Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

encontros 2, Notas de estudo de Engenharia Ambiental

Para formação de educadores ambientais. Volume II

Tipologia: Notas de estudo

2010

Compartilhado em 02/08/2010

ellen-bilancieri-1
ellen-bilancieri-1 🇧🇷

4.3

(3)

5 documentos

Pré-visualização parcial do texto

Baixe encontros 2 e outras Notas de estudo em PDF para Engenharia Ambiental, somente na Docsity! ENCONTROS E CAMINHOS Ra COLETIVOS EDUCADORES | FORMAÇÃO DE EDUCADORAS (ES) AMBIENTAIS e a e “e “ar “ar Este segundo volume de Encontros e Caminhos finalmente chega às suas mã 5. Ele foi planejado e Copyright O 2007 - Ministério do Meio Ambiente Equipe Técnica de Revisão Ana Luiza Castelo Branco Figueiredo Gustavo Nogueira Lemos Tara Carneiro Jacqueline Martins Gomes Joana de Barros Amaral Maria Rita Avanzi Mariana Dourado Mariana Stefanelli Mascarenhas Maura Machado Silva Maurício Marcon Rebelo da Silva Philippe Pomier Layrargues Priscila Maia Nomiyama (Coordenadora) Raquel Ferreira da Silva Renata Rozendo Maranhão Renata F. Dalla Bernardina Ricardo Burg Mlynarz Thaís Ferraresi Pereira Organização Luiz Antonio Ferraro Júnior Capa, Gravuras Internas Arthur Armando da Costa Ferreira Diagramação e Editoração Ricardo Veronezi Ferrão Normalização bibliográfica Helionidia C. Oliveira Impresso no Brasil Printed in Brazil Catalogação na Fonte Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais E56 ENCONTROS e caminhos: formação de educadoras (es) ambientais e coletivos educadores. Organização por Luiz Antonio Ferraro Júnior. Brasília: MMA, Departamento de Educação Ambiental, 2007. Volume 2.; 352p.; 15x21cm. Inclui Bibliografia ISBN 85-7738-044-0 1. Educação. 2. Educação Ambiental. 3. Cidadania. 1. Ferraro Júnior, Luiz Antonio. II. Ministério do Meio Ambiente. III. Departamento de Educação Ambiental. IV.Título. CDU (1 ed.)37:504 ooo. Ti O <T00[“- -Ú=-SHi Prefácio ainda há tempo? e penso que em minhas mãos amanheceu... (um dia, eu Ituiutaba, Minas Gerais, alguém cantava isto ao longe, no rádio) Podemos por um breve momento inicial saltar da natureza à arte e, logo depois, retornar a ela. Quando Walter Benjamim escreve a res- peito do que começava a acontecer com a criação e a fruição das artes em seu tempo, ele trouxe para as suas reflexões uma palavra importada da religião, da mística, da magia: aura. E o seu artigo, até hoje nunca esquecido, re-consagrou esta palavra!. Ele recria a palavra aura ao refletir sobre o que acontece com uma obra original de arte quando ela é tecnicamente reproduzida milhares ou mesmo milhões de vezes e, verbal, visual ou sonora, torna-se algo que pode ser comprado a baixo preço em qualquer banca de jornais (e isto antes do advento da internet e da MP3, ou 4). Eo que é aura? Aura é o que faz você sentir-se reverente e fazer-se rigorosamente silencioso em uma sala de concertos em que uma orquestra sinfônica apresenta, ao vivo e a cores, a Sinfonia Pastoral de Beethoven, enquanto em casa, diante da mesma orquestra que executa a mesma sinfonia em um programa de TV Cultura, você pode vê-la e escutá-la almoçando, conversando com um amigo ou lendo um jornal (o que eu jamais recomendo). Aura é o que nos faz olharmos com um respeito entre atento, respeitoso e quase sagrado o original único do Noite Estrelada de Vincent Van Gogh, em um museu da Europa. O mesmo quadro cuja reprodução excelente, comprada na loja do museu, pode ser pregado com fita gomada na parede do escritório, atrás do microcomputador. Aliás, se você for mais prático, pode mesmo colocar o noite estrelada no seu descanso de tela, e, assim, ter um Van Gogh eletrônico ao seu dispor. 1 Remeto com insistência quem me leia ao artigo: A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. Em Português este artigo pode ser encontrado na co- letânea organizada por Luiz Costa Lima: Teoria da cultura de massa, publicada pela Paz e Terra, do Rio de Janeiro, em 1978. “a rd idid JA Ja o A O O À “Ali”, na sala-templo sagrada onde a orquestra de seres vivos reais executa “ao vivo” a sua música, a Sinfonia Pastoral chega a você e a mim carregada de aura. Executada muitas milhares de vezes em todo o mundo ela é, ali, única, irrepetível, absoluta. O Noite Estrelada original “vale milhões de dólares”. E é uma lástima que a lógica do mercado cada vez mais se apodera da arte, como também da vida, como uma outra mercadoria. Mas por noventa centavos você pode comprar uma bela folha de papel de presente com várias reproduções dela em um metro quadrado. De maneira diferente do que pode ser multiplicado, deslocado de sua essência original, desalojado de sua existência primordial e única, algo está em sua aura quando convive com sua absoluta singularidade. Quando é em si-mesmo, até quando é uma flor entre outras de uma árvore entre milhares, em uma floresta, se dá a-si-mesmo. Você, por exemplo, quem quer que seja, é um ser-em-sua-aura, porque é uma pes- soa irrepetível, única. O que não acontece com uma foto sua que com um toque de dedos você pode enviar a centenas de pessoas reais-virtuais, em alguns segundos. Por isso mesmo, Você, o Noite Estrelada e a Sinfonia Pastoral, assim como uma flor, um beija-flor, uma árvore em flor em uma floresta florida, são seres carregados de aura quando tomados e vividos em si- mesmos. Quando, mesmo sendo frágeis e efêmeros, são, aqui e agora, um momento de eternidade. Pois é com esta pequena palavra, aura, que começo este pequeno prefácio a um livro que sonha dizer às pessoas que “a Vida é bela”, e que elas precisam aprender a saber e sentir, para ensinar que vale a pena viver não apenas “nela”, mas “por ela”. Viver em seu nome, e empenhar- se em sua salvaguarda. Ela, a Vida, nunca como agora, multiplicável, clonável, reprodutível, e frágil e ameaçada por nós, seus filhos, seus herdeiros, seus pensadores e predadores. E começo com esta pequena palavra porque acredito que tal como acontece com você e comigo, com a arte, com o saber, assim também acontece com a Vida, com a Natureza ou, se quisermos, com o meio ambiente. Vivemos estranhos tempos em que todas as coisas e mesmo as pessoas humanas existem cada vez mais e mais ameaçados no que possuem de mais “seu”, porque os seres humanos, os seres com quem compartimos a Vida na Terra e tudo que nela existe como substância e energia da possibilidade da própria Vida, perdem sob diferentes formas de poder e uso a sua aura. Por isso podem perder o ser da Vida ou, no planeta Terra, os cenários naturais da condição da presença da Vida. 4 rd id dA JS JA à da o O O o o À ao nosso redor, quando desaprendemos (se é que soubemos algum dia) o ir em busca da Vida e da Natureza movidos pelo desejo primordial de trocar, de partilhar ou de conviver afinal, e começamos a buscar “ali” apenas a fruição de emoções fáceis ou, pior ainda, de algum proveito utilitário, entre o prazer, o ganho e o lucro. Sob o risco de tornar-se a cada dia mais e mais o depósito de produtos materiais de onde tudo se pode “extrair”, e o cenário do simulacro, quando a Natureza se deprava em “espetáculo natural”, o Meio Ambiente de nossas vidas e de todas as outras vidas precisa ser urgentemente re-descoberto. Precisa ser re-sensibilizado, re-significado e, em síntese, re-vivido em suas verdadeiras origens e raízes. Isto sem falsos saudosismos de algum romantismo fora do seu tempo, e sem fundamentalismos sacralizantes que acabam sendo apenas uma outra máscara, um outro simulacro. Digo isto porque não acredito que o educador ambiental - este ser de difusa e difícil identidade e vocação - seja um especialista em ensinar a crianças e jovens sobre “como lidar com o meio-ambiente” u “como cuidar da natureza”. Digo isto porque creio que ele é — somos - um educador dos sentidos, dos sentimentos, das sensibilidades e dos saberes. Um educador atento a re-acordar afetos, re-ordenar saberes e re-encantar o mundo. Um estudioso (aquém, dentro e além dos “novos paradigmas), um pesquisador e um sujeito de diálogos imprevisíveis e, busca das virtudes e dos valores essenciais da aura dos seres, em um mundo a cada estação do ano mais ameaçado pela voracidade do preço das coisas. Devemos aprender a saber que a Educação Ambiental não é uma outra matéria a mais nas nossas escolas. Não é um dado conteúdo ped- agógico “extra” destinado a aumentar a carga de conteúdos de nossos currículos escolares. Não é uma espécie de saber-de-recreio, quando as crianças de uma escola ou os jovens e os adultos de um “projeto” brincam de “conviver com o ambiente”. Não uma “nova ideologia” ou uma “nova pedagogia” atrelada aos novos paradigmas, pois dentro de suas inúmeras vocações e vertentes cabem diferentes filosofias de vida, diversas ideologias (como projetos sociais de presente e futuro) e dife- rentes pedagogias. A Educação Ambiental é, ao lado de tudo o que a fundamenta e acompanha, um outro ponto de partida. É um outro aprender a saber olhar, sentir, viver e interagir entre nós, os seres humanos. Pois somente aprenderemos a preservar ou a tornar sustentável e biodiverso o Meio Ambiente quando aprendermos a criarmos entre e para nós, um mundo igualitário, diferenciado, solidário e livre. E é o estender deste outro saber a todo o campo de relações entre Nós e a Vida. “a rd idid JA Ja o A O O À Distante de ser apenas “uma nova matéria”, devemos pensá-la como uma renovada e renovadora energia capaz de fertilizar e reverde- cer a secura de nossos próprios desertos interiores. Algo que antes de nos devolver cifras atemorizantes sobre o que andamos fazendo com a casca e os ares do planeta, nos devolva a nossa aura e a de tudo o que nos acompanha aqui na Terra. Quem trabalha com a Educação Ambiental realiza uma experiência tão revolucionária quanto aquelas que, em outros tempos, transformaram profundamente as idéias e práticas da educação em outros tempos. Podemos por um momento remontar à origem de nós mesmos. Podemos recuar muitos anos, muitos milênios, para lembrarmos alguns fatos conhecidos. Nossos ancestrais desceram um dia das árvores. Puseram-se de pé, andaram sobre dois pés, livraram as patas dianteiras que se tornaram mãos com sábios polegares opostos. Desenvolveram uma inédita postura corporal que tanto lhes permitia verem as formi- gas no chão quanto as estrelas nos céus. Desenvolveram uma estranha visão binocular com olhos situados na frente do rosto. Mas, mais do que tudo, ao longo do tempo multiplicaram as circunvoluções de um cérebro que aos poucos associou aprendeu a ser uma fonte reflexiva de saberes e de significados. Um estranho e único cenário onde a Vida fez interagirem sentimentos e sentido, memórias e projetos para o futuro, temores, reflexões, imaginações e tudo o que fizemos derivar da difícil conexão de tudo isto. Mas “tudo isso” e tudo o mais aconteceu muito devagar, durante muito tempo. Calculam os estudiosos de nossos primeiros ancestrais que teremos levado algo próximo a um milhão de anos para aprender a lascar pedras. E levamos um outro tanto para passar delas a alguma forma de instrumento manual mais eficiente. Só que daí em diante aprendemos a agir como quem tem muita pressa. E, assim, começamos a lidar com a Natureza e a Vida na Terra com poderes primeiro aritmética e, depois, geometricamente melhores e maiores. O que a nossa espécie fez em cinco milhões de anos (se a remontar- mos aos primeiros hominídeos), fez depois em cinco mil (mais ou menos dos tempos de Abraão aos de Lula, ou os dos de Homero aos de Milton Nascimento). E o que ela fez em cinco mil, fez depois em quinhentos, isto é, de Leonardo Da Vinci a Fritjof Capra. E o que estivemos fazendo em quinhentos anos, fizemos depois em cinquenta. O tempo que vai mais ou menos da bomba atômica que destruiu duas cidades ao arsenal atômico apontado para todos os quadrantes da Terra e que pode destruí-la várias vezes. Essas são histórias e cifras bem conhecidas. “a ooo. o O O o o À Eis aqui o desafio que toca aos cientistas que estudam o Universo, a Terra, a Vida e a Nós mesmos. E toca as diversas vocações e estilos das pessoas que, entre a ciência, a técnica, a ação social (de que a edu- cação é um plano, ou uma dimensão), buscam associar a compreensão que temos agora de tudo o que existe e nos rodeia, à possibilidade de criação de um entorno humano mais verde, vivo, sustentável e solidário. Toca, ainda e de maneira essencial, as diferentes pessoas, grupos e insti- tuições dedicadas a fazer interagirem os saberes, as ações ambientalista e o aprendizado. Ou seja, aqueles que se dedicam ao diálogo entre nós, através de nossos símbolos e significados realizados como educação e, em nosso caso mais próximo, como educação ambiental. Mas, de que desafio se trata? Penso que se trata desta reconhe- cida evidência: nunca como agora nós, os seres humanos, alcançamos uma compreensão do Universo, do planeta Terra, da Vida na Terra e de Nós mesmos tão completa, tão complexa, tão aberta, tão polêmica, tão interativa e tão próxima de um efetivo horizonte... transdisciplinar. Nunca como agora tivemos entre nossas mãos e em nossas men- tes tanto poder para, de fato, reverdecermos o planeta, reavivarmos os desertos, purificarmos nossos ares e nossas águas, tornar a casa-nave em que vivemos não apenas sustentável - o que ainda é muito pouco — mas plena de Vida fecunda e biodiversa. Múltipla e fértil de condições naturais de uma plena vida natural biodiversa. E, no entanto, nunca como agora estivemos tão distantes deste projeto em nome do qual a Educação Ambiental justifica a sua existên- cia. Hannah Arendt lembra bem o que já sabemos. Durante todos os milhões de anos que nos antecederam em nossa trajetória na Terra, mal arranhamos a sua casca. Como lembrei acima, muito tempo passou até quando nossos ancestrais lascaram pedras, cavaram a terra com as mãos e paus toscos em busca de raízes, caçaram animais e eram caçados por animais, e, um dia, aprenderam a lidar com o fogo. Bem mais perto de nossa era, centenas e milhares de anos se passaram quando, mesmo já senhores de tecnologias que saltaram da lenha ao carvão, do carvão ao petróleo e dele à eletricidade, mal podíamos ainda fabricar alimentos, armas e casas com os recursos da Terra?. Agora não. Agora passamos da fabricação de utensílios e espaços limitados para nosso uso humano, a uma escala de ação sobre a matéria e a energia do planeta capazes de alterarem o seu equilíbrio em uma escala crescente e irreversível. Os 2 Suas idéias podem ser encontradas entre as páginas 80 e 85 de La crise de la culture - huit exercices de pensée politique. Tenho a tradução para o Francês, na edição de 1989, da Gallimard. Lembro que o sugestivo nome original do livro, em inglês é: entre passado e futuro rd idid JA Ja o A O O À da identidade, da formação e da interação de/entre atores ambientais — com foco sobre os educadores ambientais — leva a própria Educação Ambiental à sua máxima e polivalente responsabilidade. Não se trata de um livro de metodologias, embora elas apareçam sob diversas indicações, aqui e ali. Menos ainda, ele não é um manual de receitas simplificadas, algo que em boa medida tende contribuir para corroer o alcance e reduzir a densidade de um trabalho social destinado acriar, estender e conectar redes e coletivos de uma experiência de ação solidária que tem no ensinar-aprender para transformar-se, para gerar agentes de transformação. Corremos o risco de imaginar que “nada mais fácil e corriqueiro do que a Educação Ambiental”. Afinal, “basta ter sensibilidade e algum traquejo para lidar com as pessoas”. Nada mais ilusório! E podemos esperar que a sucessão dos estudos aqui apresentados derrube esta visão tão superficial e pejorativa quanto a daqueles que imaginam que as questões ambientais (ou seja, as questões relativas à possibilidade de a Vida seguir existindo neste único planeta azul do Sistema Solar) podem ser resolvidas com uma boa dose de boa dose nas negociações entre o poder de estado e o mundo dos negócios. O fundamento da Educação Ambiental está na certeza de que somos nós, as pessoas da vida cotidiana - as mulheres e os homens da vida de todos os dias - os atores sociais da sociedade civil, ou, se quisermos, o “povo soberano” enunciado por Rousseau, os responsáveis substantivos por tudo o que venha a ser feito neste e em qualquer outro campo da socie- dade e de suas culturas. Podemos contar com o reforço de boas políticas públicas. Podemos partir mesmo do apoio do poder público. Podemos aceitar até mesmo a contribuição de setores empresariais do mundo dos negócios. Mas, estas duas instâncias adjetivas da vida social passam... e ficamos nós: as pessoas e coletivos de pessoas como você e eu. E é a nós que estes caminhos e encontros se dirigem, e nos deve- riam dirigir. E é para nossos diálogos e passos em direção a horizontes de aprender, saber, convergir e agir, que este livro foi escrito. Ao contrário de outras vocações da educação, vagas demais, ideológicas demais, não raro, até mesmo, fundamentalistas demais ou restritas e unidirigidas demais, a Educação Ambiental é um cenário cul- tural e pedagógico de convergência de múltiplos outros campos de saber, de sentido e de ação. Isto em nada deve fazer com que ela, em qualquer uma de suas possíveis vertentes ou tendências, venha a ser tão aberta a “qualquer coisa” que acabe não dizendo coisa alguma a ninguém. ooo. TUTO TS -TU00[ “JT €-Hi- Ao contrário. Que algumas idéias ousadas escritas acima retornem aqui. A Educação Ambiental deveria vir a ser um caminho de encontros por meio do qual toda a educação que praticamos possa vir a ser não apenas reformulada (chega de LDBs) mas verdadeiramente transformada. Que este seja um convite e um caminho deste livro. Carlos Rodrigues Brandão Outono de 2007 — Lua Nova INTRODUÇÃO .......... sl... is iss seneanaenaaasassasanaanaanaaaaaa 17 ATORES SOCIOAMBIENTAIS ..........sissrmeeemeaneranenanaas 2 ALQÍSI RUSCHEINSKY ATORES SOCIAIS E MEIO AMIENTE. ..................... 35 MOEMA L. VIEZZER CAPITAL SOCIAL ... PEDRO JACOBI E FERNANDO MONTEIRO 47 COMUNIDADES EDUCADORAS ......isssssasasasamesassanaas 59 SEVERIANO JOSEH SANTOS JR. E ALBA MARIA NUNES CONFLITOS .....ssssssasaaasaasasaeaaasaoaaaasananaaaaaaaaanaaaaaaannaaaaA A MARCA A. S. MALAGODI CONTEXTOS DE APRENDIZAGEM ...........ssssssasaeas 85 MARTHA TRISTÃO & ROBERTA CORDEIRO FASSARELLA CULTURA ....iisssssaaaaasaasaaaaaaasaaaaaaaaanaaaaa aaa an anna anna ana 95 GEY ESPINHERA DIÁLOGO DE SABERES .................iss ssa to5 DIMAS FLORIANI EDUCAÇÃO AMBIENTAL VIVENCIAL . RITA MENDONÇA EDUCAÇÃO NA GESTÃO AMBIENTAL PÚBLICA ../31 JOSÉ SILVA QUINTAS 7 EDUCACIÓN SOCIAL .........s. iii isinrssanasasanaanaa 143 PABLO MERA & JOSE ANTONIO CARIDE EMANCIPAÇÃO ....... iss is ressesasassasanaananasanananaas 157 CARLOS FREDERICO B. LOUREIRO ÉTICA AMBIENTAL ........ iii snnmarennsananeas 171 MARCELO PELIZZOLI ÉTICA E AS DIMENSÕES SOCIAIS DA SUSTENTABILIDADE ...............iasaaeseaanesananoonaanananas 183 ROBERTO GUIMARÃES ATORES SOCIAIS = O E MEIO AMBIENTES | Luiz Antonio Ferraro Júnior Nascido em São Paulo - SP. Engenheiro Agrônomo e Mestre em Ciências Agrárias pela USP/ESALQ, doutorando do Centro de Desenvolvimento Sustentável CDS-UnB. Professor da Universidade Estadual de Feira de Santana desde 2000, pesquisador da Equipe de Estudos e Educação Ambiental, professor do Curso de Especialização em Educação Ambiental para a Sustentabilidade, curso que coordenei entre 2001 e 2004. Assessorei Movimentos Sociais Camponeses da Bahia (CETA e Fundos de Pasto), a Comissão Pastoral da Terra e a Rede de Escolas Famílias Agrícola na Bahia. Consultor ad hoc do Programa Nacional de Formação de Educadores Ambientais da DEA/MMA. Associado do programa “Leadership for Environment and Development” (LEAD) desde 2000. Vale-me o ditado, sempre citado pelo Brandão: “uma árvore cai com grande estrondo mas ninguém escuta a floresta crescer” Tenho dois filhos e gosto de jogar futebol. ferraroluiz O yahoo.com.br rd id dA JS JA à da qi -S0 -É.[[ - .ãõ ÕÃêÃÇà = <]S Hi Introdução Tenho a satisfação de apresentar-lhes este segundo livro da série “Encontros e Caminhos”. Como organizador tive o grande privilégio de entrar em contato com várias pessoas que admiro e convidá-las para par- ticipar deste projeto. Este volume seguiu as mesmas diretrizes do primeiro livro, textos instigantes e simples, dirigidos a educadoras e educadores ambientais para que estes se reúnam e os discutam. O formato dos artigos (ou verbetes?), seu pequeno tamanho frente à complexidade dos conceitos tratados, teve duas razões de ser; 1) viabilizar a participação destes autores e autoras que, invariavelmente, têm a agenda fechada e 2) comprometer o formato dos textos com a própria finalidade do livro. Neste livro, ampliando os horizontes dos caminhos e a diversidade dos encontros, as provocações também se encontrarão no agradável e familiar galego dos queridos Pablo Meira e Caride quando defendem que “os límites que se establezan entre a educación ambiental e a educación social son borrosos e puramente con- vencionais.” Este livro não exaure um tema sequer, nenhum autor ou autora buscou isso, o que fizeram foi dar uma “triscadinha”, uma “reladinha” neles. E pra que isso? Pra dar gosto, pra provocar o paladar, pra dar vontade de buscar mais. Querer saber mais não para que então estes educadores e educadoras esgotem um tema, a idéia de exaurir temas é oposta àquilo que a prática da educação ambiental propõe. Saber tudo de um mesmo assunto raramente vai, por si, resolver uma problemática, pode ajudar a resolver um problema relativo àquela disciplina, mas de nada adianta para a situação socioam- biental vivida, um imbricamento de desafios políticos, sociais, culturais e técnicos. Alguns torcem o nariz para a proposta porque não se aprofundam os conceitos que são tão complexos, outros desgostam porque o livro mescla vertentes de pensamento que na academia nem se dizem bom dia. São camin- hos solitários, cheios de desencontros. Em ode à crítica, Pablo Neruda diz que mesmo após os críticos destroçarem seus escritos, usando várias armas como dicionários e citações respeitáveis, junto à sua poesia “voltaram a viver mulheres e homens, de novo fizeram fogo, construíram casas, comeram pão, repartiram entre si a luz e no amor uniram relâmpago e anel.” Os autores e autoras deste livro possuem uma característica singu- laríssima, são pessoas envolvidas com a realidade, com a problemática socioambiental e, cada um deles, tem construído referenciais interessantes naqueles temas específicos que mais fazem sentido para suas práticas. ALOÍSIO RUSCHEINSKY Aloísio Ruscheinsky, nascido em Mondai, SC. É professor do PPG em Ciências Sociais da Unisinos. Graduado em Filosofia e em Ciências Sociais, é mestre em Ciências Sociais, pela PUC-SP, e doutor em Socio- logia pela USP, tendo sua tese o título “Partido político e movimentos so- ciais”. O professor é autor, entre outros livros, de Metamorfoses da cidada- nia. São Leopoldo: Unisinos, 1999; Atores sociais e lutas políticas. Porto Alegre: Edipucrs, 1999; e Associativismo na invenção da modernidade. Rio Grande: Editora da FURG, 2000. É também organizador de Educação Ambiental: múltiplas abordagens. Porto Alegre: Artmed, 2003; Sustenta- bilidade: uma paixão em movimento. Porto Alegre: Editora Sulina, 2004. Além disto mais de 30 aitigos publicados em periódicos e 15 capítulos em coletâneas. Realizou pesquisas sobre educação ambiental por alguns anos como membro do Mestrado em Educação Ambiental, da FURG, Rio Grande/RS. Atualmente seu interesse de pesquisa está voltado ao tema do consumo de água na sociedade de consumo e um diagnóstico dos projetos de educação ambiental em função da proteção aos mananciais e da confia- bilidade do consumidor urbano. 22 ea rd ifidA Ai da o O O o o À ATORES SOCIOAMBIENTAIS Aloísio Ruscheinsky As questões e atores ambientais adentram na arena política brasi- leira e se materializam através de significativas articulações, entidades e militantes ambientalistas por ocasião de encaminhar emendas populares ao texto da nova constituição entre 1986-1987. Apesar de tantos conflitos e dissensos no seio dos setores populares e intelectuais, esta articulação conseguiu superar em muitos pontos o distanciamento do ambientalismo como protagonista em relação a outros tantos atores sociais. Vale lembrar que este esforço de aglutinação, de negociação e de envolvimento se con- solida como um fator fundamental para que o capítulo de meio ambiente na Constituição Brasileira seja considerado avançado em face da realidade de inserção de questões ambientais na teia da sociedade brasileira. Fato notá- vel é a construção da educação ambiental como expressão de atores sociais no cenário brasileiro. Encontramos neste processo a formulação e a criação de múltiplas e inúmeras experiências de educação ambiental, bem como a ratificação de uma legislação que dá guarida para a práxis neste campo e daí resulta a razão da denominação de atores socioambientais. As considerações sobre atores socioambientais remetem à relação entre ecologia e política e a oportunidade de sustentar uma outra vontade política que privilegia a sustentabilidade. O discurso nas ciências sociais que trabalha com a noção de ator ou de sujeito compreende-o em seu atuar de um modo emancipatório. A sua forma e o imaginário dos atores sociais quanto ao meio ambiente são invocados como fenômeno da história, cujas características são a política, a democracia, a práxis, cidadania e sustenta- bilidade. A abordagem a partir de atores sociais requer um aprimoramento na reflexão e diagnóstico, no desvendar de desafios e perspectivas. Processos sociais e atores socioambientais Ao tratar dos atores socioambientais compreendemos a socieda- de sob uma dupla perspectiva: de uma parte, a dimensão de mudança permanente, isto é, tudo está em movimento e mutação; de outra parte, a idéia de ator com a sua capacidade criadora que substitui qualquer idéia de consenso na sociedade para instaurar a ótica dos conflitos sociais. Poitan- to, uma sociedade permeada por atores não pode ser compreendida como uma ordem social, como equilíbrio ou coesão. Através dos atores sociais se operacionaliza a capacidade da sociedade de eleger a sua organização 23 rd idid JA Ja o A O O À com as respectivas relações sociais, estabelecer as bases de negociação de conflitos, de selecionar os seus valores ambientais e de estrear os processos de mudança e ação sobre o meio ambiente. Anoção de sujeito se identifica com a idéia de consciência reflexiva, com a noção de criador de si, com uma cultura cidadã, com a invenção da sustentabilidade. Todavia, estamos num período onde os atores socioam- bientais declinam mais e mais da autonomia radical em relação as suas expressões políticas: desenha-se na relevância de seu papel social tanto a autonomia associativa para iniciativas de sua aspiração, quanto à inserção no sistema institucional. Atores socioambientais são concebidos como agentes colocados dentro das contradições e dos conflitos suscitados pelos relacionamentos entre sociedade e natureza. As tensões em tomo de questões ambientais jamais se encontram isoladas de outros tipos de conflitos inerentes à socie- dade desigual. Entretanto, uma ação estratégica dirigida seja contra uma forma de degradação ou de exaustão de recursos finitos, seja em prol de um projeto de reordenamento do consumo e contra o desperdício, não se qualificam como uma estratégia de olhar e ambicionar o poder político. Acima de tudo trata-se de criar ou transformar as instâncias deliberativas com o intuito de aparelhar para a defesa de causas ambientais. Os atores socioambientais tratam de questões que frequentemente estão excluídas da agenda da vida política ou na prática encaradas como da esfera privada, quando não naturalizadas ou estranhas à ordem do dia do debate político e cultural. Eles organizam-se em função da participação no conflito ao redor da gestão do desenvolvimento ou do decrescimento da economia que esbanja bens naturais da gestão da sustentabilidade ou dura- bilidade, da avaliação dos processos reversíveis e irreversíveis. A crítica ao sistema de produção que opera por resultados a qualquer custo, à cultura de consumo que opera novas distinções ou a discriminação social e à ciência que projeta avanços tecnológicos representa uma situa- ção de tal forma incômoda em muitas circunstâncias da vida cotidiana que se torna compreensível os que dela se afastam. Os atores socioambientais sobrevivem melhor ou seus projetos adquirem maior grau de legitimidade social e eficácia política quando combinam desenvolvimento e qualidade de vida, inclusão social, solução de problemas ambientais e crítica social, quando assentam um projeto ambiental, a dimensão cultural, os respecti- vos conflitos e a adequada mediação de um agregado de atores. Diante do aprofundamento do abismo entre riqueza e pobreza os atores socioambientais também ficam estarrecidos, bem como diante dos 24 “a ea rd id dA JS JA à da o O O o o À de questões ambientais também está inclusa a luta contra as grandes cor- porações, o controle do capital financeiro sobre a sociedade, bem como o discernimento entre a ótica que tende a reconhecer a prioridade aos objetos (consumo) em detrimento do enfoque das relações sociais. Esta crítica a valores manifesta a reação dos atores socioambientais a processos ambientais por vezes irreversíveis de perda da biodiversidade ou de degradação ambiental. Com este duelo se esforçam para manter, re- tomar ou forjar o controle sobre suas próprias condições de vida com dife- renciado relacionamento entre sociedade e natureza, bem como questionar valores, gostos, aspirações, desejos e práticas sociais. Empenham-se em um movimento para organizar de uma maneira nova a capacidade de gera- ção, de apropriação e de difusão de linguagem e de representações usuais sobre a natureza, as relações sociais, a qualidade de vida. A responsabilidade socioambiental através de um conjunto de inicia- tivas molda políticas públicas e inclusive delineia novos papéis aos atores socioambientais. Neste campo é fundamental compreender o movimento de avanços e recuos dos diferentes atores dentro da sociedade em busca de superar, conquistar ou garantir seus interesses e/ou direitos a um ambiente saudável e democrático. No campo da educação ambiental surgem iniciati- vas que pretendem envolver e comprometer indivíduos e grupos para for- talecer a transversalidade da temática ambiental, não só no sistema escolar, mas em todas as atividades sociais. O processo de educação ambiental requer para o sucesso em suas atividades que a sociedade seja tolerante, onde forças novas podem emer- gir fundando-se sobre uma análise crítica, uma vez que contestam o pa- radigma vigente. Encorajam-se no seu empenho para romper fronteiras e barreiras que se opõem à perspectiva da sociedade sustentável. Os educadores ambientais padecem permanentemente de ambigtii dades pelo fato de serem atores em campos marcados por posicionamentos e pela permanente necessidade de discernir como ser atores na medida em que as tensões socio-ambientais exigem a demarcação mais nítida de um posicionamento em um dos campos do conflito. Estes educadores situam- se precisamente nas fronteiras onde fluem tempestades, onde os conflitos pressionam por mudanças ambientais profundas e nas encruzilhadas re- sultantes da expansão do consumo. Sendo assim, só podem estar insatis- feitos. Os sentimentos que os animam misturam cólera e esperança, raiva e ternura, entre outras ambigúidades. Outras vezes não se dão conta em suas proposições a que interesses se ligam às ações ou a que forças sociais correspondem mais detidamente os seus projetos. “a rd idid JA Ja o A O O À Conflitos, atores e instâncias decisórias O estudo da participação, da articulação e das decisões na sociedade dos atores sociais é de todo conveniente na medida em que se multiplicam as dimensões da vida social que são tomadas como objeto de decisão. A multiplicação de fóruns de deliberação, que recobrem a complexidade dos problemas ambientais, caracteriza, a partir dos instrumentos decisórios, uma sociedade de comitês. Enraizar e radicalizar a educação ambiental 1equer atentar para a democratização das decisões, uma vez que a degra- dação e a exaustão de recursos naturais é também um atentado e degrada a democracia. Atores socioambientais se definem e aprendem na luta contra a lógi- ca do mercado, da técnica, dos aparelhos burocráticos. O marco diferencia- dor é a passagem de práticas de oposição para encaminhamentos e práticas sociais definidas como pró-ativas, na medida em que em escala crescente tem como objetivo central a afirmação de uma altemativa viável, onde se somam forças dos atores e do institucional. Na sua trajetória capacitam-se cada vez mais para exercer uma influência sobre as agências estatais de meio ambiente, o Legislativo e o Judiciário, a comunidade científica e o empresariado. É o significado de uma aproximação com o institucional. O surgimento e fortalecimento de diversas instâncias, consultivas ou deliberativas, em várias áreas e níveis com a participação de setores da sociedade civil e nos quais os atores socioambientais são figura chave, em- bora frequentemente minoritários. As instâncias visando uma gestão am- biental agregam atores diversos e frequentemente em conflito: conselhos ambientais de abrangência diversa, comitês, fóruns. Ora são formatos com procedimentos formais ou resumem-se em cumprir uma exigência formal, sem poder efetivo de influenciar num processo decisório em questões am- bientais originadas da demanda do movimento ambiental, onde a repre- sentação assume muitas vezes características contraditórias. Outras vezes espelham de fato as circunstâncias e o jogo de forças em que se inserem os atores socioambientais. É um campo onde se assentam assimetrias, ins- tabilidade de regularidade e êxito e imperativos de legitimação (DUPAS, 2005). Em cada momento e em cada setor é preciso demonstrar o grau de autonomia real ou de cooptação pelo poder público do sistema de decisão e/ou sua influência efetiva. A multiplicação de fóruns setoriais por pres- são da sociedade civil não representa de imediato uma democratização do “a rd fiddAdA JA ida o O O o o À Estado como esfera pública em sentido amplo. As alterações produzidas podem ater-se a espaços específicos e limitados, sem ferir no coração os interesses que conduzem à deterioração da qualidade ambiental. Também é errôneo imaginar que as escolhas efetuadas a partir da participação dos atores socioambientais em instâncias decisórias são resultantes de prefe- rências e de negociação de alternativas completamente abertas e trans- parentes. O empenho cooperativo em mobilizações ambientalistas pode também ser compreendido pela subserviência ou inserção dependente. Isto caracterizaria uma insuficiência de potencialidades para assegurar as con- quistas alcançadas e formalmente reguladas. A ação política diante de problemas ambientais complexos, diante da dialética entre sociedade e natureza é fundamental para compreender a participação em coletivos como uma contribuição à práxis em educação ambiental (LOUREIRO, 2006). A multiplicação das instâncias de decisão numa sociedade de problemas ambientais complexos tem o grande mérito de valorizar os atores sociais e a índole dos procedimentos de planejamen- to. A democracia é identificada com a noção de representatividade, toda- via requer também que os atores sociais sejam representáveis, isto é, que sejam reconhecidos, organizados e capazes de agir em meio aos conflitos inerentes aos canais de participação (comitês, fóruns, conselhos), decisão e representação política. A construção de modalidades participativas e o recurso às técnicas de deliberação em sítios coletivos encontram-se intimamente associadas com uma cultura política, com o reconhecimento da vigência dos confli- tos acima do consenso, com o desenvolvimento da capacidade para nego- ciações, consultas, barganhas, alianças e transações. Usualmente o enca- minhamento de decisões sobre problemas ambientais de que participam atores sociais se vale de uma série de acordos entre disputas, de apelo ao conhecimento cientifico, de negociações, de recursos discursivos e de jus- tificativas de interesses (CASTRO & OLIVEIRA, 2006). Os atores socioambientais se orientam em relação a um futuro sus- tentável, em base a sua própria mudança e a emergência de um novo pa- radigma, que podem ser definidos pelas modificações constantes do siste- ma de decisões e da influência de diversos atores sociais. A mobilização em questão na sociedade brasileira vem suscitando avanços nas questões ambientais no sentido de institucionalizar políticas e soluções para o de- senvolvimento sustentável em diversos setores. Hoje se pode visualizar um contorno mais nítido no desenho do chamado campo ambiental, cuja “a dC. aAAA sa a o A O O À O Estado constitui um ator chave do processo de geração de uma sociedade informada e participativa, sustentável e durável. A pergunta a se colocar é simples: em que medida os procedimentos atuais ajudam a pro- mover a participação cidadã para o desenvolvimento sustentável? Haverá aqui um conjunto de aportes possíveis. As organizações da Sociedade Civil são tanto produtoras como usu- árias de informação, de demandas e de solidez para um projeto sustentável. Às vezes são experiências pequenas, enraizadas na comunidade e a sua articulação em rede tornou-se fundamental, gerando sinergias. Outros atores a articular: a mídia e a universidade. A mídia como forma de articulação de sistemas locais de informação, para dinamizar iniciativas locais de gestão ambiental participativa e democratização da sociedade. As Universidades constituem um impressionante acervo de recursos estratégicos, cabendo integrá-la aos problemas locais ligados à qualidade de vida e à cidadania ativa, interagindo com os diversos atores sociais, a fim de que seja organizadora dos conhecimentos na região onde está inserida. Proposta metodológica da EA a partir da perspectiva de atores socio- ambientais (ver a realidade pelas lentes de um observador atento e através da metodologia do ver, julgar e agir): * Enxergar a realidade como um movimento e a partir da ótica de atores num determinado cenário, espaço e tempo, que expressa conflitos, alianças, conciliações, traições e contradições. * Inquietar-se com o posicionamento, as restrições, as objeções, a prática de cooptação e os projetos de atores sociais, observando as orientações em jogo e avaliando as potencialidades. *Intervir na qualidade de atores socioambientais como uma proposta de EA, que se mune de todos os instrumentos para agir de maneira eficaz, que prima pela articulação em rede, que conecta o local e o global e cujos encaminhamentos lhe permitem vislumbrar uma sociedade sustentável. Onde observar a orientação e a influência dos atores sociais como forças sociais: * Quais os atores sociais que se movem em torno de uma área de risco, de uma área de preservação ou para a organização de um evento ambiental? * AEA pode organizar coletivos de consumidores para compreender processos reversíveis e irreversíveis no uso dos recursos natur: rd fidA AS JA da o O o À e transformá-los em novos atores para a defesa da questão ambi- ental ou para que os bens naturais estejam ao alcance do uso de todos? Quais os atores socioambientais a articular para que se venha a implementar a produção, a comercialização e o consumo de produtos orgânicos ou agro-ecológicos ? Ou quais os diferentes pontos a tocar para uma reeducação alimentar? Os atores sociais com interesse em torno da água potável numa certa região, com seus cuidados, usos e abusos, domínio, abundân- cia. A que se refere dominância? Ou carência”? Quais são as prin- cipais mudanças na forma de consumo de líquidos que podem ser observados e quais as principais consequências? Ou ainda, na sua região, quais os principais conflitos socioambien- tais e quem são os principais atores na arena? E quais as soluções com o envolvimento de atores em questões que competem ao nível pessoal, municipal, estadual, etc., ou competências de organizações da sociedade civil ou da esfera pública. Usualmente observamos os diferentes atores na história narrada num filme... Uma análise permite afirmar como se entrelaçam num filme atores coletivos ounão. Assista a um filme e avalie quem são e que papéis desempenham os personagens como atores sociai Atores sociais num bairro ou num jogo de futebol... Interessante como forma de preparo para outros campos examinar as jogadas de futebol: as estratégias dos times; tipo de jogadas com maior eficácia; outros atores como financiamento, torcida, treinador, entre outros, todos compõem o quadro. Atores sociais e a questão dos resíduos (sabendo da existência de interesses muito diferenciados): quem e quais os interesses circu- lam e se articulam. Exemplo disto é desvendar quais os interesses, conflitos, negociações em torno da coleta dos resíduos sólidos e líquidos na cidade ? A coleta seletiva contempla interesses e como tais apresentam uma série de obstáculos. Compreender a EA na dimensão dos atores socioam- bientais em circunstâncias e seus confiitos não é tare- fa fácil, nem é a tarefa para um individuo, senão um conjunto de articulações e mediações. Se é verdade que apotência, a amplitude, a eficácia e o imaginário de atores sociais é grande, a paciência da utopia é infinita 33 “a dC. aAAA sa a TU -T “-e ii Referências bibliográficas ACSELRAD, Hemi (org). Conflitos ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará: Fundação H. Boll, 2004. CASTRO, Ronaldo Souza de & OLIVEIRA, Renato José de. Cognição e dialética em educação ambiental, in LOUREIRO, C. F., LAYRAR- GUES, P.P., CASTRO, R.s. (orgs). Pensamento complexo, dialética e Educação Ambiental. Cortez Editora, 2006. DUPAS, Gilberto. Atores e poderes na nova ordem global : assimetrias, instabilidades e imperativos de legitimação. São Paulo: UNESP, 2005. LOUREIRO, Carlos Frederico B. Problematizando conceitos: contribuição à práxis em educação ambiental, in LOUREIRO, C. E, LAYRAR- GUES, P.P., CASTRO, R.s. (orgs). Pensamento complexo, dialética e Educação Ambiental. Cortez Editora, 2006. MACHADO, Leda Maria Vieira. Atores sociais: Movimentos urbanos, continuidade e gênero. São Paulo: Annablume, 1995. PORTILHO, Fátima. Sustentabilidade ambiental, consumo e cidadania. São Paulo: Cortez Editora, 2005. RUSCHEINSKY, Aloísio. Atores políticos e lutas sociais: movimentos sociais e partidos políticos. Porto Alegre: Edipucrs, 1999. . Atores sociais e meio ambiente, in. Identidades da educação am- biental. Ministério do Meio Ambiente, Brasília, 2004. . O associativismo na invenção da modernidade : atores e perspec- tivas da ação coletiva. Rio Grande: FURG, 2001. SATO, M. e CARVALHO, I. (org). Educação ambiental: pesquisa e desa- fios. Porto Alegre: Artmed, 2005. TOURAINE, Alain. Le retour de l'acteur. Paris: Fayard, 1984 - Poderemos viver juntos? : Iguais e diferentes. Petrópolis: Vozes, 1999. 34 ea rd ifidA Ai da o O O o o À ATORES SOCIAIS E MEIO AMBIENTE Moema L. Viezzer “DEPENDE DE NÓS... Quem já foi ou aindaé crian- ça Quem acredita ou tem esperança, quem faz tudo pro mundo melhor DEPENDE DE NÓS... Se este mundo ainda tem jeito, apesar do que o homem tem feito... Se a vida sobreviverá. DEPENDE DE NÓS... ” (Ivan Lins). Em todos os lugares do planeta, as ações humanas que se sobrepuse- ram ao planejamento da natureza com forte impacto ambiental estão sendo repensadas, trazendo a necessidade urgente da formação da consciência ambiental e cidadã e a educação de pessoas/instituições a partir de prin- cípios e valores que orientam as ações na perspectiva da ética do cuidado para a sustentabilidade. Esta constatação nos remete a uma questão funda- mental: de quem depende um novo presente e um novo futuro no planeta Terra e a quem deve dirigir-se a educação ambiental? No contexto da Rio 92, o Tratado de Educação Ambiental para So- ciedades Sustentáveis e Responsabilidade Global aprovado no Fórum Glo- bal transcendeu, de longe, o público cativo de jovens e crianças, com uma afirmação clara: Este Tratado é dirigido para: * Organizações dos movimentos sociais, ecologistas, mulheres, jovens, grupos étnicos, artistas, agricultores, sindicalistas, asso- ciações de bairros e outros; * ONGs comprometidas com os movimentos sociais de caráter popular, * Profissionais da educação voltados à questão ambiental tanto nas 1edes formais de ensino como em outros espaços educacionais; * Responsáveis pelos meios de comunicação capazes de aceitar o desafio de um trabalho transparente e democrático, iniciando uma nova política de comunicação de massas; * Cientistas e instituições científicas com postura ética e sensível ao trabalho conjunto com as organizações dos movimentos sociais; * Grupos religiosos interessados em atuar junto às organizações dos movimentos sociais; 37 ea rd idid JA Ja o A O O À * Governos locais e nacionais capazes de atuar em sintonia/parceria com as propostas deste Tratado; * Empresários comprometidos em atuar dentro de uma lógica de recuperação e conservação do meio ambiente e de melhoria da qualidade vida; * “Comunidades Alternativas que experimentem novos estilos de vida condizentes com os princípios e propostas deste Tratado.” Evidentemente, esta lista não é exaustiva. Sua inclusão no Tratado teve o propósito de mostrar o perfil de quem já tem sinergia de interesses para atuar nos compromissos que os Princípios e Valores do Tratado e suas diretrizes trazem implícitos e nos remetem à reflexão que pretendemos abordar neste texto em dois momentos: * Atores Sociais: que interferem na qualidade do meio ambiente e de vida e o necessário equilíbrio entre os poderes representados pelos mesmos. * “O pessoal é coletivo”: a mudança de paradigmas pessoais como condição sine qua non para a mudança do paradigma social. 1. Atores Sociais que interferem na Qualidade do Ambiente e de Vida. “Ninguém educa ninguém. Nin- guém se educa a si mesmo. Os seres humanos se educam me- diatizados pelo mundo”. Paulo Freire. Não faz muito tempo, “as questões ambientais eram vistas como assunto de conservacionistas, cientistas, políticos e de alguns poucos em- presários. A presença das comunidades, das organizações e instituições da sociedade civil foi adquirindo importância crescente no último quarto do século 20. Foi nesta época que a participação cidadã emergiu na região latino-americana como mola-mestra na solução dos problemas ambientais e na proposta de novas formas de conviver em sociedade e com a natureza (...). No caso da gestão ambiental, a participação cidadã tornou-se o alfa e ômega, a seiva das profundas transformações que se estão gestando para assegurar a convivência democrática, sustentável e harmônica dos seres humanos entre si e com o ambiente”, segundo o Manual Latino-Americano de Educação Ambiental (1995). 38 rd id dA JS JA à da qi -S0 -É.[[ - .ãõ ÕÃêÃÇà = <]S Hi Avançando no tempo, organizações governamentais e para-governa- mentais, instituições da comunidade científica, organizações da sociedade civil e empresas foram percebendo a indispensável articulação para chegar a resultados positivos de ações a serem empreendidas por uns e outros, uma vez que todos nós temos parte nesta tarefa planetária. “Sinergia de Interesses” foi um conceito forte que entrou em pauta. A realização da 2º. Conferência das Nações Unidas sobe Meio Am- biente e Desenvolvimento/Rio 92, com o respectivo Fórum Global da So- ciedade Civil, foi um marco neste sentido. Pois demonstrou claramente como o futuro perfil da humanidade é algo demasiado importante para ser desenhado apenas pelos governos nacionais ou pelos mecanismos oficiais de concentração mundial hoje existente Manual Latino-Americano de Educação Ambiental (1995) . Mas o diálogo necessário para estabelecer as bases mínimas de atu- ação conjunta em relação ao meio ambiente e o desenvolvimento para a sustentabilidade não é assunto que brota “naturalmente”; ele se dá em pro- cessos de aprendizagem continuada e permanente. Neste sentido, educa- doras e educadores ambientais que adequaram as idéias de Paulo Freire à aprendizagem socioambiental foram também adaptando os conceitos e propostas de educação ambiental para os Atores Sociais que interferem no meio ambiente, além de insistir na necessária revisão pessoal de paradigma para cada ser humano em sua qualidade de cidadão-cidadã do planeta. Quem são os Atores Sociais? Neste texto, a expressão é utilizada para designar as instituições cria- das pela sociedade ao longo de séculos e cujo poder interfere na qualidade de vida de todos os seres que constituem a “teia da vida”. Na realidade, os Atores Sociais representam “blocos de poder” que, colocados em sinergia de interesses pela qualidade do meio ambiente e de vida, podem aprender e ensinar uns aos outros, “mediatizados pelo mundo”, como diz Paulo Freire, entendendo-se por “mundo” o universo complexo de todos os seres que constituem a comunidade de vida em Gaia, o Planeta Terra, como sugerem a Carta da Terra e o Tratado de Educação Ambiental. Nenhuma pessoa e nenhuma instituição, ao ocupar algum destes espaços de poder, pode dar conta da complexidade das questões que se colocam do ponto de vista econômico, social, ambiental, cultural, político, institucional. Assim, é fundamental trabalhar com todos os Atores Sociais na perspectiva da ética do cuidado, desenvolvendo a ação educativa per- manente, continuada e inclusiva nos diversos espaços e níveis de atuação 39 rd dA dd JA da o O O o o À Além de multiplicar o movimento “de dentro pra fora”, estas redes de conexões, podem contribuir para trazer ao cotidiano de nosso compro- misso com a qualidade do ambiente e de vida, muitas outras pessoas e ins- tituições com as quais estamos em contato, algumas delas desde nossa en- trada para atuar no palco da vida em Gaia. O poema que segue, de autoria de Robert Miller, um dos idealizadores das Nações Unidas e fundadores da Universidade da Paz é bem significativo em relação a este tema: Participe de Redes de Conexões Use cada palavra que escrever, cada conversa que mantiver; Cada encontro de que participar Paraexpressar suas crenças básicas e seus sonhos, Para afirmar aos outros a visão de nundo que você almeja. Conecte-se através do pensamento. Conecte-se através da ação. Conecte-se através do amor. Conecte-se através do espírito. Você é o centro de uma rede de conexões. Você é o centro do mundo. Você é uma fonte livre e imensamente poderosa de vida e de bondade. Afirme-a Expanda-a. Irradie-a. Pense nela noite e dia... E um milagre acontecerá: a grandeza da sua própria vida. Nim mundo de grandes poderes, grandes mídias e grandes monopólios, Com mais de (cinco) seis bilhões de pessoas, Participar de redes de conexões é a nossa liberdade, Anova democracia, uma nova forma de felicidade. 3. Atores Sociais e Redes de Conexões como Temas de Formação Quando um Coletivo Educador compõem seu Cardápio de Apren- dizagem torna-se imprescindível incluir estes dois temas que perpassam todos os demais relativos à realidade ecológica de sua região. A título de exemplo, lembramos um Programa de Formação de Educadores e Educa- doras Ambientais/ProFEA, concebido a partir de dois universos eco-sistê- micos: Bacia do Paraná III e entorno do Parque Nacional do Iguaçu. Em ambos os casos, abordar o tema dos Atores Sociais que interfe- 1em na qualidade do ambiente e de vida significou apreender a importância de verificar, em qualquer “iniciativa-programa-projeto-política” pública “quem é quem” neste pedaço do planeta em que vivemos, marcado pela 42 intervenção das sociedades que nele vivem e/ou com ele convivem por razões bio-regionais e históricas especiais. A Bacia do Paraná III, por exemplo: desde as nascentes dos rios que se agrupam para formá-la, só pode ser pensada levando em consideração, ambas as margens do Rio Paraná — uma no Brasil, outra no Paraguai - e sua conexão com os demais rios que a ele se interligam ao longo do percurso. O Planejamento territorial e ambiental leva e traz implícita a necessidade de uma visão sistêmica desta Bacia que remete, inclusive, aos necessá- rios “Diálogos da Bacia do Prata” reunindo comunidades de cinco países Brasil, Paraguai, Bolívia, Argentina e Uruguai, onde a Bacia do Paraná HI encontra as demais que compõem a Bacia. Por sua vez, o Parque Nacional do Iguaçu, o outro eixo bio-regional do ProFEA na região, além de constituir-se num ecossistema que extrapola as fronteiras criadas entre Brasil e Argentina, tem uma variável importante em relação ao tema que nos interessa: por suas características particulares, foi declarado “Patrimônio Natural da Humanidade” pela UNESCO, que lhe dá um status particular a ser constantemente lembrado nas políticas, es- tratégias, iniciativas e programas que ali se estabelecem, lembrando sem- pre que o que ocorre no Parque reflete-se nas populações que vivem em seu entorno e vice-versa. Assim, no contexto dos processos educativos sobre a realidade eco- lógica da região e a legislação em vigor que nela interfere, o tema dos Atores Sociais que interferem na qualidade do ambiente e de vida no Par- que Nacional do Iguaçu e seu entorno e na Bacia de Paraná III permeiam necessariamente todas as reflexões que marcam as paradas mensais do Coletivo Educador na “trilha” traçada para o Programa de Formação de Educadores e Educadoras na região. Cada vez que nosso olhar se debruça sobre algum aspecto da realidade ecológica da região, naturalmente ele se volta para visualizar: de quem depende a denúncia dos problemas encon- trados? De quem depende a solução das questões diagnosticadas? De quem depende o anúncio e a divulgação de soluções encontradas que merecem ser partilhadas e multiplicadas nos níveis local, estadual, nacional e, inclu- sive, internacional? Esta forma de trabalhar convoca a todos e todas para a aprendiza- gem do diálogo na perspectiva do encontro de saberes — acadêmicos ou não — e para a necessária criação de sinergia de interesses, sem a qual os Atores Sociais não podem lograr uma efetiva conectividade com a realidade eco- lógica da região. 43 “a rd idid JA Ja o A O O À Conclusão Todo e qualquer envolvimento de educadores e educadoras ambien- tais traz à tona o tema das Redes de Conexões e dos Atores Sociais que interferem na qualidade do ambiente e de vida, independentemente do eixo escolhido para a aprendizagem e ação. Pode ser alguma questão específica como: a poluição sonora ou dos mares, o câncer de pele provocado pela camada de ozônio ou o envenenamento do leite materno ocasionado pela ingestão de agrotóxicos. Pode ser um universo específico como uma bacia hidrográfica, uma unidade de conservação ou um oleoduto que atravessa diversos municípios. Em todos os casos, a educação ambiental para a sustentabilidade só adquire seu pleno significado quando atinge os diferentes Atores Sociais que interferem na qualidade do ambiente e de vida: pensadores, pesquisa- dores, estrategistas, planejadores, fiscalizadores, legisladores, empresários. lideranças, formadores de opinião, educadores e educadoras ambientais. Todos são convidados a constituir-se em comunidades de aprendizagem e de diálogo para encontro de saberes e fazeres na perspectiva da formação para a cultura da ética do cuidado. “Depende de nós”, diz o músico-poeta. Mas não somente de nós, educadoras e educadores ambientais depende “se este mundo ainda tem jeito e, apesar do que o homem tem feito, se a vida sobreviverá”. Depende de todos nós, indivíduos e Atores Sociais que interferimos na Comunidade de Vida, interiorizar que “somos todos aprendizes” como lembra o Tratado de Educação Ambiental e criar sinergia de interesses para aprender a “sa- ber cuidar” de nós mesmos e de todos os seres com os quais partilhamos nossa passagem por Gaia, nossa Mãe Terra. Sugestão de Oficinas Um problema a ser resolvido, uma ação pró-positiva a ser divulgada, um projeto a ser implementado podem ser temas de oficinas sobre Atores Sociais e Redes de Conexões como sugerem os exemplos abaixo: 1. Atores Sociais: O grupo pode aprender a trabalhar na construção do “Mapa dos Atores Sociais” que interferem na qualidade do ambiente e de vida denominando “quem é quem” em sua interferência em relação ao assunto trabalhado: órgãos públicos, organizações da sociedade civil, 1ede de ensino e comunidade científica, empresas, meios de comunicação. A seguir, com o “Mapa dos Atores Sociais”, pode-se construir o “Mapa da Mina”, identificando papéis, atribuições e funções de todos os envol- 4 PEDRO JACOBI & FERNANDO MONTEIRO ", PEDRO JACOBI Pedro Jacobi é Professor Titular da Faculdade de Educação e do Pro- grama de Pós- Graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo (PROCAM-USP). Coordenador do Doutorado do PROCAM-USP. Coordenador conjunto do projeto Bacias Irmãs que articula a formação e capacitação de atores locais para atuar nos comitês de bacias hidrográficas em parceria USP/InstitutoEcoar/Universidade de York(Canadá). Coorde- nador da equipe de pesquisa PROCAM no Projeto Negowat que aborda a negociação da gestão da terra e da água em bacias peri-urbanas da América Latina combinando modelagem multi-agente e jogo de papéis. Coordena- dor de Projeto Alfa sobre Governança da Agua (2005-2008) integrado por universidades e centros de pesquisa do Brasil, Chile, Bolívia, Colombia, França, Inglaterra e Holanda. É autor de Gestão compartilhada dos resídu- os sólidos no Brasil — inovação com inclusão social (org.), 2006; Diálogos em Ambiente e Sociedade (org.), 2006; Inovação no campo da gestão pú- blica local, 2005; em co-autoria Citizens at Risk - From Urban Sanitation to Sustainable Cities, 2001; Políticas Sociais e Ampliação da Cidadania, 2000; Cidade e meio ambiente- percepções e práticas em São Paulo, 1999; Ciência Ambiental —os desafios da interdisciplinaridade, 1999. FERNANDO MONTEIRO Engenheiro Agrônomo formado pela ESALQ-USP. Mestre em Ci- ência Ambiental pelo PROCAM-USP, especialista em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Atuou como consultor para instituições nacionais e in- ternacionais como Banco Mundial, Unesco, PNUD e Fundação Getúlio Vargas (FGV). É fellow do programa LEAD - Leadership for Environment and Development e autor de artigos sobre responsabilidade socioambiental e gestão de recursos naturais. Atualmente é doutorando e pesquisador do LAPAM - Laboratório de Análise de Políticas Ambientais, da USP. 48 rd fiddAdA JA ida o O O o o À CAPITAL SOCIAL Pedro Jacobi e Fernando Monteiro Embora os mecanismos de participação popular na gestão ambiental tenham aumentado nos últimos dez anos, eles ainda exercem pouca influ- ência no modo como as políticas públicas são efetivamente formuladas e executadas. Apesar de mais democráticos, estes mecanismos ainda são mal aproveitados, como é o caso dos comitês de bacia hidrográfica. Em geral, a população aproveita a disponibilidade dos mecanismos de forma contra- ditória, a partir de uma visão imediatista. De fato, os impactos das práticas participativas na gestão ambiental, apesar de controversos, apontam para uma nova qualidade de cidadania, que institui o cidadão como criador de direitos para abrir novos espaços de paiticipação sócio-política. Apesar das barreiras que precisam ser supera- das para multiplicar iniciativas de gestão que aiticulem de forma eficaz a democracia com a crescente complexidade dos temas objeto de políticas públicas, justificam-se todos os esforços de fortalecimento do espaço pú- blico e de abertura da gestão pública à participação da sociedade civil. Se por um lado a modernização destes mecanismos prescinde uma engenharia sócio-institucional complexa apoiada em inovações institucio- nais para garantir condições de acesso dos diversos atores sociais envol- vidos, e notadamente dos grupos sociais mais vulneráveis, também é ne- cessário ampliar a articulação entre as esferas públicas e privadas, em um esforço para cobrir a lacuna histórica existente entre essas duas esferas na gestão pública brasileira. Essa articulação passa pela criação de um am- biente institucional apoiado fundamentalmente na cooperação. Capital social: a emergência do conceito e seus alcances Desde os anos de 1990, o conceito de capital social tem uma re- percussão significativa, constituindo-se numa das mais difundidas linhas de análise no contexto atual das ciências sociais, tendo se expandido para diversas áreas de conhecimento com uma crescente ampliação da produção intelectual. Embora se trate de um conceito emergente, se traduz em um importante instrumento conceitual e prático para a consolidação de políti- cas públicas. Mas também, apesar do seu uso plural, suscita dúvidas meto- dológicas. Trata-se de um conceito relativamente novo, mas cabe enfatizar 49 aca fAJdA Ja o A O O À a dimensão social nos processos de desenvolvimento, como normas, cos- tumes, cultura, valores, motivação ou solidariedade levaram a resultados pouco desejáveis ou até mesmo a enormes fracassos. Ea Entretanto de forma geral, há um consenso na literatura, de que capital social refere-se à habilidade que os atores desenvolvem em garantir benefícios através de associação em redes de relações sociais ou outras estruturas sociais. Figura 1. Três perspectivas sobre Capital Social: principais atores e implicações para políticas públicas. Perspectiva Principais Atores Políticas Publicas 1) Visão comunitária Sociedade civil “Small is beautiful” Associações locais Voluntariado Valorização do volunta- Grupos comunitários riado 2) Visão de Redes Laços intra (fortes) e inter (fracos) comuni Empreendedores Grupos de negócios “Gestores de informação” Grupos comuni Descentralização Criação de áreas de negó- cios Federações da Sociedade Civil 3) Visão Institucional Redes comunitárias e relações estado-sociedade Setores público e privado Estruturas sociais, gover- nança Regras formais e informais Co-produção, Comple- mentaridade, cidadania, accountability, participa- ção, sinergia Fonte: Woolcock TI995). O capital social é compreendido, basicamente, por sua função, sen- do encontrado em organizações sociais que potencializem a produção do ser humano. Segundo Putnam (1996), o capital social refere-se a aspectos da organização social tais como redes, normas e laços de confiança que facilitam a coordenação e cooperação para benefícios mútuos. Durante a década de 90, diversos autores discutiram mais especifi- camente a questão da autonomia do Estado e dos efeitos da dispersão das instituições públicas. Robert Putnam (1996) e Peter Evans (1995) incorpo- 1aram o conceito de capital social, e debateram o papel das instituições na indução de mudança social, indicando o esgotamento dos dois eixos prin- cipais da intervenção pública: o neoliberalismo e o desenvolvimentismo clássico. Para Evans (1995), os componentes que formam o capital social, entre os quais estão o engajamento cívico, a integração social e as normas de confiança, podem ser promovidos pelas esferas governamentais e, in- clusive, podem ser utilizados com vistas ao desenvolvimento. Entretanto, enquanto Evans dá primazia ao Estado como fonte principal da dinâmi- ca social (o que foi chamado de abordagem neo-institucional), Putnam se opõe ao ressaltar a interpretação culturalista, demonstrando sua propensão aum determinismo cultural na identificação das fontes de ação coletiva. 52 “a ea rd id dA JS JA à da qi -S0 -É.[[ - .ãõ ÕÃêÃÇà = <]S Hi Com estes pressupostos, Putnam (1996) estudou os diversos aspec- tos que condicionaram as diferenças regionais encontradas entre o Norte e o Sul da Itália, que nos primeiros anos do século XX, tinham padrões de desenvolvimento muito semelhantes. Nas oito décadas posteriores, criou-se uma desigualdade bastante acentuada entre essas regiões. Putnam conclui na sua pesquisa, feita com base em diversos instrumentos - como leitura de jornais, comparecimento a referendos, grau de associativismo e ocorrência de voto preferencial, que as tradições cívicas e a capacidade de organização social se revelaram um poderoso determinante das dispari- dades de desenvolvimento sócio-econômico encontradas atualmente entre as duas regiões. Também observou que as experiências de mobilização e atuação coletiva acumulam um capital social derivado dos laços de con- fiança mútua entre os cidadãos, aumentando o engajamento público. E ainda, um Estado determinado a firmar normas transparentes, reguladoras da interação entre os interesses organizados, facilita a propagação de uma vida pública ativa e dinâmica, ampliando a confiança e a transparência na sociedade e permitindo a implementação de políticas maximizadoras do bem-estar geral. Putnam distingue dois tipos ideais de associação: o horizontal e o veitical. O primeiro aglutina membros iguais em status e poder; o vertical reúne sujeitos desiguais numa relação assimétrica de hierarquia e depen- dência. Sociedades moldadas no associativismo horizontal têm um grau elevado de engajamento cívico e auto-organização superior às sociedades verticalizadas, além de obterem um elevado desempenho econômico, ga- rantindo o bem-estar social de seus cidadãos (a horizontalidade propicia melhores condições para a reconciliação da democracia com o desempenho socioeconômico). O autor adota uma vertente cultural na explanação de fontes de confiança e defende a cultura política e a história particular como determinantes da existência ou não do associativismo horizontal, base do engajamento cívico, no qual o sistema político é um reflexo da lógica de hierarquia, coesão e autoridade das particularidades locais. O associativis- mo horizontal é resultado de confiança, normas e redes de solidariedade. Os achados de Putnam enfatizam o papel da confiança como base para o desenvolvimento de capital social. Assim, o conceito de capital social, definido como o conjunto das características da organização social, que englobam as redes de relações entre indivíduos, suas normas de comporta- mento, laços de confiança e obrigações mútuas, torna possível a tomada de ações colaborativas que resultem no benefício de toda a comunidade. Em recentes estudos, Putnam (2000), observa que o capital social está em declínio, a partir da constatação sobre as mudanças no associati- vismo americano e seus possíveis impactos sobre a comunidade cívica. O 53 rd dA dd JA da q 0-0 -SgÃi ii exemplo é muito original, e inclusive dá o título ao livro - Bowling Alone (2000), mostrando que os jogadores de boliche, um esporte de caracterís- ticas associativas nos Estados Unidos, passaram a praticá-lo desacompa- nhados, o que significava que as ligas deste esporte não mais mobilizavam as pessoas da mesma maneira. É claro que a sua pesquisa se desdobra em outras áreas de atividades, e o resultado é sempre o mesmo, uma diminui- ção dos hábitos associativos. A mesma situação o autor verifica em outro estudo comparativo no qual diversos autores concluem o declínio das anti- gas formas de capital social, em países como Inglaterra, Japão, Alemanha, Suécia, dentre outros. Atualmente, a maioria das formulações sobre esse conceito tem se 1estringido mais a exemplificações dos seus efeitos do que à construção de um aparto conceitual consistente, e tal aplicação empírica tem se tornado muito atrativa, na medida em que tem enfatizado um conjunto de temas que estão associados com a redução da pobreza, inclusão social, desen- volvimento local, relações sociais e organização social, como alguns dos principais temas estruturantes. Todas as formas de capital podem ser compreendidas como bens de diversas naturezas que exercem a função de produzir benefícios. Es- ses beneficios tornarão o processo produtivo futuro mais eficiente, efetivo, inovador ou simplesmente maior. Poderíamos então associar o conceito de capital social ao conjunto de bens sociais, psicológicos, cognitivos e institucionais que possibilitam a produção de comportamento cooperativo mutuamente benéfico (UPHOFF, 2000, KRISHNA, 2000). Cabe assinalar que não é fortuita a importância que uma instituição como o Banco Mundial passa conferir ao conceito de capital social, nota- damente nos assuntos ligados ao combate à pobreza, e principalmente no enfoque que privilegia o fortalecimento de laços sociais em comunidades carentes, onde se busca transformar os projetos de desenvolvimento eco- nômico em iniciativas que gerem capital social. Poites (1998), analisa as origens e aplicações do conceito de capital social na sociologia moderna, e constata na pesquisa empírica que existem três funções ou concepções básicas acerca desse conceito. A primeira refe- re-se ao capital social como fonte de apoio familiar. Uma outra refere-se ao capital social como fonte de benefícios através de redes extra-familiares, onde capital social refere-se ao ganho das pessoas que participam de redes sociais. A última função do capital social trata deste como fonte de controle social, focado no reforço de regras e normas. 54 ooo. o O LIN,N. Social Capital: A Theory of Social Structure and Action. London : Cambridge University Press. 2001 MONTEIRO, Fernando. Desempenho institucional na gestão de recursos hídricos: o caso dos subcomitês de bacia hidrográfica Cotia-Guara- piranga e Billings-Tamanduateí na Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo, 2004. 146p. Dissertação (Mestrado) — Programa de Pós Graduação em Ciência Ambiental -PROCAM, Universidade de São Paulo. OSTROM, Elinor. Goveming the Commons: The Evolution of Institu- tions for Collective Action. New York: Cambridge University Press. 1990. PUTNAM, Robert. Comunidade e Democracia: a experiência da Itália Moderna. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1996. . 2000 Bowling Alone. The Collapse and Revival of AmericanCom- munity. New York, Simon and Schuster. SCHERER-WARREN, Ilse. Redes de movimentos. São Paulo: Edições Loyola, 1993. UPHOFF, Norman. “Understanding Social Capital: learning from the Analysis and Experience of Participation” In: Dasgupta e Serageldin (orgs.) Social Capital, a Multifaceted Perspective. Washington, D.C.: The International Bank for Reconstruction and Development/The World Bank. WOOLCOCK, Michael. “Social Capital and Economic Development: Toward a Theoretical Synthesis and Policy Framework”. Theory and Society; renewal and critique in social theory. (Vol. 27/2). 1998. 57 58 SEVERIANO JOSEH DOS SANTOS JP, & 1 ALBA MARIA NUNES SANTOS a. asa a Rs: sobrepõem às formas anteriores (base agrária, traços hereditários, religio- so-morais, de parentesco e vizinhança), onde a passagem de uma para ou- tra seria inevitável. Hoje, a presença deste tipo de comunidade é cada vez menor. Quando não são anuladas por um processo de perda das raízes, tendem a se “adaptar”, perdendo os laços identitários originais (familiares, espirituais, produtivos). Para Bauman (2003), o que prevalece, hoje, é o desengajamento e a insegurança. Na modernidade atual (líquida), a perda de força do Estado e do ideário nacional, os quais ainda davam alguma espécie de segurança no lugar das comunidades tradicionais!, tem feito crescer a competitividade e o individualismo. Há um processo de “guetificação” nas sociedades, mas que, os novos “guetos” não significam comunidade. Os ricos, vivendo o permanente perigo da violência cotidiana, criam condomínios e moradias cerradas, sob a proteção de parafernálias de segurança. O medo partilhado gera certa unidade, mas não senso de comunidade. Os pobres, empurrados para as favelas e periferias, criam uma coletividade às avessas, dificul- tando o sentimento de solidariedade, presente nas formas societárias mais tradicionais. Os ricos, de seus guetos podem sair e transitar (ainda que sob a proteção de “carros fortes”). Aos pobres não é permitido o livre acesso. Porém, tanto uns como os outros exercessem sentidos incompletos de co- munitarismo. Se chegamos ao ápice da construção humana sobre o Planeta com a técno-ciência, estamos longe de ter atingindo um equilíbrio entre as socie- dades e seus membros e dessas com os ecossistemas. Carecemos de formas mais orgânicas, de relação dos seres humanos entre si e desses com a Ter- 1a, que possam superar a atual crise civilizatória (UNGER, 1991), gerada pela expansão competitiva e desigual do sistema. Ademais, temos esque- cido das ligações mais vitais com a Natureza que, permanece sendo à base de sustentação da vida planetária, incluindo a nossa. Assim, como pensar formas de resistências e de manutenção de traços comunitários orgânicos em meio às injustiças e crises atuais? Como pensar a comunidade, hoje, enquanto educadora, que enseje segurança, liberdade e responsabilidade? Qual a matriz relacional e ética desse (novo) sentido comunitário que possa solidificar uma nova relação com a Terra? Onde encontrar o sentido de tal coisa? 1 Bauman (2003) faz sua reflexão sobre as comunidades em torno do binômio segurança-liberdade. Para ele, as comunidades tendem a criar espaços seguros, porém, à custa da liberdade. 62 “a ooo. o O O o o À Comunidade Face-a-Face, Encontro e Educação O ser humano necessita de vínculos coletivos que o liguem à sua história, bem como à Terra. Em tempos de velocidade, de desencantos e perdas de solidariedade, um sentido de comunidade, que pressupõe rela- ções face-a-face e encontros “inter-humanos” baseados no outro a partir de sua alteridade, é cada vez mais urgente. Com todas as potencialidades, desafios e ambigiiidades que possam carregar. Martin Buber? nos ensina que viver é relacionar-se. Porém, a vida vivida é diferente da experiência, pois enquanto esta pressupõe apenas uma relação unidimensional entre o Eu e o mundo, do tipo sujeito-objeto (re- lação Eu-Isso), a vida vivida é a total imersão no presente, onde o Eu se direciona a um Tu, outro, e que, por ele é também afetado (relação Eu-Tu). A presença do outro demanda uma resposta, concreta, solicitando inteireza e permanente estado de atenção e abertura às coisas e pessoas com as quais se interage. Viver é mergulhar vulnerável nas relações que nos são oferta- das, por graça, a cada momento. O universo do “Eu-Isso” é mais seguro, pois que conhecido e apto à análise e planejamento. O universo dialógico do“Eu-Tu” é incerto, arriscado, pressupõe entrega e responsabilidade, diá- logos “face-a-face, do um ao outro”. Porém, a esfera do inter-humano não se dá nem no Eu nem no Tu, mas no espaço aberto pelo diálogo, no “entre”. o qual não diz nem de um nem do outro, mas do indizível entre os doi: Para Buber, a comunidade é o território onde esta (nova) dialogicidade, o espaço do “entre”, pode acontecer. “A comunidade em evolução (...) é o estar um-com-o-outro; de uma multidão de pessoas que, embora movimentem-se juntas em direção a um objetivo, experienciam em todo lugar um dirigir-se um-ao-outro, um face- a-face dinâmico, um fluir do Eu para o Tu”. (BUBER, 1982, p. 66). Esta comunidade acontece nos encontros dialógicos entre homens e mulheres, nas respostas aos desafios cotidianos de suas vidas. Diferente de um coletivismo amorfo a espera de transformações globais, esta comuni- dade provoca enraizamento, ao estabelecer o diálogo como matriz para a construção social. Ela refaz a história, pela capacidade de ações concretas, territorializadas, em contextos que são globais. Em termos de educação ambiental, onde encontrar esta comunidade? Na escola, no bairro, nas cidades e aldeias, no trabalho, na igreja, na universidade, em comunidades “alternativas”, toda vez que pessoas se vinculam umas às outras, não apenas em torno de um objetivo comum, mas 2 Ver Bibliografia em anexo. Evitamos as referências demasiadas pelo objetivo deste trabalho. 63 ea rd idid JA Ja o A O O À para estar face-a-face “uns com os outros”, construindo espaços autênticos de transformação e auto-transformação. A convivência dialógica nesses es- paços permite o nascer de propostas que se transformam, organicamente, em ações em função do comprometimento das pessoas entre si e com a realidade na qual estão inseridas. O fundamental não é a ação em si, mas a resposta que ela carrega. A responsabilidade de cada um para com os ou- tros e para com o mundo que as envolve. Assim, os indivíduos, e o grupo em si, vão mudando, não apenas por necessitarem se adaptar para poderem atingir seus objetivos, mas, porque foram, indubitavelmente, tocados pelo encontro e pelas realidades vividas. Uma comunidade educadora é todo grupo de pessoas, que territorializado e vivendo experiências face-a-face, possa viver experiências de auto-aprendizado e aprendizado mútuo, res- ponsabilizando-se com o destino de cada um e com os destinos das ações que elas ensejam. Nesta comunidade, a educação, o “entre” o aprender e o ensinar, já se tornou parte orgânica do viver cotidiano de cada um que nele, arrisca- damente, se envolveu. Mais do que formalismos e processos pedagógicos elaborados (sem se prescindir deles pela demanda do seio social que esta- mos envolvidos), a educação se torna parte da vida, um sentido permanente de descobertas nas aberturas demandadas pelo diálogo. Em tempos de tec- nicismos exacerbados não é contra a instrumentalidade técnica que a luta deve se dar. A energia humana deve ser direcionada para ocupar e criar es- paços cada vez mais orgânicos para que o encontro possa acontecer. Neste sentido, a comunidade educadora pressupõe essa relação inexorável com o outro, na vivência cotidiana de seus membros, bem como nas respostas da comunidade em relação às outras comunidades, ao mundo e à Natureza. Comunidade Educadora e Terra Uma comunidade se torna educadora na medida em que seus mem- bros tomam consciência que a vida vivida por cada um pode penetrar os processos sociais e transfigurá-los em relações saudáveis e honestas entre todos. Na medida em que a consciência da unidade do grupo reconhece a singularidade de cada um, e que, do diálogo entre elas possa surgir um corpo coeso de sentido e propósito para atuar na realidade histórico-social que envolve o grupo. Assim, as demandas institucionais da comunidade passam a se coadunar com este propósito comum. Isto nos leva pensar a educação ambiental não como um fim em si mesmo, por meio de formalizações pedagógicas onde as pessoas devem aprender a melhor maneira de lidar com o meio. Na comunidade educado- 4 rd id dA JS JA à da o O O o o À certas práticas e visões pessoais. Porém, também, era a possibilidade de nos conhecermos e de administrar relações especulares, que dificultariam o crescimento de cada um e do grupo. Os primeiros anos foram de grande euforia e intensas inquietações. Na medida em que a inquietude crescia, foi-se estabelecendo uma necessidade urgente de mudanças. Crises e discussões se sucediam; a ins- tituição iniciava seu processo natural de mutação. As saídas de pessoas que estavam desde o início assustavam os poucos que permaneciam e que insistiam em viver o sonho inicial. Depois de certo tempo, os poucos que restavam não falavam mais em sair, mas, em fortalecer os compromissos com o “propósito”, o qual sempre significou o real sentido de estarmos jun- tos. O ato de nos conhecermos, e ao mesmo tempo conhecer a teia viva que nos abriga: a Natureza e seus dizeres. Neste momento, urgia um processo de pacificação entre a natureza interna de cada um e a natureza extema. Após seis anos, a comunidade gestava seu ato de existir nas prá- ticas e ritmos cotidianos, desenhando sua própria arquitetura relacional. Identificamos-nos com o conceito de “comunidade intencional”, na época, em função da clara intenção do viver coletivo. Porém, apesar de vir de comunidades afins, este permanecia esvaziado em nós. Era o partilhar e o compromisso cotidiano com o “propósito” que nos definia. O ritmo e as responsabilidades institucionais foram se tornando mais intensos. Aos poucos, foi-se processando, organicamente, o conceito que atualmente nos identifica por completo: comunidade educadora. Por que educadora? De- pois de 14 anos, está claro para nós que podemos nos assumir como uma comuna que se educa e propicia espaços para educação de todos/as que dela se aproximam e interagem. Nesses anos, temos percebido o sentido profundo do estar juntos e do processo da educação: no se alimentar, no cuidar dos filhos, no zelar pela natureza interna e externa. Temos buscado compreender e viver o verdadeiro significado da palavra sustentabilidade, em termos físicos, emocionais, mentais e espirituais. O crescimento da comunidade foi se dando em paralelo a um maior contato com as comunidades vizinhas. Em um processo de descoberta mú- tua, a Mirim começou a abrir-se para acolher inúmeras pessoas “de fora” em diversos tipos de atividades, mostrando sua enorme capacidade de abrir espaços para a educação (em especial a educação ambiental). Para nós, a educação ambiental é um processo permanente, ela se dá de forma orgâ- nica, cotidiana, na interação dos membros e visitantes com as dinâmicas e mistérios dos elementos da Natureza: terra, água, ar e fogo. Assim, nos é claro esta identidade educadora tecida na interação permanente entre nos- sos sonhos e mãos, nascida de dentro de nós e no diálogo com o mundo, no 67 rd dA dd JA da q 0-0 -SgÃi ii dia-a-dia, com traços de choro e riso. O aprender a esperar o tempo do sol e das chuvas, do dia e das noites, o acompanhar das sinfonias dos bichos, nos faz refletir sobre o próprio desabrochar de cada ser humano. A temperança que surge, o discernimento do que é aprender, se educar. A vida, intrinse- camente vinculada à Natureza, clama pelo aprendizado dos ciclos que se abrem e que se fecham: a vida e a morte. Sentimos que esta concepção de educação, de proximidade com o outro e com a Terra, nos obriga a indagar sobre o local onde situamos o saber. Por isto tentamos não cair na armadilha de situar o saber em nós, tornando-nos arrogantes em um saber imaginário, fadado a fenecer. Por cuidado, preferimos sempre nos ver como educandos, sendo também edu- cadores, dinamizando estes papéis com os que aqui habitam e transitam. Estamos descobrindo, cada dia mais, que o importante não é simplesmente o ato de ensinar, dar cursos, capacitar, mas conviver, partilhar, celebrar e vibrar. Importa agora o ato de ser um só com aqueles que tenham boa vontade. Isto pra nós é o sentido de nos colocarmos como comunidade educadora. Em torno do Encontro e da Prática: Sugestões de Reflexões e Atividades O acreditar em valores dialógicos entre os humanos e seus iguais, e desses com a Terra, não só é factível como é experienciado por mais pes- soas do que imaginamos. São vivências que podem surgir e desaparecer sem grande notoriedade. Porém, o sonho de alguns, quando vividos com desapego e o fervor, pode abalar estruturas, reconstruir mundos. Como nos cantava Raul Seixas: “sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só, sonho que se sonha junto é realidade”. Os desafios atuais demandam respostas que dificilmente serão con- seguidas pelo viés do individualismo-competitividade. Somos instigados a dá um novo sentido ao viver comunitário, nos re-vinculando de forma mais estreita e responsável à Terra, a partir da justiça social. E, como nos diz R. Gilman (1983), “não mais estamos imersos em nenhuma grande tradição de comunidade. Isto nos torna mais livres para buscá-la nas mais diversas tradições culturais”. Assim, o que vale é ver o que já temos e sobre que bases queremos construir o novo. Em nosso país, muitas experiências co- munitárias, dialógicas e educadoras, já existem. Algumas precisam acordar para isto, outras ainda precisam crescer do húmus fértil da Terra. Deixamos algumas reflexões e atividades para serem desenvolvidas em grupos: 68 “a ooo. o O O o o À Questões para Reflexão: * As Memórias De quais vínculos comunitários você já participou? Como se deu, na infância e adolescência, seus primeiros vínculos comunitários? Quais memórias e valores você guarda dessas experiências (família, escola, gru- pos de amigos, clubes)? Nelas, como se deu seu contato com a Natureza? Como essas experiências lhe ajudaram a estar mais próximo ou mais dis- tante da Natureza? Quais práticas, valores, visões, em relação à Natureza, você herdou a partir de suas experiências comunitárias? * O Presente E hoje, de quais comunidades você participa? Como se dão as re- lações entre as pessoas e que valores vocês partilham? Partilham tarefas conjuntas? Quais? Qual a relação dessas comunidades com outras comuni- dades e com a Natureza? * O Sonho Você já sonhou participar de algum tipo de comunidade diferente daquela que você vive hoje? Como seria ela? Que tipo de valores, ideais comuns esta comunidade partilharia? Que ritmos e tarefas vocês partilha- riam? Quais seriam individuais e quais coletivas? Como seria a relação desta comunidade com as outras comunidades do entorno, com a sociedade como um todo e com a Natureza? * Atividades Lúdicas Como alternativa, o facilitador pode sugerir que as questões acima possam ser apresentadas em forma de uma expressão artística: dramati- zação, música, dança, pintura ou desenho, escultura ou maquete. A tarefa deve ser feita em conjunto, onde cada equipe desenvolve as três etapas propostas. Depois, as equipes partilham com todo grupo suas reflexões e/ou expressões artísticas. Ao final, o facilitador também pode sugerir uma reflexão sobre a comunidade, o grupo, a qual eles pertencem. Em que me- dida, eles já desenvolvem, ou podem desenvolver, relações mais dialógicas entre eles mesmos, com outras comunidades e com a Natureza como um todo. Outra sugestão é uma excursão onde o grupo possa vivenciar uma relação de maior proximidade com a Natureza. Nela, ele pode por em práti- ca um exercício comunitário (partilhas de tarefas, propósitos, etc.) estando atento às relações entre os membros e desses com o lugar visitado. Como 69 MARCO ANTONIO SAMPAIO MALAGODI Nascido em Jundiaí (SP), fez graduação em agronomia e mestrado em ciências florestais pela USP/ESALQ de 1990 a 1999, em Piracicaba (SP). Colaborou no curso de especialização “Formação de Educadores para Sociedades Sustentáveis”, entre 2000 e 2001, também na ESALQ. Vem desenvolvendo consultoria e pesquisa em ações e projetos socioambientais e de educação ambiental envolvendo espaços coletivos de aprendizagem, com adultos. Colaborou no “Curso de Formação de Agentes Locais para a Sustentabilidade” em Capão Bonito (SP), de 2001 a 2005. Atualmente é doutorando pelo Programa de Pós-graduação em Psicologia Social da USP/Instituto de Psicologia, em São Paulo, integrando o Laboratório de Psicologia Socioambiental e Intervenção (LAPSI). 72 ea rd ifidA Ai da o O O o o À CONFLITOS : Conflitos, discórdias, polêmicas, desentendimentos... Estorvando a “ordem” conformista e desbloqueando a aprendizagem social! Marco A. S. Malagodi “A minha alma tá armada e apontada para a cara do sossego. Pois paz sem voz, pois paz sem voz não é paz é medo . Às vezes eu falo com a vida, às vezes é ela quem diz. Qual a paz que eu não quero conservar para tentar ser feliz (...)” (“Minha Alma — A paz que eu não quero”, de Marcelo Yuka / O Rappa). Cresci ouvindo que brigas, divergências, conflitos e polêmicas são ruins para a vida social, pois todas essas formas de desarmonia além de nos trazerem dor e tristeza elas nada constroem. Era uma orientação promovi- da na Família, na Igreja e na Escola, fazendo-me crer que era “normal”, e assim, que era “boa”?. Éramos governados por uma ditadura militar (já então enfraquecida, ao final dos anos 1970), um período que ficou marca- do pelo autoritarismo, pela intensidade da violência praticada pelas in: tituições governamentais que foi escondida estrategicamente da opinião pública para que a legitimidade dessas instituições e de suas propostas de desenvolvimento não fossem ainda mais questionadas. Esse ocultamento (pela coerção da imprensa), somado ao aparente sucesso econômico e à expansão da propaganda governamental na TV? talvez tenha facilitado a aceitação popular de que a restrição das liberdades não era algo tão ruim assim, ou que era até necessária para alcançarmos certos objetivos, para “o bem do povo brasileiro”. E assim, na vida privada era preciso calar e obedecer para manter a paz, e na vida pública, zelar pela ordem para me- recer o progresso: “Brasil: ame-o ou deixe-o”. Supressão de direitos, vigi- 1 Agradeço a Luiz Ferraro e Mariana Mascarenhas as provocações para a elaboração desse texto, e a Gisele Almeida pelas críticas e sugestões que facilitaram essa versão final. 2 Perdoemo abuso nas aspas, ao longo de todo texto. Não achei forma melhor de provocar estranheza sobre algumas palavras e expressões, reforçando as intenções do texto. 3 “Por essa época, beneficiada pelo governo, a Rede Globo expandiu-se até se tornar rede nacional e deter praticamente o controle do setor. A propaganda governamental passou a ter um canal de expressão como nunca existira na his- tória”. http://www] folha.uol.com.br/folha/especial/2002/eleicoes /historia-1969. shtml. 73 ea rd idid JA Ja o A O O À lância e repressão para quem discordasse. Negação da comunicação e da espontaneidade. Grandes obstáculos ao amadurecimento coletivo político, intelectual e afetivo. Até os anos 1980 grandes projetos de apropriação do espaço foram implementados pelo Estado brasileiro “desenvolvimentista”, articulando- se com a implantação de uma complexa estrutura industrial espacialmente concentrada, ocorrendo assim à ampliação dos espaços integrados à dinâ- mica do desenvolvimento capitalista. Aceleraram-se os ritmos do ciclo in- dustrial de extração de materiais, emissão de efluentes e resíduos, ancora- dos na concentração da renda e nas expoitações*. Isso tudo causou grande desestruturação nos ecossistemas, deslocando populações que dependiam dessa base de recursos para áreas menores e menos férteis, levando à inten- sificação desse uso e comprometendo, com o tempo, sua qualidade. Os con- flitos ambientais vão se avolumando. Com a maior abertura democrática nos anos 1980, muitas práticas sociais perseguidas e silenciadas ao longo de duas décadas foram se fortalecendo: novas vozes se expressam, projetos altemativos conquistam e criam um espaço público de debate, inovações administrativas são gestadas no governo, movimentos sociais começam a ser reconhecidos em suas lutas por direitos e em suas propostas alternati- vas de sociedade, os impactos negativos do modelo de desenvolvimento socioeconômico - antes ocultados - vêm à tona. Nos anos 1990 eu me “for- mava” em engenharia agronômica aprendendo que o modelo “dominante” de sociedade apela para a despolitização das questões socioambientais, conferindo primazia à economia de mercado e à tecnociência, afastando as decisões geopolíticas do debate público e da participação popular, e demandando procedimentos ainda autoritários, persuasivos, coercitivos. Nessa mesma época acelerou-se a inserção brasileira no mercado capitalis- ta mundializado através da especialização de funções de diferentes porções do território nacional, intensificando a corrida pela captação de investi- mentos internacionais. Nesse modelo a “natureza” foi concebida ou como estoque de valor para esse mercado (natureza a ser conservada), ou como campo de expansão de empreendimentos incompatíveis com sua conserva- ção (natureza a ser destruída). Para tanto se promoveu a flexibilização das normas ambientais e a fragilização das agências públicas responsáveis pela aplicação delas. Contra essa intensa “desregulação do ambiente” vemos emergir um novo momento dos conflitos ambientais no Brasil. Amaior carga dos danos ambientais do desenvolvimento é destinada às populações de baixa renda, aos grupos sociais discriminados, aos povos étnicos tradicionais, aos bairros operários, às populações marginalizadas 4 Essas idéias e as seguintes estão mais claramente desenvolvidas em Acselrad (2004b). Ver casos em Acselrad (2004). 74 rd fidA AS JA da o O O o o À “realidades” diminui muito. Nossas atuais imagens do mundo não serão problemáticas (continuarão aparentemente válidas), não se perturbará o funcionamento de nossos atuais conhecimentos e não permitiremos a dú- vida (BERGER e Luckmann, 1973). Trata-se de uma forma de dominação simbólica que traz um desafio a mais para nossa reflexão e ação, justa- mente porque seu poder está no fato de não acionar a nossa consciência”. Damos nosso consentimento para a manutenção do mundo tal como é, sem consciência disso, sem optarmos livremente por isso. É uma forma de inti- midação que se dá pelo poder da sugestão, da insinuação, invisível e silen- ciosa, tanto mais forte quanto mais natural e normal nos parece. b) Desestabilização da dominação social: conhecimentos são práticas sociais em conflito Boaventura de Sousa Santos (1996), ao propor uma pedagogia do conflito elogia a capacidade de suspeita, inconformismo e rebeldia diante da idéia de um presente que se repete indefinidamente. Diz que essa idéia é produzida pela ideologia dos vencedores, e que é parte de uma estratégia de manutenção de sua vitoriosa dominação. Essa mesma ideologia repre- senta o passado como uma “imagem estável”, consensual, que legitima a posição dos vencedores na história, tornando “banal” e “natural” os confli- tos e sofrimentos humanos. Contra isso, o autor propõe pensarmos as ener- gias capazes de impedir tal repetição, recomendando que as procuremos no passado e no futuro, buscando agora “imagens de desestabilização” que contribuam para a recuperação do inconformismo, para promover a contra- dição e a resistência, como também diz Adorno (2003). As formas de dominação pregam a necessidade de haver alguns sa- crifícios “aceitáveis” hoje, em função de um “futuro melhor”. É contra essa promessa-armadilha que Santos (1996), se insurge, revelando no passado ssa mesma estratégia. Se pudermos entender o passado como um produto da iniciativa humana (ou seja, uma escolha entre tantas outras alternati- vas), e como conflito entre formas altemativas de saber e de vida (ou seja, s “vencedores” se valeram da eliminação física ou simbólica de outras formas de vida), talvez possamos desbloquear a rebeldia necessária e de- sestabilizar a repetição do presente. Sua proposta quer resgatar a respon- sabilidade das ações humanas amarradas às suas consequências históricas, tais como os sofrimentos humanos. A banalização desses sofrimentos, seja ontem ou hoje, quer nos convencer de que eles não poderiam ter sido evi- tados, banalizando assim também as responsabilidades envolvidas, ontem e hoje. 8 Idéias também trabalhadas em Bourdieu (1 996), ao abordar as formas de domi- nação embutidas na linguagem. 77 rd dA dd JA da o O O o o À Resistindo a essa forma de representar a história, uma educação transformadora deve tornar-se ela própria inconformista, recuperando sua capacidade de espanto e de indignação. Precisamos aprender a lidar com esses conhecimentos em conflito, ontem e hoje, para construirmos a deses- tabilização que sugere o autor. O espaço de aprendizagem tem de transfor- mar-se, ele próprio em campo de possibilidades de conhecimento dentro do qual educandos e educadores devem optar, e essas opções - feitas de idéias, emoções, sentimentos e paixões - não têm que coincidir, nem são irrever- síveis. Para o autor, três tipos de conflitos de conhecimento precisam ser promovidos para criar esse projeto educativo emancipatório, denunciando que soluções (ditas) “consensuais” escondem relações de poder: * Oconflito entre a aplicação técnica do conhecimento (dominante) e aaplicação edificante: o aplicador do conhecimento está implicado no contexto da ação ou está fora dele? Essa aplicação incide sobre os fins ou apenas sobre os meios da ação? Qual a importância do debate argumentativo para essa ação? Há apenas uma definição da realidade silenciando outras? A técnica está tornando dispensável a reflexão ética, escondendo os desequilíbrios de poder? Os saberes locais estão sendo negados para se minar as resistências? Quem cria os critérios de avaliação dos efeitos das ações? * O conflito entre conhecimento-regulação (dominante) e conheci- mento-emancipação: ao estudarmos uma situação social concreta, os conhecimentos aí produzidos favorecem mais a imposição da ordem e o controle dos comportamentos da multidão, ou favore- cem mais expressões solidárias e livres das diferentes existências sociais? Conseguimos imaginar como poderiam ter sido os acon- tecimentos já passados? Conseguimos sonhar novas possibilidades para situações futuras? * O conflito entre imperialismo cultural (dominante) e o multicul- turalismo: por que a cultura ocidental se representa como superior a outras culturas? Conseguimos ver por trás do “consenso” da globalização econômica os conflitos culturais? Que mapas cult- urais estão guiando nossa percepção do mundo? Como aparecem neles os povos islâmicos, os indígenas, as minorias étnicas, os imigrantes, os povos africanos? Como as culturas dominadas se auto-representam? 78 rd id dA JS JA à da qi -S0 -É.[[ - .ãõ ÕÃêÃÇà = <]S Hi c) Construção de decisões coletivas pela discórdia: o conflito é alavanca de mudanças A atmosfera de um “consenso de todos” e a lealdade grupal geral- mente comandam as nossas discussões e trocas em espaços coletivos de modo que cada um tende a obedecer sem hesitar: nos acostumamos a ser intolerantes com quem cria obstáculos a esse consenso”. É uma forma de pressão para um consenso obrigatório, um consenso como ponto de parti- da. É nesse meio que costuma dominar uma concepção estática e individu- alista de que o entendimento serve para evitar desacordos e dissonâncias. Daí surgem as seguintes “verdades” sobre os grupos: “os grupos são me- nos criativos que os indivíduos” (demandam mais e fazem menos), “dimi- nuem a eficácia e a iniciativa de cada um e tornam-se preguiçosos, geram a conformidade e a obediência”. No entanto, sob uma outra orientação do processo de decisão coletiva, é possível argumentar que os grupos são indispensáveis, pois inovam em matéria de regras, normas, e alteram os comportamentos enraizados (fazem mais com menos), tendem a assumir mais riscos que os indivíduos e por ário da mudan- ça, negando a conformidade. Acontece que diferentes objetivos, orientações e formas de parti- cipação nos grupos levam a também diferentes resultados individuais e coletivos: a atmosfera de um consenso, como ponto de partida é muito diferente daquela do consenso, como ponto de chegada. Dizem Mosco- vici e Doise(1991), que decisões coletivas visando o consenso (um con- senso radical) tem como condição essencial a igualdade dos membros do grupo, onde a maioria reconhece à minoria seu direito de se expressar e tem grande consideração pelas suas opiniões, porque sem isso o acordo atingido não teria valor. As decisões orientadas a esse consenso devem ter como característica favorecer a minoria as melhores condições possíveis para influenciar a maioria. Não é papel do consenso eliminar as tensões e equilibrar as propostas concorrentes de um grupo; pelo contrário, ele deve contribuir para que elas se modifiquem mutuamente. É nessa situação de consenso radical, democrático, que os autores abordam a importância dos conflitos: dizem que a discórdia num grupo não é um fracasso, uma perda, um dano, uma resistência à mudança, mas sim “a alavanca mais preciosa da mudança”. Nesse caso, depois da discus- são coletiva, suas percepções, atitudes e avaliações vão se tornando mais extremas e não mais moderadas, como se esperaria; ou seja, o grupo vai se tornando mais radical. Desse modo, o conflito aparece no grupo como 9 Idéias discutidas em Moscovici e Doise (1991), onde se estrutura toda a reflexão desse tópico. 79 rd dA dd JA da q 0-0 -SgÃi ii seja a política está, para o autor, mais próxima da idéia de polícia, já que diz respeito ao controle e vigilância dos comportamentos humanos e sua distribuição nas diferentes porções do território, cumprindo funções con- sideradas mais ou menos adequadas à ordem vigente. Estamos geralmente tão hipnotizados pela “necessidade de um compromisso para se alcançar o tem-comum” e pela opinião geral de que “as instituições sociais já estão fazendo todo o possível para isso”, que não conseguimos perceber nossa contribuição na legitimação dessa política policial que administra alguns corpos e torna invisíveis outros. O conceito de Política trabalhado pelo autor traz como princípio a igualdade, uma igualdade que não está lá como sonho a ser alcançado um dia, mas que é uma potencialidade que só ganha realidade se é atualizada no aqui e agora. E essa atualização se dá por ações que irão construir a possibilidade dos “não-contados” serem levados em conta, serem conside- rados nesse princípio básico e radical de igualdade. Para além dos movi- mentos sociais, existem os ainda sem nome e ainda sem movimento. Diz o autor que a Política é a reivindicação da parte daqueles que não têm parte; política se faz reivindicando “o que não é nosso” pelo sistema de direitos dominantes, criando assim um campo de contestação!?. Como diz Chico de Oliveira, em uma sociedade em que os que não têm parte são a maior parte, é preciso fazer Política. Para Ranciêre(1996), a Política é a atividade que tem por racionalidade própria a racionalidade do desentendimento. Mas vivemos sob uma ordem social hegemônica (marcada pela for- ça do compromisso entre Mercado, Direito, Estado e Mídia), uma ordem “que define as divisões entre os modos de fazer, de ser e de dizer dos cor- pos”, a tal polícia que fala Ranciêre (1996). O discurso da igualdade que essa ordem promete (por exemplo na imagem de um Estado de direito) não é a mesma igualdade concebida pelo autor como princípio da políti- ca. Essa segunda definição de igualdade é a que é reivindicada por uma outra ordem de práticas, que criam transgressões na ordem hegemônica (quando, e se conseguem). O autor chama de dano a não-realização dessa suposta igualdade. A reivindicação desses que não “cabem” na sociedade mas estão nela, coloca em destaque que está ocorrendo o dano: a contagem oficial da população não dá conta dessa população. É quando essas duas ordens de definição entram em oposição (explicitando o desentendimento) que acontece a política. Mas essa oposição encontra forças poderosas de repressão e controle, marcadas pela pressão para o consenso. Nessa de- mocracia consensual condena-se o conflito e considera-se razoável apenas 13 Citação de Chico de Oliveira encontrada no site: www.ibase.br/userimages/fran- cisco. de oliveira. port pdf 82 rd id dA JS JA à da o O O o o À a sua resolução ótima baseada no conhecimento do que é possível e na discussão entre “parceiros” legitimados socialmente. A prática consensual é assim, a prática do apagamento das formas do agir democrático. Não é penmitido estar fora desse consenso, e só se garantiria alguma igualdade obedecendo à ordem política policial de “ser igual aos iguais”. Por isso, para o autor, democracia e consenso são termos contraditórios: o consenso é o desaparecimento da política. Pelas estratégias de controle e formação da opinião pública, o povo precisa continuamente receber uma imagem pré-fa- bricada de si mesmo e da organização social (tipo “Estado de direito”), ma- nipulando os “não-considerados” para que não apareçam na cena pública como divergência ou reivindicação, nem tentem representar a si mesmos. Se desconsiderarmos as condições sociais em que tal consenso é pro- duzido, as forças políticas policiais ficam invisíveis e, assim também, toda a violência dos consensos forçados. Como no caso em que o conflito em si é considerado um problema a ser resolvido, um defeito do sistema harmô- nico a ser identificado e conduzido por peritos até o regime do “possível de ser feito” pelo Estado. Se não for “possível”, esse “problema” não é considerado razoável e novamente se reforça a legitimidade e necessidade de uma política policial, repressora. Apagando esse tipo de conflito que po- tencialmente surge de um “povo esquecido na contagem”, fica fácil sugerir a harmonia entre um Estado gestor (aquele que administra) e um Estado de direito. Seria essa a sutil proposta do lema “Brasil: um país de todos”? Referências Bibliográficas ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. 3º. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2003. ACSELRAD, Henri (org.). Conflito Social e Meio Ambiente no Estado do Rio de Janeiro. Rio deJaneiro: Relume Dumará / FASE, 2004a. - Conflitos Ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará : Fundação Heinrich Bóll, 2004b. BERGER, PeterL.; LUCKMANN, Thomas. A construção social da reali- dade: tratado de sociologia do conhecimento. Tradução de Floriano de S. Femandes. Petrópolis: Vozes, 1973. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas linguísticas: o que falar quer dizer. Tradução de Sergio Miceli e outros. São Paulo: EDUSP, 1996. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17º. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. 83 rd idid JA Ja o A O O À GONÇALVES, Carlos W. P. Os (Des)Caminhos do Meio Ambiente. São Paulo: Contexto, 1998. LEROY, Jean Pierre; ACSELRAD, Henri (coords.). Mapa dos conflitos ambientais no Estado do Rio de Janeiro (CD-ROM). Rio de Janeiro: FASE/BSD & ETTERN/IPPUR/UFRI, 2006. MOSCOVICI, Serge: DOISE, Willem. Dissensões e Consenso: uma teoria geral das decisões coletivas. Lisboa: Horizonte de Psicologia/Livros Horizonte, 1991. PÁDUA, José Augusto; HERCULANO, Selene; ACSELRAD, Hemi (orgs). Justiça ambiental e cidadania. Rio de Janeiro: Relume Dumará / Fundação Ford, 2004. RANCIÉRE, Jacques. O desentendimento: política e filosofia. Tradução de Ângela Leite Lopes. São Paulo: Editora 34, 1996. SANTOS, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência (vol. 1 de Para um novo senso comum: a ciência e a política na transição paradigmática). 4º. ed. São Paulo: Cortez, 2002. - Para uma pedagogia do Conflito. m Silva, Luiz H. et al (orgs), Reestruturação curricular: novos mapas culturais, novas perspectivas educacionais. Porto Alegre: Editora Sulina, 1996. - Introdução a uma ciência pós-modema. 3º. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2000. 84 “a ea rd ifidA Ai da o O O o o À CONTEXTOS DE APRENDIZAGEM: encontros e eventos Martha Tristão e Roberta Cordeiro Fassarella Palavras-chave: encontros, eventos, mobilização, participação e contextos de aprendizagem. Os contextos de aprendizagem Queremos conversar com vocês sobre o que chamamos de contex- tos de aprendizagens da Educação Ambiental que envolve desde a sala de aula a outros múltiplos espaços/tempos de nossas vidas articulados com a produção de conhecimento para a formação de diferentes sujeitos, ati- vos na Educação Ambiental: alunos/as, professores/as, educadores/as e gestores/as ambientais... E todas as pessoas em seus processos vitais/cog- nitivos. Retomamos aqui algumas interpretações e análises de pesquisas desenvolvidas, de experiências vivenciadas, de cursos, encontros, eventos realizados, enfim, de contextos coletivos em que haja interação, troca e produção de saberes e fazeres. Inclusive a Pesquisa, a nosso ver, pode ser um contexto de aprendizagem e de formação quando compreendida como busca investigativa, como situação reflexiva, como um desejo de conhecer e “ver” para além das aparências. No que se refere aos contextos de aprendizagem em educação am- biental, são compreendidos como situações que facilitam esquemas prag- múáticos de ação (GARCIA, 2003). Os contextos são micro-instâncias da cultura mais ampla onde estão localizados, ou seja, circunscrevem-se fisica- mente por meio da linguagem de um determinado grupo reunido intencio- nalmente. Defendemos a idéia de que a frequência em que os contextos de aprendizagem em Educação Ambiental acontecem em determinada cultura pode suscitar transformações significativas, nas formas de sociabilidade, relações entre individualismo e associação (comunidade), nos grupos es- colhidos (sua efemeridade, graus de coesão), nas redes sociais cotidianas e nos grupos de afinidade no interior das organizações (TEDESCO, 2003). Dentro de uma abordagem relacional, de interação, um contexto funciona como um sistema que, de acordo com Morin (1997), é uma inter- relação de elementos que constituem uma entidade ou unidade global. Po- demos considerar um contexto de aprendizagem como um sistema, como 87 ea rd dA dd JA da q 0-0 -SgÃi ii uma totalidade organizada, unida por elementos solidários e concebidos um em relação aos outros em função dos espaços/tempos que ocupam. Nessa abordagem sistêmica, os contextos de aprendizagem são con- siderados dentro de uma rede de relações, de um espaço/tempo vivido, remetendo-se um a outro(s) contexto(s) continuamente, numa relação re- troativa para um processo contínuo de formação dos sujeitos envolvidos. Desse modo, compreendemos que, como educadoras ambientais, fazemos opções por contextos de aprendizagens coletivos, seja na sala de aula, seja fora dela, pois a própria sala de aula é um contexto em que se vive à expe- riência de aprendizagem em encontros, em relações, e em trocas de saberes e fazeres. A compreensão da unidade na diversidade, do unitas-multiplex, vem ao encontro da transgressão disciplinar da Educação Ambiental, da sua característica interdisciplinar e transdisciplinar, que permite organizar o saber de modo diferente, não somente pela análise, mas pela síntese, numa relação dialógica. Uma preocupação extrema com a análise esmigalhou os saberes e fragmentou o conhecimento. Aqui compreendemos essas duas abordagens: analítica e sistêmica, de modo complementar, enquanto uma se focaliza sobre os elementos, a outra se preocupa com as interações entre eles. Estamos, aqui, atentas para não cairmos na flexibilização e no relati- vismo já que uma análise-reflexiva e crítica tem certa resistência em vestir uma camisa de força, sendo muitas vezes forçada a uma síntese. Nosso propósito é pensar uma maneira diferente da educação tradi- cional para as práticas da Educação Ambiental, uma tentativa de articular noções, conceitos, princípios das diferentes áreas, com uma metodologia que tenha a marca da participação, da interação e da emancipação com fundamentos ético-políticos. A produção de conhecimento, então, está em movimento, em consonância com os contextos de aprendizagem, com os encontros, em função de sua mobilidade e das diferentes formas em que vem acontecendo a transversalização da educação ambiental como uma articulação entre processo vital e processo cognitivo, pois como diz Ass- mann “o ambiente pedagógico tem de ser um lugar de fascinação e inven- tividade” (1998, p. 29). No sentido de se considerar sob análise a Educação Ambiental e “[...] em função da mobilidade que adquire sua transversalidade também está associada à produção do conhecimento em rede” (TRISTÃO, 2004a, p. 112). Nessa perspectiva, está intrinsecamente marcada pela forma como 88 ea rd ifidA Ai da o O O o o À se inter-relaciona com outros espaços/tempos educacionais inscritas no co- tidiano que são “com-ver-gentes” na formação individual e coletiva e não só se somam como mapas com territórios demarcados. Encontros e Eventos de Educação Ambiental: contextos “com-ver-gentes” de formação É nessa perspectiva que estamos lidando com os Encontros e Even- tos de Educação Ambiental: na complexidade e no sentido educacional e ambiental que eles podem ter, entrecruzando-se com situações e acon- tecimentos fazedores de história, como contextos educacionais de comu- nidades em rede e de solidariedade ao movimento ambientalista, e destes na sociedade. São também como rituais de iniciação e de formação em Educação Ambiental junto a pessoas que se sensibilizam, se mobilizam e participam do debate ambiental. Grin e Vorraber (2002, p. 95), analisam a palavra “evento” e dizem que ela é de vital importância para a compreensão do intento da aprendi- zagem, pois imprime dinamismo ao compreender, perdido ou suprimido pela metafísica ideacional do ocidente. O “evento da compreensão” como explica o sentido intrínseco da palavra, poderia ser tomado aqui só como um trocadilho, quando estamos discutindo sobre os Encontros como recur- sos metodológicos para a Educação ambiental, mas não o é. Está reiterando uma posição de entendimento de que um encontro ou evento, se for toma- dos em situações pedagógicas, validam as manifestações dos sujeitos, as imagens a partir dos encontros, das experiências, das trocas, das vivências e dos seus desdobramentos como contextos de aprendizagem, para além do que se poderia defini-los por sua possibilidade instrumental ou prag- mática. Até porque, em termos processuais, podem se dar pontualmente no espaço/tempo, mas são também, contextos fazedores de história, pois não estão contidos em sua finitude, são recorrentes no enredamento de saberes e fazeres para o processo da educação ambiental e da formação individual- coletivo nos sujeitos-grupos. A idéia de rede de significados e de conhecimentos, aqui presente, se dá na “interatividade” de um ser-estar “com-ver-gente” no Encontro. A interatividade está na disposição ou predisposição para mais interação, para uma direcionalidade múltipla — fusão emissão-recepção, para partici- pação e intervenção. Não é apenas um ato, uma ação; e sim um processo, inclusive instável, uma abertura para mais e mais comunicação, mais e mais trocas, mais e mais participação (apud BONILLA, 2005). 89 rd dA dd JA da o O O o o À Senão vejamos, a história do movimento ambientalista e da Edu- cação Ambiental é tecida, sobretudo, em Encontros e Eventos, marcados mundialmente desde 1972, com a Primeira Conferência Mundial de Meio Ambiente. Nesses contextos, a Educação Ambiental se inscreve na socie- dade em movimentos tangenciais de aprendizagem, para além da escola, ganhando outros espaços culturais, de comunicação, e de informação. Mas, notadamente, de formação do(s) indivíduo(s) e grupo(s) na imanência de produção e reprodução da vida e do conhecimento na sociedade. Enredando passado, presente e futuro, Encontros e Eventos de Edu- cação ambiental realçam uma educação como teoria e prática social vol- tada a gerar um sentido para um determinado grupo/comunidade com a abrangência do meio ambiente: natural, social e cultural, e, potencialmen- te, também arregimentar forças para conquistas político-ambientais e/ou melhorias na realidade socioambiental. Validam uma narrativa de parti- cipação social para a proteção do meio ambiente e da qualidade de vida, numa trama que articula e enraíza dimensões individuais e coletivas coti- diana e politicamente. Ainda merecem registro outros eventos de conotação ambiental, tanto os de entretenimento quanto os de caráter técnico. Afinal, há que se ver como “Encontros e Eventos” o ato de inauguração de uma área verde; o dia de promulgação de uma lei ambiental; uma manifestação pública por 1eivindicações ambientais; além de realizações de audiências públicas para deliberações de “EIA/Rima”; reuniões de conselhos de meio ambiente em funcionamento; e outras situações de interação factual deflagradas por pro- jetos educativos junto às comunidades com enfoque em resíduos sólidos, 1ecursos hídricos, reflorestamento, e outros, que mobilizam e contribuem com a formação ambiental dos indivíduos/sociedade; além de cursos de formação continuada para professores/as, educadores/as e dos encontros presenciais das organizações sociais em rede, ao que podemos citar os da própria Rede Capixaba de Educação Ambiental - RECEA, em que, não raro, se vê uma curiosa diversidade de público, unidos/as por alguma(s) 1azão(ões), reunidos/as para algum(ns) objetivo(s). Esses contextos conotam, também, partilhas simbólicas, construções coletivas, informalidades e outras maneiras de interações socioambientais, por exemplo: um passeio ou excursão para se “refletir” sobre o que acon- tece hoje com a rua/bairro/cidade onde se mora/estuda. Como funciona a dinâmica de nossas ruas, áreas livres/verdes? Como vivenciar o funcio- namento dos serviços de saneamento, luz, telefone, lixo? Como reviver nossa história cultural e arquitetônica dos patrimônios públicos? Quando, num projeto ou agenda, se pode/deve sair da escola ou da sala de aula para 92 rd id dA JS JA à da o O O o o À experimentar outros contextos de conhecimento cultural que não mediada pela linguagem oral; ou quando se pode receber alguém de fora da escola para falar com o/a professor/a sobre o rio, a praça etc.? Exemplos ilustrativos desses momentos podem ser traduzidos pela mobilização e participação da comunidade escolar em momentos-ápice referidos institucionalmente à pedagogia dos projetos; à realização poli- tica e reflexiva de datas comemorativas; à atenção à agenda ambiental da cidade (numa interação pertinente com os organismos executivos de meio ambiente da cidade), à articulação artística e tecnológica de curso em edu- cação ambiental para professores/as; à elaboração/realização de planeja- mento executivo organizado, como a “Agenda 21 Escolar” ou outra forma interativa de tentar articular as organizações, saberes e fazeres para uma atenção ambiental local e, pode-se dizer, até em nível planetário. Nessa e noutras discussões sobre educação ambiental, vemos que é recorrente se considerar a relação “aprendizagem-comunidade-meio- ambiente”, e os substratos de interatividade desses elementos como fenô- menos naturais de nossa dimensão ambiental. Esse esforço epistemológi- co avoluma-se em direção a lograr um “encantamento” do ato educativo (ASSMANN, 1998) e a “[...] desenvolver uma aprendizagem baseada no contexto e que leve em conta as experiências dos/as estudantes e suas rela- ções com a cultura popular e o terreno do prazer” (GIROUX, 1995, p.98). Assim, há que se flexibilizar a compreensão sobre as formas e for- mas de caracterizar, teorizar e considerar as práxis de mobilização, parti- cipação social e formação educacional, propriamente, reconhecendo suas legitimidades nas formas viáveis, seja de conotação cotidiana, seja macro- política. Conquanto, é importante que se reconheça os Encontros e Eventos de Educação Ambiental como possibilidades “multirreferenciais” teórico- metodológicas, “[...] atendo-se mais a auxiliar [...] o processo educativo ar- ticulado e compromissado com a sustentabilidade e a participação, apoiado numa lógica que privilegia o diálogo e a interdependência de diferentes áreas de saber” (JACOBI, 2003, p. 189). Roteiro para reflexão: * Que conceitos, que significados para a formação em Educação Ambiental podem emergir de um contexto de aprendizagem criado, como um Evento planejado e organizado? * Quais são os fundamentos de um encontro/evento de Educação Ambiental? 93 “a rd idid JA Ja o A O O À * Quais são ou poderiam ser as consequências ou desdobramentos da promoção de um encontro/evento de Educação Ambiental em sua escola, bairro, cidade ou município? Referências Bibliográficas ASSMANN, Hugo. Reencantar a educação: rumo à sociedade aprendente. Petrópolis: Vozes, 1998. BONILLA, Maria H. S. Interatividade. Disponível em: <http://posedu- cacaoestatistica.vilabol.uol.com.br/interatividade.htm>. Acesso em: 11 ago. 2005. GARCIA, R. L. Tentando compreender a complexidade do cotidiano. In: GARCIA, Regina Leite (Org.). Método: pesquisa com o cotidiano. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. p. 9-16. GIROUX, H. A. Praticando estudos culturais nas faculdades de educação. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Alienígenas na sala de aula. Petrópolis: Vozes, 1995. p. 85-103. GRÚN, Mauro; COSTA, Marisa V. A aventura de retomar a conversação: hermenêutica e pesquisa social. In: COSTA, M. V. (Org.). Caminhos investigativos: novos olhares da pesquisa em educação. Rio de Ja- neiro: DP&A, 2002. p. 85-104. JACOBI, Pedro. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cad- emos de Pesquisa Fundação Carlos Chagas/Autores Associados, São Paulo, n. 118, p. 189-205, 2003. LAYRARGUES, Philippe P. Educação para a gestão ambiental: a cidadania no enfrentamento político dos conflitos socioambientais. In: LOU- REIRO, Carlos F. B.; LAYRARGUES, Philippe P.; CASTRO, Ron- aldoS. B. (Orgs.). Sociedade e meio ambiente: a educação ambiental em debate. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002. p. 87-155. MORIN, E. O método: a natureza da natureza. 3. ed. Portugal: Publicações Europa — América, 1997. TRISTÃO, Martha. A educação ambiental na formação de professores: redes de saberes. São Paulo: Annablume, 2004a. TEDESCO, João Carlos. Paradigmas do cotidiano: introdução à con- stituição de um campo de análise social. 2. ed. Santa Cruz de Sul: EDUNISC, 2003. 94
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved