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Guias e Dicas
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Mitos Gregos, Notas de aula de Informática

são os principais temas da mitologia, sendo mais fácil para a compreensão pois vem comentado, ajuda muito para quem vai preparar aulas ou falar a respeito dos mitos

Tipologia: Notas de aula

2010
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Compartilhado em 31/01/2010

jaime-coan-9
jaime-coan-9 🇧🇷

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Baixe Mitos Gregos e outras Notas de aula em PDF para Informática, somente na Docsity! MITOS GREGOS Paulo Sérgio de Vasconcellos Objetivo/ALPRO – São Paulo 1998 Editora SOL Índice Faetonte e o carro do Sol Orfeu e Eurídice Narciso Prometeu, o primeiro benfeitor da humanidade Teseu e o Minotauro, Dédalo e Ícaro As aventuras de Hércules – O nascimento e a primeira façanha do herói – Os doze trabalhos de Hércules – I – Os doze trabalhos de Hércules – II A guerra de Tróia – As origens da guerra de Tróia – A ira de Aquiles – A morte de Heitor – O calcanhar de Aquiles – O cavalo de madeira e o fim de Tróia O retorno de Odisseu – Odisseu e o ciclope – Na ilha da feiticeira Circe – Odisseu vai ao reino dos mortos – Os novos perigos da viagem – A chegada de Odisseu e o massacre dos pretendentes Os deuses gregos – Genealogia divina – Os principais deuses – A soberania de Zeus e sua esposa Hera – Afrodite e Ártemis, a deusa do amor e a virgem caçadora – Ares e Dionisio – Apolo e Palas Atena – Hermes e Hefesto – Deméter e Possêidon, divindade da terra e do março Questionários Respostas APRESENTAÇÃO Os mitos gregos estão por toda parte ainda hoje. Estas narrativas, que um dia povoaram não só a imaginação como também a vida cotidiana de todo em povo, perduraram no tempo e ainda hoje fascinam escritores, cineastas, escultores, psicólogos, antropólogos, etc, etc. Pode-se fazer delas o uso mais variado, mas é curioso que guardam, em si mesmas e por si mesmas, um interesse inabalável para os leitores comuns, pessoas que sempre sentirão prazer em mergulhar na poesia de deuses nada perfeitos, cheios de defeitos muito humanos, ninfas que definham de amor por mortais, heróis que redimem a humanidade, vozes encantadoras de sereias, monstros brutos de um olho só, derrotados pela inteligência do homem. Os estudiosos podem tentar analisar os mitos como forma primitiva de explicação racional do universo, como ciência ingênua e rudimentar; outros podem vê- los como projeção de nossa vida inconsciente, etc. - o mito sobrevive a qualquer tentativa reducionista de enquadrá-lo em termos que não são os seus, reduzi-lo a alguma “chave” que supostamente o desvende – ele sobrevive inatingível, com o impacto de sua força narrativa. “O mito é o nada que é tudo”, já disse Fernando Pessoa, criador de mitos, como todo poeta. Este livro reconta alguns mitos do vasto repertório de histórias da Grécia antiga, pensando no leitor leigo das nossas escolas de ensino fundamental, em especial os da quinta à oitava série. Tentamos auxiliá-lo a se iniciar nesse universo, à primeira vista de difícil aproximação para os mais jovens, empregando linguagem mais simples, sem subestimar, porém, sua capacidade, acrescentando notas explicativas e exercícios de fixação dos conteúdos lidos. Sempre que possível, entretanto, fomos a alguma fonte da Antiguidade, por vezes quase traduzindo esse original: Ovídio, na história de Faetonte, Virgílio, na narrativa da queda de Tróia, etc. Assim, o leitor conhecerá, aqui, algumas versões que grandes poetas elegeram para contar mais uma vez a mesma história (já que o mito é sempre recontado, modificado, nunca exatamente o mesmo, a cada narrativa filtrado pela visão especial de cada artista). Como são pretendemos fazer obra de referência, geralmente evitamos acumular várias versões da mesma história ou aborrecer os jovens com eruditismos desnecessários. Se o leitor se sentir atraído por esse universo no que ele tem de mais fundamental, a beleza de cada conto, seja qual for o uso que se faça dele, estaremos satisfeitos. E quem sabe o nosso leitor passe, então, a perceber como seu dia-a-dia moderno está repleto de evocações daquele mundo que subsiste vivíssimo mesmo depois de sua civilização material se encontrar reduzida a pobres ruínas. Por fim, agradeço ao professor Francisco Achcar por muitas sugestões e correções; este livrinho certamente se enriqueceu com suas observações ou, pelo menos, livrou-se, com elas, de não poucas imperfeições. P.S.V. o s final; quanto ao u, representa um som intermediário entre /u/ e /i/ ). Este último filme, uma produção de 1959, foi rodado no Rio de Janeiro e é baseado em texto de Vinícius de Moraes, que também compôs, com Tom Jobim e Luís Bonfá, a trilha sonora. Aqui, Orfeu é um sambista carioca. O filme ganhou a Palma de Ouro em Cannes e o Oscar de melhor filme estrangeiro. Narciso Quando Narciso nasceu, sua mãe, uma ninfa belíssima, consultou o adivinho Tirésias para saber se aquele filho de extraordinária beleza viveria até o fim de uma longa velhice. Pareceram sem sentido as suas palavras: – Sim, se ele não chegar a se conhecer. Narciso cresceu, sempre formoso. Jovem, muitas moças e ninfas queriam o seu amor, mas o rapaz desprezava a todas. Um dia, Narciso caçava na floresta quando a ninfa Eco o viu. Eco, por causa de uma punição que Hera (Hera=na mitologia latina, Juno, rainha dos deuses) lhe infligira, só era capaz de usar da voz para repetir os sons das palavras dos outros. Ao se deparar com a beleza de Narciso, a ninfa se apaixonou por ele e se pôs a segui-lo. Quando resolveu manifestar o seu amor, abraçando- o, Narciso a repeliu. Desprezada e envergonhada, Eco se escondeu nos bosques com o rosto coberto de folhagens. O amor não correspondido a foi consumindo pouco a pouco, até que, depois de reduzida pele e osso, seu corpo, se dissipou nos ares. Restou-lhe, apenas, a voz e os ossos, que, segundo dizem, tomaram a forma de pedras. Um dia, uma das muitas jovens desprezadas por Narciso, erguendo as mãos para o céu, disse: – Que Narciso ame também com a mesma intensidade sem poder possuir a pessoa amada! Nêmesis, a divindade punidora do crime e das más ações, escutou esse pedido e o satisfez. Havia uma fonte límpida, de águas prateadas e cristalinas, de que jamais homem, animal ou pássaro algum se tinham aproximado. Narciso, cansado pelo esforço da caça, foi descansar por ali. Ao se inclinar para beber da água da fonte, viu, de repente, sua imagem refletida na água e encantou-se com a visão. Fascinado, quedou (quedar=ou quedar-se, deter-se, ficar parado) imóvel como uma estátua, contemplando seus próprios olhos, seus cabelos dignos de Dioniso (Dioniso=na mitologia latina, Baco, deus do vinho) ou Apolo, suas faces lisas, seu pescoço de marfim, a beleza de seus lábios e o rubor que cobria de vermelho o rosto de neve. Apaixonou-se por si mesmo, sem saber que aquela imagem era a sua, refletida no espelho das águas. Nada conseguia arrancar Narciso da contemplação, nem fome, nem sede, nem sono. Várias vezes lançou os braços dentro da água para tentar inutilmente reter com um abraço aquele ser encantador. Chegou a derramar lágrimas, que iam turvar a imagem refletida. Desesperado e quase sem forças, foram estas suas últimas palavras: – Ah!, menino amado por mim inutilmente! Adeus! O lugar em que estava fez ecoar o que dissera. E quando proferiu “Adeus!”, Eco também disse “Adeus!”. Em seguida, esgotado, Narciso se deitou sobre a relva, e a Noite veio fechar seus olhos. Diz- se que, nos Infernos, Narciso continua a contemplar sua imagem refletida nas águas do rio Estige. As ninfas, juntamente com Eco, choraram tristemente pela morte de Narciso. Já preparavam para o seu corpo uma pira quando notaram que desaparecera. No seu lugar, havia apenas uma flor amarela, com pétalas brancas no centro. (Narciso é outro mito que reaparece constantemente nas artes. Em Sampa, de Caetano Veloso, há esta passagem, na qual o poeta descreve a primeira impressão negativa que teve ao ver a cidade de São Paulo: “Quando eu te encarei frente a frente, não vi o meu rosto, chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto. É que Narciso acha feio o que não é espelho...” A poetisa Cecília Meireles (1901 – 1964) tem um poema interessante sobre Narciso. Aqui a imagem que se tem do rapaz, a de um vaidoso apaixonado pelo próprio rosto, é apresentada como falsa. Na verdade, Narciso sorria, encantado não para o seu reflexo mas para a água, que imaginava ter gerado ela própria a imagem do belo e sorridente jovem. Não é um texto fácil; mas vale a pena lê-lo. Atente para o ritmo dos versos e as imagens surpreendentes (o reflexo do sorriso comparado a uma grinalda de flores que cai na água; a imagem de Narciso vista pela água como uma estátua de cristal): Epigrama Narciso foste caluniado pelos homens, por teres deixado cair, uma tarde, na água incolor, a desfeita grinalda vermelha do teu sorriso. Narciso, eu sei que não sorrias para o teu vulto, dentro da onda: sorrias para a onda, apenas, que enlouquecera, e que sonhava gerar no ritmo do seu corpo, ermo e indeciso. A estátua de cristal que, sobre a tarde, a contemplava, fixando-a sempre, com o seu efêmero sorriso... (epigrama: poema que se caracteriza, sobretudo, por sua brevidade; ermo: solitário; efêmero: passageiro, fugidio). Prometeu, o primeiro benfeitor da humanidade Dizia-se que Prometeu criara os primeiros homens a partir do barro. Desejando ajudar a essa humanidade primitiva, provocou por duas vezes a cólera de Zeus (Zeus=Júpiter na mitologia romana; é o rei supremo e pai dos deuses). Um dia, durante um sacrifício de um boi aos deuses, Prometeu cobriu com couro a carne e as vísceras (vísceras=órgãos do interior do corpo, como fígado, coração, pulmão) do animal; quanto aos ossos, passou neles uma espessa camada de gordura. Convidado a escolher a sua parte, Zeus, sem saber da trapaça, atraído pela gordura, acabou ficando com os ossos. É por isso que nos sacrifícios os gregos queimavam a gordura e os ossos para os deuses, mas a carne e as vísceras eram comidas pelos participantes da cerimônia. Ao descobrir que tinha sido enganado para favorecer os homens, o pai dos deuses resolveu vingar-se privando a humanidade do fogo. Novamente, porém, Prometeu interveio em socorro dos mortais, desta vez roubando para eles uma centelha (centelha=fagulha) do fogo divino. A cólera terrível de Zeus maquinou uma punição exemplar. Zeus enviou aos homens a primeira mulher, que os deuses Hefesto (Hefesto=na mitologia latina, Vulcano, o deus do fogo) e Palas Atena (Palas Atena=na mitologia latina, Minerva), ajudados pelos demais, criaram. Cada um dos deuses lhe concedeu determinadas características: Afrodite (Afrodite= na mitologia latina, Vênus) lhe atribuiu a beleza e o encanto, Palas Atenas ensinou-lhe tarefas femininas, Hermes (Hermes=na mitologia latina, Mercúrio, o mensageiro dos deuses), astúcia, o fingimento e a mentira, além do dom da palavra. Foi este último quem a chamou Pandora, que foi enviada à terra como se fosse um presente para os homens. Essa primeira mulher levava consigo uma jarra tampada, na qual os deuses haviam colocado todos os males e desgraças imagináveis. Na terra, Pandora não conseguiu conter a curiosidade e destampou a jarra. Imediatamente, males e desgraças espalharam-se por todos os lados. Até então, os homens tinham vivido em paz, sem doenças, fome ou guerras. Pandora precipitadamente voltou a tampar a jarra, mas já todos os males tinham escapado, com exceção da esperança. Foi assim que a justiça de Zeus puniu os homens. Quanto a Prometeu, foi acorrentado a um rochedo. Uma águia vinha de dia roer-lhe o fígado; à noite, a parte que faltava renascia milagrosamente, tornando eterno o seu suplício. Muito tempo depois, Hércules, um outro benfeitor da humanidade, mataria a águia e libertaria Prometeu. Teseu e o Minotauro, Dédalo e Ícaro Na ilha de Creta reinava Minos. Um dia, Possêidon (Possêidon=Netuno, na mitologia latina) enviou-lhe, surgido do mar, um touro, que o rei lhe deveria sacrificar. Minos, porém, guardou para si o animal. A esposa de Minos, Pasífae, apaixonou-se pelo animal. Essa paixão deve ter sido uma vingança de Possêidon, o rei do mar, ou de Afrodite (Afrodite=Vênus na mitologia latina), a deusa do amor, de cujo culto a rainha tinha descuidado. Vivia em Creta um célebre arquiteto, escultor e inventor, Dédalo. Foi esse homem quem construiu para Pasífae uma novilha (novilha=bezerra) de bronze, oca, para que a rainha, pondo-se em seu interior, pudesse atrair o touro. Assim Pasífae se uniu àquele animal. Da união nasceria um monstruoso homem com cabeça de touro – o Minotauro. Quando nasceu o filho de Pasífae e do touro, Minos, envergonhado, fez com que Dédalo construísse um labirinto para aí deixar aquela criança monstruosa. Com seus inúmeros corredores, salas e galerias, criados de maneira a fazer perder a direção e confundir até o mais astuto dos homens, o labirinto só era dominado pelo próprio Dédalo: quem ali entrasse, não conseguiria mais sair. Com o passar dos anos, o Minotauro foi crescendo no labirinto, longe dos olhares das pessoas. Ora, Minos, tendo derrotado os atenienses em batalha, exigiu deles um tributo sinistro: todos os anos, Atenas deveria enviar sete rapazes e sete moças para serem devorados pelo Minotauro. Pode-se imaginar o terror que deveria se apossar de quem, perdido na confusão dos caminhos tortuosos, sentia aproximar-se de si aquela criatura grotesca que habitava o labirinto...Disposto a pôr um fim a essa situação, o herói ateniense Teseu foi um dia a Creta, junto com os outros jovens destinados à morte certa. Quando Teseu chegou à ilha, Ariadne, filha de Minos e Pasífae, apaixonou-se pelo jovem. Desejando salvá-lo da morte no labirinto, a moça lhe deu um novelo com um fio: Teseu deveria desenrolá-lo à medida que penetrasse naquele emaranhado. Quem tivera a idéia fora Dédalo. Foi assim que o herói, depois de matar o Minotauro, encontrou facilmente a saída, seguindo o caminho criado pelo fio de Ariadne. Ao saber do que ocorrera, Minos, enfurecido, aprisionou Dédalo e seu filho Ícaro no labirinto, pois julgava que o arquiteto tinha sido cúmplice daquela traição. Haveria de ser a morte para os dois, se Dédalo, sempre astucioso e inventivo, não tivesse encontrado um meio de escapar. Fez, com penas de aves coladas com cera, um par de asas para si e outro para o filho. Antes de saírem por uma das altas janelas do labirinto, Dédalo fez uma recomendação a Ícaro. Que ele sob hipótese alguma, se aproximasse do sol; deveria voar nem muito alto nem muito baixo, entre o céu e a terra. Partiram. Mas Ícaro não obedeceu ao conselho paterno. Chegando demasiado perto do sol, a cera das com esse ataque. Depois, deu-lhe, com sua clava (clava=pedaço de pau mais grosso na parte de cima, usado como arma), fortes golpes e sufocou-o entre seus braços. Morto o leão, Hércules tirou- lhe a pele e se cobriu com ela. Finalmente, Zeus transformou o animal em constelação. Como segundo trabalho, Hércules teve de matar a Hidra de Lerna, uma serpente com várias cabeças (humanas, segundo alguns!) que devastava as terras por onde passava. Seu hálito era mortífero (mortífero=mortal, que causa a morte), e suas cabeças renasciam em dobro quando cortadas. Além disso, a cabeça do centro era imortal. Mas, com a ajuda de seu sobrinho Iolau, o herói venceu o monstro. De fato, enquanto ia cortando as cabeças da Hidra, Iolau queimava as feridas, impedindo, assim, que da carne machucada nascessem novas. Por fim, Hércules cortou a cabeça do meio, enterrou-a e pôs-lhe por cima um enorme rochedo. Morto o monstro, o herói embebeu suas flechas no seu sangue venenoso, tornando-as também envenenadas. A terceira tarefa de Hércules foi trazer vivo um enorme javali que vivia na montanha chamada Erimanto, na Arcádia, um região da Grécia. O herói o fez com facilidade, atraindo o javali para fora de sua toca e fazendo-o caminhar pela neve até se cansar. Aí, capturou-o e levou-o nos ombros até a cidade de seu primo, que lhe ordenara aquele trabalho. Quando chegou com o animal, Euristeu, apavorado, saiu correndo e se escondeu dentro de um jarro de bronze... Trazer viva a corça do monte Cerinia foi o quarto dever imposto a Hércules. Era, também, um animal gigantesco, mais forte que um touro, e devastava as colheitas. Tinha chifres dourados, pés de bronze e era velocíssima. O herói não podia matá-la, pois era um animal consagrado à deusa Ártemis (Ártemis=Diana, na mitologia latina, a deusa das florestas, dos animais e vegetais). Hércules perseguiu-a durante todo um ano, em vão. Um dia, porém, quando ela, já cansada, foi atravessar um rio, Hércules conseguiu feri-la com uma flecha e capturá-la. E levou-a Euristeu, cumprindo mais uma tarefa impossível a um mortal qualquer. Matar as gigantescas aves do lago Estínfalo foi o quinto trabalho de Hércules. Eram em grande quantidade e devastavam colheitas e pomares. Diziam alguns que eram antropófagas, com penas de aço que feriam o inimigo como se fossem setas. Para liquidá-las, Hércules tinha de as fazer sair da espessa floresta, perto do lago Estínfalo, em que se ocultavam. Teve uma grande idéia: com castanholas de bronze, fez um barulho tal, que as aves saíram daquele esconderijo. Então, usando as setas envenenadas com o sangue da Hidra de Lerna, Hércules as matou uma por uma. O sexto trabalho consistiu em limpar os estábulos do rei Augias, que tinha um imenso rebanho, com milhares de cabeças. Esse homem não limpava as instalações havia trinta anos. O estrume não era aproveitado como fertilizante nas lavouras, e as terras iam ficando estéreis com o passar do tempo. Hércules fez uma aposta com Augias: receberia uma parte de seu rebanho se conseguisse limpar os estábulos em apenas um dia. Julgando que aquilo era impossível, o rei prontamente aceitou a aposta. Hércules, então, desviou a corrente de dois rios para os estábulos e, com a maior rapidez, conseguiu limpar toda a sujeira acumulada ao longo dos anos. Os doze trabalhos de Hércules – II Um touro enlouquecido, que soltava fogo pelas ventas, devastava a ilha de Creta. O sétimo trabalho de Hércules consistiu em capturá-lo e trazê-lo vivo a seu primo Euristeu. Esse, por sua vez, quis consagrá-lo a Hera, mas a deusa, ainda colérica contra Hércules, recusou, e o animal foi solto. A oitava proeza do herói consistiu em capturar as éguas de Diomedes, o rei da Trácia. Diomedes aprisionava os estrangeiros que vinham ter a seu país e com sua carne alimentava os quatro animais. Hércules matou o rei e deu seu corpo às éguas para ser devorado por elas. A filha de Eristeu, Admeta, desejava para si o cinto da rainha das amazonas, Hipólita; obtê- lo foi o nono trabalho de Hércules. As amazonas eram mulheres guerreiras, descendentes de Ares, o deus da guerra, e tinham uma comunidade formada apenas de mulheres. Lutavam com grande bravura. Para se apoderar do cinto d rainha, Hércules teve de lutar com aquelas mulheres e matar Hipólita. Trazer os bois do imenso rebanho de Gerião, um gigante de três cabeças, foi a décima proeza do herói. Para isso, Hércules teve de ir até a ilha de Eritia, atravessando o Oceano. Como conseguiria isso? Foi preciso empregar a enorme taça do Sol; nela, todos os dias o Sol embarcava de volta para seu palácio no Oriente depois de ter, ao cair da noite, chegado ao Oceano. O Sol só lhe emprestou sua taça quando Hércules, irritado com o calor ao atravessar um deserto, ameaçou atingi- lo com suas flechas. No Oceano, tão agitadas estavam as ondas, que Hércules teve de fazer também a mesma ameaça a ele para que se acalmasse. Em Eritia, nos confins do Ocidente, Hércules matou, com sua clava, o cão Ortro, um animal monstruoso, e o pastor Eritíon, que guardavam o rebanho. Gerião tentou resistir, mas as setas de Hércules o venceram. Os animais que o herói conseguiu fazer chegar até Euristeu foram sacrificados a Hera. O décimo primeiro trabalho parecia realmente impossível: descer ao reino dos mortos, ao sombrio Hades, e capturar o cão Cérbero. Esse animal aterrorizante, com três cabeças e as costas e o pescoço cobertos de serpentes, impedia a entrada de vivos naquelas regiões bem como a saída dos mortos. O deus Hades consentiu que Hércules levasse Cérbero com a condição de que não usasse armas. Hércules, então, atacou o cão, segurou-o pelo pescoço e , com a cauda do animal, que tinha um ferrão, deu-lhe várias picadas. E pôde sair dos Infernos e levar a Euristeu a estranha presa. O primo, à vista daquele ser monstruoso, saiu correndo, apavorado e foi se esconder em seu jarro de bronze... O herói devolveu Cérbero a Hades. O último dos doze trabalhos foi trazer maçãs de ouro do jardim das Hespérides. Essas maçãs tinham sido o presente de casamento oferecido pela Terra, nas bodas de Zeus e Hera. A deusa as plantara no jardim dos deuses e, para proteger a árvore e os frutos, deixara-os sob a guarda de um dragão de cem cabeças e das três ninfas do Poente, as Hespérides. No caminho para o jardim, Hércules, dentre outras façanhas, libertou Prometeu do rochedo a que estava encadeado. Prometeu, em reconhecimento, advertiu-lhe que a única maneira de conseguir colher os frutos era através do gigante Atlas, que sustentava o céu sobre os ombros. Ao encontrar Atlas, Hércules fez-lhe uma proposta: seguraria o céu em seu lugar por algum tempo, enquanto o gigante iria colher três maçãs do jardim das Hespérides, que ficava perto. E assim aconteceu. Atlas, porém, queria levar pessoalmente as maçãs a Euristeu, enquanto o herói ficaria suportando o peso do céu. Hércules fingiu concordar, mas usou de esperteza para escapar a essa situação: pediu ao gigante que segurasse aquele fardo por alguns momentos para que ele pudesse colocar uma almofada sobre os ombros. Atlas voltou a segurar o céu – para sempre...enquanto Hércules partia, de volta à pátria de Euristeu. Levadas ao rei, as frutas foram oferecidas a Hera, que as pôs de volta em seu jardim. Assim se cumpriram os doze trabalhos de Hércules, doze proezas impossíveis para os mortais comuns. A guerra de Tróia As origens da guerra de Tróia Um dia, Hécuba, a esposa do rei de Tróia, teve um sonho pavoroso; ela que estava grávida e em breve daria à luz, acordou de repente no meio da noite. Logo contou a seu marido Príamo o pesadelo: sonhara que o filho esperado finalmente parecia querer sair de seu ventre, mas, ao invés de uma criança, paria uma tocha. O mais inquietante era que o fogo acabava por se espalhar pela cidade inteira, consumindo tudo. O rei tentou em vão acalmá-la e minimizar aqueles terríveis presságios; por fim, para não restar dúvidas, dirigiu-se a um de seus filhos, que sabia como ninguém a arte de interpretar os sonhos. A resposta que os pais receberam foi uma horrível notícia e um conselho tétrico (tétrico=terrível, medonho): – Vai nascer uma criança que causará a ruína de Tróia! Matem-na assim que nascer! Pode-se imaginar como o prognóstico (prognóstico=previsão, profecia) destruiu a tranquilidade de Príamo e de Hécuba. A criança finalmente nasceu, Páris, um belo menino, robusto e de traços encantadores. Que cegueira a dos homens!: contando de acordo com as luas, segundo um velho costume, levara dez meses o nascimento de Páris, assim como dez anos levaria o cerco de Tróia, terminando com o espantoso parto de guerreiros de um cavalo de madeira! Mas Hécuba, mãe, não aceitava a idéia de ver morto aquele filho e conseguiu fazer com que o menino fosse abandonado no Ida, uma cadeia de montanhas e bosques onde certamente ele não poderia sobreviver. Assim, Páris certamente morreria, para salvação de toda uma cidade, mas de uma maneira menos chocante para os pais. De repente, porém, um acaso muda o curso dos acontecimentos. Naquele mundo em que os homens sentiam sempre os deuses se manifestando e participando dos acontecimentos cotidianos,era difícil não ver aí mãos divinas, precipitando a ação humana para cumprir um plano arquitetado nas alturas. Pastores encontraram a criança desprotegida e destinada à morte e a recolheram e criaram como se fosse o filho de um deles. Prodígio (prodígio=acontecimento sobrenatural, milagre) inacreditável: fora salva da fome graças a uma ursa, que foi vista a seu lado amamentando-o... Com o passar do tempo, aquele menino cresceu robusto e se tornou um jovem de valor, que defendia os rebanhos dos pastores contra o ataque dos ladrões e das feras. Chamaram-no, então, Alexandre, isto é, em grego, “o protetor dos homens”. E um belo dia o jovem voltou para Tróia e revelou quem era, para surpresa de todo mundo, já que os súditos de Príamo estavam acostumados a participar anualmente dos jogos que o pai celebrava em memória do filho supostamente morto quando criança. Príamo e sua esposa o receberam muito bem e, esquecidos daquela profecia sinistra, cumularam (cumular=encher de, dar em grande quantidade) Páris de tudo a que tinha direito o filho de um rei. Não podiam imaginar o que e Destino já havia tramado durante a permanência de Páris- Alexandre entre os pastores do Ida! Nas montanhas, um dia, Páris tivera de assumir o papel de juiz num dos julgamentos mais difíceis que se possa conceber. Tudo começou com Éris, a deusa Discórdia. Era um monstro horrível de ver, com serpentes ao invés de cabelos, os olhos em brasa e a roupa ensangüentada. Estava sempre pronta a lançar deuses contra deuses, homens contra homens, deuses contra homens, em suma, a infelicitar a vida de mortais e imortais com suas intrigas. Um dia, durante as bodas de Peleu e da ninfa Tétis, os futuros pais do grande Aquiles, a Discórdia, enraivecida por não ter sido convidada para a festa, lançou entre as deusas Hera, Palas Atena e Afrodite (Hera, Palas Atena e Afrodite=na mitologia romana, Juno, Minerva e Vênus, respectivamente), uma maçã de ouro, com uma inscrição: “À mais bela”. Uma simples frase causou a maior confusão, especialmente entre as três belíssimas deusas, que disputavam acirradamente (acirradamente=apaixonadamente) o título de a mais formosa. Zeus, desejando pôr fim à discussão, decidiu organizar uma espécie de concurso de beleza entre as três rivais. Talvez para evitar ciumeiras e proteções entre os imortais determinou que o juiz seria um ser humano, ninguém menos do que o também formoso pastor Alexandre-Páris! Mas, com um mortal falível (falível=que pode se enganar, que pode falhar) e divindades dispostas a tudo para satisfazer a vaidade e não macular a reputação, aquela disputa não seria das mais imparciais... Cada uma das deusas prometeu algo ao juiz: – Você reinará sobre toda a rica Ásia, se me escolher, disse Hera, que era casada com o supremo rei do Olimpo (*), Zeus. – Dê-me seu voto e será o mais sábio dos homens e vencerá todas as batalhas de que participar, prometeu, majestosa, Palas Atena, a mais sábia e a mais guerreira dentre as deusas. Mas foi a dourada Afrodite, com seu sorriso cheio de encantos e seus olhos brilhantes, seu doce perfume e seus gestos delicados, que seduziu o pastor, tanto mais que prometeu algo equiparável (equiparável=comparável) à maravilha que ele tinha diante de seus olhos: – A mais bela das mortais, a grega Helena, mulher de Menelau, compartilhará do seu leito, disse a deusa do desejo amoroso, sempre doce e amarga ao mesmo tempo, como costuma ser o amor. Terminou com a vitória de Afrodite aquele julgamento, mas não a guerra das deusas nem as suas conseqüências – pelo contrário, ali Tróia começava a caminhar para a ruína última e definitiva. O pomo (pomo=fruta com polpa carnosa e forma esférica, como a maçã, a pêra e a romã) dourado Aquiles pelos cabelos loiros. Só o herói conseguia vê-la; perguntou-lhe o que ela fazia por ali. - Vim para acalmar sua ira, disse Palas Atena, a deusa de olhos azuis. Não use a espada contra o rei, mas o maltrate apenas com as palavras. Um dia, por causa da violência que estão fazendo a você, esses mesmos homens lhe darão o triplo de bens. Por isso, contenha seu ódio e obedeça! Aquiles, então, obedecendo, desistiu de usar a espada, mas cobriu o rei com pesados insultos; Agamêmnon replicou com a mesma dureza. Permaneceram os dois cada qual em sua posição, uma disputa que seria prejudicial aos gregos. Após a dissolução da assembléia, Aquiles retirou-se para sua tenda, acompanhado do fiel amigo Pátroclo e de outros companheiros. Cruzava os braços, deixando o exército grego entregue à própria sorte. Pouco depois, vieram buscar a sua escrava Briseida, que o herói deixou partir. Sozinho à beira-mar, Aquiles chorava e invocava a mãe, a deusa Tétis, de pés argênteos (argênteo=de prata). Queixava-se de não receber a honra que os deuses lhe prometeram em sua breve vida. Surgindo dos abismos do mar como uma névoa, a deusa acariciou o filho e, ao saber o motivo daquele pranto, prometeu-lhe queixar-se pessoalmente a Zeus de uma tal afronta. Doze dias depois, quando o supremo rei e pai dos deuses retornou de uma viagem à África, Tétis, abraçada a seus joelhos, como era costume quando se suplicava a alguém, falou-lhe assim: – Zeus pai, se eu, entre os imortais, alguma vez te ajudei, atende à minha súplica: concede honra a meu filho, destinado a uma morte precoce. Dá vitória e glória aos troianos enquanto os gregos não atribuírem a ele as honras devidas. Apesar de temer a ira da esposa Hera, que apoiava os gregos, Zeus comprometeu-se a atender ao pedido, franzindo as sobrancelhas num sinal de aprovação; seus cabelos de ambrosia (pronuncie ambrosía, substância divina que também servia de alimento para os deuses) se agitaram e todo o Olimpo tremeu. Dias de derrotas se sucederam para os gregos, que sentiram na pele a falta que fazia Aquiles, o herói de pés ligeiros. Sempre mais desconsolados a cada dia que passava, os gregos resolveram enviar uma embaixada de conciliação à tenda do herói. Mas Aquiles recusou os ricos presentes que lhe traziam e, dentre muitas outras palavras, proferiu estas: – Minha mãe Tétis disse-me que o destino me reservava uma escolha: se eu permanecer em Tróia, combatendo, morrerei conquistando grande glória, mas se eu voltar para casa, terei uma vida longa, ainda que sem glória. Voltem, vocês todos, pois não verão jamais o fim da cidade de Príamo. Amanhã decidirei se voltarei para casa ou permanecerei aqui. Acumulavam-se os sofrimentos dos gregos. Pátroclo, então, o grande companheiro de Aquiles, pediu-lhe que, ao menos, permitisse que ele usasse sua armadura e suas armas para ir em ajuda aos companheiros. Aquiles consentiu. No campo de batalha, Pátroclo faz grande carnificina entre os inimigos troianos, mas Apolo intervém. Dissimulado em uma densa névoa, o deus chega perto de Pátroclo, golpeia-o na espinha e nos ombros e derruba o elmo (elmo=capacete) de sua cabeça. Heitor, então, o maior dentre os guerreiros troianos, passaria a usar aquele capacete que outrora protegia Aquiles e jamais tinha caído ao chão antes daquele momento. Apolo continua a agir sobre Pátroclo; rompem-se a lança e o cinturão que o herói trazia consigo; cai por terra o seu escudo, e o deus ainda lhe tira a couraça (couraça=armadura que protege o peito e as costas do combatente). O herói pára, completamente aturdido. Um troiano de nome Euforbo o fere, enterrando uma lança nos seus ombros. Heitor, percebendo que Pátroclo está ferido e procura se salvar retirando-se da batalha, fere-o com uma lança no ventre. O troiano parecia um leão vitorioso depois de disputar com um javali indomável a posse de uma mina de água. Diz Heitor: – Pátroclo, você estava certo que iria tomar de assalto a nossa cidade e escravizar as mulheres troianas. Tolo! Os abutres o devorarão! Aquiles não poderá mais proteger você. Mas Pátroclo ainda teve forças para responder: – Isso mesmo, Heitor, você se vangloria com uma vitória que Apolo e Zeus lhe deram; mas foram os deuses que tiraram minhas armas. Mas ouça bem o que tenho a lhe dizer: Você não irá muito longe; logo virão ao seu encontro a morte e o destino invencível. Morrerá às mãos de Aquiles. Depois de assim falar, a alma lhe voou dos membros e desceu ao reino dos mortos, o sombrio Hades, lamentando sua sorte (sorte=destino), já que deixava um corpo há pouco cheio de vigor e juventude. Heitor dirigiu ao morto estas palavras: – Pátroclo, por que me prediz terrível destino? Talvez Aquiles me preceda, ferido pela minha lança. Então o troiano arrancou a sua arma do corpo do grego e pisou-o. Foram levar a notícia a Aquiles, que naquele momento tinha o coração inquieto e a mente cheia de receios. Já pressentia a morte do companheiro. Ao receber a confirmação de suas suspeitas, o herói demonstrou sua aflição: cobriu de cinzas o rosto e a veste e caiu por terra arrancando os cabelos. Chorava e gritava desconsolado. A ninfa Tétis ouviu os lamentos do filho e gemeu; todas as ninfas do mar acompanharam sua dor e choraram. A mãe foi consolar Aquiles, que se sentia culpado pela morte do amigo e pretendia voltar ao combate para vingar a morte de Pátroclo. Tétis prometeu ao filho novas armas, já que as dele haviam sido tiradas do corpo de Pátroclo e agora pertenciam a Heitor. A promessa logo se cumpriu. A pedido d ninfa, armas novas foram fabricadas pelo deus ferreiro, Hefesto (Hefesto=na mitologia latina, Vulcano). Chamava a atenção, sobretudo, um grande escudo em que o deus representara a terra, o mar, o céu com seus astros, além de cidades e campos. Quando a Aurora do dia seguinte despontou (despontar=surgir), trazendo a luz aos mortais e imortais, Tétis levou ao filho as armas fabricadas por Hefesto. Encontrou-o chorando, abraçado ao corpo do amigo. Aquiles, então, dirigiu-se a Agamêmnon e disse-lhe que desistia de sua ira; pediu-lhe que esquecesse a disputa que os tinha separado. O rei, por sua vez, devolveu-lhe Briseida e confirmou que lhe daria todos os presentes prometidos quando da embaixada à tenda do herói. Estava selada a reconciliação, para desgraça dos troianos. A ira de Aquiles iria ter, agora, outro alvo. A morte de Heitor Após fazer as pazes com Agamêmnon, Aquiles retornou ao campo de batalha, onde guerreava com fúria. Rápido por causa de seus pés ligeiros, parecia um corcel galopando a toda velocidade ou uma estrela brilhando através da planície. Tomado por um mau pressentimento, o rei Príamo suplicou a seu filho Heitor que não o enfrentasse. Hécuba, sua mãe, em lágrimas, fez-lhe a mesma súplica. O troiano, porém, estava decidido a não ceder ao apelo dos pais. No entanto, quando Heitor avistou Aquiles, com sua armadura de bronze brilhando como um fogo ou o sol nascente, teve medo e fugiu. Aquiles voou atrás dele, perseguindo-o sem descanso. Estava em jogo, naquela corrida, a vida de Heitor. Assistiam a esse espetáculo não só gregos e troianos mas também os deuses; Zeus sentiu piedade do filho de Príamo. Os heróis corriam sem que um conseguisse alcançar o outro. O pai e rei dos deuses, então, pesou numa balança de ouro os destinos dos dois: o resultado indicou claramente que a vida do troiano estava por um fio. Diante disso, Apolo, que até então o vinha protegendo, abandonou-o. Para precipitar a morte de Heitor, Atena se transformou no mais querido dentre seus irmãos, Deífobo, e o estimulou a ir ao encontro de Aquiles. Heitor disse ao grego estas palavras: – Não vou mais fugir. Dei três voltas ao redor dos muros de Tróia sem ousar enfrentá-lo, mas agora basta. Se eu vencer, devolverei seu corpo aos seus companheiros e, se for você o vencedor, devolva meu corpo aos meus. – Não diga isso, maldito!, respondeu Aquiles. Nunca poderemos ser amigos, assim como acontece com o homem e o leão, com o lobo e o cordeiro, que se odeiam. Você pagará pelos sofrimentos dos meus companheiros mortos pela sua lança. Depois destas palavras, Aquiles atirou a lança contra Heitor. Como este se desviou, a arma foi se fincar no chão. A própria Palas Atena a pegou de volta e, sem ser vista pelo troiano, entregou- a a Aquiles. Heitor, porém, atirou a sua contra o herói, atingindo o centro de seu escudo. O troiano, irritado, de repente percebeu que o falso Deífobo não estava mais do seu lado; compreendendo que fora vítima dos deuses, deu-se conta de que sua morte já estava próxima. Resolveu morrer lutando: desembainhou a espada e se precipitou contra Aquiles. No entanto, o grego fere o pescoço de Heitor, num ponto deixado descoberto pela armadura que o troiano portava, a mesma que tomara de Pátroclo. Ao vê-lo tombar na poeira, Aquiles lhe diz palavras duras; Heitor ainda lhe dirige um pedido: – Suplico-lhe, por seus pais, não deixe meu corpo sem sepultura, não o entregue aos cães dos gregos. Aceite resgate em troca dele e o devolva a Tróia. – Ah!, cão, deixe de súplicas. Nem se Príamo quisesse comprar com ouro o seu corpo, eu o entregaria. Cães e aves o devorarão, replica o grego. Morto Heitor, Aquiles lhe furou os calcanhares, passou por eles correias de couro, amarrou, pelos pés, o corpo a seu carro e partiu em direção aos navios gregos. Ao assistir a essa cena, a mulher de Heitor, Andrômaca, depois de um desmaio, chorando, pôs-se a lamentar a sorte do marido, dela mesma e do filho pequeno de ambos, Astíanax. Tróia toda acompanhava seu pranto. Enquanto isso, também Aquiles chorava, pensando em Pátroclo. E todos os dias, ao nascer do sol, tomado de fúria, voltava a ligar o corpo de Heitor a seu carro e dava três voltas em torno do túmulo do amigo. Apolo, porém, encarregava-se de evitar que o corpo do troiano se desfigurasse com o tratamento que vinha recebendo. Até que, dez dias depois, o deus, indignado, assim falou aos outros habitantes do Olimpo: – Cruéis! Por acaso Heitor não fazia sacrifícios a todos vocês? E agora não querem salvar nem mesmo seu corpo para que seus familiares possam incinerá-lo, prestando-lhe todas as homenagens? Vocês querem é ajudar Aquiles, que tem no peito um coração intratável, como um leão feroz. O que ele faz com o corpo de Heitor não é nem belo nem justo. Mas Zeus, lembrado dos sacrifícios que Heitor sempre lhe fazia, pôs em prática um plano para fazer Aquiles entregar o corpo do inimigo a seu pai. Chamou Tétis ao Olimpo e encarregou-a de enviar a seu filho uma mensagem: os deuses estavam irritados com seu comportamento, por isso ele deveria devolver o corpo de Heitor aos troianos. Por outro lado, mandou Íris, a mensageira divina, a Príamo, para estimular o velho rei a ir oferecer presentes a Aquiles como resgate pelo corpo do filho. Ao ouvir as palavras de Zeus pela boca da mãe, Aquiles se comprometeu a aceitar o resgate. Quanto a Príamo, após receber o recado de Íris, consultou a esposa, mas Hécuba lhe disse que não fosse ao encontro daquele homem cruel; finalmente, o rei resolveu ir mesmo assim ao encontro do grego. Levava-lhe, entre outros presentes, belíssimos mantos, túnicas e moedas de ouro. Zeus o viu partindo e enviou o deus Hermes para protegê-lo no caminho. Chegando à tenda de Aquiles, Príamo o encontrou ainda à mesa; tinha acabado de comer e beber. Em atitude de quem suplica, segurou-lhe os joelhos e beijou a mão que tinha matado tantos filhos seus. Disse-lhe: – Lembre-se, Aquiles, de seu pai, que tem a mesma idade que eu. Ele se alegra por saber que você está vivo e aguarda com ansiedade que seu filho volte para casa. Mas a mim, não me restou nenhum dos filhos de valor que gerei. Você matou o último, Heitor, que protegia Tróia e seu povo. Venho resgatar seu corpo, trazendo muitos presentes. Respeite os deuses, Aquiles, e, pensando em seu velho pai, tenha piedade de mim. Eu sou o mais infeliz dos mortais, já que levo aos lábios a mão do homem que matou meus filhos! A essas palavras, Aquiles, pensando no pai e em Pátroclo, chorou, acompanhando as lágrimas de Príamo por Heitor. Finalmente, tomou a palavra: – Infeliz, você sofreu muito em seu coração! Deixemos ambos nossas dores encerradas no peito: não se ganha nada com o pranto. Zeus distribui aos homens bens e males, misturados. Suporte! Chorando assim, não fará seu filho reviver mas conseguirá apenas sofrer ainda mais. Aquiles, então, mandou que as escravas lavassem o corpo de Heitor e o untassem com óleo. Concluída essa tarefa, colocaram-lhe uma túnica. O próprio Aquiles o levantou e depositou no carro. Depois disso, convidou Príamo a comer junto com ele. Príamo observava, admirado, o grande então, traz o adivinho Calcas e o obriga a dizer que os altares estavam destinando à morte...Sinão, a mim, que aquele velhaco queria há tanto tempo pôr a perder! Todo mundo, aliviado de escapar à morte, aprova as palavras de Calcas. Chega o dia do sacrifício; amarram- me e colocam fitas em volta da minha cabeça, polvilhada (polvilhado=salpicado) com cevada e sal, como é costume fazer com os animais oferecidos aos deuses em sacrifício. Fugi, confesso a vocês, mas já não tenho esperança de rever meus queridos filhos e meu saudoso pai. Pelos deuses do alto e pelos numes (numes=divindades) da verdade, suplico-lhes, tenham compaixão de uma alma que suportou tamanhos sofrimentos sem merecer! Sinão terminou esse discurso em lágrimas, comovendo o coração dos troianos. Por fim, com a mesma habilidade, contou como o cavalo fora construído para obter as boas graças de Palas Atena. Por recomendação de Calcas, tinham feito algo enorme, que fosse impossível de penetrar nos muros de Tróia, afinal a posse do cavalo significaria a proteção da deusa para seu povo. Se o recebessem na cidade, um dia Tróia haveria de fazer uma guerra vitoriosa aos gregos; porém, se maltratassem o dom de Palas, grande mal adviria para o Império de Príamo. Mas eis que de repente um prodígio aterrador veio perturbar a mente e o coração dos troianos ainda mais. Quando Laocoonte, que atingira com a lança o cavalo deixado pelos gregos, estava sacrificando um touro na praia, da ilha de Tênedos, através das águas tranquilas, duas serpentes gigantescas começaram a vir em sua direção. Tinham enormes anéis e seus peitos erguidos e suas cristas cor de sangue se sobressaíam sobre as ondas. Faz-se um estrondo no mar espumante. E eis que logo chegam à praia e se dirigem ao sacerdote com os olhos ardentes injetados de sangue e fogo e vibrando as línguas sibilantes (sibilantes=que sibilam, isto é, fazem ruído semelhante a um assobio, como acontece com as cobras). A esse espetáculo horrendo, os troianos fogem em disparada, brancos como cera. Os monstros do mar buscam Laocoonte e envolvem em seus anéis gigantescos o sacerdote e seus dois filhos. O pai estava armado, mas as serpentes o prendem com nós apertados em volta do seu corpo, impedindo qualquer reação Laocoonte tenta em vão afrouxar os nós, ainda segurando nas mãos as fitas do sacrifício, agora tingidas de sangue e do negro veneno dos montros. Ao mesmo tempo solta em direção aos astros horrendos berros. Pareciam os mugidos de um boi que foge do altar, depois que recebeu um golpe de machadinha no pescoço não forte o bastante para derrubá-lo em sacrifício aos deuses. Os dragões então se dirigem ao santuário da deusa Palas e se escondem sob o escudo aos pés da deusa. Esse acontecimento pareceu aos troianos uma severa advertência da deusa, afinal Palas Atena punira com as serpentes do mar o sacerdote que tinha atirado uma lança contra o cavalo a ela dedicado. Mais que depressa, eles transportaram aquele objeto gigantesco para dentro de suas muralhas. Ao som de hinos religiosos, com festas e alegres cânticos, o cavalo foi introduzido na cidade. Nessa noite, enquanto os troianos dormiam, como que sepultados no sono e no vinho, a esquadra grega deixou Tênedos e se dirigiu a Tróia, encoberta pelas trevas que pareciam abraçar todo o mundo, cúmplices da estratégia de Odisseu. Sem ser visto, Sinão caminhou até o cavalo e chamou os guerreiros para fora. É sobre uma Tróia despreocupada e desarmada que se precipitaria o inimigo, sedento de vingança depois de tantos anos de luta inútil. E aquela foi a última noite da outrora próspera cidade asiática, vítima dos deuses, da esperteza de um grego, de palavras e lágrimas mentirosas, mas também da sua própria boa-fé e compaixão. Muitos dos guerreiros gregos que praticaram naquela ocasião toda espécie de crime seriam castigados depois, ao passo que os troianos que conseguiram escapar da cidade em chamas haveriam de lançar as sementes de uma outra e muito mais poderosa Tróia, a futura Roma, como se os deuses se divertissem em erguer hoje às alturas da glória os que amanhã tombariam na mais dura ruína e vice-versa. Mas essa já é uma outra história. Em pouco tempo, uma cidade próspera e rica tombava em ruínas junto com seu velho rei, Príamo, logo reduzido a um mísero corpo decapitado, sem ninguém que lhe desse sepultura. Em pouco tempo, toda a cidade se enchia de lágrimas de mulheres e crianças logo escravizadas para servir aos senhores gregos. As trevas que haviam dissimulado a irrupção (irrupção=invasão súbita e impetuosa) do inimigo pela cidade iluminavam-se com o fogo de um incêndio que parecia querer durar para todo o sempre. O retorno de Odisseu Odisseu e o ciclope Dentre os heróis gregos que lutaram em Tróia, Odisseu se destacava por sua astúcia e inteligência. Ninguém sabia como ele sair de uma situação difícil empregando os recursos de um espírito sagaz (sagaz=astucioso). Terminada a guerra, Odisseu teve de se aventurar, com seus companheiros de armas, por uma longa e arriscada jornada de volta à ilha de Ítaca, sua terra natal. Navegavam pelos mares, quando Zeus enviou sobre todos uma tempestade espantosa: ventos velocíssimos varriam terras e mares, e a mais profunda noite desceu sobre o oceano. Depois de vários dias de cansaços e sofrimentos, os gregos foram parar na terra dos Lotófagos, um povo que se alimentava da flor do lótus (lótus=nome de uma planta aquática). Ao desembarcar, Odisseu mandou alguns homens em missão de reconhecimento, para descobrirem que tipo de pessoas viviam ali. Os Lotófagos os receberam bem e lhes deram para comer a flor do lótus. Quem comia aquela flor, porém, não sentia mais vontade de voltar para casa e acabava ficando. Assim, aqueles companheiros de Odisseu não queriam mais voltar aos navios. Foi preciso levá-los à força e partir correndo daquela terra, para que ninguém mais, comendo a flor, se esquecesse do sonhado retorno para casa. A próxima região visitada por Odisseu foi a ilha dos ciclopes. Eram seres monstruosos, gigantescos e com um só olho no meio da testa. Viviam sem leis e eram pastores. Nem aravam a terra nem tinham cidades. Suas casas eram cavernas situadas no alto das montanhas. Odisseu chegou de noite à terra dos ciclopes e, ao surgir a aurora do dia seguinte, pôs-se a explorar a ilha. Ali havia muitas cabras selvagens e os homens caçaram algumas para a refeição do dia. Voltaram para os navios. Na manhã seguinte, Odisseu resolveu ir com seus homens ao encontro dos habitantes daquela terra, que ainda não conhecia. Ao penetrar na ilha, Odisseu avistou uma caverna que ficava bem no alto de uma montanha; por perto havia ovelhas e cabras e um ser enorme, que dormia e parecia viver apartado dos outros. Era o ciclope Polifemos. Odisseu, então, decidiu escolher doze companheiros, mandou os outros de volta para o navio, e se dirigiu à caverna. Trazia consigo comida e um ótimo vinho, doce, puro e perfumado, digno dos deuses. Quando chegou à caverna, Odisseu notou que o ciclope saíra para apascentar (apascentar=levar para pastar) seu rebanho. Na gruta, os companheiros de Odisseu viram queijo e ovelhas e cabras; desejaram, então, apoderar-se de tudo e ir embora para o navio. O herói, porém, queria esperar pela volta do ciclope, para conhecê-lo de perto. Os homens estavam comendo quando o ciclope apareceu, trazendo lenha seca para preparar seu jantar. Ao jogar o feixe de lenha no chão provocou um estrondo que fez os gregos fugirem correndo para o fundo da caverna. Estavam presos ali, pois o ciclope fechou a entrada com uma enorme pedra que aqueles homens jamais poderiam remover. Depois de ordenhar seus animais e alimentá-los, o monstro acabou percebendo aqueles intrusos, mortos de medo num canto de sua morada, e lhes perguntou com uma voz profunda e assustadora: – Quem são vocês, estrangeiros? De onde vieram? São comerciantes ou piratas? – Somos gregos, respondeu Odisseu. Retornamos para casa vindos de Tróia. Mas tempestades e ventos nos desviaram de nossa rota, pois assim quis Zeus. Ó poderoso, trate-nos como hóspedes, abrigando-nos. Zeus protege os deveres da hospitalidade. – Você é um tolo ou vem de muito longe, já que não sabe que nós, os ciclopes, não nos preocupamos com Zeus nem com os outros deuses. Mas me diga onde está o seu navio. – Possêidon (Possêidon=Netuno, na mitologia latina) destruiu-o, mentiu astutamente Odisseu. O vento o lançou contra as rochas desta ilha. Então o ciclope, sem nada mais falar, estendeu a mão sobre os companheiros de Odisseu, agarrou dois e bateu-os contra o solo. Esquartejou-os membro por membro e os devorou, entre goles de leite. Era o seu jantar daquela noite. Em seguida, adormeceu. Diante daquele espetáculo horrendo, a mais profunda angústia tomou conta dos homens. Odisseu, então, pôs-se a pensar num meio de escapar dali com vida; não podia matar o monstro, pois, nesse caso, quem removeria a pedra gigantesca que tapava a entrada da caverna? 1. No dia seguinte, o ciclope acordou e pegou mais dois homens para devorar na sua primeira refeição e saiu. Veio à mente de Odisseu, então, uma idéia para salvar a si e aos seus: pegou um grande tronco que ali se encontrava, fez uma estaca com uma ponta bem fina e escondeu-a. À noite, o ciclope voltou, recolheu na caverna seu rebanho e fechou a entrada com a rocha. Depois, como jantar, agarrou mais dois dos homens de Odisseu e devorou-os. Odisseu se dirigiu a ele: – Ciclope, vamos, beba vinho. Trouxe-o para lhe oferecer, na esperança de que você tivesse piedade de nós. Polifemo tomou o vinho e achou-o delicioso; quis mais. Perguntou, então, como Odisseu se chamava. - Meu nome é “Ninguém”, disse espertamente Odisseu. É assim que todos me chamam. Depois daquele jantar e de muito vinho, o ciclope foi vencido por um sono profundo. De quando em quando, saía de sua boca vinho e carne humana. Odisseu não perdeu tempo: com mais quatro companheiros, pegou a estaca e aqueceu sua ponta no fogo. Depois, a um só tempo, furaram o único olho do ciclope. O monstro acordou gritando espantosamente, fazendo toda a caverna ressoar com seus berros. Furioso, tirou a estaca do olho e saiu para chamar os outros ciclopes que moravam em cavernas vizinhas. – Por que você grita desse jeito, Polifemo? Por acaso alguém está tentando matá-lo usando a astúcia ou a força?, perguntaram os outros. – “Ninguém” está tentando me matar, usando a astúcia e não a força!, respondeu Polifemo. Os ciclopes, diante daquela resposta, acharam que ninguém estava perturbando o companheiro, que devia estar doente, e foram embora. Odisseu ria por dentro daquele plano astucioso que enganara Polifemo... O ciclope, gemendo e agora cego, conseguiu tirar a pedra que tampava a caverna e, na entrada, ia apalpando as ovelhas e carneiros que saíam, para não deixar escapar os homens. Odisseu teve, então, mais uma de suas idéias brilhantes: amarrou lado a lado, de três em três, alguns carneiros grandes e com a lã crescida. No carneiro do meio, colocava um dos seus companheiros, amarrado sob seu ventre; os outros dois carneiros, cada um de um lado, serviam de proteção, disfarçando o homem que ia no centro. Odisseu pegou um carneiro maior e de pêlo mais crescido e colocou-se embaixo do animal, agarrando-se fortemente à sua lã. Passaram todos pelo ciclope, que de nada desconfiava. Ao sair, Odisseu largou o animal e desamarrou os companheiros. Quando estava a salvo em seu navio, Odisseu dirigiu-se ao ciclope. Criticou a violência que ele exercera contra os companheiros e disse seu verdadeiro nome, para que o monstro pudesse contar a quem perguntasse que fora Odisseu quem o cegara. Politemo, enfurecido de ódio, suplicou ao deus Possêidon, que era seu pai. Pediu-lhe que Odisseu ou não voltasse para casa, ou só conseguisse isso depois de muito tempo e sofrimento, após perder todos os companheiros. E, se devia mesmo retornar, que encontrasse muitas dores em sua casa. Depois de orar, jogou contra o navio uma enorme pedra, que não o acertou mas provocou uma grande onda. Odisseu e os seus partiram às pressas, com o coração inquieto por causa das palavras do ciclope. De fato, aquele pedido a Possêidon seria atendido... Na ilha da feiticeira Circe petrificava as pessoas). Voltou correndo para o navio e zarpou (zarpar=partir sobretudo numa embarcação). Os novos perigos da viagem De retorno do mundo dos mortos, Odisseu voltou à casa de Circe com os seus companheiros; ali sepultou Elpenor e, após ouvir as advertências da feiticeira, partiu. Aproximando-se das Sereias, Odisseu tapou com cera os ouvidos dos companheiros para que eles não ouvissem seu canto, que enfeitiçava os homens fazendo-os esquecer do retorno e ficar por ali até a morte. Quanto a ele, que queria escutar a canção daqueles seres sem ser arrastado pelo seu encantamento, ordenara aos homens que o amarrassem fortemente ao mastro e não o soltassem, mesmo que pedisse. Feito isso, pouco depois se ouviram as vozes das Sereias: – Venha aqui, famoso Odisseu, para escutar nosso canto suave como o mel. Odisseu, enfeitiçado por aquelas vozes belíssimas, implorou que os companheiros o soltassem, mas obedecendo a suas ordens, eles não o fizeram. Passado o perigo, destaparam os ouvidos e o soltaram. Mas uma outra prova os aguardava: deveriam passar por um estreito perigoso, entre rochas ameaçadoras de um lado e outro. De um lado, havia Cila, do outro Caríbdis, dois monstros que destruíam as embarcações que por ali passavam. Caríbdis sugava a água do mar, com terrível estrondo, e depois a vomitava. Quem conseguia escapar de uma, via seu navio estroçado pela outra. E eis que Cila arrebatou os seis melhores companheiros de Odisseu: precipitados ao mar, gritavam seu nome em vão. Tendo conseguido escapar a mais esse perigo mortal. Odisseu chegou à ilha onde estavam os rebanhos do Sol. Não queria permanecer naquele lugar, mas os companheiros estavam esgotados e desejavam descansar. Odisseu os advertiu para não tocar nas vacas e ovelhas do Sol. Entretanto, com o passar dos dias, quando as provisões do navio acabaram, Euríloco e os outros companheiros de Odisseu decidiram matar as vacas mais gordas para saciar a fome. Com receio da ira do deus, prometeram que, ao chegar a Ítaca, construiriam um templo para o Sol. Odisseu estava em terra, dormindo. Quando voltou para o navio e percebeu que tinham cometido o sacrilégio, repreendeu-os. Estranhos prodígios estavam mostrando a cólera divina: as carnes nos espetos mugiam como vacas. Sete dias depois, estavam todos de novo no mar. De repente, o céu se escureceu e o mar se encrespou. Zeus enviava terrível tempestade contra o navio, que, atingido por um raio, se desfez. Os companheiros de Odisseu não retornariam mais... Odisseu conseguiu amarrar a quilha e o mastro e, nessa espécie de jangada improvisada, sentou-se, deixando-se levar pelos ventos furiosos. Vagou vários dias ao sabor das ondas até ir parar na ilha de Ogígia, onde morava a ninfa Calipso, numa grande caverna. Calipso apaixonou-se por Odisseu e não queria deixá-lo mais ir embora. Sete anos passaram. Odisseu permanecia muito tempo olhando para o mar e chorava sempre, desejando partir. Calipso queria que ele fosse seu esposo, e para sempre, pois ela o faria imortal. Mas o grego só pensava em Penélope, a mulher que deixara em Ítaca. Zeus teve de mandar Hermes com uma mensagem para a ninfa: deveria deixar o herói partir, pois era seu destino retornar. Às palavras divinas, Calipso respondeu: – São cruéis os deuses. Vocês têm inveja das deusas que tomam um mortal por marido. Eu salvei Odisseu, acolhi-o e alimentei-o. Pretendia torná-lo imortal e tê-lo sempre ao meu lado. Mas não posso desobedecer a um ordem de Zeus. Assim, Calipso não só permitiu que Odisseu a deixasse como também lhe deu comida, bebida, roupa e até mesmo um vento propício para a viagem. O herói partiu numa jangada. Perto da terra dos feácios, Possêidon, sempre irritado contra Odisseu, que cegara o ciclope, provocou uma terrível tempestade. Com seu tridente, agitou violentamente as águas do mar. Todo tipo de vento se precipitou, com horrendo uivo, sobre as ondas. E a noite envolveu a tudo. Quando a morte parecia próxima, Atena veio ajudar Odisseu; acalmou os ventos, e o herói pôde nadar até a terra dos feácios, onde estaria a salvo. A chegada de Odisseu e o massacre dos pretendentes Depois de uma estada na terra dos feácios, onde o rei Alcínoo, sua esposa Arete e a filha Nausícaa o receberam muito bem, Odisseu conseguiu retornar à ilha de Ítaca. Estivera longe da terra natal por muitos anos. Ao chegar, não a reconheceu, pois Palas Atena a tinha envolvido em uma névoa, e ele tinha a impressão de estar em país desconhecido. Quando Odisseu chorava pela pátria, a deusa lhe apareceu na figura de um jovem pastor, que lhe disse estar ele em Ítaca. Astucioso, Odisseu contou ao jovem uma história mentirosa sobre si mesmo e suas viagens. Palas, sorrindo, disse-lhe então: – Quem poderia vencê-lo em astúcia? Como você gosta de histórias mentirosas! Eu também conheço astúcias. Pois saiba que eu consegui enganá-lo: sou Palas Atena, a filha de Zeus. E Palas Atena desfez a névoa e mostrou Ítaca a Odisseu, que de tão feliz, beijou a terra, buscada por tanto tempo e tantos mares e perigos. A deusa concebeu um plano para que ele pudesse se vingar dos pretendentes que estavam como abutres em sua casa: transformou-o num mendigo maltrapilho (maltrapilho=esfarrapado; vestido com trapos), de pele enrugada, velho e calvo. E Odisseu, sempre aconselhado pela deusa, caminhou até a casa do porqueiro (porqueiro=que cuida de porcos) Eumeu, que se mantivera fiel ao patrão durante toda a sua ausência. Na casa desse criado leal, Odisseu, que inventou, a seu respeito, uma história em que mesclava habilmente mentira e verdade, foi muito bem recebido; e pôde observar o grande cuidado com que o porqueiro cuidara de seus bens. Ali ocorreria um acontecimento notável: o reencontro entre Odisseu e seu filho Telêmaco, depois de tão longa separação. Eumeu tratava Telêmaco como a um filho querido. De início, pai e filho conversaram sem que o segundo soubesse a verdadeira identidade do primeiro. Mas Palas Atena apareceu mais tarde a Odisseu e, tocando-o com uma varinha de ouro, devolveu-lhe o antigo aspecto, Telêmaco reconheceu o pai, e os dois se abraçaram chorando. Depois de transformado novamente em mendigo, Odisseu foi para a sua casa. Seu cão Argo, ao ver o dono, reconheceu-o, mesmo sob aquele aspecto: abanou a cauda, erguendo as orelhas, Odisseu que não podia se revelar, conteve sua emoção, mas uma lágrima lhe caiu às escondidas. Argo, revendo Odisseu após vinte anos de ausência, de repente caiu por terra, morto. Quando Odisseu entrou junto com Eumeu, um dos pretendentes, de nome Antínoo, disse: – Já não temos vagabundos suficientes em nossa cidade? Na ausência do dono da casa, os pretendentes comiam e bebiam às suas custas. Tinham tentado matar Telêmaco numa emboscada que falhara. Desejavam a mão de Penélope, mas a astuciosa mulher de Odisseu os enganava com um estratagema. Dizia que se casaria com um dos pretendentes após acabar de tecer uma mortalha (=veste para envolver um morto que vai ser enterrado, aqui, para Laertes, o pai de Odisseu, que, entretanto, ainda estava vivo, morando no campo.) para o sogro; porém, o que tecia de dia, desmanchava à noite, secretamente. E assim ia adiando a decisão, pois a mortalha jamais ficava pronta. Dos pretendentes, o falso mendigo Odisseu teve de escutar muitas insolências e suportar maltratos. Mas vingou-se terrivelmente, com a ajuda do filho, da esposa e dos criados que lhe tinham permanecido fiéis. A astuciosa Penélope propôs uma prova aos pretendentes: casar-se-ia com quem conseguisse, usando o arco de Odisseu, fazer passar uma flecha por doze machados postos em fileira. A flecha deveria passar, de uma vez, pelos orifícios que os machados tinham na parte superior. Era difícil até mesmo conseguir vergar o arco. Nenhum dos pretendentes conseguiu. Mas eis Odisseu entrou na competição e realizou a façanha que parecia impossível. Então pai e filho, ao lado dos servidores fiéis, mataram os pretendentes um a um. Cautelosa, Penélope quis uma prova a mais de que aquele homem em farrapos era o seu caro Odisseu: que ele descrevesse o leito conjugal, cujas características só ela e o marido conheciam. Quando teve certeza de que se tratava mesmo de Odisseu, sentiu o corpo se enfraquecer como se fosse desmaiar e, chorando, abraçou-o e beijou-o, dizendo: – Os deuses deram muitos sofrimentos a nós dois, Odisseu; não pudemos gozar de nossa juventude um ao lado do outro. Odisseu também chorou, abraçando-a. Após vinte anos de longas dores e perigos constantes, parecia que finalmente o senhor de Ítaca e sua fiel Penélope reencontravam a paz para sempre. A soberania de Zeus e sua esposa Hera De Úrano e Géia (=Céu e Terra, respectivamente. Úrano pode também ser pronunciado Urano), nasceram vários filhos; dentre eles, Cronos, um dos Titãs (eram seis dos filhos de Úrano e Géia, dentre eles o próprio Cronos), que um dia, tomando o poder sobre o céu, tornou-se o deus supremo. Cronos se casou com Réia. Entretanto, haviam predito ao novo soberano que ele haveria de ser destronado como Úrano, e também pelo próprio filho. Tentando escapar a esse destino, cronos devorava os filhos assim que Réia os dava à luz. Um dia a mãe, não suportando mais essa situação, fugiu, grávida, para a ilha de Creta, e ali gerou Zeus (=Júpiter, na mitologia latina). Para enganar o marido, envolveu uma pedra num manto e, fingindo tratar-se de mais um filho de Cronos, deu-lhe para que devorasse. Mais tarde, Zeus, ao lado dos outros deuses do Olimpo, guerreou contra Cronos e seus irmãos Titãs, num disputa que durou dez anos e terminou com a vitória do primeiro. A Terra, furiosa por Zeus ter precipitado os Titãs nos Infernos, mandou contra ele seus terríveis filhos, os Gigantes, mas a nova guerra também terminou com sua vitória. Foi assim que Zeus se tornou o supremo rei dos deuses, reinando sobre o céu luminoso. Com o raio em uma das mãos e o cetro de rei na outra, Zeus zelava pela ordem do universo, pela concórdia entre os deuses e o cumprimento das promessas e juramentos. Era o soberano do céu, como Possêidon era o deus do mar e Hades o das regiões infernais. Mas uma força superava a de Zeus: a do Destino. Havia três Moiras (=Parcas, para os romanos) que teciam a sorte dos homens, e nem Zeus poderia mudar o que elas estabeleciam. Cloto esticava o fio dos destinos, Láquesis o colocava no fuso da roca (fuso da roca=a roca é um instrumento para fiar e tem uma peça, chamada fuso, onde se enrola o fio) e Átropos o cortava, determinando a duração de cada vida humana de acordo com o tamanho do pedaço de fio. A águia era a ave de Zeus, como o carvalho sua árvore preferida. Hera (=Juno, na mitologia latina), irmã e esposa de Zeus, deusa do casamento, morria de ciúmes diante das infidelidades constantes do marido. De fato, ele não hesitava em recorrer a todos os meios para obter o amor das mortais por cuja beleza se apaixonava. Não podendo enfrentar o supremo rei dos deuses, a cólera da deusa se voltava contra suas rivais ou os filhos que Zeus tinha com elas. Foi por causa de Hera que o herói Hércules teve de passar por doze terríveis tarefas. Um dia, quando ele navegava de volta para casa, vindo de Tróia, Hera provocou no mar uma tempestade espantosa. Zeus, porém, castigou-a por isso: prendeu-a com uma corrente de ouro, amarrada de cabeça para baixo do alto de uma nuvem, com uma bigorna (=peça de ferro sobre a qual os ferreiros trabalham os metais) em cada pé... Seu filho Hefesto (=Vulcano, na mitologia latina), o deus ferreiro, libertou-a, provocando a cólera de Zeus, que o precipitou do alto do céu. Foi nessa ocasião, dizem, que Hefesto ficou coxo para sempre. Com o nome de Juno, em Roma a deusa era a protetora das mulheres, que a invocavam durante o parto. Assim como todo homem tinha uma espécie de anjo da guarda chamado “gênio”, toda mulher tinha sua Juno para protegê-la. No dia de seu aniversário, os romanos celebravam essas criaturas divinas. Você já parou para pensar nos nomes dos meses do ano? Junho vem de Juno, mês assim, o deus de Nisa, Dioniso. O deus se locomovia num carro puxado por panteras. Acompanhava-o um estranho cortejo: Sátiros, meio homens meio bodes, com uma longa cauda de cavalo; as Bacantes, mulheres com os cabelos desgrenhados, empunhando o tirso, uma vara enfeitada com hera e ramos de videira; o deus Priapo, com seus chifres de bode e orelhas de cabra, extremamente feio e sempre excitado sexualmente. Na cidade grega de Tebas, Dioniso instituiu as Bacanais; nessas festas, as pessoas, especialmente as mulheres, eram como que possuídas pelo espírito do deus e, parecendo alucinadas, vagavam à noite pelos campos e montanhas. O rei de Tebas, Penteu, resolveu proibir esse culto e provocou a ira do deus, também duvidando de seus poderes e até mesmo mandando prendê-lo como se ele fosse um mero impostor. Dioniso, porém, escapou da prisão e incendiou o palácio. Mas a vingança mais cruel do deus não tardou. Fez com que Penteu fosse espionar as mulheres que estavam celebrando o culto numa montanha. Quando elas, enfurecidas, o viram, agarraram-no e fizeram seu corpo em pedaços. Enlouquecidas por Dioniso, pensavam que se tratava de um animal. Agave, sua própria mãe, não reconhecendo o filho, cortou-lhe a cabeça e a pôs na ponta de seu tirso. Sobre as origens de Dioniso, corria outra versão. Os Titãs, incitados por Hera, devoraram o deus quando ele era ainda uma criança. Zeus, então, fulminou com seu raio os Titãs. Das cinzas desses seres nasceram os homens: com uma parte má, titânica, e uma parte boa, divina, vinda de Dioniso. Daí a natureza ambígua do ser humano, nem totalmente bom nem totalmente mau. O coração de Dioniso, porém, teria sido salvo por uma deusa e dado a Sêmele, que o engoliu e, assim, engravidou. Dessa forma, o deus renasceria. Para sempre, afinal, sendo deus, como não seria imortal? Apolo e Palas Atena Uma das incontáveis amantes de Zeus foi Latona. Como todas as outras, tornou-se vítima de Hera, que fez a Terra jurar jamais permitir que Latona desse à luz em seu reino. Possêidon (=Netuno, na mitologia latina), porém, fez surgir do oceano uma ilha que a acolheu. Era um pedaço de terra que vagava ao sabor das ondas, sempre se movimentando. Ali, no início da primavera, Latona gerou os irmãos Apolo e Ártemis. Um dia, em sinal de gratidão, Apolo haveria de fixar com suas setas a ilha, que se tornaria conhecida como Delos. Antes do nascimento, porém, Latona ainda sofreu por causa da cólera de Hera. A deusa reteve no céu Ilítia, que ajudava as mulheres a dar à luz, e o parto tardava. Hera só consentiu em enviar Ilítia quando recebeu das outras deusas, que tinham pena de Latona, um belo colar. Quando Apolo nasceu, era o sétimo dia do mês, e sete cisnes voaram sete vezes ao redor da ilha. Do pai, recebeu uma lira e um carro puxado por cisnes, que o conduziu a Delfos, depois de o levar para outras regiões do mundo. Em Delfos, Apolo matou um dragão chamado Píton, que devastava os campos, e instituiu os Jogos Píticos, que ali se celebrariam de quatro em quatro anos, com seus concursos de músicos e poetas, além das competições de atletismo e corridas. O santuário ali existente, que era protegido pelo dragão, tornou-se um oráculo do deus. Sentada sobre um banco de três pés, a trípode, uma sacerdotisa de nome Pítia entrava em transe e, recebendo o espírito do deus, proferia, com voz alterada, palavras enigmáticas. Era a resposta aos que consultavam o oráculo antes de tomar uma decisão importante para saber o quer tinham de fazer. Delfos, para os gregos, era o centro do mundo, um lugar sagrado a ser visitado e cultuado. Jovem e belo se apresentava sempre Apolo. Tinha longos cabelos, de reflexos azulados. Sua cabeça era coroada por raios, pois esse deus também era o próprio Sol, assim como a sua irmã Ártemis era a Lua. Daí ser chamado também de Febo, “o brilhante”. Era também o deus da música e da poesia. O loureiro lhe era consagrado por um motivo especial. Apolo se encantara com a ninfa Dafne e a perseguia pelas montanhas e florestas. Dafne dirigiu uma súplica ao seu pai, o deus e rio Peneu, e foi ouvida: para escapar à perseguição, foi transformada num loureiro, que é o que significa “Dafne” em grego. Apolo se enamorou também do jovem Jacinto. Deixando de lado a cítara e as setas, entregava-se às caçadas ao lado do rapaz. E quando se divertiam lançando o disco, enciumado, o vento Zéfiro, que também amava Jacinto, acabou provocando sua morte: o disco lançado pelo deus foi ferir mortalmente o jovem. A palidez da Apolo, ao ver o que acontecera, igualava-se à do rosto de Jacinto. Gemendo, tentou em vão reanimá-lo estancando a ferida. Por fim, disse, entre lágrimas: – Tenho diante de meus olhos tua ferida a me acusar. Tu és minha dor e meu crime. Mas qual foi a minha culpa? A não ser que se possa chamar de culpa ter amado alguém... Se ao menos pudesse perder a vida ao teu lado! Mas sempre estarás comigo, não sairás jamais dos meus lábios, que sempre se lembrarão de ti. E, transformado numa nova espécie de flor, na tuas pétalas virá gravado o meu lamento. Eis que enquanto Apolo assim falava, do sangue de Jacinto, que corria pela terra, viu-se formar aos poucos uma flor, parecida com o lírio, mas de cor púrpura. O próprio deus gravou nas pétalas a expressão dos seus gemidos. É por isso que se pode perceber no jacinto as letras da interjeição de dor: “ai”. Antes de se casar com Hera, Zeus teve por esposa Métis. Ora, quando ela estava grávida, uma profecia inquietante para o pai dos deuses o fez tomar uma decisão drástica. Dizia-se que, se Métis desse à luz uma filha e, depois, tivesse por neto um menino, este ao crescer destronaria Zeus. O rei dos deuses, então, engoliu Métis... Entretanto, com o passar do tempo, uma terrível dor de cabeça veio tirar o sossego de Zeus; intrigado chamou o deus ferreiro Hefesto (=Vulcano, na mitologia latina) e pediu que lhe abrisse a cabeça com um machado. Hefesto fez um corte nela e eis que de dentro saiu, armada e dançando uma dança guerreira, a deusa Palas Atena. Carregava a égide, um escudo recoberto com pele de cabra, e o grito de guerra assustador, que proferiu ao surgir para a luz do dia, ecoou por terra e céu. Palas era a protetora maior da cidade grega de Atenas, a quem ofertou a oliveira, árvore tão importante para os gregos. Não era, pois, uma deusa somente guerreira. Era a deusa da sabedoria, da inteligência, das artes e das letras. Também o trabalho com a lã, uma tarefa deixada às mulheres, era seu dom. Deusa que se mantinha sempre virgem, o nome do magnífico templo que se ergueu em sua homenagem em Atenas – o Partenón – faz referência a isso. A coruja, que consegue enxergar no escuro, era a ave consagrada a essa deusa, cujo dom maior, a inteligência, também é capaz de ver através das trevas e vencê-las. Hermes e Hefesto (=Mercúrio e Vulcano, respectivamente, na mitologia latina) Numa caverna do monte Cilene, numa região da Grécia chamada Arcádia, nasceu Hermes, filho de Zeus e Maia. Haveria de se tornar um dia mensageiro de seu pai. Se Zeus queria levar a algum mortal um recado importante, convocava o filho, que imediatamente colocava seu chapéu de abas largas e calçava suas belas sandálias de ouro com asas que o elevavam nos ares e o mantinham acima das águas dos mares. Obediente, o mensageiro divino partia cruzando os céus com a rapidez dos ventos mais velozes. Deus astuto e hábil, foi o inventor da primeira lira, que fabricou colocando tripas de bois num casco de tartaruga. Quando nasceu, já era tão excepcionalmente precoce que saiu de seu berço e roubou parte de um rebanho que estava sob os cuidados de Apolo. Esse deus estava muito irritado com o menino, mas ao se deparar com aquele instrumento musical que ele inventara, imediatamente aceitou trocar por ele seus animais. Outra invenção sua foi a flauta, e por ela Apolo deu-lhe o bastão de ouro que lhe servia de cajado (=vara ou bastão usado pelos pastores em seu trabalho diário), e era chamado caduceu. Com esse bastão, Hermes conduz as almas dos mortos para as regiões infernais e fecha os olhos dos que caem no sono assim como os reabre quando despertam. Hermes, com sua esperteza, era o deus do comércio e dos ladrões. Protegia também os viajantes, que homenageavam sua imagem quando por ela cruzavam. Hefesto, o deus do fogo, era filho de Zeus e Hera. Conta-se que um dos dois precipitou o deus do Olimpo: Hera, envergonhada com o filho feio e coxo, ou Zeus, que, irritado por Hefesto ter tomado o partido da mãe numa discussão entre o casal, de repente o teria pego por um pé e atirado para a terra, fazendo com que o deus mancasse para sempre. Mas Hefesto acabou voltando ao Olimpo, morada dos deuses, graças a sua astúcia. Construiu um belo trono todo feito de ouro e mandou-o a Hera. Quando sua mãe se sentou nele, cadeias a prenderam firmemente, e ela não conseguiu se libertar. No Olimpo, os deuses caíram na gargalhada ao ver seus apuros. Ninguém sabia como soltá-la. Foi preciso, então, chamar Hefesto, que sabia o segredo para libertar Hera. Ao se reconciliar com os pais, acabou recebendo como esposa a mais bela das deusas, Afrodite. Muito habilidoso no uso dos metais, que sabia fundir (=derreter) muito bem, Hefesto era o deus ferreiro. Suas forjas estavam no vulcão Etna, na Sicília; aqui, trabalha com a ajuda dos Ciclopes. O trono e o cetro de Zeus, seus terríveis raios, o carro do Sol, o fantástico escudo de Aquiles, dentre outras maravilhas, foram obra desse deus habilidoso e trabalhador. Deméter e Possêidon (=Ceres e Netuno, respectivamente, na mitologia latina), divindades da terra e do mar Deméter é a deusa da terra cultivada: foi a primeira a usar o arado e fazer a terra produzir o alimento dos homens. Tinha com Zeus uma filha chamada Perséfone, que haveria de se unir ao soberano do rei dos mortos. Desejando que também o deus dos Infernos, Hades, se submetesse ao poder do amor, Afrodite pediu ao filho Cupido que o transpassasse com uma de suas setas, provocando nele o desejo. Cupido assim o fez. Perséfone, em companhia de amigas, colhia violetas e lírios brancos em meio a um bosque. Eis que Hades a viu, depois de ter sido ferido de amor, e, tomado de desejo por aquela moça, resolveu raptá-la e levá-la para seu reino sob a terra. Precipitou-se sobre a moça. Aterrorizada, Perséfone gritou em vão pela mãe e pelas companheiras. Mas o deus a colocou em seu carro puxado por cavalos e partiu em disparada. Quando soube do que acontecera com sua filha, Deméter sentiu terrível dor. Correu o mundo à sua procura sem conseguir encontrá-la. Enquanto peregrinava, abandonando o cultivo da terra, o solo foi ficando estéril e seco, impossibilitando aos homens tirar do chão o alimento. A queixa, através do mundo, era geral. Mas, finalmente, com seu carro, Ceres partiu em direção às regiões celestiais. Foi queixar-se a Zeus: – Venho pedir por uma filha que tem meu sangue e o teu, ó Zeus. Ela não merece ter por marido um bandido. – Mas Hades, a quem coube o reinado sobre os mortos, é meu irmão. Contudo, concederei que Perséfone volte dos Infernos, desde que ela não tenha tocado em nenhum alimento lá embaixo, porque tal lei estabeleceu o Destino. Perséfone, porém, já havia provado de uma romã. Mas a justiça de Zeus decidiu contentar a mãe aflita na medida do possível. Assim, decidiu que Perséfone passaria uma parte do ano com Deméter e outra parte do ano com Hades, nas profundezas do reino subterrâneo. Quando tem a filha consigo, Deméter se alegra, é primavera, e a terra renasce exuberante, as árvores voltam a produzir folhas e frutos; quando a natureza parece morrer, sem poder oferecer aos homens os dons do cultivo. Se Zeus reina sobre o céu e a terra, Hades sobre as profundezas da terra, Possêidon é o senhor dos mares e oceanos. Com seu tridente corta as águas do mar em seu carro de rodas ligeiras. Uma farta barba cobre-lhe o rosto, e a expressão do deus é séria e calma; mas quando ele se irrita, tempestades terríveis tomam conta do mar, a terra treme, ventos furiosos se precipitam sobre as
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