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Guias e Dicas
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Urgências e Emergências Maternas, Notas de estudo de Saúde Pública

Ministério da Saúde

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 30/12/2009

Selecao2010
Selecao2010 🇧🇷

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Baixe Urgências e Emergências Maternas e outras Notas de estudo em PDF para Saúde Pública, somente na Docsity! ' Y URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS MATERNAS AGE HB1322.5 SERA RN RT TR ATT ER TETO ELES TST B823ur 2Zed,e.3 2000 URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS MATERNAS Guia para diagnóstico e conduta em situações de risco de morte materna 2º EDIÇÃO FEBRASGO MINISTÉRIO DA SAÚDE A P R E S E N T A Ç Ã O As altas taxas de mortalidade materna representam um desafio à saúde pública em nosso país. Ao não se garantir o acesso seguro ao evento da maternidade, impõe-se às mulheres o mais sério limite ao exercício dos direitos reprodutivos e, portanto, à condição de cidadania. Embora o risco de óbito tenha se reduzido no Brasil com a ampliação do acesso ao pré-natal e ao parto institucional, ainda há muito a fazer. Para evitar a morte de muitas mulheres, é fundamental o pronto e adequado atendimento às emergências obstétricas. O Guia de Urgências e Emergências Maternas irá contribuir, com certeza, para garantir à gestante uma assistência mais efetiva. JOSÉ SERRA Ministro da Saúde S U M Á R I O INTRODUÇÃO................................................................................................. .7 1. INFECÇÕES............................................................................................... 13 1.1. Abortamento infectado................................................................. 13 1.2. Pielonefrite aguda .......................................................................... 18 1.3. Corioamnionite................................................................................ 20 1.4. Sepse e choque séptico ................................................................ 22 1.5. Infecção puerperal......................................................................... 26 1.6. Pneumonia ....................................................................................... 30 1.7. Malária .............................................................................................. 31 2. HIPERTENSÃO ARTERIAL .......................................................................... 35 2.1. Hipertensão arterial aguda ........................................................... 35 2.2. Eclâmpsia ......................................................................................... 38 2.3. Síndrome HELLP................................................................................ 42 2.4. Anestesia da paciente com HAS ................................................. 45 3. HEMORRAGIAS........................................................................................ 49 3.1. Placenta prévia e acretismo placentário................................... 49 3.2. Descolamento prematuro da placenta e coagulação intravascular disseminada.............................................................. 52 3.3. Rotura uterina .................................................................................. 58 3.4. Hemorragia puerperal.................................................................... 60 3.5. Choque hemorrágico - Regras para reposição de volume e correção das coagulopatias......................................................... 62 3.6. Fígado gorduroso agudo............................................................... 65 3.7. Hemorragia intracraniana ............................................................. 67 4. CARDIOPATIAS ........................................................................................ 71 4.1. Edema agudo de pulmão............................................................. 71 4.2. Hipertensão pulmonar.................................................................... 73 4.3. Infarto agudo do miocárdio ......................................................... 74 4.4. Endocardite bacteriana ................................................................ 77 5. DISTÚRBIOS TROMBOEMBÓLICOS ......................................................... 79 5.1. Trombose venosa profunda .......................................................... 79 5.2. Embolia pulmonar ........................................................................... 82 5.3. Embolia amniótica.......................................................................... 89 5.4. Anticoagulação profilática na gravidez .................................... 92 6. PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA ...........................................................95 7. ASMA AGUDA GRAVE ............................................................................103 8. CETOACIDOSE DIABÉTICA......................................................................105 9. ESTADO DE MAL EPILÉPTICO ..................................................................111 10. APÊNDICES ...............................................................................................113 A. Guia Terapêutico .............................................................................113 B. Terapêutica com Componentes Sangüíneos .............................117 C. Tabela de Uso de Medicações Parenterais Usadas no Tratamento de Crise Hipertensiva .................................................119 Assistência pré-natal: maior acesso e mais qualidade Segundo a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) realizada em 1996, aproximadamente 13% das mulheres que tiveram filhos nos cinco anos que antecederam a pesquisa não haviam realizado nenhuma consulta de pré-natal. Essa porcentagem foi de 9% nas regiões urbanas e 32% no meio rural. A menor cobertura foi encontrada no Nordeste (75%) e a maior no Estado do Rio de Janeiro (96%). A pesquisa também mostrou que em 75% das gestações foram realizadas mais de quatro consultas, e que entre as mulheres que fizeram pré-natal, 50% realizaram seis ou mais consultas; isto é, o número mínimo de visitas necessário para um bom acompanhamento. Quanto à época de início do pré-natal, o estudo mostra que 66% das gestantes brasileiras o fizeram adequadamente, isto é, no primeiro trimestre da gravidez, com diferencial de 73% na área urbana e 46% na área rural. Uma proporção menor de mulheres inicia o pré-natal nos primeiros três meses nas regiões Nordeste (52%) e Norte (56%). A análise dos três parâmetros acima descritos indica que o acesso ao pré-natal é problema significativo para a população rural e da localizada nas regiões Norte e Nordeste. Demonstra ainda que a qualidade da assistência é deficiente em todo o país, pois mesmo em regiões com alta cobertura e concentração de consultas de pré-natal a mortalidade materna se mantém elevada. Existem pelo menos três indicadores objetivos da má qualidade do atendimento pré-natal no país. O primeiro se refere à alta incidência de sífilis congênita (24/1.000 nascidos vivos no SUS), cuja prevenção depende do diagnóstico e tratamento durante a gravidez. O segundo, é o fato de a hipertensão específica da gravidez ser nossa causa mais freqüente de morte materna. O meio mais eficiente de redução desse tipo de morte está no adequado controle ao longo da gestação. O terceiro é que 37% das gestantes no Brasil não recebem nenhuma dose de vacinação antitetânica, segundo a PNDS-96. Além disso, estudos mostram que as consultas são muito rápidas, fazendo com que possíveis anormalidades não sejam percebidas e impedindo que as mulheres possam manifestar suas queixas, dúvidas e medos intrínsecos à gravidez. São fatores determinantes dessa situação: a dificuldade para fixar recursos humanos em unidades básicas de saúde, em função dos baixos salários e da carente infra-estrutura; a retaguarda laboratorial insuficiente para realizar os exames mínimos necessários, a descontinuidade da oferta de medicamentos básicos, como sulfato ferroso e ácido fólico. Por último, mas tão importante quanto os anteriores, é a atitude do profissional. Nenhum investimento material na 9 assistência pré-natal será capaz de garantir a vida de mulheres e recém-nascidos se médicos e enfermeiras não prestarem maior atenção a cada pessoa atendida. É preciso lembrar também que aproximadamente 15% das gestações caracterizam-se como de alto risco. O pronto reconhecimento desses casos associado à existência de retaguarda de serviços com maior complexidade para o adequado acompanhamento, são decisivos para a manutenção da vida dessas mulheres. Do pré-natal ao parto: a responsabilidade dos serviços e dos profissionais de saúde O pré-natal é o momento mais apropriado para a preparação ao parto e detecção de possíveis intercorrências. Entretanto, a grande maioria das mulheres recebe "alta" do pré-natal no seu momento mais crítico, ao redor do oitavo mês – quando agravam-se patologias como a hipertensão, o diabetes – deixando-as sem saber a que serviço recorrer frente a uma intercorrência ou no momento do parto. Informar à gestante sobre qual o serviço a ser procurado em situações de emergência e no momento do parto é obrigatório, sem que isto signifique a desobrigação da unidade básica de saúde em atendê-la até o final da gestação. Em vários centros urbanos ocorre uma verdadeira peregrinação das mulheres no momento do parto, como se fosse delas a responsabilidade pelo encontro de vagas. Essa demora no atendimento obstétrico, além de indigna, tem trágicas conseqüências maternas e neonatais. Raramente o gestor municipal e estadual conhece a relação entre a oferta e a demanda por leitos obstétricos, e planeja o sistema de atendimento desde o pré-natal até o parto. Freqüentemente, o número de leitos é suficiente, sendo necessário apenas organizar a assistência mediante a vinculação de unidades básicas de saúde a maternidades e a instituição de centrais de regulação de leitos. Assistência ao parto: melhor acompanhamento e menos intervenção Aproximadamente 60% dos óbitos maternos declarados no país ocorrem na internação para o parto. A busca itinerante por uma vaga, o insuficiente acompanhamento do trabalho de parto e do pós-parto imediato acarretam o que se tem chamado de inoportunidade da assistência. Isto é, a identificação tardia de uma complicação faz com que se perca a oportunidade de intervir quando ainda é possível salvar a vida da mãe. Contribui para essa "desassistência" o fato de a atenção ao parto não ser visto como objeto do trabalho de uma equipe. A enfermeira- obstetra, profissional preferencialmente responsável pelo acompanhamento do trabalho de parto e pela realização do parto normal em inúmeros países, 10 é pouco encontrada nos nossos serviços de saúde. E quando existe, assume papel essencialmente administrativo. Somente a atuação compartilhada de médicos e enfermeiras será capaz de garantir às mulheres brasileiras o acompanhamento solidário e seguro ao longo do trabalho de parto, do parto e nascimento. Agrava esse quadro, o recurso excessivo ao parto cirúrgico, responsável por conduzir gestações absolutamente normais a riscos materno-fetais desnecessários. Estudos epidemiológicos têm demonstrado que o risco de morte materna e neonatal associado à cesariana é, respectivamente, sete e três vezes maior do que o associado ao parto normal. Consulta puerperal: a identificação de complicações tardias A atenção sistemática ao ciclo gravídico-puerperal inclui, no mínimo, uma consulta pós-parto. Essa consulta é fundamental para a manutenção da amamentação, a introdução da contracepção necessária para o devido intervalo entre as gestações, e a detecção de intercorrências próprias desse período, como anemia ou depressão puerperal. A maioria dos serviços, no momento da alta hospitalar, não faz a adequada orientação sobre sinais precoces de infecção puerperal ou de outras complicações freqüentes. A consulta de puerpério no SUS é rara, embora seja freqüente o retorno com o recém-nascido para a primeira consulta de puericultura, revelando a desarticulação nos serviços de atenção primária. Como conseqüência, grande parte das mulheres engravida antes do tempo desejado, abandona a amamentação e sofre de alterações preveníveis, como anemia grave. Assistência às urgências e emergências maternas: atendimento pronto e eficaz A morte materna decorre, em geral, de um conjunto de eventos malsucedidos. Esse processo inclui desde o manejo da própria gestante com sua sintomatologia, o maior ou menor suporte familiar e social a suas necessidades, e, em especial, a resposta dos serviços de saúde. As urgências e emergências maternas ao mesmo tempo que nos permitem identificar os casos críticos, nos oferecem a oportunidade de interrupção do processo. Para isso, são fundamentais o pronto atendimento e a precisa avaliação do quadro e das alternativas de suporte disponíveis no âmbito do serviço. Entre as atitudes que atrapalham o sucesso desse atendimento figuram freqüentemente a desvalorização da queixa da paciente ou a ansiedade de encaminhamento para hospitais de referência. 11 Complicações: Endomiometrite Perfuração uterina Necrose miometrial Piossalpinge/abscessos tubo-ovarianos Tromboflebite pélvica/embolia séptica Pelviperitonite/Abscessos pélvicos Peritonite generalizada Choque séptico Nos abortos provocados com o uso de instrumentos rígidos, aumenta a possibilidade de perfuração uterina ou de fundo de saco. Algumas substâncias químicas instiladas dentro da cavidade uterina podem provocar necrose miometrial. A infecção por Clostridium perfringens pode levar a um quadro de anemia hemolítica fulminante e insuficiência renal aguda, com a descrição de uma tríade sintomática clássica: hemoglobinúria, anemia e cianose perioral. Avaliação Laboratorial: Hemograma com contagem de plaquetas: dependendo do agente bacteriano causador, haverá leucocitose ou leucopenia. A leucopenia pode significar um quadro decorrente da ação de agentes aeróbios gram-negativos. Em situações de maior gravidade detecta-se o consumo plaquetário, demonstrado por contagem plaquetária inferior a 100.000. Em caso de suspeita de hemólise (anemia hemolítica), considerar a possibilidade de infecção por Clostridium. Tipagem sanguínea: obrigatória, pela eventual necessidade de transfusão sanguínea, e também para prevenção de aloimunização Rh. Para as pacientes com Rh negativo é obrigatório o uso de imunoglobulina anti-Rh. Urina tipo I ou EAS - elementos anormais e sedimento urinário: serve como diagnóstico diferencial de infecção urinária e para avaliar presença de hemoglobina na urina. Uréia/creatinina: importante para controle de função renal, que pode ser alterada pelo quadro infeccioso, pela coagulopatia e pelo uso de antibióticos. Coagulograma: indicado para diagnóstico de quadros subclínicos e clínicos de coagulação intravascular. São exames de triagem, o Tempo de Protrombina (RNI), Tempo de Tromboplastina Parcial (R) e o Tempo de Trombina. Poderão ser dosados, também, o fibrinogênio e os produtos de degradação da fibrina, dependendo da gravidade de um quadro hemorrágico e da alteração dos exames de triagem. 14 Hemocultura: realizar culturas para aeróbios e anaeróbios. Considerar que em quadros sépticos por gram-negativos, muitas vezes é a endotoxina bacteriana que está agindo sistemicamente, podendo as hemoculturas resultarem negativas. Cultura de secreção endocervical e de material endometrial: exame importante para detectar a(s) bactéria(s) causadora(s) da infecção. Há necessidade de culturas para aeróbios e anaeróbios. Embora alguns agentes não sejam detectados pelos meios de cultura convencionais, esse exame pode colaborar no diagnóstico e orientar o tratamento, principalmente quando não há resposta ao tratamento proposto. Espécimens endometriais possibilitam melhor informação que os cervicais. Bilirrubina: quando a paciente demonstrar icterícia ou na suspeita de anemia hemolítica. Ultra-som: avaliação de restos ovulares intra-uterinos e diagnóstico de complicações, como bolhas de gás em parede miometrial, comprometimento anexial e presença de abscessos. RX de abdômen: auxiliar em casos de suspeita de corpo estranho intra- uterino e em situações onde há suspeita de perfuração uterina ou intestinal. RX de tórax: na suspeita de embolia pulmonar por desprendimento de êmbolos sépticos, relacionados à trombofletite pélvica. Tomografia computadorizada do abdômen: complementar ao ultra-som nos casos de massas intra-abdominais. CONDUTA A conduta proposta deverá ser individualizada segundo a gravidade do quadro, semana de gravidez e se o aborto é retido ou não. Punção de veia de grosso calibre com agulha calibrosa, para colher exame, garantir infusão de soros e sangue em caso de agravamento do quadro. Hidratação com Soro Fisiológico 0,9%, procurando manter a pressão arterial em níveis aceitáveis e uma diurese/hora > 30 ml. Iniciar antibioticoterapia de largo espectro, utilizando, um anaerobicida (metronidazol ou clindamicina) e um aminoglicosídeo (gentamicina ou amicacina). Se não houver resposta, associar ampicilina ao esquema adotado ou ampliar o espectro antibacteriano com outros antibióticos. A escolha deve ser definida com a Comissão de Infecção Hospitalar. A associação de ampicilina ao esquema acima pode ajudar a eliminar o Streptotoccus faecalis (enterococo). A seguir, como guia, um quadro resumido de antibióticos de maior utilização nessa condição patológica. 15 É importante levar em conta não só a necessidade de cobertura antibiótica, mas, também, a questão dos custos envolvidos. O esquema preferencial de tratamento é a associação da gentamicina com a clindamicina. Antibiótico Dose Via Duração Observação Gentamicina 1,5mg/kg/dose cada 8 horas IV IM 7-10 dias Evitar desidratação e monitorar função renal, ototoxicidade Clindamicina 600 a 900 mg, cada 6 a 8 horas IV 7-10 dias Precauções em caso de disfunção renal ou hepática Amicacina 15mg/kg/dia, cada 8 a 12 horas IM IV 7-10 dias Monitorar função renal, ototoxicidade Metronidazol 500mg a 1g cada 6 horas IV 7-10 dias Reações colaterais de pouca intensidade Ampicilina 500mg a 1g cada 6 horas IV 7-10 dias Reações alérgicas raras As pacientes deverão permanecer com terapia IV por, pelo menos, 24 a 48 horas após o último pico febril. A amicacina dá melhor cobertura a bacilos gram-negativos resistentes, sendo mais indicada em pacientes com queda da imunidade. Em pacientes com insuficiência renal a gentamicina e a amicacina podem ser usadas com fator de correção ou substituídas por aztreonam. O metronidazol é menos efetivo que a clindamicina na cobertura de gram-negativos anaeróbios resistentes. Administrar drogas que aumentem o tônus e a contratilidade uterina, tanto para provocar a eliminação de restos ovulares quanto para permitir um esvaziamento cirúrgico mais seguro. Ocitocina: usar na dose de 20 U em 500 ml de soro fisiológico ou soro glicosado 5%, infundindo 20 a 30 gotas/minuto. Misoprostol (200 mcg): colocar um comprimido no fundo de saco posterior cada 6 a 8 horas, podendo associar com o uso por via oral. O uso de ocitócitos/misoprostol deverá ser com os devidos cuidados (cicatriz anterior/hipertrofias uterinas). Se a idade gestacional for inferior a 12 semanas, realizar esvaziamento uterino após a instalação dos antibióticos. O esvaziamento uterino pode ser feito com as drogas acima ou, de maneira mais rápida e efetiva, por intervenção cirúrgica: aspiração manual intra-uterina (AMIU - para abortos precoces), vácuo- aspiração ou curetagem. Se a idade gestacional for superior a 12 semanas e o canal cervical estiver impérvio, desde que o quadro clínico esteja estável e não exista indicação emergencial de esvaziamento uterino, administrar misoprostol ou ocitocina para conseguir a dilatação cervical e eliminação do feto, seguida de curetagem uterina. 16 Tabela 1 – Antibióticos recomendados para o tratamento inicial da PNA na gravidez, sem complicações maternas e fetais Antibiótico Dosagem e via de administração 1ª linha de escolha* Ampicilina Cefalotina Cefazolina Cefoxitina 0,5 a 2,0 g de 6/6 horas – E.V. 1 – 2g de 6/6 horas – E.V. 1 – 2g de 8/8 horas – E.V. 1 – 2g de 8/8 horas – E.V. *Os aminoglicosídeos podem ser droga de 1ª escolha dependendo da gravidade do caso. Infecções urinárias recorrentes ou que não respondem ao tratamento devem ser investigadas com exames complementares: hemocultura, RX de tórax e ultra-som. Tabela 2 – Antibióticos recomendados para o tratamento de manutenção da PNA na gravidez sem complicações maternas e fetais. Antibiótico Dosagem e via de administração 1ª linha de escolha Ampicilina Amoxilina Cefalexina Nitrofurantoina Cefadroxil 0,5g de 6/6 horas - Oral 0,5g de 8/8 horas - Oral 0,5g de 6/6 horas - Oral 100 mg de 8/8 horas - Oral 0,5g de 12/12 horas - Oral Contra-indicação relativa Gentamicina 1,5 mg/kg de 8/8 horas IM Após o término do tratamento de manutenção, repetir urocultura com antibiograma. Por causa da possibilidade de recorrência (34%), fazer uma urocultura mensalmente até o parto. Todas as gestantes com bacteriúria sintomática ou assintomática, confirmadas com urocultura, devem ser tratadas. A terapia antimicrobiana supressiva (profilática) está indicada para evitar a recorrência (nitrofurantoína 100 mg/dia). Se houver persistência da bacteriúria, uma avaliação urológica após o parto deve ser realizada. Antibióticos contra-indicados para tratamento da PNA durante a Gravidez Sulfametoxazol/trimetropim Tetraciclina Eritromicina (estolato) Cloranfenicol Fluoroquinolonas 19 1.3. CORIOAMNIONITE A corioamnionite ou infecção ovular caracteriza-se como um processo inflamatório agudo e às vezes difuso das membranas extraplacentárias, placa coriônica da placenta e cordão umbilical. Pode ocorrer com membranas íntegras, mas é mais comum em casos de rotura de membranas ovulares, decorrente do tempo prolongado de rotura e/ou da realização de toques vaginais. Às vezes não há história típica de rotura de membranas ou a rotura não é percebida pela paciente. A infecção corioamniótica é mais freqüentemente uma infecção polimicrobiana, destacando-se entre os agentes mais comuns os anaeróbicos, bastonetes aeróbios gram-negativos, estreptococos do grupo B, micoplasmas, Gardnerella vaginalis. Os achados clínicos associados à corioamnionite aguda que se desenvolve na gravidez a termo são, freqüentemente, benignos. Entretanto, podem ocorrer conseqüências mais drásticas, como: aumento das mortes fetais em 2,6 vezes nos casos leves e 4,1 vezes nos casos moderados ou graves. A maioria desses óbitos se relaciona à sepse. DIAGNÓSTICO Clínico: é sugerido pela presença, em graus variáveis, de febre, taquicardia materna ou fetal, hipersensibilidade uterina. Se houver rotura prolongada de membranas, o líquido amniótico pode apresentar odor fétido ou mostrar-se purulento. Avaliação Laboratorial: Hemograma com contagem diferencial de leucócitos. Pode haver leucocitose ou leucopenia (conforme os agentes bacterianos envolvidos), geralmente com desvio à esquerda. Coleta de secreção endocervical com cotonete, para bacterioscopia e cultura. Hemoculturas. Amniocentese: para casos com membranas íntegras onde existe a suspeita diagnóstica. Gasometria arterial (casos mais graves ou suspeita de quadro séptico). CONDUTA Iniciar antibioticoterapia de largo espectro, utilizando, um anaerobicida (metronidazol ou clindamicina) e um aminoglicosídeo (gentamicina ou amicacina). Se não houver resposta, associar ampicilina ao esquema adotado ou ampliar o espectro antibacteriano com outros antibióticos. A utilização de penicilina como anaerobicida de 1ª escolha, reduz o espectro antibacteriano. 20 A via vaginal é preferencial. Deve-se iniciada a indução de parto, desde que não exista contra-indicação obstétrica e a situação clínica materna permita um tempo de espera na resolução do quadro, que não deve ser superior a 12 ou, no máximo, 24 horas. Se for indicada uma cesariana, proteger a cavidade com compressas, para reduzir a contaminação bacteriana intraperitoneal. Lavar cavidade, fazer suturas com pontos separados, inclusive no útero infectado. Avaliar no intra-operatório a responsividade uterina aos ocitócicos. Colocar drenos intraperitoneais se houver dúvida quanto à possibilidade de formação de abscessos. Complicações: Infecção puerperal Bacteremia na mãe ou no neonato em 10% dos casos Protraimento do trabalho de parto; resposta diminuída à ocitocina Aumento de duas a três vezes na proporção de cesarianas Aumento no numero de mortes perinatais Síndrome de angústia respiratória e infecções em lactentes com baixo peso ao nascer Técnica operatória para cesariana com corioamnionite A histerotomia em pacientes com a cavidade uterina contaminada ou infectada, coloca em contato direto a flora bacteriana uterina com a cavidade peritonial. Daí a necessidade de promover-se uma técnica operatória diferenciada para diminuir ao máximo a contaminação: A antibioticoterapia deve ser iniciada no pré-operatório para os casos de corioamnionite. Considerar, em alguns casos, a laparotomia longitudinal infra- umbilical que, por não descolar a aponeurose, tem menos risco de abscessos de parede. Proteção da cavidade peritoneal superior, com a colocação de duas compressas protetoras, uma em cada goteira parietocólica, antes da histerotomia. Manter o decúbito da paciente em céfalo-aclive, para evitar a passagem de material contaminado para o abdome superior. Histerorrafia com fio de absorção lenta (vicril), número zero, que tem menos risco de deiscência frente a um quadro de endometrite. Lavagem da pelve com soro fisiológico morno após a histerorrafia. Trocar luvas após dequitação. 21 Manter oxigenação adequada: deve-se procurar manter a PaO2 > 60 mmHg e a saturação de O2 entre 92% - 94%, com cateter nasal ou máscara de O2, podendo ser necessário ventilação assistida. Deve ser feito um controle contínuo da função pulmonar com oxímetro de pulso ou intermitentemente com gasometria arterial. Se a perfusão periférica for inadequada, ou se a hemoglobina estiver baixa, a oximetria de pulso pode ser prejudicada. A utilização de ventilação assistida vai depender dos parâmetros gasométricos e da experiência com o uso de respirador, devendo ficar, preferencialmente, a critério do intensivista ou do anestesiologista. Manter adequada volemia: a administração rápida e controlada de soluções cristalóides pode auxiliar a garantir a boa perfusão de órgãos e tecidos. Entretanto, há o risco de edema pulmonar e SARA. Para fazer o controle da infusão, deve ser utilizado, preferencialmente, o cateter de Swan-Ganz. Se isso não for possível, fazer o controle através de medida da Pressão Venosa Central (procurando mantê-la entre 8 - 12 cm/H2O). Expansão do volume intravascular: com agulha de grosso calibre, por meio abocath: infundir 250-300 ml de soro fisiológico 0,9% em 15 minutos. Infusões adicionais até o máximo de 2 litros podem ser administradas, monitorizando-se a melhora do estado sensorial, cor da pele, elevação da PA (procurar manter PAS acima de 90 mmHg), diminuição do pulso, monitorar com sonda vesical de demora o aumento do débito urinário ( 30ml/h). Instituir terapia vasopressora ou inotrópica para melhorar o débito cardíaco: caso a hipotensão não responda à infusão inicial de líquidos, emprega-se o uso de agentes inotrópicos sob monitorização central. Dopamina é a droga inicial de escolha: Utilização de Dopamina: Em doses baixas (1 - 3 µg/kg/min.) ativa receptores dopaminérgicos, causando vasodilatação e aumentando o fluxo renal, mesentérico, coronariano e cerebral. Em doses intermediárias (3 - 10 µg/kg/min.) ativa receptores beta- adrenérgicos, com aumento da contratilidade miocárdica e melhora da função cardíaca. Em doses altas (acima de 10 µg/kg/min.) ativa receptores alfa- adrenérgicos, causando vasoconstrição em todos os leitos vasculares (inclusive no útero e circulação uteroplacentária). Se a dopamina não melhorar a pressão arterial, a utilização de outras drogas vai depender de diferenciar se o quadro é devido à vasodilatação persistente ou à depressão miocárdica. Se o problema for depressão miocárdica, recomenda-se terapia inotrópica (dobutamina 2-20 µg/kg/min., ou epinefrina 1-8 µg/kg/min.). Se for vasodilatação 24 persistente, usam-se vasoconstritores periféricos (fenilefrina 20-200 µg/min., ou norepinefrina 2-8 µg/min.). Antibioticoterapia: iniciar logo após a coleta das culturas e modificar a terapia, se necessário, quando o agente bacteriano for identificado. Os esquemas de antibioticoterapia devem ser padronizados em comum acordo entre o serviço de obstetrícia, o serviço de medicina intensiva (quando existir) e, principalmente, o serviço ou a comissão de controle de infecção do hospital. Na maioria das vezes, a associação entre antimicrobianos com ação sobre bactérias anaeróbicas e aeróbicas gram-negativas habitantes da flora geniturinária e intestinal, é a terapia indicada. Iniciar antibioticoterapia de largo espectro, utilizando, um anaerobicida (metronidazol ou clindamicina) e um aminoglicosídeo (gentamicina ou amicacina). Se não houver resposta, associar ampicilina ao esquema adotado ou ampliar o espectro antibacteriano com outros antibióticos. Esquemas terapêuticos: Antibiótico Regime 1 a) clindamicina ou metronidazol associado a b) gentamicina ou amicacina Regime 2 a) + b) associado a ampicilina ou penicilina Antibiótico Dose Via Duração Observação Gentamicina 1,5 mg/kg/dose cada 8 horas IV IM 7-10 dias Evitar desidratação e monitorar função renal, ototoxicidade Clindamicina 600 a 900mg, cada 6 a 8 horas IV 7-10 dias Precauções em caso de disfunção renal ou hepática Amicacina 15 mg/kg/dia, cada 8 a 12 horas IM IV 7-10 dias Monitorar f unção renal, ototoxicidade Metronidazol 500 mg a 1g cada 6 horas IV 7-10 dias Reações colaterais de pouca intensidade Ampicilina 500 mg a 1g cada 6 horas IV 7-10 dias Reações alérgicas raras Se não houver resposta ou se a infecção for hospitalar: imipenem/ cislatatina (500 mg 6/6 horas) ou cefalosporina de 3ª geração + aminoglicosídeo. Suspeita de Pseudomonas: incluir amicacina (5 mg/kg 8/8 horas ou 7,5 mg/kg 12/12 horas) e cefotaxima (2g 8/8 horas) ou Ceftriaxona (2g a cada 12-24 horas). 25 – Manifestações de choque tóxico ou sinais de infecção cirúrgica por Staphylococcus aureus: nafcilina (2 g a cada 4-6 horas) + ancomicina (1 g 12/12 horas) – Paciente esplenectomizada: cefotaxima (2 g 8/8 horas) ou ceftriaxona (2 g a cada 12-24 horas). Tratamento cirúrgico: conforme indicado para cada caso particular. A histerectomia fica reservada para situações com foco uterino confirmado ou quando há foco uterino suspeito e a paciente não melhora, apesar do tratamento instituído. A decisão pela histerectomia nos casos de não-melhora da paciente deve ser tomada em conjunto com o intensivista. Muitas vezes, em pacientes graves, retardar a histerectomia pode provocar a impossibilidade de reversão do choque. Lembrar que nesses casos está indicada a histerectomia total, com revisão dos pedículos ovarianos para detecção de trombos nesses vasos. 1.5. INFECÇÃO PUERPERAL É aquela que se origina do aparelho genital após parto recente. Há necessidade de complementar o conceito de infecção puerperal com o de morbidade febril puerperal, pela eventual dificuldade de caracterizar a infecção que ocorre após o parto. Morbidade febril puerperal é a temperatura de, no mínimo, 38ºC durante dois dias quaisquer, dos primeiros 10 dias pós-parto, excluídas as 24 horas iniciais. A infecção puerperal é polimicrobiana e os agentes etiopatogênicos são germes aeróbios e anaeróbios da flora do trato geniturinário e intestinal. Principais fatores de risco: Amniorrexe e/ou trabalho de parto prolongados Desnutrição ou obesidade Manipulação vaginal excessiva (toques) Traumas cirúrgicos Mas condições de assepsia Operação cesariana Debilidade imunológica Retenção de restos ovulares 26 Em pacientes com insuficiência renal, a gentamicina pode ser usada com fator de correção ou substituída por aztreonam. O metronidazol é menos efetivo que a clindamicina na cobertura de gram-negativos anaeróbios resistentes. Evitar o uso terapêutico da droga utilizada na antibioticoterapia profilática. Se o quadro febril da paciente não melhora e não há indicação cirúrgica, há a possibilidade de estar ocorrendo tromboflebite pélvica, que vai acarretar o uso de heparina como teste terapêutico. Utilização de Heparina: A heparina clássica é a de alto peso molecular. Pode ser administrada por via endovenosa ou via subcutânea. Dose terapêutica: 5.000 UI IV, seguida de 700 a 2.000 UI por hora, devendo ser feito controle de TTPA de 4/4 horas. O nível terapêutico será atingido quando elevar o TTPA (R) em 1,5 a 2 vezes o valor médio. Após estabilização do TTPA e da dose, o controle laboratorial pode ser diário. As principais complicações do tratamento são a hemorragia e a trombocitopenia. Profilaxia de embolia pulmonar: heparina de alto peso molecular em doses baixas (5.000 UI, subcutaneo, cada 8 a 12 horas) – não requer controle laboratorial, já que o TTPA não é prolongado. Hoje existem disponíveis heparinas de baixo peso molecular (7.000 daltons), que produzem alterações mínimas nos testes de coagulação e possuem meia-vida mais prolongada – dose diária na profilaxia é de 7.500 UI cada 24 horas. Tratamento cirúrgico da infecção puerperal Indicado em determinadas situações ou se o tratamento clínico for insuficiente: curetagem de restos placentários drenagem de abscessos: perineais, da incisão de cesariana debridamento de fasciite necrozante perineal e abdominal colpotomia: abscesso do fundo de saco de Douglas histerectomia total: miometrite e infecção pelo Clostridium welchil laparotomia: abscessos entre alças, do espaço parietocólico e subfrênico, ligadura de veia ovariana e veia cava, em caso de tromboflebite pélvica séptica que não responde ao tratamento de antibiótico + heparina. 29 1.6. PNEUMONIA As pneumonias comuns, causadas por Streptococcus pneumoniae e Hemophilus influenzae, trazem risco à vida da gestante quando ocorrem próximo ou na ocasião do parto (normal e cesárea, incluindo aborto). Há entretanto, pneumonias que são sempre graves em qualquer época, podendo acometer eventualmente gestantes, com acréscimo de mortalidade. São os casos de pneumonias complicadas com empiema, pneumonia estafilocócica, pneumonias causadas por agentes como o P. carinii, virais (vírus da varicela), pneumonias pós- operatórias e pneumonia aspirativa. Cerca de 50% são tratadas empiricamente, sem identificação etiológica. Em todo caso de pneumonia na gestação, solicitar sorologia para HIV. DIAGNÓSTICO Tosse, febre, dor torácica, produção de escarro (escarro ferruginoso ou amarelado), dispnéia Taquicardia, taquipnéia, febre Incursão respiratória diminuída, dor pleurítica, macicez e crepitação inspiratória Avaliação Complementar RX de tórax: é fundamental, devendo ser feito com os cuidados de proteção ao feto. Não é justificado receio em fazer o RX de tórax em caso suspeito, já que a quantidade de radiação neste exame é muito baixa. Há três modelos patológicos e radiográficos: – Pneumonia alveolar ou do espaço aéreo – consolidação densa, homogênea, não segmentar. – Broncopneumonia - infiltrado segmentar. – Pneumonia intersticial - um padrão linear ou reticular envolve os campos pulmonares. Hemograma completo Exame de escarro por bacterioscopia direta Cultura de escarro Hemocultura Coleta de material broncopulmonar Punção de líquido pleural Punção aspirativa transtorácica Obs.: Em todo caso de pneumonia na gestação, solicitar sorologia para HIV. 30 CONDUTA Antibioticoterapia. A penicilina G é o agente preferido na pneumonia pneumocócica suspeita ou estabelecida. Dose de 1.000.000 U de 4/4 ou 6/6 horas. Pode ser usado alternativamente a amoxacilina ou eritromicina por 7 dias. Havendo elementos de convicção para uma etiologia específica, deve ser utilizado antibiótico apropriado. Em casos graves ou extremos, usar cefalosporina de 2ª geração associada a macrolídeo. Cuidados gerais - oxigenioterapia, hidratação venosa, etc. A ocorrência de pneumonia não deve indicar, por si só, interupção da gravidez. O trabalho de parto ou a cesárea podem agravar a pneumonia, recomendando-se nessas situações que a parturiente seja encaminhada a Centros de Terapia Intensiva. A indicação da via de parto é obstétrica. 1.7. MALÁRIA Os casos graves ou complicados de malária são devidos principalmente à PRIMOINFECÇÃO causada pelo Plasmodium falciparum e são quase sempre conseqüência da demora no diagnóstico e do tratamento incorreto ou inadequado. As gestantes, as crianças e os adultos não-imunes constituem os grupos de maior risco nas áreas endêmicas. DIAGNÓSTICO: Anamnese: Procedência da paciente (zona endêmica ou não); Período de incubação da doença (em média 12 – 14 dias); Modo de transmissão (exposição a picada de mosquitos, hemotransfusão, uso de seringas comunitárias); Febre de caráter intermitente ou paroxística (a cada 48 ou 72 horas). 31 Malária Falciparum - Não Grave Droga Dose Via Duração Efeitos Colaterai Sulfato de Quinino (Qualquer I.G.). + Clindamicina (Qualquer I.G.). 8-10 mg/Kg por dose, de 8/8 horas 10 mg/Kg por dose, de 8/8 horas Via oral Via oral 3 dias 7 dias Chinchonismo Náuseas Zumbidos Cefaléia Visão Turva Perda da Audição Intranqüilidade Hipoglicemia Diarréia (colite pseudomembranosa) Mefloquina Base (após o 1º trimestre da gestação) 15 mg/Kg Via oral Dose Única Náuseas Dor abdominal Vertigem Cefaléia Visão Turva Hipotensão Diarréia Arritimia Sinual assimet. Bradicardia Sinusal Obs.: 1 comprimido de Quinino = 500 mg 1 comprimido de Clindamicina = 150 mg A Mefloquina tem sido usada para tratamento de todos os tipos de malária, mas só está disponível em comprimidos. Intoxicação por Mefloquina – psicose aguda, encefalopatia transitória com convulsões. Malária Falciparum – Grave Droga Dose Via Duração Efeitos Colaterais Artesunato (Qualquer Idade Gestacional) + Clindamicina (Qualquer Idade Gestacional) 1 mg/Kg por dose 10 mg/Kg por dose de 8/8 horas EV EV 4 doses; 1ª dose, seguida de outras após 4 horas, 24 e 48 horas 7 dias Praticamente sem efeitos colaterais (purido, disf. gastrointestinais e hipotensão) Diarréia Obs.: Não se dispõe de estudos suficientes sobre a inocuidade do uso de derivados da artemisina em gestantes, mas alguns trabalhos mostram ausência de efeitos colaterais para o feto e RN. O artesunato E.V. deve ser diluído em 20 a 50 ml de solução glicosada, por dose, e pode ser substituído por artemether I.M (1,6 mg / kg, por dose) às 0, 12, 24, 48, 72 e 96 horas. Pode-se usar o Sulfato de Quinino (diluído em soro glicosado na proporção de 1:1 e infundido em 4 horas) durante três dias, associado a clindamicina (7 dias) por via endovenosa, nos casos graves de M. falciparum. 34 H I P E R T E N S à O A R T E R I A L 2. 1. HIPERTENSÃO ARTERIAL AGUDA DIAGNÓSTICO Define-se como crise hipertensiva a presença de pressão arterial diástolica3 110 mmHg. A Hipertensão Arterial Aguda (HAA) ainda pode ser identificada pelo aumento abrupto nos níveis pressóricos basais independentemente dos valores absolutos. A crise hipertensiva pode caracterizar-se em urgência (ausência de sintomatologia clínica) ou emergência hipertensiva (presença de sintomatologia clínica). A segunda é extremamente danosa para a mulher, uma vez que leva a comprometimento de funções vitais como: insuficiência cardíaca congestiva, encefalopatia hipertensiva e hemorragia intracraniana. Técnica recomendada para aferição da pressão arterial na gravidez Esfigmomanômetro calibrado e manguito de tamanho adequado ao diâmetro do braço. Prévio repouso da gestante (se for possível 25 minutos ou mínimo 5 minutos), braço sem blusa apertada para não reduzir o retorno venoso. Posição da gestante: deitada em decúbito lateral esquerdo a 15 ou 30 graus e tomada a pressão no braço superior no nível do coração ou ainda sentada e o braço posicionado e apoiado horizontalmente no nível do coração. A tomada da pressão arterial deve ser sempre na mesma posição (sentada ou decúbito lateral esquerdo) e nunca em posição supina. A determinação da pressão arterial diastólica pode ser dada pelo 4ºº som de Korotkoff (som de abafamento) ou 5ºº som de Korotkoff (desaparecimento). Preconiza-se o 4ºº som de Korotkoff ou som de abafamento. Idealmente deve-se repetir a medida após 5 minutos. CONDUTA A crise hipertensiva pode manter-se como urgência, em que a ausência de comprometimento de órgãos-alvo permite o controle pressórico em até 24 horas ou iniciar-se e/ou evoluir para emergência, quando o controle pressórico deve ser rápido, em até 1 hora. A impossibilidade de previsão na evolução do quadro impõe como medida mínima a 35 observação da gestante por 12 horas em ambiente tranqüilo sob terapia anti-hipertensiva aguda e controle de dados vitais e vitalidade fetal. Idealmente preconiza-se a internação. São objetivos da terapia anti-hipertensiva aguda: reduzir rapidamente a pressão arterial, contudo de maneira controlada (queda em torno de 20% do nível inicial, mantendo-se a pressão arterial diastólica entre 90 e 100 mmHg), para não produzir redução do débito cardíaco e conseqüente insuficiência coronária, renal, cerebral e uteroplacentária. A droga utilizada, preferencialmente, deve melhorar a perfusão útero- placentária e não produzir efeitos colaterais tanto para a mãe quanto para o feto (ver apêndice I). Terapia anti-hipertensiva: 1ª escolha: Hidralazina – o cloridrato de hidralazina é um relaxante direto da musculatura arterial lisa, sendo a droga preferida para o tratamento agudo da hipertensão arterial grave na gestação. Cada ampola apresenta 20 mg. Dilui-se o conteúdo de uma ampola em 9 ml de solução salina (SF) ou água destilada. A dose inicial recomendada é de 5 mg ou 2,5 ml da solução por via endovenosa, seguida por um período de 20 minutos de observação. Se não for obtido controle da pressão arterial (queda de 20% dos níveis iniciais ou PAD entre 90 e 100 mmHg) pode-se administrar de 5 mg (2,5ml da solução) a 10 mg (5ml da solução) em intervalos de 20 minutos até uma dose cumulativa máxima de 40 mg. A ausência de resposta deve ser considerada como hipertensão refratária. O efeito hipotensor dura entre duas a seis horas. Apresenta como efeitos colaterais o rubor facial, cefaléia e taquicardia. Nifedipina – é um agente bloqueador de canal de cálcio, produzindo relaxamento da musculatura arterial lisa. É facilmente administrada por via oral, com ação entre 10 a 30 minutos e com duração de ação entre 3 a 5 horas. A dose inicial recomendada é de 5 a 10 mg por via oral, podendo ser repetida a cada 30 minutos até um total de 30 mg. O uso sublingual (1 cápsula = 10 mg) pode produzir hipotensão severa, com risco aumentado tanto materno quanto fetal. O uso concomitante com sulfato de magnésio não é aconselhável (ambos bloqueadores de canal de cálcio) pela possível exacerbação dos efeitos colaterais do magnésio (parada respiratória e cardíaca), além de hipotensão severa. A nifedipina apresenta como efeitos colaterais rubor facial, cefaléia e taquicardia. 2ª escolha ou na hipertensão refratária: Diazóxido – é uma benzotiazida, sem efeito diurético, que atua diretamente no capilar arteriolar. Sua utilização está associada com sofrimento fetal causado pelo efeito muito agudo sobre a pressão 36 LDH (desidrogenase láctica) sérica enzimas hepáticas AST (aspartato aminotransferase sérica) e ALT (alanina aminotransferase sérica) uréia e creatinina séricas coagulograma (TP, TTP, fibrinogênio, PDF) urina tipo I proteinúria quantitativa em urina de 24 horas depuração da creatinina endógena (DCE ou clearence de creatinina) CONDUTA Medidas gerais ambiente tranqüilo e o mais silencioso possível. manter vias aéreas livres para reduzir o risco de aspiração e observar decúbito elevado em torno de 30º, com a cabeça lateralizada, para facilitar a remoção de secreções nasofaríngeas. oxigenação com a instalação de catéter nasal ou máscara com O2 úmido (5 litros/minuto). colocar cânula de Gedel, com o objetivo de evitar o trauma na língua, (não forçar sua introdução para não desencadear estímulo, reflexo e vômitos). sondagem vesical de demora para monitorização da diurese. punção venosa em veia calibrosa. Terapia Anti-hipertensiva (ver página 36/37 deste manual) Terapia anticonvulsivante: Mais importante do que interromper uma convulsão já iniciada é a prevenção de uma nova crise. O sulfato de magnésio é a droga de eleição. A grande vantagem do sulfato de magnésio sobre os anticonvulsivantes é o fato de não produzir depressão do sistema nervoso central. Recomenda-se sua administração tão logo sejam concluídas as medidas gerais, sem a necessidade, na maioria dos casos, de administração de outras drogas para interromper a convulsão vigente, como benzodiazepínicos ou difenil-hidantoína. 39 Esquemas para uso de sulfato de magnésio (MgSO4-7H2O) na pré-eclâmpsia grave/eclâmpsia Apresentações: * Deve-se estar atento para as diferentes concentrações das apresentações existentes no mercado: MgSO4,7H2O a 50%: 1 amp = 10 ml = 5 g MgSO4,7H2O a 20%: 1 amp = 10 ml = 2 g MgSO4,7H2O a 10%: 1 amp = 10 ml = 1 g – Diluição 4g a 20%: 8 ml de MgSO4,7H2O + 12 ml de soro fisiológico a 0,9% = 4g = 20 ml a 20% (20 ml, correr 1 ml por minuto). dose de ataque: 4 g E.V., lentamente, em 20 minutos. dose de manutenção: há vários esquemas, todos procurando manter a dose de 1 a 2 g/hora. a) 10 ampolas a 10% em 400 ml de solução glicosada a 5%, E.V., 2 a 3 g/hora (bomba de infusão). b) 5 g a 50% em injeção IM no glúteo profundo a cada 4 horas. Em qualquer esquema a medicação deve ser mantida por 24 horas após a última crise, ou por 24 horas após sua administração na iminência de eclâmpsia. A concentração plasmática do magnésio, além dos valores terapêuticos ideais pode induzir a efeitos colaterais culminando com apnéia e parada cardíaca. Durante as doses de manutenção, para utilização segura do sulfato de magnésio, devem-se tomar alguns cuidados, tais como: Parâmetros clínicos associados aos níveis séricos de magnésio Nível de magnésio sérico (mg/dl) Parâmetros clínicos 1,5 – 2,5 nível normal na gravidez 4 – 8 nível terapêutico adequado 9 – 12 nível para abolição do reflexo patelar 15 – 17 paralisia muscular, parada respiratória 30 – 35 parada cardíaca 40 controle de diurese ( 30 ml/hora); presença de reflexos tendinosos profundos, sendo mais utilizado o reflexo patelar; observação da freqüência respiratória (mínimo 16 rpm); pode-se também, quando se optar por infusão IV contínua e houver condição laboratorial, monitorar os níveis de magnésio sérico. A abolição do reflexo patelar é um bom parâmetro clínico para impedir o efeito tóxico do magnésio, orientando, a partir deste achado, a suspensão da infusão da droga. As ações do aumento do magnésio sobre a função neuromuscular são antagonizadas pelo cálcio. Assim, o desenvolvimento de depressão respiratória, pode ser revertido pelo emprego endovenoso de gluconato de cálcio (10 ml) a 10%, durante 3 minutos. Outros anticonvulsivantes: Benzodiazepínicos: são potentes no controle de convulsões em geral. Esquema terapêutico: dose de ataque: 10 mg endovenoso em 1 ou 2 minutos manutenção: 40 mg diluídos em 500 ml de solução salina ou solução glicosada a 5%. os efeitos indesejáveis dos benzodiazepínicos são: sedação prolongada com risco aumentado para aspiração, dificuldade de controle neurológico, aumento de salivação e de secreção brônquica. No recém-nascido ocorre maior depressão respiratória, hipotermia e hipotensão. Fenitoína - droga eficaz para controle e prevenção de convulsões epilépticas, tem efeito estabilizador da membrana neuronal, suprime descargas elétricas. Esquema terapêutico: dose de ataque: 15 mg/kg de peso (empiricamente se utiliza 500 mg a 1 g). Utiliza-se 500 mg diluídos em 200 ml de solução salina durante 20 minutos. manutenção: 500 mg também diluídos em 200 ml para infusão endovenosa em 4 horas. A dose final de mais 500 mg é aplicada 12 horas após o início da terapia também por período de 4 horas. Efeito colateral: arritmia cardíaca se infusão rápida. CONDUTA: Parto vaginal: se houver possibilidade (paciente clinicamente estável, sem complicações e feto com boa vitalidade), o parto vaginal deve ser considerado preferencial, principalmente nas pacientes com idade gestacional próxima ao termo. As condições que o justificam são: presença de trabalho de parto espontâneo, tendência a trabalho de parto mais rápido e a menor morbidade e mortalidade materna no parto vaginal quando comparada ao parto por cesárea. Cesárea: deve ser o método de eleição nas situações de: hematoma subcapsular hepático, sinais de choque, DPP com feto vivo, sofrimento fetal agudo (excluir bradicardia transitória pós-convulsão), suspeita ou confirmação de sangramento no SNC e presença de outras contra-indicações ao parto vaginal. 41 Eventualmente em gestações com prematuridade extrema e condições maternas estáveis, o parto poderá ser postergado por alguns dias. Esta conduta somente deverá ser tomada em hospitais de nível terciário, com equipe experiente em condução de gestações de alto risco. B) Conduta prévia à interrupção avaliação pré-operatória da crase sanguínea. transfusão de plaquetas e fatores de coagulação na vigência de interrupção por cesariana. anti-hipertensivo: preferência para a hidralazina injetável (5 - 40 mg). sulfato de magnésio: preferencialmente esquemas IV, pelo risco de hematoma de glúteo na injeção IM. hidratação venosa de volume sob monitorização. Controle rigoroso da diurese. C)Conduta conservadora anti-hipertensivo: o de escolha do Serviço ou Hospital. sulfato de magnésio por 24 horas segundo esquema de rotina. corticoterapia para a maturação pulmonar fetal: betametasona/ dexametasona (12 mg/dia IM). Repetir a mesma dose em 24 horas. monitorização fetal diária. rotina laboratorial em dias alternados (hemograma, AST, LDH, bilirrubina, lâmina de sangue periférico, ácido úrico, creatinina, proteínas séricas, rotina de urina). D) Conduta no hematoma hepático Uma complicação grave das pacientes com Síndrome HELLP é a ruptura de um hematoma hepático, com choque hipovolêmico e óbito (60% de mortalidade materna). A presença de dor no hipocôndrio direito ou epigastralgia intensa (distensão da cápsula hepática) é sugestiva de hematoma. O diagnóstico pode ser confirmado por ultra- sonografia, tomografia computadorizada, ressonância nuclear magnética ou angiografia seletiva. Na presença de hematoma hepático, deve-se optar pela cesariana, pois há risco de ruptura da cápsula hepática durante o período expulsivo. Quando o diagnóstico do hematoma é feito após o parto, a conduta conservadora pode ser adotada, mantendo a volemia através da administração de soro fisiológico e/ou concentrado de hemáceas e acompanhamento por ultra-sonografias seriadas. A ruptura do hematoma com hemorragia intraperitoneal é indicação de laparotomia imediata, se possível por um cirurgião com experiência em cirurgia hepática, e com disponibilidade de transfusão de grande 44 quantidade de volume e hemoderivados (concentrado de hemácias, plaquetas, plasma fresco e crioprecipitado). Pode-se tentar a hemostasia por tamponamento local com compressas, sutura, agentes coagulantes de uso local, embolização arterial, ligadura da artéria hepática ou lobectomia, dependendo da extensão do dano hepático. 2.4. ANESTESIA DA PACIENTE COM HAS Avaliação inicial: Anamnese e exame físico: ênfase nos sistemas cardiovascular, pulmonar e neurológico (Ex. cefaléia e escotomas podem preceder uma atividade convulsiva) Avaliação laboratorial: hemograma completo; plaquetas; fibrinogênio; TP; KTTP; bilirrubinas direta e indireta; AST; ALT; creatinina sérica; glicemia. Hemodinâmica: A resistência vascular periférica pode ser variável. Há relação inversa entre o débito cardíaco e a resistência periférica. Portanto, drogas vasodilatadoras que diminuem a resistência periférica podem melhorar o débito cardíaco e a perfusão placentária. Entretanto, respostas específicas aos vasodilatadores dependem do estado do volume intravascular. Em pacientes com pré-eclâmpsia grave deve haver uma monitorização da mãe e do feto quando drogas ou técnicas vasodilatadoras são usadas. Sistema neurológico: O sistema neurológico de gestantes com PE é tipicamente irritável. Muitos obstetras utilizam sulfato de magnésio para prevenir convulsões. Se houve eclâmpsia (convulsão), deve-se realizar uma radiografia de tórax e solicitar uma gasometria arterial, pelo risco de aspiração. Convulsões repetidas podem ter outras causas, tais como hemorragia intracraniana ou trombose venosa cortical. Indicações para cateterização da artéria pulmonar: Hipertensão grave não responsiva ao tratamento anti-hipertensivo convencional. Edema pulmonar. Oligúria persistente não responsiva a uma carga de fluidos. Função ventricular esquerda comprometida. PRÉ-ECLÂMPSIA GRAVE E ECLÂMPSIA: Uma das causas mais freqüentes de mortalidade materna é a indução de uma anestesia geral em gestante durante ou logo após uma convulsão eclâmptica. Após uma convulsão eclâmptica, a paciente deverá receber tratamento com sulfato de magnésio, ter sua hipertensão arterial controlada com 45 hidralazina, e ter sua gravidez interrompida, preferentemente por parto vaginal, mas somente após a recuperação do sensório, o que ocorre, no mais das vezes, cerca de 4 a 6 horas após a última convulsão. Anestesia para cesariana na pré-eclâmpsia: A maioria dos anestesistas obstétricos prefere o bloqueio peridural para gestantes com PE. As contra-indicações para bloqueio peridural incluem: a) presença de coagulopatia (TP e TTPA prolongados, plaquetas < 100.00/ml ou fibrinogênio < 150 mg/dl); b) hipovolemia não corrigida; c) quadro de hipóxia fetal. Nesses casos, indica-se anestesia geral. A raquianestesia, se indicada, deve ser usada com grande cautela por produzir severas alterações na dinâmica cardiovascular em pacientes depletadas de volume, em conseqüência de súbito bloqueio simpático. O nível de bloqueio sensitivo pela anestesia regional deve se estender a T3-T4, acompanhados de adequada administração de líquidos e deslocamento uterino para a esquerda. Anestesia geral nas pacientes pré-eclâmpticas oferece obstáculos particulares. Indução sob seqüência rápida e entubação traqueal podem ser mandatórias para evitar aspiração. A manobra de entubação pode ser ocasionalmente difícil em razão do intenso edema da língua, epiglote ou faringe, com conseqüente distorção da anatomia. Em pacientes com disfunção, da coagulação a laringoscopia e entubação da traquéia podem ocasionar sangramento profuso. Durante a indução de uma anestesia geral, entubação e extubação traqueal há um aumento na PAM de 45 mmHg, na pressão média da artéria pulmonar (PMAP) de 20mmHg e na PPCP de 20 mmHg, aumentos esses que põem a paciente em risco para descompensação cardíaca e complicações cerebrais. Portanto, a pressão sanguínea deve ser rigorosamente controlada durante tais procedimentos. Os anti- hipertensivos que mais têm sido usados por obstetras para controlar os aumentos agudos da PA em gestantes com PE são a hidralazina E.V. e a nifedipina V.O. ou sublingual. Sua utilização durante a indução anestésica pode produzir hipotensão associada com a perda sanguínea transoperatória, principalmente por sua ação prolongada. O fentanil tem sido usado para bloquear a resposta hipertensiva à entubação traqueal, mas pode provocar depressão neonatal. O thiopental-sódico na dose de 4 mg/kg deve ser o agente de escolha, pois provê anestesia materna com um mínimo de efeito no recém- nascido. A cetamina deve ser evitada em pacientes com PE, pois provoca resposta simpaticomimética e pode piorar a hipertensão e a taquicardia associadas à entubação traqueal. Após a indução e entubação, a anestesia deve ser mantida com óxido 46 H E M O R R A G I A S 3.1. PLACENTA PRÉVIA E ACRETISMO PLACENTÁRIO Consiste na implantação da placenta e seu desenvolvimento no segmento inferior do útero, situando-se antes da apresentação. Sua incidência vem aumentando em conseqüência do aumento de partos operatórios. O diagnóstico feito precocemente (antes de 20 semanas) pode ser modificado com o tempo pela alta probabilidade de "migração placentária". Classificação: Centro-total: a placenta oclui totalmente o orifício cervical interno Centro-parcial: a placenta cobre parcialmente o orifício cervical interno Marginal: a placenta alcança somente a borda do orifício cervical interno DIAGNÓSTICO O sangramento é seu principal sintoma, podendo ser repetitivo, progressivo, de maior gravidade em cada novo episódio e indolor. Lembrar que placentas prévias aderidas ao miométrio (acretas) podem não sangrar, não sendo, por isso, menos graves. Placentas acretas em grande profundidade miometrial (incretas e percretas) podem evoluir com rotura uterina, a qual pode ocorrer em qualquer período da gravidez, inclusive no primeiro trimestre. A hemorragia decorrente dessas roturas pode ser fatal. O diagnóstico é feito pelo quadro clínico e exame ultra- sonográfico. Frente a um diagnóstico de placenta prévia por ultra-som, é necessário, principalmente em casos de pacientes com cicatrizes uterinas, solicitar avaliação sobre a existência ou não de acretismo placentário. Essa informação é de enorme utilidade para planejamento do parto e para prevenção da morbimortalidade associada a essa condição. CONDUTA Quando uma gestante é admitida com o diagnóstico de placenta prévia com hemorragia, deve ser feita avaliação do tipo de placenta prévia, da 49 idade gestacional, da ocorrência de trabalho de parto e da intensidade da hemorragia. A conduta em gestações pré-termo é geralmente expectante, exceto se o volume de sangramento for de tal intensidade que provoque risco materno-fetal. A conduta expectante não significa passividade. Implica vigilância hematimétrica materna, de vitalidade e maturidade fetal (indução de maturidade pulmonar) e tocólise profilática ou terapêutica. Em gestações de termo, a melhor conduta vai depender das variáveis acima, sendo obrigatória a cesárea nos casos de placentas centrais. Considerações: toque vaginal: proscrito, exceto se não houver outro recurso de diagnóstico. Se for realizado, deve ser feito obrigatoriamente em ambiente cirúrgico, procurando avaliar com cuidado os fundos de saco vaginais e, por último, o canal cervical. exame especular: confirmar a origem intra-uterina do sangramento medidas gerais: punção de veia calibrosa, infusão de volume, sondagem vesical, coleta de sangue para exames laboratoriais (hemograma, tipagem sanguínea, prova cruzada) se houver condição e tempo, procurar confirmar o diagnóstico através da ultra-sonografia, com a preocupação de visualizar se a posição da placenta é anterior ou posterior e a existência de áreas de acretismo. se a localização placentária permitir e estando a paciente em trabalho de parto a termo, sempre deverá ser feita a amniotomia. estando indicada uma cesariana, a incisão pode ser segmentar transversa, mesmo em placentas prévias anteriores, desde que o médico tenha experiência na realização de extração fetal rápida. em casos de gestações pré-termo a incisão segmentar pode ser feita, analisando a melhor área do segmento uterino para realizá-la. Nessa situação, deverá ser utilizada tesoura curva para prolongamento lateral da histerotomia e não a dígito-divulsão, já que além da maior espessura miometrial nesse local, em gestações pré-termo, as fibras segmentares têm orientação de concavidade inferior, o que pode provocar maior lesão vascular, com prolongamento da incisão para ligamento largo. após a extração fetal, proceder à dequitação manual e à curagem uterina de maneira convencional, fazendo revisão da área de implantação placentária no segmento uterino interior. O sangramento dessa área é comum nesse período e geralmente reverte com a contratilidade uterina normal do puerpério. A paciente deverá 50 receber imediatamente ocitocina endovenosa ou metilergometrina intramuscular para auxiliar essa contratilidade. se o sangramento do sítio placentário for abundante, não cessando com uma prolongada e paciente compressão mecânica com o uso de compressas, poderá ser realizada sutura dessa região com catgut 2-0 cromado. Persistindo o sangramento, pode-se optar pelo tamponamento uterino ou a utilização de sonda Foley, com balão de 50 ml, que pode ser inserido com a histerotomia aberta, saindo pela vagina. caso a placenta apresente-se anormalmente inserida, não se desprendendo com a dequitação manual, é importante fazer uma avaliação rápida do tipo de acretismo placentário e ter em mente certos conceitos: na mesma placenta podem haver vários tipos de penetração no miométrio. se a placenta tiver grande área de incretismo ou percretismo, a extração manual pode apenas fragmentar a placenta, aumentando a área de sangramento. feito o diagnóstico de grande área de incretismo ou percretismo, não deve-se tentar "arrancar" a placenta. Se a paciente não estiver sangrando e o útero estiver contraído, pode-se fazer a histerorrafia e encaminhar a paciente para um centro com maiores recursos hemoterápicos e cirúrgicos. Se a área de invasão for parcial e pequena, querendo-se preservar o útero, pode ser feito, excepcionalmente, a ressecção da porção uterina acometida e sutura posterior. a histerectomia é o tratamento-padrão nesses casos de incretismo ou percretismo. Como a placenta geralmente é prévia, far-se-á necessária uma histerectomia total, lembrando que a presença da placenta no segmento inferior acarreta maior dilatação deste, com aumento do risco de ligadura de ureter. se após a histerectomia persistir sangramento pélvico, avaliar ocorrência de coagulação intravascular disseminada, sangramento de ligaduras, de cúpula vaginal, etc. Se houver experiência do obstetra, não cessando a hemorragia com a utilização de hemocomponentes e compressão local, a ligadura de artéria ilíaca interna (hipogástrica) deve ser considerada e pode resolver o quadro hemorrágico. Não havendo experiência do obstetra para fazer ligadura de hipogástrica, a colocação de compressas na pelve (várias) pode conter o sangramento e auxiliar o encaminhamento e a reabertura posterior. 51 Dosagem de fibrinogênio (normal de 150 a 300 mg/dl): na CID em graus subclínicos seus níveis estão abaixo de 150 mg/dl. Em casos graves, os níveis estão abaixo de 100 mg/dl. Dosagem dos produtos de degradação da fibrina (PDF): indica grau de fibrinólise aumentado quando > 20 g/ml. As alterações laboratoriais,principalmente de coagulograma, dependem, para sua interpretação adequada, da rapidez entre coleta e realização do exame. Obs.: Tempo de Sangramento (normal 2 a 7 minutos) e Tempo de Coagulação (normal 5 a 8 minutos, em tubos de vidro) são exames menos precisos, sendo pouco recomendados pelos hematologistas nessas situações. Entretanto, na impossibilidade de se determinar os testes específicos de coagulação ou se não houver retaguarda laboratorial rápida e satisfatória, recomenda-se a realização do teste de Wiener, como medida emergencial da coagulação, principalmente se a paciente for submetida a procedimentos anestésicos ou cirúrgicos. É um teste de baixa sensibilidade, com seu resultado afetado por inúmeras variáveis: temperatura, limpeza do vidro, diâmetro do tubo utilizado, etc. Teste de Wiener: coleta-se cerca de 10 ml de sangue em um tubo seco, e coloca-se em estufa a 37ºC ou aquecimento manual, em repouso por 10 minutos. Se o coágulo for firme e estável, o fibrinogênio é superior a 100 mg/dl e o risco de coagulopatia é pequeno. Caso a formação seja débil ou se dissolva, iniciar o tratamento antes do coagulograma. CONDUTA 1) Medidas gerais: Acesso venoso (veia calibrosa) para infusão de volume e, em casos mais graves, para medida da Pressão Venosa Central. Se houver necessidade de passagem de intracath por punção de veia jugular ou veia subclávia, deve ser levado em conta o risco de coagulopatia instalada. A flebotomia pode ser melhor opção em casos de inexperiência com o intracath ou se o distúrbio de coagulação for grave e não puder ser corrigido rapidamente. Infusão de volume: deve ser feita com o objetivo de manter o volume circulante em níveis aceitáveis. A reposição abaixo do indicado é, geralmente, a falha mais comum na manipulação desses casos. A preferência inicial é para os cristalóides, podendo chegar a 2.000 ml em infusão rápida, conforme a gravidade do caso. Reposição de volume com cristalóides em quantidade elevada pode acarretar edema agudo de pulmão – frente a essa necessidade (reposição 54 acima de 2.000 ml), considerar a necessidade de utilização de Pressão Venosa Central. (ver choque hemorrágico, cap. 3.5). Cateterização vesical de demora para medir o fluxo urinário ( 30 ml/hora), que propicia uma avaliação indireta da volemia circulante e do fluxo renal. Monitorização cardíaca contínua e registro dos sinais vitais a cada 15 minutos. Conduta no parto: Feto vivo: o parto deve ocorrer pela via mais rápida. Sempre realizar amniotomia por diminuir a área de sangramento, prevenindo a passagem de tromboplastina tecidual à circulação materna. Feto vivo fora do período expulsivo, cesariana imediata. Feto morto: se a condição materna permitir e a evolução do trabalho de parto for rápida, pode-se aguardar algumas horas (4 a 6) para uma resolução por via vaginal. Quando ocorre o óbito fetal significa que existe maior área ou maior tempo de descolamento – conseqüentemente maior será a probabilidade de complicações (coagulopatia, lesão renal, choque). Sempre realizar amniotomia. Pode ser administrada ocitocina para acelerar a evolução do trabalho de parto. Hemocomponentes podem e devem ser administrados durante a evolução do trabalho de parto ou da cesárea, conforme a situação clínica e os achados laboratoriais. A realização de uma cesariana associada ou não à atonia e apoplexia uterina tornará obrigatória a disponibilidade de hemocomponentes, e maior cuidado do obstetra com a técnica operatória e com os cuidados com a hemostasia. Um útero de Couvelaire não é, em princípio, indicação obrigatória de histerectomia, pois muitos respondem a medidas clínicas (massagem uterina) ou a drogas (ocitocina, metilergometrina, misoprostol). Deve ser considerada a possibilidade de drenagem de cavidade ou parede abdominal (lembrar que as alterações de coagulação podem recorrer e que a pressão arterial da paciente pode subir, o que poderia facilitar o surgimento de hemorragias nas estruturas que foram incisadas). Curativo compressivo é fundamental para a melhor hemostasia de parede, principalmente quando o número de plaquetas for baixo. 55 CONCEITO NA COAGULOPATIA DE CONSUMO (COAGULAÇÃO INTRAVASCULAR DISSEMINADA) É freqüente a ocorrência de coagulopatia laboratorial de pequeno grau em casos de DPP. Se não ocorrer hemorragia, a vigilância de dados vitais e das condições gerais e da ferida operatória são suficientes, dispensando-se a correção. Em casos de maior gravidade (óbito fetal, hemorragias, incoagulabilidade) haverá necessidade de tratamento da coagulopatia de consumo grave e clinicamente reconhecida. Fundamental no seu entendimento é que pode ser resultado de um ou mais eventos causadores. Como resultado do consumo de fatores de coagulação e ativação do sistema fibrinolítico pode haver: hemorragia; produção sistêmica de monômeros/polímeros de fibrina, com trombos de fibrina provocando isquemia/necrose em órgãos finais; ativação do sistema de cininas com resultante aumento de permeabilidade vascular e hipotensão; ativação do sistema do complemento com manifestações sistêmicas Suspeita clínica de CID pode ser feita quando ocorre sangramento de locais de incisão, punção e/ou mucosas (epistaxe, gengivorragia), hemólise (anemia, hematúria, icterícia), hipotensão (causada por hemorragia e/ou liberação de bradicinina), oligúria (por agressão renal ou hipotensão/hipovolemia). CONDUTA A morbimortalidade da CID depende dela própria e do problema de base que a originou. O objetivo terapêutico é tratar a doença causal, acompanhado de suporte eficaz de volume sanguíneo e manutenção da pressão arterial. A hipóxia secundária à isquemia pela hipotensão e hipoperfusão, bem como a hipotermia exacerbam o ciclo de lesão do endotélio vascular. Baixa reposição volêmica e de fatores de coagulação são, provavelmente, as falhas mais comuns na condução desses casos. Se o ciclo do fator causal foi interrompido, dizer que o tratamento com fatores é "adicionar lenha à fogueira" não parece consistente. Reposição volêmica e expansão (cristalóides, plasma, albumina). O tratamento sempre começa com reposição de volume com cristalóides, partindo-se depois para a terapia com hemocomponentes (concentrado de hemácias, plasma fresco congelado, concentrado de plaquetas, crioprecipitado). Tratar ou remover o evento causal. 56 DIAGNÓSTICO Sinais de iminência de rotura uterina 1. Pacientes com contrações subentrantes intensas e excessivamente dolorosas. 2. Síndrome de distensão segmentar (Bandl-Frommel). – Sinal de Bandl (anel próximo ou contíguo à cicatriz umbilical que separa o corpo do segmento inferior do útero) – Sinal de Frommel (ligamentos redondos retesados e desviados para frente) Rotura uterina instalada 1. Dor abrupta e lancinante no hipogástrio, seguida de acalmia dolorosa transitória. 2. Hemorragia (interna e/ou externa) cuja intensidade dependerá da extensão da rotura e dos vasos atingidos. 3. Choque diretamente relacionado ao volume da hemorragia 4. Sinais de Irritação peritonial. 5. Paralisação do trabalho de parto. 6. Deformidades abdominais (útero vazio e feto fora da cavidade – rotura completa), feto "superficial" e com ausculta em geral negativa. CONDUTA tratamento é cirúrgico, variando desde a sutura uterina à histerectomia, podendo a paciente necessitar de suporte vital. Algumas roturas provocam grandes hematomas de ligamento largo, podendo estender-se ao retroperitônio. O hematoma de ligamento largo deve ser drenado, mas hematomas retroperitoniais, em princípio, não devem ser manipulados. em casos de parto vaginal com roturas sem manifestação clínica, mais encontrados em rotura de cicatriz segmentar transversa (muitas vezes deiscência e não rotura), detectadas na revisão de segmento uterino após a dequitação, a conduta dependerá da estabilidade hemodinâmica da paciente e da hemorragia visível. Em alguns casos pode ser adotada conduta expectante, desde que a paciente fique sob rigorosa observação e com ocitócicos em grandes doses. Em grandes roturas detectadas ao toque, é mais aconselhável proceder- se à laparotomia com sutura da área lesada, podendo ou não ser feita laqueadura tubárea, conforme o desejo da paciente e sua condição obstétrica. 59 3.4. HEMORRAGIA PUERPERAL A hemorragia pós-parto (HPP) está relacionada à alta taxa de mortalidade materna. Fundamentalmente, esses óbitos decorrem da falta de detalhamento de padrões de risco para HPP, por falta de condição hospitalar adequada, dificuldade de aquisição de hemoderivados, dificuldade de acesso a centro especializados e falta de observação médica e de enfermagem mínimos. Muitas pacientes de risco podem ser identificadas antes do parto, o que permite conduzir o parto dessas mulheres em unidade hospitalares capacitadas com recursos técnicos e humanos, para rápida correção da HPP. DIAGNÓSTICO Conceitualmente, HPP é uma perda sanguínea puerperal calculada em mais de 500 ml. A HPP poderá ser imediata, quando ocorre nas primeiras 24 horas do puerpério, ou tardia quando presente após esse período. Os sangramentos uterinos são responsáveis por 90% dos casos de HPP, e são mais graves. HPP imediata Atonia uterina Lacerações de trajeto Retenção de placenta Placentação anômala Rotura uterina Inversão uterina HPP Tardia Restos placentários Hematoma puerperal a) PREVENÇÃO MEDICAMENTOSA DA ATONIA UTERINA Ocitocina 10 U IM de rotina imediatamente após o desprendimento do feto (antes mesmo da dequitação), em todos os partos e cesarianas. b) CONDUTA Atonia uterina Esvaziamento vesical – a distensão vesical dificulta a involução uterina Sonda vesical de demora – débito urinário adequado 30 a 50 ml/h Massageamento uterino Revisão da cavidade vaginal e colo uterino (diagnosticar e tratar as lacerações, se necessário) Ocitocina 20 U em 500 ml de soro glicosado a 5% ou fisiológico, gotejamento de 20-30 gotas/min. ou Metilergometrina – 0,2 mg I.M. ou 60 Misoprostol - 2 cp V.O. ou no fundo de saco vaginal posterior e/ou via retal. 15 metilprostaglandina F2 - 0,25 mg intramiometrial a cada 15 minutos. Reposição-solução salina isotônica e sangue, conforme a necessidade Se as medidas clínicas de controle da HPP falharem, o obstetra deverá inspecionar novamente vulva, vagina e cervix em busca de lacerações. Caso o sangramento seja de trato genital superior, a cavidade uterina deverá ser examinada na busca de restos placentários, perfurações, ruptura ou inversão uterina parcial. Além de manter a infusão de agentes uterotônicos, o obstetra pode estimular e comprimir manualmente o útero, com a mão direita, palpando-o por cima do abdome, e a mão esquerda fechada, no interior da vagina, levando a porção ístmica contra a mão externa. Outra técnica para tentar o controle da hemorragia puerperal consiste no tamponamento uterino: pinçado o lábio superior do colo uterino, introduz-se, através do colo, uma faixa de gaze seca ou compressas suficientes para preencher completamente a cavidade uterina, tamponando inclusive a cavidade vaginal. Realizar antibioticoterapia profilática no momento em que se realiza o tamponamento vaginal. O tamponamento deverá ser removido após 24 horas. Lacerações de trajeto: o tratamento consiste na sutura das lesões. Em casos de grandes lacerações ou lesões múltiplas, onde a sutura não for suficiente para conter o sangramento, proceder ao tamponamento vaginal. Retenção placentária e placentação anômala: um período superior a 30 minutos para ocorrer a dequitação deve ser considerado patológico, embora um tempo inferior a esse possa obrigar a realização de extração placentária, se a hemorragia for intensa. Qualquer exploração de cavidade uterina só poderá ser feita se a paciente estiver convenientemente anestesiada. Após a extração placentária, proceder à curagem e/ou curetagem uterina. Se houver acretismo placentário, evitar fragmentar a placenta em sua retirada (tentar retirá-la sempre conservando sua integridade). Se a placenta não puder ser extraída manualmente, estará indicada a laparotomia. Rotura uterina: (ver capítulo 3.3). Inversão uterina: a inversão uterina é uma causa rara de hemorragia puerperal imediata, embora de elevado risco para a paciente. Pode ser parcial ou completa (esta é visível pela saída do útero invertido pela fenda vulvar), acometendo mais multíparas e mulheres com acretismo placentário, quando se tenta tracionar demais o cordão, associado à compressão fúndica. A correção pode ser feita sob anestesia, com manobra de Taxe (empurrar o útero para sua posição original com a mão fechada), que se não resolver, deverá ser seguida pela laparotomia e tração cirúrgica do corpo e fundo uterino (procedimento de 61 Insuficiência cardíaca Síndrome de angústia respiratória do adulto (SARA) Íleo paralítico Dificuldade cicatricial Nos casos de hemorragias com perda aguda de aproximadamente 25% da volemia, devemos administrar solução isotônica. A aplicação de dois cateteres intravenosos de grosso calibre é obrigatória. A reposição de cristalóides costuma ser de 3 ml para cada ml de sangue perdido. Portanto, se a puérpera apresentar sinais e sintomas de hipovolemia a perda de sangue deve ser superior a 1000 ml, e assim sendo a reposição de solução salina isotônica deverá ser de 3000 ml. Se a perda aguda for superior a 25%, administrar cristalóides + colóides. – Reposição de hemocomponentes A ausência de resposta à infusão de 3000 ml de soro fisiológico sugere uma hemorragia Classe II, com perda hemorrágica de 20% a 25% do volume de sangue total, equivalente a 1000 a 1500 ml de sangue. Após a melhora, com o uso de cristalóides a reposição de sangue deverá ser de acordo com os dados clínicos e pelos níveis de hemoglobina (< 8 g/dl) e volume globular < 25%. Concentrado de hemáceas: o objetivo é manter o hematócrito entre 25% - 30% (cada unidade de concentrado de hemáceas aumenta a hemoglobina em 1,5 g e o Htc em 3%). Frente a uma situação emergencial, caso o tipo de sangue da paciente seja desconhecido, poderá ser administrado concentrado de hemácias tipo O Rh negativo. Plasma fresco congelado: para correção dos fatores de coagulação V, VIII e fibrinogênio, e não deve ser utilizado para correção de volume. Nesses casos – colher sangue para exames laboratoriais de coagulação. Poderá ser feito, como método auxiliar prático de avaliação da coagulação o teste de Wiener (coleta-se cerca de 10 ml de sangue em um tubo seco, e coloca-se em estufa a 37°C ou aquecimento manual, em repouso por 10 minutos. Se o coágulo for firme e estável, o fibrinogênio é superior a 100 mg/dl e o risco de coagulopatia é pequeno. Caso a formação seja débil ou se dissolva, iniciar o tratamento antes do coagulograma. Esse teste é pouco recomendável em serviços onde os exames laboratoriais sejam rápidos e eficientes. Confirmada a coagulopatia, iniciar plasma fresco congelado (PFC). Devemos restringir a administração de PFC aos distúrbios de coagulação clinicamente evidentes e a alteração documentada do Tempo de Protombina (TP) ou Tempo de Tromboplastina Parcial (TTPA), superiores a 1,5 vez o valor normal, ou àqueles quadros hemorrágicos maciços em que não há tempo para avaliação laboratorial. Corrige os fatores V, VIII e fibrinogênio. Dose de ataque: 10 ml/kg de peso; 64 manutenção de 10 - 30 ml/kg/dia, dividido em 4 doses. Para cada 4 ou 5 bolsas de concentrado de hemáceas transfundidas, recomenda-se transfundir 1 bolsa de PFC. Crioprecipitado: em pacientes obstétricas o uso de crioprecipitado é infreqüente, e sua principal indicação é no manejo da CID. O objetivo é aumentar a concentração de fibrinogênio. Se o fibrinogênio é < 50 mg% ou se o TT não se corrigir com o uso de PFC, realizar infusão de crioprecipitado 1U/7-10 kg/dia (meia-vida do fibrinogênio é maior que 24 horas, salvo situações de consumo). A transfusão de plaquetas deve ser realizada somente se a contagem for < 20.000/mm3 ou quando for < 50.000/mm3 e a paciente estiver apresentando sangramento grave ou se for submetida a procedimento cirúrgico. Dose: 1U/10 kg de peso 1 ou 2x/dia (cada bolsa de 50 a 70 ml contém 0,55 x 1011 plaquetas, aumentando sua contagem em 5.000 - 10.000 plaquetas por unidade transfundida). 3.6. FÍGADO GORDUROSO AGUDO O fígado gorduroso agudo é uma infiltração gordurosa que ocorre na 2ª metade da gravidez, levando a um quadro de insuficiência hepatocítica reversível, podendo se confundir com a Síndrome HELLP e hepatite. É um quadro grave, com alta mortalidade materna se demorar a ser diagnosticado e se tratado sem os cuidados e recursos indispensáveis na condução de paciente com uma insuficiência hepática grave e coagulopatia severa. DIAGNÓSTICO Clínico: aparece, em sua maioria, em torno de 34 semanas (há descrições a partir da 20ª semana da gravidez). Geralmente começa com um quadro incaracterístico de náuseas e vômitos, que freqüentemente é tratado com sintomáticos. Na evolução surge a dor em hipocôndrio direito, a icterícia (clínica ou subclínica) e o quadro de insuficiência hepatocítica (diminuição de produção de fatores de coagulação, diminuição do clearence de anticoagulantes circulantes, hipoglicemia). Alguns casos podem evoluir com hematoma intra-hepático, aumentando o risco de morte. Complementar: Coagulograma: encontra-se com os tempos de coagulação alargados (TP, TTP), podendo chegar a níveis de grande gravidade e risco hemorrágico grave. As plaquetas não estão diminuídas nas fases iniciais. A primeira alteração ocorre no coagulograma (fatores de coagulação), não nas plaquetas. 65 Leucocitose sem desvio. Hipoglicemia. Aumento de transaminases hepáticas: valores não muito elevados, semelhantes aos encontrados na Síndrome HELLP. Aumento de bilirrubinas, com predomínio da bilirrubina direta, geralmente. Pode ocorrer aumento da fosfatase alcalina, LDH e enzimas pancreáticas. Imagem: a lesão primária é a esteatose hepática, podendo haver ou não hepatomegalia. Os exames de imagem (ultra-sonografia, tomografia computadorizada e ressonância) contribuem para confirmar o quadro de esteatose, mas não podem afirmar o diagnóstico de fígado gorduroso agudo. Obs.: O diagnóstico diferencial com Síndrome HELLP é difícil, mas a conduta obstétrica não muda: interrupção da gravidez. Entre os elementos importantes para diferenciar, considerar, nas pacientes com fígado gorduroso, a menor possibilidade de hipertensão e as alterações profundas dos fatores de coagulação (na Síndrome HELLP as alterações plaquetárias são mais significativas). CONDUTA A conduta é sempre antecipação do parto. É essa atitude que pode reduzir a mortalidade materna e a perinatal. Transferir a paciente para unidades terciárias. Infusão de 2.000 a 2.500 cal/24h, em soluções glicosadas. Diminuir produção de amônia. Corrigir desequilíbrios eletrolíticos Coagulação: vitamina K, plasma fresco congelado, crioprecipitado, plaquetas. Resolução do parto. Como pode haver uma recuperação lenta da função hepática, essas pacientes podem apresentar grandes hemorragias no parto ou no puerpério, ao que devem ficar alertas tanto o obstetra quanto o intensivista, necessitando de grandes quantidades de hemocomponentes para manterem sua estabilidade hemodinâmica. Todo o cuidado na hemostasia deve ser tomado frente a qualquer procedimento cirúrgico, já que as alterações dos fatores de coagulação podem ser profundas e com demora na sua recuperação. Tais pacientes 66 significativos. Uma alternativa é a embolização de MAV sob controle angiográfico antes da excisão cirúrgica. Durante os procedimentos neurocirúrgicos, há duas estratégias terapêuticas instituídas para reduzir complicações transoperatórias - hipotensão e hipotermia - que trazem preocupação especial para a paciente gestante. O nitroprussiato de sódio tem sido usado com sucesso em gestantes, quando a infusão não exceder 10 ug/kg/min., para minimizar o risco fetal. Os efeitos fetais da hipotensão materna devem ser avaliados durante o período perianestésico pela monitorização da freqüência cardíaca fetal. Deve-se evitar também a hiperventilação excessiva que, na presença de infusão de nitroprussiato de sódio, tem demonstrado diminuir ainda mais o fluxo placentário. Quando o feto for maduro, alguns autores recomendam a cesariana antes da neurocirurgia, pelo risco da hipotensão em relação ao feto. A hipotermia instituída durante a clipagem de aneurisma parece ser bem tolerada pelo feto. Nas pacientes com HIC por pré-eclâmpsia, as intervenções cirúrgicas de urgência, mesmo que para remoção de um grande hematoma intracraniano, raramente trazem benefício. O controle das convulsões e da hipertensão arterial deve ser obtido. A correção dos quadros de CIVD por terapia de reposição de fatores de coagulação (ver capítulo 3.2) está sempre indicada. Uma cesariana perimortem deve ser considerada naquelas pacientes com agravamento do quadro e feto vivo. Via de parto após cirurgia de aneurisma ou MAV: A via preferencial tem sido a cirúrgica, embora estudos recentes sugiram que o parto vaginal não acrescenta risco adicional à gestante ou ao feto. Tal recomendação e também provavelmente válida para pacientes que entram em trabalho de parto antes que a correção 69 O tratamento clínico deve ser direcionado para reduzir os riscos de novos sangramentos e avaliar a isquemia cerebral resultante do vasoespasmo: Repouso no leito em quarto quieto e escuro Laxantes Sedativos Analgésicos Soluções colóides ou cristalóides (expansão de volume) Bloqueadores do cálcio (nimodipina: 15ug/kg/h nas primeiras 2 horas e se boa tolerância – ausência de queda acentuada da PA – 30 ug/kg/h). cirúrgica seja tentada ou nos casos em que a lesão é inacessível ao tratamento cirúrgico. Embora não sendo um consenso, muitos autores recomendam o uso de analgesia peridural durante o trabalho de parto e fórcipe de alívio durante o período expulsivo, para minimizar possíveis alterações hemodinâmicas cerebrais maternas. 70 C A R D I O P A T I A S 4.1. EDEMA AGUDO DO PULMÃO Nas gestações, diferentes patologias podem levar ao EAP. DIAGNÓSTICO: Achados clínicos: o diagnóstico é clínico e suas manifestações são dependentes da quantidade de líquido acumulada nos pulmões. – Quadro moderado: tosse seca e persistente, taquicardia, taquipnéia e poucos estertores crepitantes pulmonares. O RX de tórax pode mostrar apenas aumento da trama vascular, com acentuação da circulação no ápice e ingurgitamento das artérias pulmonares. A gasometria é normal ou evidencia alcalose respiratória. – Quadro grave: tosse produtiva, franca dispnéia, estertoração até ápice pulmonar, secreção rósea e bolhosa pela boca e nariz. RX de tórax mostra opacidade pulmonar difusa e a gasometria arterial evidencia hipoxemia, retenção de CO2 e, nos casos mais graves, acidose respiratória. Exames laboratoriais: eletrólitos (sódio e potássio), uréia e creatinina, gasometria arterial, ECG, RX de tórax. CONDUTA: Tratamento: – Paciente sentado ou elevação da parte superior do tronco e cabeça a 45° (tentar reduzir o retorno venoso e melhorar a respiração). – Máscara facial de O2, principalmente aquelas com efeito Venturi, em que é possível obter frações inspiradas de oxigênio de até 50%, 71 As causas mais comuns na gravidez são: Uso de beta adrenérgicos com abuso de infusão ou sobrecarga hídrica Hipertensão arterial Arritmias cardíacas Valvulopatias (principalmente a estenose mitral) Miocardiopatias (chagásica, hipertensiva, congênita, idiopática e periparto) Tratamento imediato da ICC, com cuidado extremo para evitar excesso de pré e pós-carga. Parto: manter oxigenação, evitar raquianestesia, fazer reposição volêmica conforme a perda sanguínea. A melhor via e o procedimento anestésico deverão ser discutidos com cardiologista e anestesiologista. Quando for indicada a cesárea, a mesma deve ser feita com monitorizacao da pressão pulmonar. É aconselhável evitar nova gestação, devendo a laqueadura tubárea ser proposta. 4.3. INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO A maior mortalidade ocorre no 3º trimestre ou próximo do parto (até 2 semanas), chegando a 50%. Em torno de 60% dos óbitos ocorre na primeira hora devido à fibrilação ventricular. Entre os fatores predisponentes (antecedentes familiares, fumo, hipercolesterolemia, hipertensão, diabetes, uso de beta- bloqueador em paciente cardiopata), atentar para o uso de cocaína e/ou "crack". DIAGNÓSTICO: – Dor torácica: a dor da isquemia miocárdica é retroesternal ou precordial, em aperto ou peso, com duração superior a 30', podendo irradiar-se para pescoço, mandíbula, dorso, ombro ou braço, desencadeada pelo exercício e aliviada pelo repouso e pelo uso de nitrato sublingual. Diagnóstico diferencial: 74 – Músculo-esqueléticas: costocondrite, espasmo dos músculos intercostais. – Gastrintestinais: refluxo gastroesofágico, espasmo esofágico, colelltíase com cólica biliar, colecistite aguda, gastrite, úlcera de Mallory-Weiss. – Ansiedade: síndrome de hiperventilação, crises de pânico. – Pulmonares: pleurite ou pneumonia, traqueobronquite, embolia pulmonar, pneumotórax espontâneo. – Cardíacas: dor induzida por tocolíticos, prolapso de valva mitral, pericardite, miocardiopatia abstrutiva hipertrófica, estenose aórtica. – Mamárias: mastodínia, inflamação, tumores. Exame físico: os sinais dependerão da localização e extensão do infarto. Além dos sinais adrenérgicos (sudorese, tremores), poderá haver hipotensão (na maioria dos casos a pressão arterial é normal), abafamento de ausculta cardíaca, sendo a 4ª bulha um achado muito freqüente. Pode ainda haver sopros sistólicos, hiperfonese de 2ª bulha, atrito pericárdico e sinais de hipoperfusão periférica. Freqüentemente o exame fisico traz poucos subsídios. RX de tórax: para avaliar área cardíaca e descartar outras causas de dor. ECG: o achado mais significativo é a elevação do segmento ST (supradesnivelamento), decorrente da oclusão arterial. O surgimento de ondas Q reflete a existência de necrose do músculo cardíaco. Em fases mais avançadas ocorre o desaparecimento do supradesnivelamento e inversão de onda T. Localização do infarto Derivação eletroscardiográfica inferior Anterior Ântero-septal Anterior extenso Septal Lateral Posterior verdadeiro Ventricular direito D2, D3 e AVF V3 E V4 V1 a V4 V1 a V6, D1 e AVL V1 e V2 V5 e V6 V7, V8, libera R V3R e V4R Dosagem de enzimas séricas: creatinoquinase (CK ou CPK), transaminase glutâmico oxalo-acética (TGO) e desidrogenase láctica (LDH). A CK tem uma fração miocárdica (CK-MB) e ambas podem estar discretamente aumentadas, fisiologicamente, no pós-parto. A CK atinge o máximo de aumento nas primeiras 24 horas e depois volta aos valores normais em 48/72 horas. A TGO eleva-se de 8 a 12 horas, atinge o pico em 24 - 36 horas e normaliza-se em 3 a 4 dias. A LDH tem uma fração que predomina no coração que é a LDH-1; seu pico é atingido em 72/96 horas e decai lentamente no prazo de 7 - 14 dias. Ecocardiograma: determina o déficit contrátil, estima a fração de ejeção do ventrículo esquerdo e define complicações mecânicas do infarto. Cintilografia miocárdica: não é um método recomendado na vigência da gestação. CONDUTA: Acesso venoso, monitorização cardíaca, tanto materna quanto fetal. – Oxigênio: 2 a 4 litros/min., através de cateter ou máscara. 75 Aspirina: na dose de 200 mg, mastigável, iniciado precocemente, dando melhor resultado quando associado à terapia trombolítica. Manutenção igual 100 mg/dia. Nitrato: dinitrato de isossorbida ou propilnitrato na dose de 10 mg SL a cada 3 horas, nas primeiras 48 horas. Nitroglicerina: usar apenas em Unidade de Terapia Intensiva, em caso de falha do dinitrato de isossorbida, gota a gota IV, na dose de 15 microgramas IV rápido, aumentando-se progressivamente 5 microgramas/minuto, ajustando-se a dose até o alívio da dor torácica. Não deve ser usada se pressão sistólica < 100 mmHg ou se houver taquicardia. Doses acima de 200 microgramas/minuto não devem ser usadas. Beta-bloqueadores se não houver contra-indicação (hipotensão, ICC, asma, bradicardia e bloqueio cardíaco): metoprolol, em doses de 5 mg por via IV cada 5 minutos, até atingir dose total de 15 mg; segue-se o metoprolol VO nas primeiras 24 horas, na dose de 50 mg, duas vezes ao dia e, após isso, na dose de 100 mg, duas vezes ao dia. Sulfato de morfina: ampolas de 5 e 10 mg. Aplicar 2 a 4 mg IV a cada 5 minutos, se a dinitrato de isossorbida não aliviar a dor. Administrar, no máximo, 10 – 15 mg. Pode ser feito SC ou IM. Na ausência de morfina pode ser administrada a meperidina (ampola de 100 mg = 2ml. Aplicar EV, em diluição para 10 ml, fazendo até 100 mg). Terapia trombolítica: (estreptooquinase) conduta fundamental e dependente da avaliação de cardiologista. Deverá ser administrada na primeiras 6 horas pós-infarto, ou, no máximo, até 12 horas, se persistir a isquemia. Como há contra-indicação relativa de seu uso durante a gravidez, haverá necessidade de decisão conjunta de risco/benefício entre médicos e família da paciente. Angioplastia e revascularização cirúrgica: em casos mais graves, por indicação do cardiologista. Sâo complicações agudas do IAM: Arritmias Ruptura de septo Insuficiência mitral ICC Pericardite Ruptura da parede do ventrículo Aneurisma ventricular Angina pós-infarto Choque cardiogênico Tromboembolismo Síndrome de Dressier (febre e dor torácica pleuropericárdica 76 D I S T Ú R B I O S T R O M B O E M B Ó L I C O S 5.1. TROMBOSE VENOSA PROFUNDA No transcorrer da gravidez normal ocorrem diversas alterações que podem predispor a fenômenos tromboembólicos graves. O risco no puerpério é maior que na gravidez, em função da Iiberação de tromboplastina pela dequitação. São fatores de risco, além da própria hipercoagulabilidade da gravidez: procedimentos cirúrgicos (cesárea), trabalho de parto prolongado, imobilização, varizes e vida sedentária. A Trombose Venosa Profunda (TVP) acomete, principalmente, membros inferiores e sua sintomatologia resulta da obstrução e da reação inflamatória. Na trombose não tratada há um risco de 15% a 24% de embolia pulmonar, que pode ter mortalidade de 12% a 15%. DIAGNÓSTICO: O diagnóstico da TVP é predominantemente clínico, podendo ser complementado com métodos radiológicos e por imagem. Manifestações clínicas – dor intensa no local – edema, que determina o aumento da circunferência do membro – aumento da temperatura cutânea – dor provocaa à compressão – empastamento muscular – presença de circulação colateral Obs.: trombose da veia ileofemoral pode determinar grandes edemas com compressão dos vasos arteriais e, subseqüentemente, cianose, diminuição ou ausência dos pulsos e redução da temperatura das extremidades. Na gravidez o diagnóstico clínico da TVP é pouco específico: a presença de edema e dilatações venosas podem confundir notadamente a suspeita. Sempre que acessível, um método objetivo deve ser utilizado para o diagnóstico seguro, com a finalidade de evitar a administração desnecessária da terapéutica anticoagulante. 79 Diagnóstico Complementar O ultra-som Doppler é, atualmente, o método mais empregado para a confirmação do diagnóstico da TVP. Permite, na maioria dos casos, detectar rapidamente a Iocalização e a extensão da trombose. A flebografia ascendente é o método invasivo mais específico para a detecção da NP. Quando utilizado adequadamente, confirma ou afasta definitivamente a TVP, mas é contra-indicada durante a gravidez. CONDUTA Repouso no leito mantendo o membro afetado elevado Tratamento anticoagulante: composto por duas fases, a fase aguda e a fase de manutenção. Em gestantes, só deve ser usada a heparina. Em puérperas pode ser utilizado o anticoagulante oral. Antes de iniciar a terapêutica, sempre se deve colher coagulograma e hemograma com contagem de plaquetas para se ter o padrão da paciente. FASE AGUDA Heparina por via endovenosa 80 – Dose de ataque: 5.000 a 10.000 U em “bolus”, seguida da infusão de 1,500 U/h (25.000 U em 50 ml de SG 5% ou SF 0,9%, gotejando 10 gotas/minuto). – Dose de manutenção endovenosa: manter a dose total diária de heparina entre 500 a 1.000 U/Kg. A infusão de heparina deve ser mantida por 7 a 14 dias, até obter-se a regressão dos sinais e sintomas. Se ultrapassar 6 – 7 dias de uso EV há o risco de plaquetopenia. Para evitar essa complicação, pode-se usar, a partir da 1ª semana, a heparina de baixo peso molecular. O efeito anticoagulante ideal da heparina é de 0,3 a 0,5 U/ml de plasma. A heparina pode ser administrada intermitentemente, por via endovenosa, mas a infusão contínua e lenta é preferida, pois os níveis resultantes são mais estáves, verificando-se, também, que o risco de hemorragia é menor. Como alternativa á heparina de alto peso molecular, pode ser usada a de baixo peso molecular (enoxiparina, nadroparina) na dose de 1 mg/kg/12 horas, durante os 10 primeiros dias de tratamento. Controle laboratorial da heparinização: o controle da ação anticoagulante deve ser realizado pelo TTPA (Tempo de Tromboplastina Parcial Ativado), que deverá ser mantido entre 1,5 a 2,0 vezes superior ao valor normal. O exame deve ser feito de 1 a 3 horas após o início da terapêutica ou mudança de dose e o intervalo entre a coleta e a realização do exame deve ser o menor possível (a demora em processar o exame pode ocasionar neutralização da heparina pelas plaquetas, resultando um TTPA falsamente normal). Nunca colher o sangue para exame da mesma veia onde esteja sendo infundido o soro heparinizado. Se não houver disponibilidade do TTPA, pode-se utilizar o TC (Tempo de Coagulação), que deverá ser mantido acima de 15 minutos. FASE DE MANUTENÇÃO • Heparina por via subcutânea Após o tratamento endovenoso, a heparina pode ser administrada por via subcutânea na dose de 8.000 a 10.000 U cada 8 horas ou 10.000 a 15.000 U cada 12 horas. Heparina subcutânea: ampolas de 5.000 UI=0,25 ml. Jamais se utiliza a via intramuscular pelo risco de aparecimento de hematomas. Se o uso for prolongado, monitorar contagem de plaquetas semanalmente. A duração da terapia de manutenção vai depender de cada caso e da opinião de hematologista ou cirurgião vascular. Anticoagulação no parto: manter a heparina até 6 – 8 horas antes do parto, quando deve ser suspensa para desaparecer seu efeito anticoagulante até o momento do procedimento. Anticoagulação no puerpério: após o parto, a anticoagulação deve ser reiniciada em 6 – 8 horas. Retorna-se à dosagem já usada da heparina endovenosa ou subcutânea, mantendo-a por 48 a 72 horas. Após o primeiro dia já pode ser introduzido o anticoagulante oral (warfarina, femprocumona), que pode ser mantido no período de amamentação. A substituição da heparina pelo anticoagulante oral não pode ser abrupta. Fazer o esquema 3:2:1 (no primeiro dia usa-se a heparina e 3 comprimidos do anticoagulante oral; no segundo dia usa-se a heparina e 2 comprimidos do anticoagulante oral; no terceiro dia usa-se a heparina e 1 comprimido de anticoagulante oral; a partir daí usa-se apenas o 81 DIAGNÓSTICO Manifestações clínicas dispnéia súbita e intensa dor torácica taquipnéia/taquicardia tosse hemoptise sudorese Na propedêutica do tórax pode-se identificar: diminuição da expansão pulmonar, ausência do murmúrio vesicular, frêmito pulmonar, hipotensão arterial, hiperfonese da segundo bulha pulmonar e até ritmo de galope, quando instala-se a insuficiência cardíaca. Na suspeita ou confirmação de embolia pulmonar, deve ser investigada a fonte emboligênica, sendo a mais comum a TVP, apesar de estimar-se que, em aproximadamente 50% dos casos de embolia pulmonar, as gestantes não apresentam quaisquer sintoma ou sinal de trombose, ou seja, não há nenhum sinal de alarme. Pequenos êmbolos podem determinar dor do tipo pleural, ou a embolia pode estar precedida do aparecimento de hipertermia, taquicardia inexplicável e de sintomas como mal-estar, ansiedade, inquietação e angústia, que podem não ser valorizados pelo médico assistente na evolução puerperal. Tais manifestações devem alertar o obstetra para a possibilidade de tromboflebite pélvica, com ou sem embolização. Alguns autores recomendam a administração de heparina nesses casos: a remissão da sintomatologia irá confirmar, muito provavelmente, a hipótese diagnóstica (teste terapêutico). Os exames laboratoriais são inespecíficos. Gasimetria do sangue arterial: poderá comprovar a alcalose respiratória aguda, motivada pela hiperventilação (diminuição do PaO2 e PaCO2). É importante assinalar que aproximadamente 90% das pacientes com embolia pulmonar comprovada apresentam PaO2 abaixo de 80 mmHg. Eletrocardiograma: também pode apresentar irregularidades inespecíficas: taquicardia, desvio do eixo elétrico para a direita, alterações da onda ST-T e arritmias. RX de tórax: pode apresentar anormalidades, mas é inespecífico. Em casos comprovados de embolia pulmonar, a radiografia torácica apresenta alterações que comumente são detectadas em doenças cardíacas e pulmonares: condensação pulmonar periférica, atelectasia, 84 derrame pleural e elevação da cúpula diafragmática. É paradoxal, mas devemos sempre lembrar que o achado de radiografia normal, na presença de quadro clínico grave, presta-se para confirmar o diagnóstico de embolia pulmonar. Mapeamento pulmonar (cintilografia): pode ser realizado com tecnécio- 99 ou xenônio-133. O método, apesar de não-invasivo, também é inespecífico, pois quando apresenta alterações, estas não são patognomônicas da embolia pulmonar, ou seja, podem estar relacionadas a outras entidades patológicas, tais como: pneumonia, atelectasia, doença pulmonar obstrutiva crônica, etc. Contudo, é fundamental observar que a cintilografia pulmonar normal exclui a hipótese de embolia pulmonar. Angiografia pulmonar (arteriografia pulmonar): é a prova definitiva para o diagnóstico da embolia pulmonar. Detecta êmbolos a partir de aproximadamente 3 mm de diâmetro. Um anglograma normal afasta definitivamente a hipótese de embolia pulmonar. Entretanto, após 5 dias, a realização do exame e obtenção de um resultado normal não afasta a possibilidade de que tenha ocorrido embolia pulmonar. É um método invasivo, de custo relativamente alto e que pode apresentar complicações, mesmo quando realizado por profissionais altamente competentes (taxa de 1% de morbidade e mortalidade). 85 CONDUTA A terapêutica da embolia pulmonar exige a hospitalização da paciente, com monitoração ventilatória e hemodinâmica (Unidade de Terapia Intensiva). Tem por finalidade precípua corrigir e manter o estado cárdio- respiratório, combater a infecção e prevenir a recorrência embólica. – Manutenção e correção do estado cardiorrespiratório: Oxigenoterapia, para corrigir a hipóxia e manter a PaO2 acima de 60 - 70 mmHg. Pode ser usado, inicialmente, cateter nasal ou máscara facial de O2, principalmente aquelas com efeito Venturi, em que é possível obter frações inspiradas de oxigênio de até 50%, procurando manter a PO2 > 60mmHg. Se a hipóxia for intensa ou não responder às medidas iniciais, deverá ser usada a assistência ventilatória mecânica. 86 O efeito anticoagulante ideal da heparina é de 0,3 a 0,5 U/ml de plasma. A heparina pode ser administrada intermitentemente, por via endovenosa, mas a infusão contínua e lenta é preferida, pois os níveis resultantes são mais estáveis, verificando-se, também, que o risco de hemorragia é menor. Alternativas terapêuticas: – Emprego de drogas fibrinolíticas (estreptoquinase): pode restaurar rapidamente a perfusão e a pressão arterial pulmonar. Entretanto, não há evidências de que a sua utilização seja melhor do que a ação dos anticoagulantes na prevenção da recorrência embólica. A sua administração deve ser criteriosamente avaliada, pois pode determinar hemorragias graves. – Ligaduras vasculares: se as recorrências embólicas persistirem apesar do adequado tratamento anticoagulante, após criteriosa avaliação, as ligaduras venosas podem ser realizadas: ligadura das veias ovarianas e da veia cava inferior. A tromboflebite superficial da veia safena magna deverá ser cuidadosamente avaliada pela sua gravidade. Se o processo tornar-se ascendente, poderá, através da croça, determinar a liberação de trombos para o sistema profundo e, conseqüentemente, a embolização pulmonar. Deve-se, nesses casos, proceder à ligadura da veia safena magna na croça para evitar a progressão dos trombos. 5.3. EMBOLIA AMNIÓTICA A embolia por líquido amniótico (ELA), também conhecida como embolia amniocaseosa, é uma complicação obstétrica rara com mortalidade materna altíssima (aproximadamente 80%). É um processo desencadeado por súbita embolização de líquido amniótico ou de partículas de origem fetal dentro da circulação venosa materna. DIAGNÓSTICO Quadro Clínico: A apresentação clínica inicial mais freqüente é a de dispnéia súbita e hipotensão, seguida, dentro de minutos, por parada cardiorrespiratória. Em mais de 50% dos casos, os eventos iniciais são acompanhadas por convulsões. Metade de todas as pacientes com ELA, morrem dentro de uma hora após o início dos sintomas, e nas que sobrevivem, não são raros os danos neurológicos secundários à hipóxia. Em geral há disfunção ou insuficiência ventricular esquerda, acompanhada por pressões de parede capilar pulmonar (PPCP) elevadas e, em muitos casos, fração de ejeção ventricular esquerda deprimida. Freqüentemente há um componente de edema pulmonar 89 não-cardiogênico (SARA), o qual pode tornar-se o problema clínico predominante. Em pelo menos metade dos casos, há uma segunda fase hemorrágica, com CIVD, podendo ou não ser acompanhada de atonia uterina. Em 50 % dos casos está presente um descolamento prematuro de placenta (DPP), com sofrimento ou morte fetal, podendo estes eventos ocorrerem antes mesmo do início dos sintomas clínicos agudos. Patogenia: Estudos recentes sugerem que uma substância humoral, em vez de partículas de LA, fetais ou mecônio, é a responsável pelas alterações hemodinâmicas. As grandes semelhanças entre as manifestações clínicas da ELA, do choque séptico e do choque anafilático, sugerem o envolvimento de mediadores endógenos na fisiopatogenia. Clark e colaboradores sugerem que o termo mais adequado para ELA seria o de Síndrome Anafílactóide da Gestação. Fatores predisponentes: Trabalho de parto com hipertonia e/ou hipersistolia, trabalho de parto prolongado, uso de ocitócicos, macrossomia fetal, aborto induzido, rotura prematura das membranas, presença de mecônio, multiparidade e idade materna avançada. Sinais e Sintomas % Hipotensão arterial Sofrimento fetal Edema agudo pulmonar / SARA Parada cardiorrespiratória Cianose Coagulopatia Dispnéia Convulsão Atonia ulterina Broncoespasmo Hipertensão arterial transitória 100 100 95 90 85 85 50 50 25 15 10 90 O diagnóstico diferencial inclui: choque séptico, pneumonia por aspiração, infarto agudo do miocárdio, tromboembolia pulmonar, eclâmpsia e, nos casos em que a coagulopatia é a característica dominante, DPP. Embora classicamente o diagnóstico de embolia por LA seja feito por necropsia, atualmente aceita-se o diagnóstico baseado na apresentação clínica. CONDUTA O tratamento baseia-se em manter uma via aérea com boa oxigenação, manter um adequado débito cardíaco, corrigir a coagulopatia. Portanto deve-se manter a PAS > 90 mmHg, o débito urinário > 25 ml/hora, e a PO2 > 60 mmHg ou a SaO2 > 90%. O sofrimento fetal agudo, estará presente em 100% das vezes em que houver colapso cardiorrespiratório materno. Entretanto, a decisão sobre uma intervenção operatória em uma mulher com tal instabilidade hemodinâmica, é extremamente difícil e deve ser individualizada, baseada nas condições maternas e na viabilidade fetal. Avaliação Laboratorial Gasometria arterial. Hemograma completo. Plaquetas. Fibrinogênio, TP, TTPA e PDF. PROTOCOLO DE MANEJO PARA EMBOLIA DO LÍQUIDO AMNIÓTICO Ressuscitação cardiopulmonar se necessário. O2 por máscara se a paciente estiver consciente, ou entubação e ventilação com O2 100%. Monitorização da freqüência cardíaca fetal e considerar intervenção obstétrica por sofrimento fetal agudo se o feto for viável. Administração de soluções cristalóides para otimizar o débito cardíaco, seguida de dopamina se a paciente permanecer hipotensa. Inserir um cateter na artéria pulmonar para guiar o manejo hemodinâmico. Repor fatores de coagulação (plasma fresco congelado e/ou crioprecipitado) e concentrado de hemácias para corrigir o déficit produzido pela CIVD. Nas pacientes que sobrevivem à ELA, recorrências em outras gestações não têm sido registradas. 91 P A R A D A C A R D I O R R E S P I R A T Ó R I A As causas mais comuns são: Acidente anestésico Embolia pulmonar e ELA Insuf. respiratória aguda AVC – Hipertensão Choque hipovolêmico Choque elétrico Choque séptico Doença cardíaca Complicação da terapia tocolítica CUIDADOS CARDIOLÓGICOS DE EMERGÊNCIA Objetivo Enviar oxigênio para os pulmões Enviar oxigênio para órgãos vitais movimentando fluxo sanguíneo (massagem cardíaca externa) Manobras Posicionar paciente em decúbito dorsal em superfície dura Figura 1: Abertura das vias aéreas superiores. Acima: obstrução das vias aéreas produzida pela queda da língua e epiglote. Abaixo: liberação da via aérea pela manobra de hiperextensão da cabeça. 95 Figura 2. Manobra de hiperextensão da cabeça. A linha perpendicular reflete adequada extensão do pescoço. Via aérea-livre através da hiperextensão da cabeça Retirar corpo estranho, se houver Resgatar ventilação (boca a boca, boca-nariz, entubação endotraqueal – ideal) Resgatar fluxo sanguíneo mínimo (massagem cardíaca externa) Figura 3. Posição adequada do ressuscitador: ombros diretamente sobre o externo da vítima e cotovelos fechados. 96
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