visto que esses dois procedimentos são manifestações do poder constituinte derivado. Um forte abraço – e até a próxima semana, se Deus quiser. Vicente Paulo CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Surgiram, então, como normas que exigiam uma atuação negativa do Estado (não fazer) em favor da liberdade do indivíduo. As normas que consagraram os primeiros direitos fundamentais eram, portanto, normas negativas, que não exigiam uma atuação positiva do Estado (um fazer), mas sim uma atuação negativa, uma abstenção (um não fazer) em favor da liberdade individual. Vejamos alguns exemplos. O direito de locomoção (de ir, vir e permanecer) foi um dos primeiros direitos fundamentais reconhecidos ao homem. Note-se que não se está a exigir uma ação positiva do Estado, mas sim uma abstenção deste (o Estado não poderá, arbitrariamente, desrespeitar o direito de locomoção do indivíduo). A liberdade de crença religiosa e de convicção filosófica também é um direito fundamental de índole negativa, senão vejamos: ao consagrar tais liberdades, o que a Constituição está prescrevendo é que o Estado não poderá discriminar os indivíduos em virtude de suas crenças ou convicções. Portanto, sobre a origem dos direitos fundamentais, a idéia essencial é a seguinte: os direitos fundamentais surgiram como direitos negativos, limitadores da ação do Estado em favor da liberdade do indivíduo. 2) EVOLUÇÃO E CLASSIFICAÇÃO Da sua origem até os dias de hoje, os direitos fundamentais passaram por uma significativa evolução nos diferentes ordenamentos constitucionais. As constituições modernas, a partir do século XX, passaram a reconhecer novos direitos como fundamentais aos indivíduos, em face da evolução da própria idéia de constitucionalismo. Com essa evolução, os direitos fundamentais deixaram de ter como proteção unicamente a liberdade do indivíduo (feição negativa), passando a exigir, também, uma atuação positiva do Estado (feição positiva). Em reconhecimento a essa evolução, a doutrina elaborou uma classificação para os direitos fundamentais, a partir do critério cronológico, isto é, levando-se em conta o momento em que tais direitos foram reconhecidos como fundamentais. A idéia é a seguinte: num primeiro momento, certos direitos foram reconhecidos como fundamentais, recebendo, por isso, a denominação de direitos fundamentais de primeira dimensão (ou primeira geração); num segundo momento, novos direitos foram reconhecidos como fundamentais, fazendo surgir, então, os direitos fundamentais de segunda dimensão (ou segunda geração) e assim sucessivamente. CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Assim, os direitos fundamentais podem ser classificados em quatro dimensões, isto é, direitos fundamentais de primeira, segunda, terceira e quarta dimensões. 2.1) DIREITOS FUNDAMENTAIS DE PRIMEIRA DIMENSÃO Os direitos fundamentais de primeira dimensão foram os primeiros reconhecidos pelos ordenamentos constitucionais, e têm as seguintes características: a) surgiram nos finais do século XVIII e dominaram todo o século XIX; b) surgiram no Estado liberal, em oposição ao Estado absoluto; c) estão ligados ao ideal de liberdade; d) são direitos negativos, que exigiam uma abstenção do Estado em favor da esfera de liberdade do indivíduo; e) correspondem aos direitos civis e políticos (direito de locomoção, direito de manifestação, direito de propriedade etc.). 2.2) DIREITOS FUNDAMENTAIS DE SEGUNDA DIMENSÃO Num segundo momento, os ordenamentos constitucionais começaram a expressar a preocupação com os desamparados, com a necessidade de se assegurar o mínimo de igualdade entre os homens, fazendo nascer a segunda dimensão de direitos fundamentais, que têm as seguintes características: a) surgiram no início do século XX (note-se que durante todo o século XIX tivemos, apenas, os direitos fundamentais de primeira dimensão); b) surgiram no Estado social, em oposição ao Estado liberal; c) estão ligados ao ideal de igualdade; d) são direitos positivos, que passaram a exigir uma atuação positiva do Estado, no sentido de assegurar o mínimo de igualdade entre os homens (importantíssimo este aspecto: os direitos fundamentais passaram a ter uma feição positiva a partir da segunda dimensão); e) correspondem aos direitos sociais, culturais e econômicos (direito a condições mínimas de trabalho, à previdência e assistência social, à habitação, ao lazer, a um salário que assegure o mínimo de dignidade ao homem, à sindicalização e à greve dos trabalhadores etc.). Mas atenção: os direitos fundamentais de segunda dimensão são, de fato, direitos tipicamente de caráter positivo, isto é, exigem uma atuação positiva do Estado, em favor dos desamparados. Entretanto, não se pode afirmar que todos os direitos de segunda dimensão são de índole positiva, pois temos alguns direitos sociais que são de natureza CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br negativa, como o direito de sindicalização e de greve dos trabalhadores (CF, artigos 8º e 9º, respectivamente). 2.3) DIREITOS FUNDAMENTAIS DE TERCEIRA DIMENSÃO Num terceiro momento, foi despertada a preocupação com os bens jurídicos da coletividade, com os denominados “interesses difusos” (pertencentes a um grupo indeterminado de pessoas), nascendo, então, os direitos fundamentais de terceira dimensão, que têm as seguintes características: a) surgiram no século XX; b) estão ligados ao ideal de fraternidade, de solidariedade que deve nortear o convívio dos diferentes povos, em defesa dos bens da coletividade (aspecto importantíssimo este: na terceira dimensão, a preocupação deixa de ser com os bens jurídicos da pessoa humana individualmente considerada, e passa a ser com os bens coletivos, com os interesses difusos); c) são direitos positivos, a exigir do Estado e dos diferentes povos uma firme atuação no tocante à preservação dos bens de interesse coletivo; d) correspondem ao direito de preservação do meio ambiente, da paz e do progresso da humanidade, do patrimônio histórico e cultural etc. 2.4) DIREITOS FUNDAMENTAIS DE QUARTA DIMENSÃO Embora ainda não consolidados nos ordenamentos constitucionais modernos, a doutrina começa a apontar o surgimento dos direitos fundamentais de quarta dimensão. Não há, nos dias de hoje, uma unanimidade sobre a matéria, isto é, sobre quais seriam os direitos fundamentais de quarta dimensão, mas entendemos que, no Brasil, está recebendo maior atenção o pensamento desenvolvido pelo constitucionalista Paulo Bonavides, segundo o qual os direitos fundamentais de quarta dimensão são aqueles ligados à globalização política, fenômeno mundial, que atinge, em maior ou menor grau, todas as nações, correspondendo ao direito de informação, de democracia e de pluralismo. Importante destacar que uma nova geração de direitos fundamentais não significa supressão, substituição das gerações anteriores. Cuida-se, em verdade, de acréscimo às gerações anteriores (a segunda dimensão veio acrescentar novos direitos fundamentais aos já existentes; a terceira dimensão veio somar-se às gerações já existentes etc.). Aliás, esse acréscimo não deve ser visto apenas sob o aspecto quantitativo, mas também qualitativo. Com o surgimento de uma nova geração de direitos fundamentais, há um acréscimo quantitativo (acréscimo de novos direitos, que passam a ser considerados CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Assim, nem mesmo o direito à vida é absoluto, haja vista que a própria Constituição Federal admite a pena de morte no caso de guerra declarada. Outros bens constitucionais (inviolabilidade das correspondências, de dados etc.) poderão ser afastados, se tais garantias estiverem sendo invocadas para acobertar práticas ilícitas (diante a prática de crime, seqüestro, por exemplo, poderão ser afastadas tais inviolabilidades, em homenagem ao direito à vida da vítima). 6) RESTRIÇÕES LEGAIS Se os direitos fundamentais não possuem natureza absoluta, podem ter o seu exercício restringido por meio da expedição de atos legais (lei ordinária, lei complementar, lei delegada, medida provisória – de acordo com as exigências do texto constitucional). Porém, esse poder da lei de restringir direito fundamental não é, por sua vez, um poder ilimitado. Ora, não é difícil perceber a razão para esse entendimento, para a existência dessa limitação: se a lei pudesse, de maneira ilimitada, impor restrições ao exercício de direitos previstos na Constituição, o legislador ordinário teria como afastar, fraudar a vontade do legislador constituinte (por meio da imposição de excessivas restrições, por lei, ao exercício do direito previsto na Constituição). Nesse ponto – o poder da lei de impor restrições ao exercício de direitos previstos na Constituição não é um poder ilimitado – é que assume relevância o chamado princípio da razoabilidade/proporcionalidade. O princípio da razoabilidade atua como limite que deverá ser observado pelas leis restritivas de direitos constitucionais. Assim, uma lei que imponha restrição ao exercício de direito previsto na Constituição só será válida se obedecer ao princípio da razoabilidade. E o que determina o princípio da razoabilidade? Quais são os seus comandos? O princípio da razoabilidade reza que as restrições impostas a direito previsto na Constituição somente serão válidas se obedecerem, cumulativamente, aos seguintes requisitos: (a) necessidade; (b) adequação; (c) proporcionalidade em sentido estrito (equivalência entre meio e fim, entre a restrição imposta e o fim almejado). Portanto, imposta uma restrição por lei a um direito previsto na Constituição, para sabermos se tal restrição é válida ou inválida, teremos que responder às seguintes indagações: (a) a imposição dessa restrição é necessária, existe uma razão de interesse público que a justifique? (b) essa restrição é adequada para o alcance do fim almejado, para o objetivo pretendido? Será que ela produzirá, efetivamente, os efeitos esperados? (c) será que há uma relativa CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br equivalência entre a restrição imposta e o fim esperado? Será que não haveria outro meio menos gravoso para se atingir esse mesmo fim, uma outra restrição menos gravosa ao indivíduo que produziria o mesmo resultado? Caso a lei restritiva não atenda aos requisitos necessidade, adequação e proporcionalidade não será válida, devendo ser retirada do ordenamento jurídico por inconstitucionalidade, por desrespeito ao princípio da razoabilidade (o princípio da razoabilidade será melhor estudado na próxima aula, quando examinaremos os princípios constitucionais do art. 5º da CF). Essa teoria, que impõe limites ao poder da lei de limitar direito previsto na Constituição, é denominada “limites dos limites” (os direitos previstos na Constituição não são ilimitados, podem sofrer limites impostos pela lei; porém, o poder da lei de impor limites aos direitos constitucionais também não é ilimitado, sofre limites impostos pelo princípio da razoabilidade – daí, “limites dos limites”, isto é, limites ao poder de limitar). 7) RENÚNCIA Os direitos fundamentais são, em regra, irrenunciáveis, vale dizer, o indivíduo não dispõe do poder de renunciar, de afastar direitos fundamentais que lhe foram outorgados pela Constituição. Entretanto, excepcionalmente, diante de um caso concreto, admite-se a renúncia temporária a direito fundamental. Um bom exemplo de situação em que, diante de um caso concreto, o indivíduo renuncia legitimamente a direito fundamental seu é o que ocorre nos programas de televisão conhecidos como (caso do BIGBROTHER, da Rede Globo), nos quais o indivíduo renuncia temporariamente ao seu direito de inviolabilidade da privacidade/intimidade no intuito de participar da competição e abocanhar os prêmios oferecidos. 8) RELAÇÕES PRIVADAS Conforme estudamos, os direitos fundamentais, na sua origem, tinham por fim estabelecer limites à atuação do Estado absoluto em favor da liberdade do indivíduo. Os direitos fundamentais regulavam, portanto, uma relação entre o Estado e o indivíduo. Pergunta-se? E as relações entre particulares, são alcançadas pelos direitos fundamentais? Ou será que no meio privado, nas relações privadas, prevalece a autonomia da vontade das partes, não tendo aplicação os direitos fundamentais? Os particulares, na celebração de negócios privados, estão vinculados pelos direitos fundamentais, ou podem livremente afastá-los? CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br No constitucionalismo contemporâneo, o entendimento é de que os direitos fundamentais obrigam, vinculam as relações entre particulares. Não podem os particulares, com amparo no princípio da autonomia da vontade (que rege a celebração dos negócios privados), afastar livremente os direitos fundamentais. 9) CONFLITO (COLISÃO) Não se pode falar em conflito, em abstrato, entre dispositivos da Constituição. O texto constitucional forma uma unidade, um todo harmônico, razão pela qual inexiste conflito, em abstrato, entre dispositivos da mesma Constituição (princípio da unidade da Constituição). Assim, se a Constituição estabelece num artigo que homens e mulheres são iguais perante a lei (art. 5º, I) e em outro dispositivo diz que o Estado deverá proteger o mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos (art. 7º, XX), não podemos afirmar que existe incongruência, contrariedade entre tais dispositivos. Devemos harmonizá-los, buscar um equilíbrio entre eles. No caso, temos o seguinte: não poderá haver discriminações arbitrárias entre homens e mulheres, mas, tendo em vista a tradicional discriminação sofrida pela mulher no mercado de trabalho brasileiro, o legislador deverá procurar minimizar esse desequilíbrio, estabelecendo certos incentivos específicos ao mercado de trabalho da mulher. Portanto, frise-se, não se pode falar na existência, em abstrato, de conflito entre direitos fundamentais. Entretanto, no dia-a-dia, diante de um caso concreto, poderemos ter conflito (ou colisão) entre direitos fundamentais. Só diante de um caso concreto, portanto, é possível juridicamente falar-se em conflito entre direitos fundamentais. Em que situações? Como surge um conflito entre direitos fundamentais? Teremos conflito entre direitos fundamentais quando, num caso concreto, uma das partes sentir-se protegida por um direito fundamental “x”, e a outra parte entender-se protegida por outro direito fundamental “y”. Exemplos: numa cobertura jornalística, o órgão de imprensa entende-se protegido pelo direito fundamental de liberdade de expressão (art. 5º, IX), e o indivíduo, vítima da reportagem, entende que seu direito fundamental à inviolabilidade da intimidade foi violado (art. 5º, X); o indivíduo, utilizando-se do seu direito fundamental à liberdade de pensamento (art. 5º, IV), publica obras sobre a raça negra no Brasil, e a população negra vê nas suas publicações manifestações preconceituosas, vedadas pela Constituição (CF, art. 5º, XLII). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br 225 da Carta Política. Esses direitos fundamentais que estão fora do catálogo (fora do intervalo do art. 5º ao 17) são chamados de direitos fundamentais não-catalogados (ou, simplesmente, direitos fundamentais fora do catálogo). Importante notar que existe um grupo de direitos fundamentais voltado especificamente para pessoa jurídica (direitos fundamentais dos partidos políticos, no art. 17 da CF/88). 10.1) RESTRIÇÕES CONSTITUCIONAIS A própria Constituição Federal estabelece hipóteses nas quais poderão ser impostas limitações ao exercício de certos direitos fundamentais. Nessas situações, portanto, não se poderá falar em ofensa, em fraude às garantias dos indivíduos, pois as limitações são autorizadas pela própria Constituição. Assim, na vigência de estado de defesa, poderão ser adotadas, entre outras medidas, restrições aos direitos de reunião, de sigilo de correspondência, de sigilo de comunicação telegráfica e telefônica (CF, art. 136, § 1º). Da mesma forma, durante o estado de sítio poderão ser impostas restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, bem assim suspensão da liberdade de reunião, busca e apreensão em domicílio entre outras medidas (CF, art. 139). Importante frisar que essas não são as únicas hipóteses em que poderão ser impostas restrições aos direitos fundamentais, pois, como vimos, estes não possuem caráter absoluto e, portanto, podem ser objeto de restrições impostas por lei, mesmo fora dessas situaç~eos excepcionais, desde que obedecido ao princípio da razoabilidade. 10.2) APLICABILIDADE IMEDIATA Determina a Constituição Federal que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicabilidade imediata (CF, art. 5º, § 1º). Certamente pretendeu o legislador constituinte outorgar a maior aplicabilidade, a maior eficácia possível aos direitos fundamentais, fazendo questão de deixar expresso determinação nesse sentido. Entretanto, nem todos os direitos fundamentais previstos na nossa Constituição são normas de aplicabilidade imediata (eficácia plena), visto que já se reconheceu a necessidade de regulamentação de certos direitos fundamentais para a produção de seus plenos efeitos, isto é, já se reconheceu a existência de direitos fundamentais que são, na verdade, normas de eficácia limitada (dependentes de regulamentação para viabilizar o exercício do direito nelas previsto). Como exemplos CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br típicos de normas definidoras de direitos fundamentais de eficácia limitada, dependentes de regulamentação por lei para a produção de seus plenos efeitos, temos o art. 7º, XX e XXVII da Constituição Federal. Portanto, temos o seguinte: (a) em regra, as normas que definem direitos fundamentais são de aplicabilidade imediata (eficácia plena); (b) porém, nem todos os direitos fundamentais são dotados de aplicabilidade imediata (eficácia plena), visto que alguns estão previstos em normas de eficácia limitada, dependentes de regulamentação por lei para a produção de seus plenos efeitos. 10.3) ENUMERAÇÃO NÃO EXAUSTIVA A enumeração constitucional dos direitos fundamentais não é limitativa, exaustiva (numerus clausus). O texto constitucional estabelece um mínimo de direitos, mas permite que outros direitos fundamentais sejam estabelecidos pelo legislador, desde que não contrariem princípios já estabelecidos pela Constituição Federal. É o que nos esclarece o § 2º do art. 5º da Constituição Federal, nos termos seguintes: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.” Significa dizer que além dos direitos fundamentais já previstos na Constituição Federal, outras normas (emendas constitucionais e normas infraconstitucionais, tais como leis, tratados internacionais etc.) poderão estabelecer novos direitos fundamentais, desde que não contrariem o regime e os princípios adotados pela Constituição Federal. Nada impede, por exemplo, que um tratado internacional ou a Constituição de um Estado-membro venham criar novos direitos fundamentais para os brasileiros, desde que estes não contrariem o regime e os princípios adotados pela Constituição Federal. A respeito desse ponto há uma controvérsia doutrinária e jurisprudencial: um tratado internacional que trata de direitos fundamentais tem, por esse motivo, status constitucional? Se um tratado internacional tratar de direitos fundamentais ele passará a ter hierarquia de norma constitucional? Ou será que não? É sabido que os tratados internacionais, depois de incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro, têm força de lei ordinária federal. E quando o tratado versar sobre direitos fundamentais, continuará ele tendo apenas força de lei ordinária federal, ou passará a ter força de norma constitucional nessa situação? CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br A resposta a essa pergunta é extremamente relevante em termos jurídicos, pelo seguinte: (a) se o tratado internacional continuar com sua força de norma ordinária mesmo quando versar sobre direitos fundamentais, significa afirmar que os direitos fundamentais por ele estabelecidos poderão ser afastados, revogados, por outras normas ordinárias quaisquer (lei ordinária, medida provisória, lei complementar, lei delegada); (b) se o tratado internacional que tratar de direitos fundamentais adquirir, por esse motivo, status de norma constitucional, significa dizer que os direitos fundamentais por ele estabelecidos só poderão ser afastados, revogados, por meio de emenda à Constituição (ou nem mesmo por emenda, se forem direitos e garantias individuais, pois estes são gravados como cláusula pétrea – art. 60, § 4º, IV). Bem, o fato é que depois de muita controvérsia o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que um tratado internacional, mesmo quando versa sobre direitos fundamentais, não adquire hierarquia de norma constitucional. De regra, portanto, os direitos fundamentais previstos em tratados e convenções internacionais não gozam de status constitucional, situando-se no mesmo plano hierárquico das diferentes espécies normativas infraconstitucionais. Há, porém, uma situação que foge a essa regra, disciplinada no § 3º do art. 5º da Constituição Federal (introduzido pela Emenda Constitucional nº 45/2004), nos termos seguintes: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.” Nessa situação, portanto, uma vez cumpridos os dois requisitos constitucionais – (i) tratados e convenções internacionais que versem sobre direitos humanos; (ii) aprovação em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros -, os direitos fundamentais previstos nessas normas internacionais ingressarão no ordenamento brasileiro com status de emenda à Constituição, no mesmo plano hierárquico das normas constitucionais. Significa dizer que esses direitos fundamentais previstos em tais normas internacionais deverão ser observados por toda a legislação infraconstitucional superveniente, sob pena de inconstitucionalidade, e, ademais, somente poderão ser modificados pelo procedimento CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br fundamental pode deixar de ter a sua fruição judicialmente assegurada por falta de regulação legislativa. 14) Entre os direitos fundamentais, somente os de índole social podem ter por sujeito passivo um particular. GABARITOS: 1) CERTO; três afirmações corretas nesse enunciado: os direitos fundamentais surgiram como limitações impostas à ingerência do Estado na esfera do indivíduo; no seu surgimento, os direitos fundamentais tinham por preocupação a defesa da liberdade; esses primeiros direitos fundamentais são conhecidos como direitos de primeira dimensão (ou geração). 2) ERRADO; o surgimento de uma nova geração não significa supressão das anteriores, mas sim complementação, acréscimos àquelas gerações, seja no aspecto quantitativo (novos direitos são reconhecidos como fundamentais), seja no aspecto qualitativo (as gerações anteriores de direitos fundamentais podem ganhar novo alcance, novo conteúdo, com o surgimento de uma nova geração). 3) CERTO; os direitos fundamentais, de fato, não possuem caráter absoluto, podem ser objeto de restrição, desde que respeitado o princípio da razoabilidade, isto é, desde que as limitações sejam: (a) necessárias; (b) adequadas; (c) na medida certa (proporcionalidade estrita). 4) ERRADO; as normas definidoras de direitos fundamentais são, em regra, de aplicabilidade imediata (de eficácia plena, auto-aplicáveis), conforme estabelece o art. 5º, § 1º, da Constituição Federal. 5) ERRADO; vimos que as pessoas jurídicas também são titulares de certos direitos fundamentais, sejam essas pessoas jurídicas privadas ou públicas. 6) ERRADO; os direitos fundamentais podem ser restringidos mesmo em circunstâncias normais da vida política do Estado, desde que haja razoabilidade na imposição das restrições. 7) CERTO; os direitos sociais, enunciados no art. 6º da Constituição Federal, e disciplinados em diversos outros artigos do texto constitucional, são direitos fundamentais, e não são exclusivamente aqueles decorrentes de uma relação de trabalho (direito à habitação, à assistência social são exemplos de direitos sociais não-decorrentes do contrato de trabalho). 8) ERRADO; conforme vimos, o direito de propriedade é direito de primeira geração, reconhecido, portanto, no Estado liberal, que possuía feição nitidamente privatística, sem nenhuma consideração CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br de ordem social; modernamente, porém, o direito de propriedade não possui mais essa natureza predominantemente privada, pois com o surgimento do Estado social, o direito de propriedade assumiu feição marcadamente social, a ponto de as constituições modernas só considerarem legítima aquela propriedade que esteja atendendo à sua função social. 9) ERRADO; não existem direitos fundamentais de caráter absoluto, podem eles ser restringidos por lei ou por atos normativos administrativos, de acordo com a exigência do próprio texto constitucional – desde que, em qualquer hipótese, seja respeitado o princípio da razoabilidade. 10) CERTO; conforme vimos, a partir da segunda geração os direitos fundamentais deixaram de ter feição exclusivamente negativa, passando a exigir atuações positivas do Estado. 11) CERTO; o direito de greve do trabalhador, previsto no art. 9º da CF/88, é direito social, classificado como de segunda geração, geração esta que, em regra, contempla direitos de natureza positiva, isto é, que exigem uma atuação positiva do Estado; anote-se, porém, que o direito de greve, embora seja direito de segunda dimensão, não possui natureza positiva (não está por exigir uma atuação positiva do Estado), mas sim direito negativo (exige uma não interferência do Estado, que não poderá impedir os movimentos paredistas dos trabalhadores); esse detalhe, porém, não invalida o enunciado, visto que não se afirma que o direito de greve é direito positivo, mas sim que os direitos sociais são caracterizados por ações positivas, o que está correto. 12) CERTO; vimos que as leis restritivas de direitos fundamentais devem obediência ao princípio da razoabilidade, isto é, as restrições impostas pelo legislador infraconstitucional só serão válidas se atenderem aos requisitos necessidade, adequação e medida certa; na verdade, a relevância do princípio da razoabilidade no Estado brasileiro é exatamente esta: atuar como limite à imposição de restrições a direito previsto na Constituição. 13) ERRADO; embora a regra seja a aplicabilidade imediata das normas que consagram direitos fundamentais, não são todos os direitos fundamentais que têm aplicabilidade imediata; alguns são de eficácia limitada, dependentes de regulamentação por lei para a produção de seus plenos efeitos. 14) ERRADO; existem, também, direitos de índole individual que poderá ter como sujeito passivo um particular (exemplo: direito de requisição administrativa, previsto no art. 5º, XXV). CURSOS ONLINE – DIREITO CONSTITUCIONAL - PROF. VICENTE PAULO www.pontodosconcursos.com.br Fiquem bem – e até a próxima semana. Vicente Paulo
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