Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

revista sobre etnomatemática, Notas de estudo de Matemática

Scientif American

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010
Em oferta
30 Pontos
Discount

Oferta por tempo limitado


Compartilhado em 22/09/2009

leci-da-conceicao-marcondes-5
leci-da-conceicao-marcondes-5 🇧🇷

5

(3)

1 documento

1 / 94

Pré-visualização parcial do texto

Baixe revista sobre etnomatemática e outras Notas de estudo em PDF para Matemática, somente na Docsity! EDIÇÃO ESPECIAL “SCIENTIFIC a CRS Brasil EIN O AIN O Rar pos pe e e ETA E diferentes o CE ct E EU] métodos própriós de Solucionr problamas PEER] alia id hoje) | Ea E A sr É Aliados een jes Tata NEI nt LER | | RR | RR (o Elcio: | E RR pone 1 TaizanAta ao fe mai ia “ | crop PURE e de Ed Já 4 id al as cordas com nós —— a I RT PA e NA uiGUE serviço dos EPI 1” [A jr v Quadrados mágicosna, terra do Islã [te PAR Atradição feminina, SR p= Ae QU o oo E] | Brasil o | A sabedoria dos E Su dude TE A SCIENTIFIC AMERICAN prasil wmmesclam.com br ENRETOR GERAL lodo Matar UNRETORAAD JUNTA, Ana Luna fatia EDIÇÃO ESPECIAL ETHOMATEMÁTICA REAÇÃO [recacooariamisduarnediial com x] EDITORA Losraknapç EDITORES ASSISTENTES: Rafael F. seia Esovama ral EDITOR DE ANTE: GorsoniGames Martins ASSISTENTE DE ANTE: Marina do Diria Lemos: IEOINOGANFIA: Petra Stefani Diva [esendenação. Sara Alencar e Sdvia Nastasi | asesstentes | PRIDQUIOR GSÁFICO: Daltro Hascimento ratio Beting, duo Maveçru de Dia, Morento az eMariy M Peres REVISÃO: Entrada (encedenação) (ude Antero Manta Qrachio Pataret Saudo Hrieger e Spears Gamberadio Score Ai EDITOR 8 CHIEF: dotar Rerendo EXECUTE ESNTOR Marte DiCttina MEANLALGIN; EXATORS Michele Press ASSISTANT MAMAGINE ELNTOA: Bichit Arcirs NEVIS DITO: Pp Yam. SEEC PRECOS EDITOR Gary Ste EANTORS: Mari per, Seven tv Geno P Cola, CangiEcroR See = Nino Grp bmate ART OIE CIO Eva Bt ASSCUE PURILISHER, PROQUE TON PRODUCTION EDNTOR: Fera ant PRESIDENT ANDICHEF EXSIUIE OFFICER: renchen 6 Teehgracher VICE PRESIDENT ANO MANAGNG INRECT OR INTERNATIONAL: Dean Sancdorsos CHAIRMAN John Sagem Sm Ao Um pula ão a Eur, Sereno Dão Estatal Lada, empreendimento conjunto das editoras Segmento a Escuro, sc Eeonça de Selentsc American, Inc Riva Cunha Gago. 412-con| 13- Feheiros -São Paulo - SE CEP.DSABIAOS -Fel/Fue (11) 3029.5533 Duetto Jorge Comet, Esfera Comi, st Fernando Pesa Ale Host PUBLICIDADE Ipublicidadesciameldueiioedinorial com br] DMRETOR DE PUBLICIDADE: Amnato Ressano dna Maria Rambo [assistente comescios) AXELUTINOS: Kátia Zaratin Santocemer, Mila Smotari Spevandeo, Rogéria (Nfveisa MEPRESENTANTES DE PUBLICIDADE BRASÍLIA Singulane Publicidade - Magda Dias [51344-518 Ce. [61) 9982-7409 (hrnsdia Decitorasegmenta com tu) CEARÁ MARANHÃO E PIA Holanda Comunicação - hgimira Holanda 1895) 3224,2067/3224:2367 [ngholandaiPsghelanda com br) PARANÃ E SANTA CATARINA. Dioeção de Produsos - Euclides de Divolra [44] 2294648 [euclidos Exip pe combe] Fra raro do Sud: LA, Glanoru Com, Regus, LIDA = Roberto Hodrigues. [51] 3308-2212 Egianonittganoni com be) Vilar Sherman. INTERNATIONAL SALES MULTEMEDOA, INC. Ted: 41407-983 5000 findoifmuitimedtasea cem) PLANEJAMENTO E CONTROLE DXRETOR: Marcia vo Martes MansErna DIRETOR: André Fei ErAmata VEREDAS AULAS: Casta Lemos [coseeriação] ASSINATURAS: Fátima de Oliveira [coordêração) a Daniela do Oljeára PLANEJAMENTO E XTERINET. Mariana Moré [ coordenação) PROPAGANDA: Casolina Conde PROMOÇÃO: Súvia Campos: CENTRAL DE ATENDIMENTO AQ ASSINANTE BRASaL: [44] 3036-560 [atenesmentols duntromitoioLcom br] NOVAS ASSIMATUBAS: [gorevassicafBihusttoedlitoril com be) NÚMENOIS AMULSOS E EDIÇÕES ESPECIAIS: (tienesavatrastl duottosditocial comb] PORTUGAL: CREATIVE SALES — Tolo [24] 2936555 Fax: (21) 3936559 [ssinoturasiere ativesades pa) MDA [ouvidoria duetrondinorial com.br) Edição Especial Scloptie American Brasiln” 81, 55H 4620-5229 Distribuição com onciusiridade para todo a BRASIL: 1inap SA Estrada Velha do Dsasco, 132. Números avulsas podem ser solicitados so seu fesnaleiso au na cerrada atendemoro do leitor [11] 3934-5641 ao preço da última neição acrearido dos curtos de postagem. Diclinuição com excede em PORTUGAL: Midusa: BHETOR RESPONSÁVEL: Alfredo antas ALGUNS DIAS ANTES DO fechamento desta edição estava conversando com o professor Vanísio Luiz da Silva, um dos nossos colaboradores no especial, e ele disse algumas coisas que sintetizam por que é tão importante falarem emmomatemática, Ele explicou como às vezes é dificil lidar com a resis- tência que alguns matemáticos têm em aceitar esse ramo das pesquisas. Essarixa se refleieementraves paraaimple- mentação de propostas educacionais que levem em conta olado histórico, cultural antropológico dessamatemática quevem do dia-a-dia, da dinâmica familiar, dos ancestrais de cada um. “É uma visão de mundo anterior, que nãoé nem maiscertanem mais errada que a matemática tradicio- nal, masque devescrlevada em contana horadeensinar”, Por que ernomatemática? defende Silva, co-autor do artigo sobre a “matemática mítico-religiosa-corporal do negro brasileiro”. Para ilustrar seu ponto de vista, ele contou a dificuldade enfrentada por professores “brancos” que foram ensinar contas para uma mibo de índios quetem uma forma peculiar de encarar as unidades. “Se cles têm várias coisas iguais, por exemplo, várias bananas, e uma laranja, eles contam como se tivessem só duas unidades porque as bananas, por serem iguais, representam uma coisa só. Não adianta tentar ensinar que ali existem dez coisas sem levar em conta essa cultura anterior.” Esse modo próprio de compreender o mundo com uma visão matemática é espe cialmente rico no Brasil. Tal característica pode ser encontrada não só nos índios, como também nos negros, nos sem-terra, até mesmo na conta do menino que vende bala no semáforo, como mostra a professora Maria do Carmo Demite em seu artigo. Por isso, nos preocupamos em enriquecer esta revista com textos que retratem a emomatemática brasileirae discutama sua abordagem em sala de aula. Pioneiro dos estudos nessaárea, o professor brasileiro Ubiratan D' Ambrosio, que escreveo amigo de introdução do especial & prestou uma assessoria técnica para à confeeção de todo o material, resume essa idéia: “a matemática é a marca da civilização humana em sua pluralidade”. Aolongo das páginas da revista, mostramos que povos de todas as partes do riundo desenvolveram um método próprio de contar, de medir, de marcarotémpo, de entender o Universo, Alguns são de uma genialidade que impressiona até hoje pesquisadores das nais diversas áreas, É o caso, por exemplo, dos incas. Eles criaram um complexo siste ma de nós em coidas, us quipos, que não só regisravam a contabilidade das transações comerciais e as datas comemorativas como talvez tenham sido uma forma de escrever a língua quíchua. Mais impactante ainda é descobrir que há 20 mil anos algumas mibos africanas desenvolveram um pensar matemáticoe registraram seus “números” com riscos em ossos (vor imagem acima). Aproveite essa viagem e tenha uma boa leimira! Giovana Girardi redacaosciamêPduettoeditorial com br SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 3 1 Ponto de Vista | Õ INTRODUÇÃO Volta ao mundo em Por Ubiratan D'Ambrosio maté E Es E as Incas, egípcios, maias, celtas, inuítes, papuas, pigmeus, indianos, chineses, japoneses. Todos esses povos inventaram sua própria maneira de contar e medir matemática é quase tão antiga quanto a espécie huma- na. Bem antes da invenção dos números, os primeiros homens tiveram de desenvolver métodos para resolver problemas cotidianos, como localizar-se no tempo eno espaço, e para tentar descrever e explicar o mundo físico, Eles cria- ram maneiras de comparar, classificar ordenar, medir, quantificar, inferir — elementos fundamentais que a tradição cultural ocidental nomeia matemática. Mascomo esses formidáveis meios de investigação se desenvol- veram? Os primeiros elementos de resposta delinciam um paralelo entre sua emergência e a da linguagem, das ferramentas, da are, da música e até do humor. Desde tempos pré-históricos (ver artigo “África, berço das matemáticas”, pág, 42), os humanos acumulam conhecimentos para responder a suas necessidades é seus desejos. Essas respostas dependiam, em grande medida, das regiões e das culturas. Assim, os povos das florestas elaboraram meios de medir terrenos diferen- tes daqueles dos povos das pradarias, é portanto desenvolveram geo-metrias (medidas da terra) diferentes. Aqueles que viviam nas proximidades da linha do equador percebiam dias e noites de mes- ma duração durante todo o ano, enquanto os que viviam além dos trópicos eram testemunhas do efeito das estações sobre a duração dosdias e das noites. Além disso, os calendáriose, portanto, osmeios de organização do trabalho, da urbanização e de numerosas ouras práticas, se distinguiram conforme as regiões. No final, diferenciaram-se tanto as estratégias de organização de quantificação como os sistemas de numeração. Por essa razão, o sistema de contagem des índios mundurucus, no coração do Brasil, nos mostra que não é necessário saber contar além de cinco para & SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL viver em harmonia com o ambiente, Matemáticas como essa, que surgiram em contextos naturaise especificos, são o objeto de estudo dos emomaremáticos, No final do século XV e durante todo o século XVI, as nações européias — sobretudo Espanha e Portugal, seguidos de Holanda, Inglaterrae França — estabeleceram colônias em quase todo o plane- ta. Como impulso do regime colonial, os meios locais de produção e comércio foram alinhados ao modelo europeu. Simultancamente, as especificidades intelectuais dos povos conquistados foram, na maior parte dos casos, ignoradas e, às vezes, proibidas. ASubordinação Histórica Dessa MANEIRA DESAPARECERAM, Ou quase desapareceram, os modos tradicionais de medida, organização e quantificação dos conjuntos des objetos, do mesmo modo que as linguas, asreligiões, a medicina e tantas outras expressões culturais. Na América do Sul, as técnicas de numeração dos incas (verartigo na pág. 20) e aaritmética maia(vertextos na pág. !6) não sobreviveram à conquista espanhola: Numerosas outras tradições matemáricas — como a dos sonas, na África subsaariana (ver texto no pág. 68)- também sumiram no século XX ou estão à caminho de desaparecer. O fim da era colonial foi marcado pelo renascimento de culturas ignoradas por séculos, e nos últimos anos temos resgatado uma ex- plosão de novas formas de arte, de práticas medicinais, de religiões e de costumes, Mesmo linguas esquecidas (às vêzes proibidas), são hoje novamente faladas. Para outras, infelizmente é tarde demais. Essa renascença teve seus pioneiros. No primeiro quarro do século XX, o historiador Oswald Spengler apresentou sua visão da história: “Não há uma escultura, uma pintura, uma matemática, ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA RE SCAGDA E SAS MA, uma física, mas muitas, e cada uma é essencialmente diferente das auiras, é limitada no tempo e autônoma, da mesma maneira que cada espécie de planta tem sua flor ou fruta particular, seu desabro- chamento e declínio”, Diversas décadas mais rirde, uma referência mais direta a outros enfoques da matemática foi revelado pelo algebrista Yasuo Akizuki: “As filosofias e as religiões orientais são de natureza difereme das pinar que existam diferentes modos de pensar, mesmo no campo da matemática. Não deveriamos nos limitar à aplicação direta dos mésodos atualmente considerados na Europa e na América como os melhores, mas estudar de periovo ensino da matemática na Ásia. Tal estudo poderia se mostrar inte- ressante e frutifero para o Ocidente e para o Oriente”, acidentais. Posso então ima Intercâmbio Cultural Mundial... ÁsTROCAS ENTRE EUROFA, Ásia é África do norte foram intensas desdea Amtigiiidade, mas foi realmente com as grandes navegações dostculoXV queo horizonte cultural se expandiu a todo o mundo. Asrepresentações dos visitantes estrangeiros foram incorporadas ao imaginário coletivo dos indigenas, ao mesmo tempo que as narrati- vas dos viajantes inflamavam o imaginário europeu. Às novas terras deixavam entrever novas riquezas. Os europeus entra- quecem o poder de negociação e a resistência das populações locais por alianças comerciais. Simultancamente, missões religiosas ecivilizadoras conso- lidaram a conquista. O roteiro foro mesmo em todo lugar. Assim, antes que o Japao se fechassc por diversos séculos, portugueses e holandeses riva- lizatam por acordos comerciais no pais. À vantagem foi dos pri- meiros enquanto 6 catolicismo foi tuleradoe dos segundos após essa religião ter sido desfavorecida. Ao mesmo tempo, indiferentes às disputas comerciais dos europeus, matemáticos japoneses discu- tam entre si com suas tábuas votívas, mantidas nos remplos (Der "A geometria a serviço dos deveses no Japao”, pág. 30). O periodo colonial propagou a civilização ocidental por todo o planeta. Instituições sociais, políticas é econômicas de origem européia se tomaram universais. Sociedades adotaram objetivos de progresso e de desenvolvimento, quantificados de acordo com os iss propostos pelas potências colôniais. “gável centralismo cultural dos ceidentais é ilustrado pela pio que sempre destacou um único lado do encontro de cris- tãos e muçulmanos após as cruzadas: os europeus incorporaram WIN VILSCIAM COM BR as componentes interessantes da cultura islâmica, nada mais: Eles esqueceram os quadrados mágicos (ver artigo na pág. 36) eos poemas matemáticos (púg, 0) que os árabes redigiam “para descansar”. Não havia muito espaço para quem não partilhasse a cultura, vcomporamento e, em numerosos casos, os mesmos valores dos europeus. Essa distinção é particularmente clara na matemática. Reencontraro conhecimento das civilizações desaparecidas ou de povos marginalizados no grande tabuleiro da globalização é apro- fundar a compreensão da matemática em seu maior sentido. Ela não nasceu de um estado primitivo que teria evoluído uniformemente em direção à matemática ocidental. Segundo essa opinião “européia”, um sistema que se desenvolve em uma cultura à parte da corrente principal é, na melhor das hipóteses, visto como algo intrigante ou como um ramo folclórico. Muitas histórias fundadas sobre descobertas arqueológicas can- mopológicas mostram que diversas atividades requerem o desenvol- vimento da matemática; arquitetura (ver "Fractais urbanos africanos”, pág. 66), recelagem, agricultura, decoração, atividades religiosas (ver "A arte dos adivinhos de Madagascar”, pxjy, 72), música (ver “Música e Ritmos”, pág: 60), 0 estabelecimento de calendários etc. Em consegj a, encontramos | Vestígios de atividades mate- áticas em todos os cantos do mundo. Por quenão os explorar, porexemploinmoduzindo-osna prática escolar? Cultura Matemática PARA ALGUNS críricos isso seria inútil com base na alegação de quetaisatividadesse restringem ao campo lúdico. Sem dúvida as estudantes em busca de um emprego serão avaliados porseu conhecimento da matemática clássica. Noentanto, aeducação é mais que uma transmissão de instrumentos utilitários direcio- nados para o sucesso profissional. Ela deve valorizar a diversidade cultural e desenvolver a criatividade. Oensino da matemática pode ter uma importante contribuição na reafirmação e, em numerosos casos, na restauração da dignidade cultural das crianças. O essencial do conteúdo dos programas atuais tepousa sobre uma tradição estrangeira aos alunos. De outro lado, clesvivem em uma civilização dominada pela matemáticae por meios de comunicação sem precedentes, mas as escolas lhes apresentam uma visão de mundo bascada em dados. Como a ernomaremática pode ajudar na pedagogia maisampla noséculo XXI? Há uma tendência a uma visão simplista dessa área. Façamos uma reflexão maior sobre a natureza do saber. SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 7 O conhecimento é criado e organizado intelectualmente pelo indivíduo em resposta a um ambiente natural, cultural e soci depois de ter sido difundido pela comunicação, ele é organizado socialmente, tómando-se assim pare integrante de uma comu- nidade (uma cultura), essencialmente por reconhecer e explicar fatos e fenômenos. Observadores, cronistas, teóricos, sábios, universitários e “guardiões do poder” se apropriam desses co- nhecimentos, classificam-nos e dão-lhes uma etiqueta, antes de e difundi-los. Assim nascem as formas estruturadas de conhecimento: a língua, a religião, a culinária, a medicina, vestimentas, os valores, a ciência, a matemática, todas interdepen- dentes eem resposta à percepção da realidade desse ambiente. E: conhecimento, “congelado” em estruturas coerentes, é transmitido e difundido pelos agentes, em particular os professores. Ao reconhecer “mais de uma matemática”, aceitamos que exis- E | Cultura dos indios! PERA O opa Tu Guatiemald + E e du SULA ciais e rom PE] Ea DE temdiversas respostas a ambientes diferentes. Do mesmo modo-que há mais de uma religião, mais de um sistema de valores, pode haver mais de uma maneira de explicar e de compreender a realidade. Matemática e Antropologia AMATEMATICA OCIDENTAL sempre se desenvolveu àdopovooudas profissões, isto é, à emomatemática. Na Idade Mé- dia, porexemplo, os artesãos desenvolviam suas medições de modo diferente às dos monastérios e universidades. E ainda o caso hoje, encontramos a matemática onde menos se espera, por exemplo nos curtumes e nas sacolas de entregadores de jornal. A história prova sua parcialidade ao não reconhecer que uma nova emomatemática era à etapa preliminar pela qual passavam as novas práticas e teorias antes de serem incorporadas pelaciência. Eis a razão por que a área deve abordar a antropologia ca história oral. Basdrados ER em EL E L.DUAS PÁGINAS DO códice Tro-Corteslanus, mantido em Madel Hesse almaraque gado à apicultura [os obelhos estdo em vermelho), as datas indicadas por pontos e barras são as da calendário religiaso, chamada do ranlhin pedra”abandonadas havia séculos: foi um dos primeiros a entrarem umsitiomaia. Em 1787, voltando de Palenque, Antonio del Rioredi- giu um relatório com numerosos mapas e medidas dos monumentos. Em 1836, o advogado americano John Lloyd Stephens encontra o desenhista inglês Frederuck Canhenwood, e ambos partem a Yucatân. Em julho de 1840, voltam a Nova York. Stephens publica ali, em 1841, Incidents of Tiwoel im Central America, Chiapas and Yucatán. Olivro causa sensação. Os dois homens revelam ao prande público a civilização maia com sua arquitetura, sua escultura, seus afrescos, suas estelas, sua escrita. E ali dão im a elucubrações fantasiosas. As Primeiras Decifrações A DECIFRAÇÃO DA ESCRITA maia começou pelas datas e durações dastextosastronômicos. À essa altura, jácra admitida a idéia de quea América amiga havia produzido-civilizações tão importantes quanto as do Velho Mundo, À redescoberta dos códices e das inscrições gravadas, junto com a da obra de De Landa ea de textos indigenas posteriores à conquista, marea o início verdadeiro das decifrações. Osprimeiros trabalhos revelaram que os maias utilizaram um sistema de unidade de tempo e dois tipos de numeração de base 20: com- preende-se uma unidade principal, o tum (um ano de 360 ou 400 dias), seus múltiplos, como o hatun (20441), 0 bakstan (ADO tun ou 20 featien) cre. e suias duas subunidades, o sinal (mês ou 1/18 de tum) e WWW.SCIAM.COM BR okin (diaou 1/20 de sinal ou 1/360 de tum). Uma das nunicrações é posicional e destinam-se à notação de algarismos isolados, a outra é não-pesicional e liga cada algarismo à indicação da unidade que ele determina. Os deis tipos de numeração possuem zeros, tanto na posição final como na posição interior, O único uso amplamente atestado das numerações maias é a notação das datas e durações. Desse ponto de vista, os maias se dis- tinguem dosincas, que tinham vegistrosda administraçãodo império. Os monumentos e os códices maias mostram esses conhecimentos numéricos aplicados aos calendários e às efemérides dos principais planetas vistos a olho nu. 4 5 5 2 8 9 . | ou [eua nous es | | | | | “ 15 = | 7 » | 8 . | e | 004 [ums 00% | | | | e | | | o | | | 2 O SISTEMA PONTO-BARRA, Criado quatro ou tic séculos antes de Cristo, era utilizado pelos mesoamericanos para representar números de 1 a 19 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 14 Dias. do calendário religioso [5] CIMI g CHUEN E MANIK g EB LAMAT [E BEN AKBAL E KAN MULUC IX CAUAL | Ei g E CHICCHAN [| DL EM MEN 7] AHAU b Meses do calendário chal am Br g 2x E Pa | a” gr” E IMIX E Ik [] ciB a CABAN H EZNAB KAaraB 8 CUMHU Z0TZ CHEN KANKIN : TEC & VAR 8º MUANT ã LArES 3 Es SEAL SA Dreligioso, chamado de trúlkin, é baseado em dois ciclos, um de 13 posições ou números, materializado pelas algarismos de 1 a 13, e outro de 20 nomes de dias (tobelo 0). O calendário civil, chamado de hacb, di constituído de 18 “meses” [tabela b) de 20 dias e de um periodo de cinco dias, adlayeb: Os calendários se combinavam, e uma data se exprimia sob a forma ciX PY, em que ct é o coeficiente [entre 1.613), X o dia religinsa, [ho indicador do dia [entre De 19, ou entre De 4 para o Uogab e Y o mês civil VAXKIN a CEH MOL MAL Osistema "ponto-barra” (cer figura 2), característico das culturas mesoamericanas, jácra conhecido dos olmecas, mas não foi utilizado pelos astecas. Sabemos pelos Livros de Chilam Balam, redigidosem 1793 por um nativo aculturado, que os maias utilizavam pontos e barras para representar os inteiros de 1a 13€ também que vano eraa unidade principal de medida do tempo. Todos os especialistas verificaram a legitimidade dessas informações para compreender a estrita maia dos inteiros de 1 a 19. No fim do século XIX, Emst Fórstemann descreve precisa- mente o uso desses algarismos na notação das numerosas datas e durações do códice de Dresden. Ele observa quea coréurilizada paradiferenciar os números que representavam datas, escritas em vermelho, das durações, escritas em preto. Por exemplo, em um dos diversos almanaques do códice de Dresden, encontramos a sério: 13-Ahau + 99-Milue + 11 7-Ahat + 6 1-Ahau + 10 TI- Ok +15 13-Chicchan + 99-Ix + 11 7-Chicchan + G 1-Chicchan + 10 11-Men + 15 13-00 + 9 9-Cuuac + 11 7-0 + G 1-Oc + 10 H-Abate + 15 13-Men + 99-Kan + 11 7-Men + G 1-Men + 10 N=Chicchan + 15 13-Ahau, Ele descobre que tais segiiências descreviam um curso no tempo: partindo da data de origem 13-Ahut, chegamos em nove dias (+9) à data 9-Muuc, de lá em 11 dias (+11) chegamos à data 7-Abau, depois em 20 dias (marcado G) à data 1-Ahau etc. Esse curso percorre exatamente umanoreligioso, chamado de tzolkin, de 260 dias, que se encerra seguindo um percurso em quatro etapas de 65 dias, cada uma composta por passos de 9, 1, 20, 106 15 dias, Ao perceber que 9+11 = 20 e que 10+15 = 2045, pode-se supor que os diferentes passos de deslocamento nesse almanaque poderiam tersido motivados pela idéia deaproximartão bem quanto 12 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL possívelo percursonoanosolarde 18 mesesde 20 dias, completados porum período de cinco dias chamado de Uapeb. Percebe-se também que os números das datas registradas pelo escriba se deduzem unsdos outros portma adição mádido 13(7+20 = 1, 1+10= 11, 11+15 = 13) e que os momes dos dias se deduzem por uma adição módulo 20 (Ahau + 20 = Ahau). Esso está ligado à natureza das datas maias (ver figura 3): os 20 dias (ordenados) X do ano religioso são afetados por um número e variando de 1 a 13, deforma que cada uma das 260 datas religiosas é da forma cx. Deduz-se que +13 (ou +20) opera como uma translação que deixa invariantes os números ct de uma data religiosa. O glifo marcado por G representa o número 20. Fomecendo um novo número de apoio aditivo, esse simbolo estende, assim como os algarismos romanos X e €, a capacidade do sistema “ponto-barra” e permite escrever números superiores a 20. Para representar do número 21 ao 39, os escribas prefixavam um dos 19 algarismos “ponto-barra” ao glifo G, que se lia uínic, “homem”, oukal, “vintena”. Sabia-se, especialmente pela obra do bispo De Landa, que a numeração maia, falada e escrita, era toda de caractere vigesimal, Eórstemann mostrou que os 19 signos precedentes, eseritos na morfologia “ponto-barra”, eram utilizados, fora dos almanaques, paramarcaros algarismos dos números que representavam períodos grandes e muito grandes e que, nesse uso, os maias haviam adício- nado um 20º signo, um zero, cardinal, frequentemente escrito em vermelho nos códices. Esses 20 algarismos (de 0a 19) eram utilizados para representar númerose, assim, eferuarcilculosaritméticoseiou pôrem evidência os resultados obridos. Tememos por exemplo a página 24 do códice de Dresden. Além de uma tabela de 16 múltiplos de 2.920 (cinço vezes 584, número de dias do ano venusiano) e de quaro múlti- plos de 260, essa página contém, embaixo e à esquerda, em três colunas adjacentes, algarismos que formam três números — 6.2.0., B9,160.0, e 9.:9.9.16,0. Esses números vigesimais se transpõem mecanicamente em numeração decimal (6.2.0. = 6x360 + 2x20 + 0= 2.200; 9.9.16.0.0. = 9x144.000 + 957.200 + 16%360 + 0420 + 0 = 1.366.560; 9,9,9.16,0, = 9x 144.000 + 2x7,200 + 9x360 + 16320 + 0 = 1.364.360). Eles são religados por uma relação sim- ples: o terceiro é a diferença do segundo e do primeiro 9,9.9,16.0. =9.9.16.0.0.-6.2/0.(1.364.360 = 1.366.560 - 2.200). Duas Sintaxes Os NUMEROSOS EXEMPLOS contidos nos códices confirmaram à hipótese de que essa é uma numeração de posição. No entanto, a escolha de umano de cálculo de 360 dias ( 18 meses de 20 dias) gerou muita discussão e ainda condur certos autores a não reconhecerem queos maias inventaram uma verdadeira numeração de posição, com um aero que não vem de um simples branco de separação. Um fato notável é que os escribas maias usaram de modo pertinente as duas dimensões da página. Fizeram isso distinguin- ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA do o espaço (horizontal) de separação dos constituintes de um número. No contexto maia, não confundimos jamais os números a Are, Ostesultados obtidos foram utilizados para decifrar as inscrições em monumentos. Dife- rentemente dos códices, nas estelasenas cons- truções as durações são representadas como “números de”, isto é, por notações em que os algarismos sãoseguidos do nome das unidades que eles denominam: por exemplo, 9-baktan 17-hatum O-tem O-uinal O-kin aparece na estela de Quirigua (ver figura 4), e não 9.17.0,0.0.. como seria escrito em um códice. Essa duração equivale a 1.418.400 kins, ou dias. Os constituintes numéricos são escritos em ordem decrescente (mais raramente crescente) dos glifos de ponto ou unidade de tempo. Os zeros, redundantes nesse sistema numérico de disposição, são entretanto sempre escriros, tan- to em posição final como em posição interior. Os escribas utilizavam, além dos algarismos “pomo-barra” um segundo jogo de algarismos cefalomárficos (em forma de cabeças). A maior parte das durações era representada por nú- meros com cinco algarismos, começando por um 9 (quatro pontos cuma barra) ou poruma “cabeça barbuda”. Esse glifo cefalomórfico devia ser 0 9 do segundo jogo de algarismos. Excepcionalmente, os maias representaram os coeficientes das unidades de tempo por personagens inteiros, Esse sistema não difere fundamentalmente do cefalomórfico e não foi difícil decifrá-lo. A exemplo do sistema posicional, inumeráveis verificações confirmaram as hipóteses da decifração das durações marcadas em sistemas não-posicionais de estilo normal e de estilo cefalomóriico. Os Calendários Como seus vizINHOS mesvamericanos, os maias tinham umano religioso de 260 dias, 0 tzolkin. Cada dia era designado por uma expressão da forma LX, composta por um número «1 e um nome de dia X, obtido pelo produto de dois ciclos. Os números c: são os imteiros de 1 a 13. Os nomes dos dias constituem um ciclo de 20 elementos (ver figura 3). Como nossa segunda-feira 3, terça-feira 4, quarta-feira 5, os números é os nomes crescem ambos em uma unidade quando se passa de um dia ao seguinte. Os maias tinham também um'anosolarde 365 dias, o haab, com 18 meses de 20 diaseum período complementarde 5 diaschamado Uiyeb, Cada dia do ano solar era designado por uma expressão do WWWLSCIAM.COM BR Gilfo introdutória. À cabeça gratesca, do centro, designa o “mês” do ano civil em que cai a data indicada; aqui, é Cunha Encontra-se a indicação do mês de Curnhu no última glifo, embaixo ed direita, mas gols uma outra forma IF KATUNS Aitw20xaÚ dias. [= 122.400 dias) SUÍNA OxZ0 dias Posipãn do mês lunar emçurno no semana hunar [aqui 2º posição) Significado sescanhacida o) 18 cume CALRSRES mta do calendário civil) 4 DATA DE CONSTHUÇÃO da estoia do Quirigua Após um glifa introdutória (a), que indica o mês em que o monumento foi crguido, lá-sa nos cinco primeiros ghifos (b) a númeso de dias transcosidas desde o início vá era maia, contados er anos de 360 dias e em base 20: 9 boitun 17 kaqun O tum Q viral Din [1.418.400 dias), Trata-se de uma numeração de di ição, mas que inclui um zero [cardinal), Lê-se também a data fc) do calendário religioso [13 Ahou Jo a data do calendário civil fa, indicada embaixo [ 18 Cimmhu ; e datas cuja <igrificado teria sido passível deduzir dos glifos precedentes tipo PY (constituído de um número [3 e de um nome de mês Y), obrida pelo produto desses dois ciclos. Os números fi dos dias são os inteiros de O a 19,€ os números dos dias do período Uupeb são esinteirosde 0a 4.Osnomes dos 18 meses mais o do periodo com- plementar formam um ciclo de 19 elementos (ver figura 3). Como nosso à de julho, 4 de julho... os números crescem em uma unidade enquanto permanecemos no mesmo mês, senão O número passa a zero e o nome do mês é substituído pelo seguinte da lista. Uima data maia se apresenta assim soba forma XY, obrida pelo produto do ano religioso e de solar, por exemplo 4 Ahau B Cumbeu, Adata do dia seguinte será 5 Imix'9 Cumltu. A coordenação do ano religiosouX edo solar ['Y énipicados maias. O produro uXBY é por sua vez um novo ciclo, uma espécie de “superano” de 18.080 dias (o minimo múltiplo comum entre 365 e 260). Fala-se de um ciclo de calendário igual a 52 anos solares e a 73 anos religiosos. Quando se tem uma data de origem, pode-se identificar data SCIENTIFICAMERICAN BRASIL 13 Os maias, especialistas na análise numérica, são os únicos a ter distinguido o zero cardinal (indicador de quantidades) para contar durações do zero ordinal (marcador de posição), utilizado para as datas 1 ESCRIBAS maias faziam truques com datas e durações; ao lado, desenho em vaso do período clássico (séc. Nl aa 1X) mostra um dia de trabalho Os dois odasas línguas distinguem singularidade e pluralida- de, o que permite exprimir não são par, a unidade e a metade, mas também a ausência, a quantidade nula. Nesse sentido, os números são instrumentos univer- sais para a aventura aritmética. O uso do algarismo zero, porém, é uma curiosidade bem mais rara. Ele aparece somente em culturas com uma escrita numérica de tipo particular, a de posição, em que os números são registrados cor algarismos cuja ordem indica as quantidades a que ela se refere — por exemplo, as unidades, as dezenas as centenas... Até hoje, arqueólogos e historiadores descobriram quatro numerações escritas de posição com zero: na Mesopotâmia, na Mesoamérica, na Índia e na China. A mais antiga numeração de posição nasceu na Mesopotâmia, ligada às necessidades de contagem e de medida das primeiras civilizações. Era de uso corrente em 1900 a.€,, mas desprovida dezero. Os escribas se contentavam em deixar um espaço branco emtre os algarismos. Como o espaço não era medido, uma série 16 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL Por André Cauty e Jean-Michel Hoppan eros maias de algarismos sucessivos podia formar números diferentes, mas a ambiguidade não incomodava os escribas. O primeiro zero conhecido apareceu tardiamente, na Babi- lónia, alguns séculos antes de Cristo, sob a forma de uma marca gráfica usada para indicar uma separação. Seu uso permaneceu limitado e não eliminou todas as ambigiiidades: sua ausência na posição final equivale a não conferir precisão à unidade em uso. O emprego desse primeiro zero, porém, não teve continuidade. Origens do Zero O zero que usamos hoje veio da Índia, onde uma diversão era nomear números grandes e caleular, por exemplo, combinações de versos possíveis segundo uma dada estrutura poética ou gramatical. Oxeroeraentão indispensável, e da palavra usada para designá-lo, sunpa (“vazio”), vieram nossos termos “cifra” e “zero”. Depois ele ganhou a Europa por intermédio dos árabes, mas pormuito tempo, essa numeração decimal foi tida como diabólica no Ocidente. ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA one Umavez que essa numeração foi aceita, a produção de outras civilizações ficou um pouco esquecida, Com efeito, a transparên- cia do sistema provoca a ilusão de que o número é uma abstração cardinal, que pura € simplesmente:se anotaria na superfície de escrita, sem tradução. Seria a numeração decimal o fruto de uma gênese ou de uma evolução necessária? Um bem universal? Essas convicçõessimplistas são falsas, pois, de um lado, ozero decimal não é universal — sua difusão planetária deve menos à necessidade aritmética do que à expansão árabe-muçulmanae seu legado ao Ocidemte, que também disseminou sua cultura. Além disso, o número não se reduz a seu aspecto cardinal, Ele possui outras facetas, em especial a ordinal e a fracionária. Por culpa de velhos reflexos emocêntricos, esse deslumbramento acaba obscure- cendoas realizações de outras culturas, como a dos maias da época clássica (do século IH ao IX). Restabeleçamos os fatos. Assim como seus predecessores, os maias parecem não ter tratado numericamente questões da administração de suas cidades: o escriba não mede as coisas ou os seres, mas clé anota datas e mede durações. Para esse uso, os exemplos de grandes números são abundantes. Os maias dispunham de dois calendários (ver artigo na pág. 10). Um religioso (o Izalkin), constituído de 260 dias, é outro solar ou civil (o haah), de 365 dias. A combinação dos dois calen- dários fomece a data completa de um dia, como a encontramos em numerosos documentos, marcada pelas quatro informações aXPY, por exemplo 4 Ahaw 8 Curmiku. O conjunto das com- binações rotaliza 18.980 dias, o chamado ciclo do calendário. WIWWESCIAM COM BR Os maias inventaram os glifos de ponto (similares à vírgula de nossosistema decimal), contmibuindoassim para aprimorar o sistema & para racionalizar a escrita das durações. Os glifos de ponto apre- sentam numerosas variantes que distinguem entre o estilo normal é ocefilomóriico (o signo tinhaa forma de uma cabeça). Graçasa essa concretização do sistema das unidades de tempo, os escribas maias exprimiam todas as durações sob a forma Zc;P). P, representa expli- citamente um período determinado e é afetado de um coeficiente, ocy correspondente (ver figura 3). Assim, a escrita “9,15,0,0,0. nos códices corresponde à escrita nos monumentos “9 balittens 15 atras Otcar O uinal O kin”, que indica todas as unidades sucessivas. À escrita não-redundante (ou concisa) obriga a escrever os coeficientes em uma ordem estrita e a marcar os zeros (o que os babilônicos não faziam). Por outro lado, a escrita redundante não obriga nem amarcar os zeros nem mestoa respeitar ordem, ainda que essa “facilidade” não renha sido utilizada. O sistema de glifos de ponto servia para exprimir grandes dura- ões, que podiam ser lidas como um tipo de data absoluta. Oriundas de durações, essas datas sãoanotadas de acordo com sua distância de uma origem arbitrária, Assim, toda duração Ec;P, podia ser traduzida por ciXPY evice-versa. Por exemplo, a duração 9-balztum 1 -katun O-tun O-uinal O-kin, ou 9.1,0,0.0,, na escrita dos códices conduz à data 6 Ahau 13 Yaxin dentro do Cielo do Calendário. Tais equações são numerosas nos monumentos do período clássico e mostram que os escribas maias marcavam todos os zeros sistematicamente, mesmo quando em posição final e ainda que eles sejam redundantes nesse ripo de notação de duração/data, SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 17 ZERO CARDINAL [DURAÇÕES) ZERO ORDINAL (DATAS) (o (e ç Estilo normal I 2. ESTELA 19 deUmeactún facima) omais antigo usado zero cardinal maia. LB-se a data [expressa paruma duração desde a origem dada] 8 boktun [azul 16 kótum fveemeslho) O tun O utnal O fin fuerdie), ou 2 de fevereiro de 352 segundo a comelação mais aceita (GMT) JA CLASSIFICAÇÃO DOS ZEROS maias [esq] evidentiao ser cardinal (empregado nas eurações) e 0 zem orinal [nas datas), Aforma dos zeros escritos nos-códices difere das des nas monumentos. Enfim, distingue-se o estilo novmal do cefalomóriico Zeros Diferentes Extri A APARIÇÃO DO glifos de ponto (séc. [lj e o do zero (séc. TV), es escribas maias se contentaram, como os babilônios, em não escrever nada quando uma unidade particularnão contribuia à expressão de uma duração. No entanto, ao contrário do uso babilônico, esse branco é verificado quando os zeros caem no fim de um número. Não resultava dai nenhuma ambigiidade, já que todas as unidades eram explicitamente inscritas. O rigor da análise dos números (as datas em lógica ordinal e as durações em lógica cardinal) e a precisão dos escritos condu- ziram os maias a distinguir dois signos de zero. Jamais os escribas confundiram as duas noções ou trocaram as notações, Assim como os outros 19 algarismos da numeração, o primeiro signo, ou zero cardinal, serve para formar à escrita das durações. Ele marca à não-contribuição de uma unidade particular. Sua mais antiga expressão remonta a 2 de fevereiro de 357 (ver figura 2). O segundo, ou zero ordinal, é mais antigo. Serve para marcar o primeiro dia de um ciclo que forma cada um dos meses do ano civil. É um número de ordem, um ranque, que se encontra na escrita de datas Y do lab, sempre seguido de um glifo de mês, como O Pop, equivalente a nosso 1º de janeiro. Os dois signos apresentam variantes e têm distribuições di- ferentes. Nos códices em que o escriba não escrevia os glifos de ponto, ozero cardinal é um algarismo que não deve ser precedido ou seguido por outro algarismo para formar a escrita de um núme- ro. Por outro lado, nos monumentos, o zeto é um determinante 18 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL (um coeficiente) e é seguido do glifo de ponto da unidade que não contribui, nesse-caso, à exp! jo-da duração. O zero ordinal não aparece jamais nesses contextos, mas sempre diame de um nome de mês para indicar seu primeiro dia. Noiniciodo século XX, o antropólogo Sylvanus Morley estu- dou essas distribuições e distinguiu os dois zeros. Ele classificou igualmente o conjunto de suas variantes cruzando o suporte (se era escrito em um códice ou em algum outro objeto) e o estilo (normal ou cefalomórico) da escrita (ver figura 3). Essa elassif- cação demonstra que esses glifos levam, independentemente do suporre e do estilo, à dois conceitos diferentes; os dois zeros maias. Às origens diferentes dos dois signos confirmam igualmente a O zero ordinal deriva da idéia de ascensão. de advento, capresenta poucas variações. O zero cardinal se associa à idéia de conclusão, de fim, de realização, talvez também de bifurcação: apresenta variantes. Por exemplo, em estilo cefalomórhico, o zero cardinal é caracterizado pelamão de conclusão, a qual pode tero polegar em direção oposta ou paralelo aos dedos: o nome de um lugar, gravado sobre um monumento (a estela E de Quiriguá) e na superficie 3 do sítio Q, provou recentemente que essas duas representações da mão são substituíveis. O fato de o zero cardinal maia evocar a idéia de conclusão permite compreender que ele admite a variante, paradoxal a um ocidental, de substituir o signo 20,0 que vemos na estela 5 de Pixoy: 0 zero cardinal foi representado pelo glifo do 20 lunar na inscrição 9-baktun 1 3-katun 20/0-tm 20/0-uinal 20/0-Kin. ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA da enfileiradas e presas em volta de uma feerfiguraao conhecidos como quichua, a língua do além de servirem para nume- s quipucamaposs, ave dos quip ptdões que estavam arm em Cuzco foi desmuida pelos iras ou por padres ndiavam ídolos e objeros de culto daquela Anatomia de um Quipo Os RAROS EXE tee que podemos admirar hoje nos museus foram encontrados em funerários, ais 08 incas eram enterrados com os ob- jetos que utilizavam quando vivos De acordo com os relato: por RUÍNAS DE UM BASTÃO inca [6 esq ), em Ingapirca, d recursos humanos ou nlimentícios tram enumerados, coma em toda o império, em livros contábeis originais: os quipas [á dir) dispositivos: ddos de cordas em que nós exprimem números, tre outras informações. Os quipucamayocs, isto é, os guardiões dos quipos, eram os únicos detentores do aber referente à confecção desses artefatos CIT asa e Ec R RES ESSES A ) Ê ; É q [A q Lu Do seda 14 UR SCIENTIF mr de la Vega, o amefato era constituído de uma corda espessa, a principal, à qual são ligadas outras de 20 a 50 em de compri- mento. Um quipo pode conter até 2 mil cordas. Se ele for esticado sobre um plano horizontal (ver figura abaixo), é possível observar que algumas dessas cordas, as pendentes, são orientadas em um sentido, e as superiores em outro (as amarras:são bem presas e não deixam dúvidas quanto à orientação das cordas), Algumas outras, as secundárias, são presas às superiores ou às pendentes, Por fim, a maior parte das cordas tem nós. Oqueelessignificam? Apesar de infor- mações recolhidas por cronistas espanhóis, o mistério não oi revelado até 1912, quan- do o americano Leland Locke descreveu um quipo do Museu de História Natural de Nova York (ver figura na pág. 25). Por causa dos escritos deixados por de la Vega, Locke sabia que o valor dos números codificados pelos nós dependia de sua posição ao redor das cordas. Cada uma normalmente continha três grupos de nós: um inférior, que ele interpretou como o das unidades; um central, para as deze- nas; é um próximo à corda principal, para as centenas. Suas hipóteses foram con- firmadas quando ele percebeu que cada grupo de cordas pendentes era enlaçado poruma corda superior cujo valor indicado correspondia à soma das outras. Três Tipos de Nó DessemoDo, arepresentação dos núme- ros sobre os quipos é similar ao nosso sis- tema de posição de base 10), no qual dispo- mos de dez simbolos distintos, os algaris- mos de 039. Em um número como 6,489, UM DURO é comstiuldo de uma corda principal, onde são presas cordas laterais par nós reforçados. Algumas são pendentes, outras são superiores. Porfim, cordas secundárias são às vezes presas a esses dos últimos tipos. E2 SCIENTIFICAMERICAN BRASIL 198 DIFERENTES TIPOS de nó representam os números em dal re a númera de voltas equivale ao número de unidades. [b = duas;e - cince, deito); es nós simples [2] representam as outras potências de 10,05 nós em oito (f] são utilizados para marcar uma unidade, pais um nó longo com uma única valia é um nó simples. cada algarismo corresponde à quantidade de uma potência n de 10, n variandode O, àdireita, eaumentando em 1 cada vez que se passa uma casa à esquerda. Por exem- plo, 6.489 é igual a 6.000+400+80+9, ou 6x0) 4x10?.8x10] 94101. Notemos que há sistemas posicionais que não são ligados à base 10, Por exemplo, os maias (verartigosnas págs. 8 e 14) contavam em sistema vigesimal, isto é, em base 20, euti- lizavam também um sistema posicional. Às cordas podiam conter três tipos de nó(ver ilustração na pág. 23): 0 simples, o longo (um simples pelo qual se davam di- versasvoltas antes de atá-lo) co nó em oito. Em uma corda, os nós cram repartidos em grupos de um a nove nós (encontramos nossos nove algarismos, exceto o zero), cada grupo sujeito a uma potência de 10, crescente à medida que se aproxima da corda principal, Na maioria dos casos, as unidades eram registradas por nós longos, nos quais onúmero de voltas indicava o número de unidades, enquanto as outras potências de LO etam marcadas por nós simples. No entanto, quando há apenas uma unidade, aparece um nó em oito, já que o nó longo com uma única volta é um nó simples. Nas cordas, ozero é indicado pela au- sência de nós em um grupo. As unidades são facilmente identificadas pelo tipo de nó, e os grupos são alinhados na mesma posição em todas as cordas, de modo que é fácil reparar as posições desprovidas de nós. Além disso, como não hã ambiguida- de para as unidades, às vezes percebem-se diversos números indicados sobre uma mesma corda. Conteúdo “Extranumérico" Esta pecIFRAÇÃO se limita ao aspecto numérico dos quipos e jamais foi con- testada. Por outro lado, e a expressão de idéias e fatos? O debate está longe de encerrado, Novamente, os cronistas, de la Vegaá frente dos quais, fomecem algumas: indicações. Segundo o historiador mestiço, podemos conhecer o significado extranu- mérico das cordas graças às cores — alguns ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA fios eram de uma única cor, outros de duas, de três ou mais. As cores simples e as combinações teriam, cada uma, seu próprio significado. Em alguns quipos, idemtificon-se a expressão do recurso armamentista de um grupo, emquea combinação de cores indica de modo hierárquico as armas: na primeira corda, as mais nobres, como as lanças, na segunda, os dardos, e depoisosarcos, as fle- chas, os maços, os machados « as fundas, O sentido da torção dos fios da corda teria igualmente um si cado. Giro para a direita representaria coisas posi- tivas, enquanto aqueles virados para a esquerda, coisas negativas. Tal sentido oculrona confecção resolveria o mistério da ausência de escrita; como uma civili- zação altamente elaborada — que esten- diaseu poder sobre um território na atual região do Peru, da Bolívia, do Equadore do norte do Chile e da Argentina — pôde se privar de esci É como imaginar os gregos sem língua. Gary Unon, da Universidade Harvard, sugere uma linguagem em código binário transcrita nas cordas dos quipos. Seria um sistema completamente inédito — ainda sujeito a debate — e radicalmente diferente donosso sistema de escrita. De acordo com Urron, cada um dos nós seria o resultado de uma sucessão de seis decisões (08 ar- queólogos do neolítico europeu falavam de cadeias operacionais). O nó deve ser feito de alpaca ou de la? A corda aponta paracima ou para baixo? No que conceme ás cores, Urron utiliza a terminologia e o simbolismo das 24 tonalidades ainda em uso pelos tecelões bolivianos. Norotal, o antropólogo distinguiu seis decisões binárias e uma de escolha múltipla (a cor). Por fim, o repertório de um quipo conteria 20x24 = 1.536 simbolos distintos de informação — maior que o da escrita cunciforme da Mesopotâmia ou que o dos hieróglifos egípcios, Um quipo seria, portanto, mais que uma pró-memória, Uron empenhou-se em informatizar todos os detalhes disponíveis e em tornar acessíveis esses dados a todos aqueles que WIWVLSCIAM.COM BR as ente 280 en) DQUIPO QUE LELAND LOCKE estudou levou à descoberta da chave da ão inca Ds incas contavam em base 10, segunda um sistema posicional. Os nós longos [em raro) representam as unidades, nas extremidades dos condães. Quando há apenas uma unidade, ela é marcada por um má em oito fem laranja) para não confundida com os nós simples que marcavam as outras potências de 1D [em verde, as dezenas; em vermelho, as centenas; em azul os milhares) À cada uma delas corresponde um grupo de nós, + as potências de 10 numentam da extremidade em direção à corda principal, Ds números codificados nas cordas supesiores são a soma dos. números das contas pendentes que elas cercavam desejassem se debruçar sobre o código. Em junho de 2003, Came Brezine, tecela e matemática, trabalhou em trans- erições de quipos encontrados um pouco antes em uma caverna próxima ao lago dos Condores, no norte do Peru. Lon- gas séries de nós eram quase idênticas em três dos aricfatos, mostrando que a informação era copiada de um a outro, do mesmo modo que 0s monges copistas da Idade Média reproduziam os manus- critos à mão. O conteúdo extranumérico é defen- dido também por Laura Laurencich Mi- nelli, da Universidade de Bolonha. Ela recentemente descreveu um manuscrito do século XVII, aparentemente de Joan Antonio Cumis e de Joan Anello Oliva, que conteria informações detalhadas so- breos“quipos literários”, No documento dos dois jesuítas, estavam intercaladas três páginas de desenhos assinados “Blas Valera” é um envelope onde havia um fragmento de quipo. Segundo Cumis, os quipos reais se distinguiam daqueles utilizados como pró-memória de contabilidade. No entanto, poucos teriam sobrevivido aos autos-de-fé dos espanhói Sobre o modo como a língua quichua era “escrita”, por méio des nós, Cumis aponta: “A raridade de palavras e de pos- sibilidades de modificar um termo com partículas ou sulixos permitiu aos incas confeccionar um dicionário sem papel, nem tinta, nem caneta. (...) Meu inter- logutor em seguida elaborou a lista das principais palavras bem como o modo de codificá-los em um quipo”. Talvez ainda estejamos longe de ler esses artefatos do mesmo modo que faziam, as quipucamapocs. Até agora, só as regras numéricas foram decifradas com certeza, e resta elucidar o mistério das combinações de simbolos, cores e posições. E Loie Mangin é redutor-chefe-adjúnto de Pour la Science, edição francesa da revista Setentmirio AMERICAN. [E TRT Crackingthe Khipu Code. Charles Mann emScience, vol 300, nº 5.626, págs. 1,650-1,651, 2003. Mathematics ofthe Incas: Code of the Quipu. Mar- Ela e Robert Ascher. Dover Edition, 1997 SCIENTIFICAMERICAN BRASIL 23 C jeitandoà maremárica o modelo geométrico do Universo assim concebido. Essa idéia, que influenciou por longo tempoo Islãea Europa, combinou-se com ateoria anterior de Aristóteles sobre aimu- tabilidade do céu e deu força à concepção deleis da Natureza fixas e de tipo matemá- tico. Quando Copérmico inverteu a antiga concepção geocêntrica ao situar o Sal no centro de mundo, a idéia de Prolomeu foi abandonada, após forte resistência. À idéia dasubmissão do Universo a leis matemáti- «as, contudo, continuava a reinar. “O Universo é escrito em linguagem matemática”, dizia Galileu, e aprender essa 26 SCIENTIFICAMERICAN BRASIL ECk A. Rg A , $ "AR TEE E nte pref báclo ; ERP RRR RE a |=]M bia É 2a [es A de jo AR jáp [2 a ESPADA | E | em js 3) | | iria PRE £| asim jemtir 8, linguagem permite compreender tudo. Essa convicção triunfou nos séculos XVII € XIX, com as leis da gravitação universal eda mecânica celeste de Newton. Comas idéias do inglês, o matemático Pierre Simon de Laplace pretendia conhecer teóricamen= te o estado do Universo em um momento qualquer do passado ou do futuro pela autoridade única da matemática. Assim, a panir da Antiguidade, o desenvolvimento da astronomia matemática fundada sobre a tradição grega se desdobrou para descobrir a verdade matemática absoluta, que daria acesso ao conhecimento tanto do estado futuro como do passado dos maiores corpos celestes e dos corpúsculos mais infimos. Os chineses também utilizaram à mate- mática como instrumento de análise racional para prever fenômenos astronômicos que não lhes pareciam irregulares, como as po- sições do Sol, da Lua e dos planctas, as fases da Lua, os eclipses (ver figura 5) é outros fenômenos. No entanto, eles jamais consi- deraram a matemática suficiente para realizar * previsões infalíveis. Ao contrário, pensavam que todo sistema de astronomia matemática preditiva era por princípio limitadoe deveria necessariamenteser “aposentado” apóscero período de tempo: Oschineses persuadiram-se dissopouco a pouco, percebendo, a partir de meados do século Il a.C, quesua matemática preditiva não conseguia sempre calcularcometameme A: CLÁVCIO PTOLOMEU [emboixo, desquenda) sobseu sistema de mundo na quala Terra está no contro do Univsrso, Essa figura Está ne infeio cia Epitormo do Alinagesto, do asirbnama alemão Regiomortanmus Inepaesentode em baixa, à direitos) 3. TRECHO DE ASTRUONÚMIA DANICA [Astronomia dinamarquesa), do astrónomo Christian Severir o), discípulo de Tycha Brahe, mostra que as movimentos. do planeta Marte sãos na século YVIL estudados com ousa de combinações de circutos, comona ema Idade Média, O movimento de Marto [4] ao redor do Sal [4] é descrito com a ajuda de dois epécicias, isto é, dai pequenas circubos. O primeiro dor circudo cujo certo [C) está situsado no grande circula, eo segundo, de centro À está stundo no círculo. precedente O ponto M representa a Tora, as redar da qual sa mevimemaria à Sol, Publicada em 1522, 0 Astronomia donico fol artaptado para a chinês [b] em certa de 1628, pouco tempo após sua publicação. A figura chisesa é a mesma, salva que as letras foram, substituldas poe caracteres dá escrita local. O teto é uma tradução das explicações acima as datas de fenômenos astronômicos regu- lares, seja aqueles que aimda não tinham acontecido, ouaqueles cujas datas jáestavam registradas nos antigos anais. Assim, nem sempre eles conseguiam prever os fenômenos celestes ou calculá-los remroativamente. Para tanto, eles se empe- nhavam em melhorar seus sistemas de predi- ção:o poder imperial favoreceu as pesquisas apconceder-lhes bons recursos financeirose ligando-as a serviços permanentes de equi- pes competentes durante séculos. O império chinês via na astrologia um meio de governo, graças ao conhe- cimento do futuro que ela pretendia fomecer. Como à astronomia € a mate- mática podiam ajudar à astrologia, clas foram objeto de uma atenção particular. Devido à idéia da ressonância reciproca entre o céu € a Terra por intermédio da figura do imperador (ver figura 2), even- tos teatrais anunciavam o que poderia no futuro acontecer de fasto e, sobretudo, de nefasto. Por exemplo; inundações ou revoltas campesinas eram sinais de uma troca iminente de dinastia. À intenção era a de que o imperador pudesse mudar o curso do futuro alterando sua política, se conseguisse um meio de saber sobre tais eventos antecipadamente. O poder imperial criou então um escri- tório de astronomia oficial cujas predições guiaram a política como se fossem as pesquisas de opinião atuais. Astrônomos e matemáticos foram recrutados é encar- regados de observar o céu, de construir instrumentos dé medida do tempo e de ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA observação, de anotar suas investigações edeelaborar sistemas de astronomia ma- temática preditiva. Competições Astronômicas Á FIM DE AUMENTAR as chances de êxito, foram organizadas competições entre siste- mas rivais de astronomia matemática, Por exemplo, no Tuanshi, à tratado de cáleulos astronômicos reproduzidos nos anais da dinastia mongol de Yuan (1277-1367), encontra-se uma avaliação estatística com- parativa da capacidade de seis sistemas de cálculo. Cada um deveria encontrar as datas, consignadas nos anais chineses da Antiglidade, de-49 solstícios de inverno ocorridos desde o periodo das primaveras e dos outonos (722 a.C, - 4Bl aC Jato ano 1280 — distribuídas num intervalo de mais de 2 mil anos. O sistema adotado sob adinastia Yuan calculaa data cometa em 39 casose falha em 10,0 modeloescolhidoera amelhorsem ser perfeito, pois seus cálculos não eram sempre bem-sucedidos. A superioridade do sistema escolhido era questionada com frequência: isso por- que seu poder preditivo, especialmente sua capacidade de prever eclipses da Lua e do Sol, degradava-se. O sisterna de Yuan, pro- mulgado em 1280, foi climinado em 1368, menos de um século mais tarde; após uma nova competição, organizada pela dinastia seguinte, à Ming (1368-1644). O novo sistemia foi julgado temporariamente melhor, mas sucumbiu em 1644, depois de ter sido posto em disputa com duas outras técnicas de cálculo, uma utilizando tabelas astronô- micas árabes € a outra, européias. Os exemplos precedentes são tardios, pois o mais antigo data apenas do final do século XII. Eles são, no entanto, repre- sentativos de uma situação que remonta à púmeira reforma da astronomia matemática chinesa, promulgada em 104 2C, Desde essaépocaaté 191 |, istoé, ara queda do re- gime imperial, os chineses reformaram suas técnicas de astronomia matemática SO vezes (em média uma reforma a cada 40 anos). À cada vez, as reformas eram selecionadas em competições entre sistemas rivais. WINWESCIAM. COM.BR O CALENDÁRIO CHINÊS OS MAIS ANTIGOS calendários chineses que chegaram a nós datam dos dois primeiros séculos antes do início da era cristã; são gravados sobre fichas de bambu ou pranchetas de madeira. Cinquenta outros são manuscritos ou impressos em papel; remontam aos séculos [Xe X As origens do calendário chinês são, no entanto, muito mais antigas e remontam ao reinado arcaico dos Shang [1600 5.€..1100 3), quando os chineses: a contar bs dias cicllcamente por grupos de EO, número resultante da ão simultânea de duas séries de símbolos, uma de 10 sipnos [os 10 wonços] e outra de 12 [os 12 galhos), associadas aos 42 animais frato, boi, tigre ete. |, a partir do século Vil. ho longa do milênio seguinte, esse sistema de numeração foi gradualmente enriquecida de uma representação hinissolar empírica do ternpo, bastada também em um ano. solar [0 ana das estações) e em um ano lunar de 12 meses de 28 ou 30 dias sincronizados com 0 Sal graças à inserção ocasional de um 13º mês lunar [Um mês intercalar].A panirde 104 aC o calendário se tornou monopólio do Estado e começou a depender de cálculos matemáticos constantemente reformados: 05 mais antigos dapenderam detoda sorte de ciclos luniesolares [ por exemplo, um ciclo composto de 391 anos com 144 meses intercalares), mas 8 mais comum envolve cálculos cuja complexidade. Frequentemente excede o entendimento. O calendário chinês possui uma estrutura muito irregular de um anoa eutro, é impossivel determinar sem cálculo a duração dos. meses lunares, sua repartição, 6 mamentado eventual mês imercalar É o mesmo no casa das luas cheias no dia 34,15 ou 15 do mês e do início do anó lunar, cuja data oscita entre 21 de janeiro « 20 de fevereiro. Essas reformas ininterruptas, cujo nú- mero elevado contrasta com o conservado- rismo europeu, simbolizado pela manuten- ção do sistema de Ptolomeu durante [.500 anos, testemunham uma extraordinária abertura da China à mudança em matéria de astronomia matemática. De fato, nas fontes astronômicas chinesas, a palavra mais comum encontrada em todas as épocas éa da novidade (xin, em chinês). Como falar então, como fazem muitos autores ociden- tais, da imobilidade da China? Ainda que tivessem estimado que seus sistemas de astronomia preditiva tinham data de validade, os chineses tentaram, sem cessar, melhorá-los. A precisão das previ- sões se aprimorou ao longo da história, e à matemática correspondente se tomou mais e mais elaborada. Sob a dinastia Hane a dos Três Reinos (222-265), oschineses usavam movimentos uniformes para calcular a posição do Sol, da Luaedosplanetas. Porexemplo, pensava-se quealongimde do Sol aumentava uniforme- mente 1 grau pordia, de modo que, ao final de um ano, teriam sido percorridos tantos. graus quanto fosse o número de dias doano. Elesadmitiam igualmente o ciclo Junissolar IMAGEM POPULAR de um calendário Ehinês simplificado de 1897 (ver quadro acihta) = segundo o qual 19 anos trópicos (o periodo que separa o retor- no de Sol á mesma altura) correspondem a 235 meses lunares sinódicos (a revolução sinúdica da Lua comesponde à lunação) — é utilizavam ciclos periódicos para prever os eclipses da LuaedoSol Segundo um desses ciclos, estimavam-se 23 eclipses lunares ou solares em 135 meses, ou pelo menos um a cada seis meses. Os resultados não crim bons, eles lan- çaram sucessivos programas de observação para compreender melhor os fenômenos astronômicos. Em 722 e 723, uma expe- dição percorreu a China de none a sul, até 6 Vietnã, a fim de mensurar as variações de sombras solares segundo a latitude, Eles ten- taram também melhorara medica do tempo aperfeiçoando a clepsidra e introduzindo um mecanismo de escape no relógio de água. Em 1280, servindo-se de uma espécie de câmara escura, chegou-se à medição precisa da sombra de um gnômon (lâmina de relógio de sol) com 12 metros de altura e deduziu-se o instante do solstício de invemo com uma precisão de meia hora. Assim, eles puderam melhorar os valores de seus parâmetros astronômicos e, a partir SCIENTIFIC AMÉRICAM BRASIL 27 daí, refinar suas previsões matemáticas. Do início da era cristã até o começo do século VII, os chineses refinaram seu ciclo lunissolar, substituindoos valores de 19anos € 235 meses por 391 anos e 4.836 meses ou 600 anos e 7.421 meses, respectivamente. Durante o mesmo período, elesconstataram também queos movimentos da Luae do Sol não podiam ser considerados uniformes. Da mesma forma, elaboraram tabelas astronô- micas para apontar as desigualdades solares e lunares. Para os eclipses, abandonaram o sistema de ciclos periódicos é bascaram os cálculos em técnicas mais elaboradas, geométricas, similares às da astronomia ma- temáticagrega. Caleularam assim o instante do primeiro e do último contato e do máximo do eclipse, bem como sua grandeza. Para as conversões recíprocas de coorde- nadas celestes (por exemplo, a conversão das coordenadas equatoriais de uma estrela em suas coordenadas elípticas ou a conversão inversa), eles utilizaram episodicamente métodos trigenométricos de origem grega que haviam aprendido por intermédio dos indianos, dos povos islâmicos da Ásia cermral é dos europeus. No entanto, com maior frequência remetia-se a fórmulas próprias. Graças a esse arsenal, os chineses me- lhoratam sensivelmente a precisão de suas técnicas preditivas, sem jamais conseguir evitarpor completo oserros, coma um eclip- seprevistomasnão observado. Também não constguiram diminuir suficientemente os erros de previsão da posição dos planetas. Em cerca dé 1600, esses erros atingiram cerca de um mês de diferença entre as datas das posições previstas e as observadas de fato. Essa margem é similar à verificada na Europa na mesma época. Apesar do aumento da precisão de suas observações astronômicas, os métodos matemáticos preditivos dos chineses não eram infalíveis. Para eles, isso se atribuía à limitação dessa ciência: considéravam um absurdo a afirmação de Galileu, segundo a qual o mundo seria escrito em linguagem matemática, e diziam que leis naturais de tipo matemático não poderiam existir. Limites da Matemática OastronomorixinG (0683-727) pensava que havia matemáticas falsas que davam resultados válidos e verdadeira com resul- 5, DIAGRAMA (O ECLIPSE CIA LIA na oito de 15 de miaia de 1631, deenhado pel escritório de astronomia chinbs. Os documentos chineses que acarnpanham esse diagrama indicam us diversos parámetras do eclipse, notadamente a tntraita da Liss na peruirmbsra [ó elireito). au mesmo tempo segundo métodos de cálculo de previsões da astronomia chinesa o da agronomia euraçaia [raljolas adaptadas ao.chinês a partir dia astronomia de Tyelha flrahe, levadas por misslanárias jesiltas europeus na fim do adculo MI) O eclipas começou b 0h30 de e durou úmalhora e 40 mininoa. Ox cálculis chineses e europeus previram a inicio e-o fim do eclipse com pouco ments de 45 minutas de atraso. Neste essimplo, 05 cálculos europeus não são melhores que 08 cálculos chineses, mas o são na múiar parto dos outros cabos. Por isso ox chineses, a partir de 1644, passaram a reformar Ssnã astminornia baseando-se mm Tabelas asironóinicas européias, como 28 Tabielos rudatfinos, de Kepler 28 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL as Ce [E MG EAR CNES | VOL tadosincorretos. No primeiro caso, erauma questão de sorte; no segundo, as regulari- «dades aparentes da Natureza poderiam se «esarranjar subitamente. Assim, não bastava que um sistema deastronomia estivesse Cor- reto, isto é, em conformidade com os dados experimentais, para que se tivesse certeza da exatidão das previsões eferuadas. Outros pensavam que era impossível traduzir perfeitamente as observações astronômicas com o uso da matemática, pois toda observação, por mais precisa que fosse, deixava necessariamente um emo que não poderia jamais ser nulo, Por exemplo, quando um instrumento de observação é dividido em graus, pode-se divídilo em décimos de graus ou algo mais, mas há sempreum limitec, conseqiientemente, um erro residual que pode se amplificar, como nos sistemas sensíveis às condições naturais. Além disso, diziam, os instrumentos de observação são sempre pequenos demais com telação à imensidade do céu. Contudo, todos admitiam que as obser- vações astronômicas com base nas quais os matemáticos imaginavam técnicas de pre- visão dos fenômenos podiam ser aplicadas apenasa intervalos de tempo extremamente curtos, considerando-se a infinidade do rem- po, passado ou futuro, Mesmo conservando arquivos de observação antigos e mademos durante milênios, obtinha-se apenas umco- nhecimento restrito do comportamento dos corpas celestes: para entender com certeza os fenômenos, as observações deveriam estender-se por milhões de anos. Assim, paras chineses, não poderíamos deduzir leis gerais, válidas o tempo todo, a partirdo conhecimento particular do céu, re- lativoa imervalos de tempo curtos, noescopo da dupla infinidade do tempo: o passado eo funiro. Nos:seus cálculos, os chineses lidavam habitualmente com intervalos de témpo de milhões de anos. Deduziram que sua matemática preditiva poderia dar bons resultados, mas na melhor das hipúreses de maneira limitada. Na prática, estimavam que, depois de 300 anos, sua matemática perecia. Era necessário, então, modificá-la cu adotar outra. ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA (ou ainda esferas e cubos) se imbricam ou se cruzam harmoniosamente proporcionando um grande deleite visual, AssoLUÇÕES, quando cram oferecidas, re- sumiarm=sea listas herméticas de operações, quenada deixavam transparecer sobre o ra- diocinive o cálculo feito para chegar atécias. Os problemas dos sangaku eram de dificul- dade variável. Alguns podiam ser resolvidos facilmente porméeio de um cálculo algébrico simples: outros exigiam instrumentos de análise muito mais elaborados. Os mestres japoneses certamentetinham, nocampodas figuras imbricadas, uma experiência muito ricaque lhes permitia distinguir instantanca- mente 0s problemas realmente dificeis das variantes de problemas conhecidos. Porque os matemáticos escolheram um sitio religioso para pendurar as tabuletas? Elas pertenciam a uma categoria mais ampla de objetos, a das ema, que significa literal- mente “cavalos pintados”, Desde o século VII osadeptos budistas ou xintoistas sulos- tituiram aos poucos as oferendas dear vivos pela colocação de pranchetasnas quais estava representado esse animal sagrado (ver figura na pág. 32) Ao longo do tempo, os ema se dissociaram da ligação com o ani- m: s mal para representar temas profanos como cenas-de batalha ou personagens célebres. Contudo, as tabuletas conservaram uma finalidade religiosa já que eram penduradas à guisa de reconhecimento ou para solicitar aajuda de Buda ou de algumas dosmilhares de divindades sintoistas. Mesmo essa função, no entanto, deixou de ser indispensável a partir dos séculos XV e XVI. Antistas novatos utilizaram esse suponte para se tomarem conhecidos. Sob o reinado dos xoguns Tokugawa, periodo numerosos lugares de peregrinação vininistas é budistas abrigam tabuletas matemáticas, chamadas de sangaku, onde estão registrados problemas quase sempre geométricos. Pocexemplo, na profeitura de lwrate, o santuário de Maminiako [0, as tabuletas são datadas de 1822 e ble o santuário de chinaseki Hachiman [ce d, de 1838] abrigara vários dessas tabuletas. É também d caso, na prefeitura de Fukushima, da entrada do santuário de Hiwatari (e, de 1888) WWINESCIAM COM ER que nos interessa aqui, admirar os “cavalos pintados” fazia pare da visita aos templos Alguns desses locais eram dotados de gale rias especialmente dedicadas a essas formas artísticas, Quanto mais célebre frequentado era o lugar, maior a quantidade de san- gaku. Por exemplo, o templo de Asakusa, em Tóquio, conserva hoje 215 tabuletas, algumas das quais são consideradas obra de ame. Além disso, não é de admirar que jovens matemáticos, ambiciosos, mas sem condições, tenham usado esse recurso para ganharem notoriedade. Com eleito, no início do século XVII, os matemáticos iam de vento em popa no arquipélago, O Japão estava na aurora do mais longo periodo de paz de sua história. Com a ajuda de obras importadas da China ou redescobentas nas prateleiras das biblio- tecas, tradições cientificas se construiam ou se reconstruiam sobre novas bases. Os matemáticos É am parte desse grande movimento que lembra o da Renascença no Ocideme. As pesquisas matemáticas atingiram um pico nos últimos decênios do século XVTI antes do surgimento do grande matemático Seki Kowa Takakazu (1642-1708) e de seu não menos brilhante discipulo Takebe Katahiro (1664-1739), É nocampo das técnicasde resoluçãoalgébrica que os progressos são mais espetaculares. Com Takebe, os japoneses exploraram o terreno da aná teresse pela ciência do cálculo se traduziu por um crescimento das publicações nesse campo e pela multiplicação de “escolas” de matemática, paraonde afluíam os amadores em busca de um ensino complero, Nesses lugares, naquela época, ni havia cursos coletivos. Os alunos eram com fregiiência deixados sozinhos pára resolver os problemas e o mestre sé contentáva em fomecer a cada um algumas pistas para reflexão. No entanto, o laço que unia o alunoa sua escola era bem mais forte e mais exclusivo que atualmente. Uma das razões eta que cada colégio cuidava com certo ciúme de seu conjunto de conhecimentos esó 0 revelava em conta-gotas e aos mais. merecedores. Assim, os métodos de resolu- e infinitesimal, Esse in- , SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 34 4 ou "cavalos pintados”, são objetos que substituíram os sacrifícios ce ardal coma oferemees a port do culo VA As tabuletas de matemática constituem uma categoria desses “cavalos pintados” ção mais elaborados eram reservados a um cireulo muito pequeno de discípulos. Só aqueles que conseguiam chegar a um nível de conhecimento equivalente ou superior aodo mestre podiam por sua vez abrir uma escola, € apenas um entre eles sucedia o mestre no comando da escola. “Nacapital Edo, antigonome de Tóquio, achamada escola de Selá desfrutou do mais alto prestígio. Ainda que o matemático não tenha sido seu fundador, essa escola foi a única a deter a obra do grande mestre em sua totalidade — ela foi apenas parcialmente publicada. O conjunto de conhecimentos da escola abrangia igualmente as obras dos discípulos ilustres que o sucederam e que aprofundaram seus métodos. Essa organização rigida e compartimen- tada nem sempre foi unanimidade entre os matemáticos. Alguns, da escola de Seki, optaram pordifundiros conhecimentos sem temera punição. No final do século XVIII, a regra do segredo era cada vez menos res- peitada diante da pressão provocada pela forre demanda por educação rural no país. À lógica econômica levou as escolas à cresce- remeaestenderem sua influência nas regiões afastadas. Para isso, entraram em contato 32 SCIENTIFICAMERICANERASIL com os mestres de província ou enviaram mestres itinerantes encarregados de recrutar a cliemtela € trazê-la para a capital, Assim, a capacidade de uma escola de se fazer conhe- cer longe passou a ter imponância. Foinesse contexto social queas tabuletas conheceram uma popularidade extraordiná- ria. Pode-se distinguir esquematicamente três funções preenchidas por clas. À PRIMEIRA FUNÇÃO. provavelmente a maisantiga, foia de divulgaros jovens talen- tos isolados e desprovidos de recursos. Para esses últimos, pendurar a resolução de um problema dificil num lugar muito visitado era uma iianeita eficaz de atrair a atenção para eles. Assim procedeu o matemático Aida Yasuali (1747-1817) no momento em que decidiu se tornar conhecido na capital. Aida (ver imagem 3) craum samurai originário de Yamagata, cheio de ambição, mas sem recursos, que aprendeu matemática com um pequeno mestre do interior. Em 1781, colocou sua primeira tabuleta no santuário do monte Atago, que na época eraum dos pontos de encontro favoritosdos matemáticos. Seu objetivo foi alcançado: 3 Asa Tasuahd, aos 70 anos de idade: Quando mais jovem, ele era um samurai ambiciaso, mas sem dinheiro. Adquiri celebridade graças a uma tabulota de matemática depositada em um santuário algum tempo depois, quando decidiu bater na porta de Fujita Sadasuke (1734-1807), representante oficial da escola de Seki, seu nome já era conhecido. Nesse episódio é possível observar a segunda função das tabuletas: a de colocar desafios e de se submeter à crítica. A lenda conta que quando Aida se apresentou diante de Fujita para lhe pedir para aceitá-lo como discípulo, omestre exigiu que ele comigisseo ermoque havia cometido na resolução do pro- blemade Atago. Essa humilhação esteve na origem de um conflito histórico que durante toda a vida iria opor os dois matemáticos por meio de outros discípules. Durante sua longa e produtiva carteira (2 mil fascículos redigidos em 30 anos), Aida não deixaria de publicar “retificações” de problemas resolvidos por Fujita. Esse último, de sua parte, também não cixaria de “retificar” as “retificações” de seu adversário. Essa guerra declarada na escola que era de longe a mais prestigiada de Edo permitiu a Aida construir sua reputação. No plano cientifico, é difícil apontar um ganhador, pois havia muita má fé de ambas as partes. O problema de Aida, na origem da polêmica, não apresentava nenhum erro, mas apenas imperfeições re- ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA PROBLEMAS INSPIRADOS EM SANGAKU [respostas na página seguinte) A. Problema clássico da matemática japonesa que se encontra em muitos manuais e tabuletas matemáticas. Os Círculos azul, laranja e vermelho são tangentes entre si dois a dois, e tangentes direita, Qual é o diâmetro do círculo vermelho, conhecendo os, diâmetros respectivos dos círculos azule laranja? € Num tronco de cone fem verde), estão inseridas duas pequenas esferas (em azul) e duas grandes esferas (em laranja) de diâmetro respectivo D'e d. Cada uma delas é tangente aos três outros, na parede exterior assim como à tima das bases. Os valores de De d são conhecidos. Determine ha altura do tronco de cone O, Problema do Iratado matemático dos tabuletas sagradas, de Fujita Sadasuke [1785]; considere-se um grande círculo [em verde) no qual se inserem círculos “em série” fem loranjo) e círculos “adjacentes” [em ozul]. O diâmetro do grande circulo é de 9? polegadas.e 5 décimos. O do último circulo “adjacente” é de um décimo: Não se conhece o número tatal de círculos “adjacentes”. À quanto-se eleva 9 número total de círculos “adjacentes” (a figura foi desenhada postulando-se que último círculo “adjacente” era 0 nono |, compreendido entre q primeiro e o último? WWWSCIAM.COM BR B. Num quadrado (em verde), estão traçados um semicirculo = cujo diâmetro é igual ao comprimento do fado do quadrado —, um grande circulo [em laranja) + três pequenos círculos [em azul) que apresentam as propriedades de tangência indicadas na figura. Exprima o diâmetro D do grande circulo laranja a par- tir do diâmetro d dos pequenos círculos azuls SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 33 Do século IX ao XIl, os árabes deram status de nobreza a um curioso passatempo matemático 36 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL Por Jacques Sesiano problema da construção dos adrados mágicos é conhe- cido: trata-se de posicionar numa tabela quadrada nú- meros naturais diferentes, de forma que as somas, em cada linha, cada coluna e cada uma-das duas diagonais principais sejam iguais. Em geral, preenche-se esse tipo de quadrado com a segliência dos primeiros números naturais. Assim, num quadrado de n casas laterais (tim quadrado de ordem n), inscrevem-se os n primeiros números naturais. Sendo a soma desses números 152436... n2= [pn n2 1/2, a solução a ser encontrada em cada fileita — a soma mágica — é [nt nº+1)]/2. Pode-se construir um quadrado mágico para qualquer n, exceto n = 2, O menor quadrado mágico possível é, portanto, o de ordem 3,€ ele rem apenas uma forma — se desprezarmos as inversõesc as rotações. Mas é uma exceção. O quadrado de ordem 4 já oferece 880 possibilidades e esse número cresce rapidamente nas ordens seguintes. Os quadhados mágicos chegaram à Eu- ropanoséculo XIV, em textos traduzidos do MELANCOLIA, gravura de 1514 de Albrecht Oúrer, traz ao fundo, no alto à direita, a imagem de um quadrado mágico ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA mos vce árabe. Os manuscritos traziam exemplos de quadrados queteriam propriedades nefastas ou benévolas, associadas aos sete planetas então conhecidos, Assim, as figuras ficaram conhecidas como mágicas ou planetárias, Essa segunda denominação desapareceu depois. A primeira foi conservada e, com cla, o desprézo pelos quadrados. Entretanto, eles não tiveram sempre uma reputação duvidosa. Sua denominação árabe original — “disposição harmoniosa dos números” — os tomava perfeitamente respeitáveis e dignos da atenção dos mate- máticos. À ciência dos quadrados mágicos evoluiu de estudos nos séculos [Xe X até aépoca de ouro do século XII, quando ela atingiu seu apogeu no Islã. Dois Autores, Dois Métodos Nos contEceMos as origens dessa ciên- cia por meio de dois textos do século X. Um é atribuído a Abul Wafa Al-Buzjani (940-998), famoso por seus trabalhos em astronomia € trigonometria. O outro, a Ali b; Ahmad al-Antaki (morto em 987). En- quanto. tratado do primeiro é prolixo é nos pemite seguir as tentativas amtigas de chegar a métodos gerais, o segundo permanece conciso e ignora os métodos de construção simples, principalmente aqueles originados de transformações do quadrado natural, ou seja, do quadrado com a mesma ordem que e quadrado a ser construído, que continha os números consecutivos, Ele abre sua ex- posição desta forma: "Alguns começam por colocar os números segundo sua segiiência de ordem natural, a partir do | até o número que a hgura, em que se deseja estabelecer a au b Io FERE 4Z SO QUADRADO MÁGICO [á 654.) do miantuscrito Agrosofira, datado da século MI, & seu equivalente [á dir, em que Z significa Ze Evote 1) no Fragmentum de Inventionitris Sciantarium te Diego Palomino, publicado em Madri em 1599 mágica, atinge. Depois eles tiramos núme- ros do lugar, sempre de forma a produzir um aumento em algumas fileiras - uma diminuição nas fileiras que lhes são opostas. Em seguida, eles ajustam o conjunto das fileiras segundo um mesmo modo. É um método que apresenta dificuldades para o iniciante. Outros são realizados de maneira mais fácil”. Esse método mais fácil € a construção dos quadrados com bordas, À parirdeum quadrado mágico conhecido, acrescenta- se uma borda que aumenta todas as suas linhas numa mesma quantidade. Vamos reter isso: no século X, as trans- formações do quadrado natura! para obrer um quadrado mágico deveriam ser eferuadas separadamente para cadaordem. Umséculo depois, seriam deduzidos métodos gerais simples, em que não haveria mais necessi- dade de representar o quadrado natural. É essa mudança que descreveremos. Quadrados de Ordem Ímpar ABUL WAFA AL-BUZIANT OS transmitiu dois exemplos de construções individuais e d para o quadrado de ordem 5 (ver figura 1). Nessas duas construções, Abul Wafa Al-Buzjani não modifica as diagonais do quadrado natural. Ele sabe que elas têm, de cara, a soma pedida — no caso, 65. No entanto, esse é apenas um caso particular de duas propriedades gerais do quadrado natural que tem um número impar de casas na lateral (ver figura 7). Primeiro, as: somas nas fileiras medianas, horizontal e vertical são, cada uma, iguais à soma mágica para a ordem considerada. Em seguida, as somas nas diagonais, principais ou quebradas, também têm a soma mágica. Diagonais quebradas são os pares de diagonais parciais situadas de um lado e de outro de uma dia- gonal principal, compreendendo o mesmo número de casas que a principal: essas diagonais quebradas são inteiras quando colamos as bordas opostas do quadrado. À construção proposta por Ibn al- Hayrham (cerca de 965-1041) está funda- mentada nessas duas propriedades, como nos relata um autor do século XI; "Al- Haytham recomendou desenhar dois qua- dados, escreverem um deles os números de vi2z]3/4]5 Vj2 |3L2]5 V|B|a)|12]5 1/34 4] 5 Ljtul2z)2a])s elzrlelalio][igfr IDR 18/7220 no] [is [7 |fo (ou ufufiafufis|in 2 15 off ul cafas 1/24] 15) 2 [ys vlw lis[19)20]|16 | 17 19 [8 |Listertio NY e ||1 [Ms [is] s n/22)22[22)25][21[147a3 [2 [2s|Jofra[2 3 [25] [afora 1.05 DOIS MÉTODOS de Aut Wfafa A-Burjani [da século X) para construir um quadrado finalmente 05 nrúmeros-das extremidades que ainda não foram tracados com aqueles. mágica de ordem 5 (as números menipedadas estão sublinhados; os números fixas. da fileira oposta, conservando sua ordem de sucessão [c, fechos violeta). Estâpem vermadho; os flechas ineficam as trocos realizados]. Segunda métocia; sem mezeer, de novo, nos números das diagonais (a), invertemos 05 Primeira método: mantemos as números das diagonais do quadrado rúturalem seu tugas a); trocamos 05 números do quadrada interior de ordem 3 [contornado em verde) comos dacasa distante de duas casas na diagamal/d, fochos vermelhas) trocamos WWW SCIAM COM.BR pares de números aprowimando à diagonal descendente [d, flechas Ioranja). Depois, como antes, trocamos os númerús restantes das bardas cam os das laterais opostas e, fischsas azuis) Nos dois casas [e e e), os quadrados abridos são mágicos SCIENTIFICAMERICAN BRASIL 37 2 b E d 5 n 20/3 un 20|3 n|2m|7]20]3 6 9 12 8 12 8 alnr|2|]8|16 12/13 15 13 13 w|s5s|13)]21/9 16 19 18 14 10 | 18 14 wo [18] 1 [14]22 25/23 15 23 15) |3]6/19)]2]15 2.0 MÉTODO DE IBN ALHAFTHAM, Os núrmesos da inha e da coluna medianas de um quadrado natural (a) tomam-se os-das duas diagonais do quadrado a ser construído bj. Sabram linhas e colunas para preencher Dra, para cada uma, exoeto para alinha ea coluna medianas, duas casas já estão ocupadas, As propriedades dos quadrados. naturais nes ajudam a completar o quadrado, Por exemplo, a linha que contémos números 38 11 deve conter elementos da diagonal quebrada comespondente fa, om vermeiho) da quadrado natural, assim como a coluna que contém e 14 será feita de elementos da disgonal correspondente (a, verde) Sua intersecção será, então, o elemento comum, 201 Segue-se esse parção fem, o neimero 10 é intersecção dos diagonais quebendias arute laranja do quedrado o) Na final, o quadrado é mágico [a] ea 1]2 6) als 1 2 KA 5 ulzlz|m|3 16 “e s KKK | | e KAKA | | + [ua [2] 0 [10 215627 666] 00 00802 0] DEDE KO 16 KEIKO) 20 Ki 20 10 18 1 14 2 RA 2 Pa 3 Ke al lals|i9)21s 3.0 MÉTODO DE UM AUTOR DO SÉCULO XI. Insereve-se, primeiro, no quadrado da ordem escolhida [aqui 5], um quadrado oblíquo, e menos, da mesma sedem [a]. Ao colscar múmeros naturais no quadrado extema, algumas casas do quadrado abtiquo estarão acordo com sua segjiência naturale transferir o conteúdo das duas fileiras medianas, ver- tical é horizontal, para as duas diagonais do outro quadrado, Ele opera, em seguida, a transferência do conteúdo das diagonais res- tantes, em direção a seus opostos, submetido a extensas condições, que demoraria muito mencionar é cuja realização apresenta, para o iniciante, muitas dificuldades”, Seu relato pára aí, mas podemos adivinhar como a quadrado é completado (ver figura 2). Seo autor do século XIL interrompeu seu relato, foi também por ter um outro método para propor (ver figura 3). 3|7% 38 29 | 70h21 79/30 39/80 40 o2 N3 | 54 2 63 Na à 23 | 55 644.24 3 61 E aja 33 so | 74) 34 10 43/75 3]M 53 38 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL Como dispensar o quadrado natural? Eis uma forma (ver figura 4): inscreve-se 1 em uma das quatro casas contíguas à casa central — digamos a de baixo. Colocam-se os números seguintes prosseguindo dia- gonalmente para baixo. Quando se chocar numa das laterais, transfere-se para a casa seguinte do lado oposto (como numa diago- nal quebrada), Depois da inclusão de uma quantidade de algarismos igual à ordem, a progressão é bloqueada: desce-se então ver- ticalmente duas casas, independentemente preenchidas, enquanto outras, às dos cruzamentos, ficam vazias. Deslocando 05 grupos detrés números que acupam coda um dos cantos do quadrado natural em direção ao Indo aposto da quadrado oblíquo (c, flechas azuis), este se toma mágico fel) as diagonais com as duas fileiras medianas do quadrado natural, Tbn al-Haytham foi conduzido ao método geral precedente. Quadrados de Ordem Par Ten AL-HArIHAM menciona queos quadra- dos naturais com ordem par têm duas pro- pricdades, análogas aos precedentes — ape- sarde isso já scr conhecido antes. À soma da metade dos elementos de uma linha, unida à soma da metade dos elementos não ali- nhados com os precedentes, perencendo à dagrandeza da ordem, e prossegue-seassim fileira colocada simetricamente em relação até o preenchimento total do quadrado, à hileira mediana, é igual à soma mágica. Essemétodoéaplicávela todasasordens Aliás, a soma em cada diagonal (principal impares. AbulWafa Al-Buzjaniconheciaas ou quebrada) é igual à soma mágica. duas propriedades do quadrado natural de Essas propriedades permitiram esta- ordem ímpar. No entanto, ele tinha conser- — belecer os primeiros quadrados mágicos vado para à figura mágica as duas diagonais de ordem par. Conservando imutáveis as do quadrado natural, Optando por ocupar A QUADRADO MÁGICO elaborado sem quadtrado natural seguindo um método geral. Partimos de uma casa [conramada em vermaiho) vizinha à casa central o seguimas [fechos azuis) as diagonais quebradas, ou seja, coma se as extremidades opostas do quadrado estivessem unidas. Quando topamos com uma casa preenchida (aqui depois da casa 9) deslocamos duas. filiras para búixo [flacha lkvanjo) e recomeçamas a completar () quadrado Hinal é mágico duas diagonais principais, segue-se para igualaras linhas, mocando a metade de seus elementos. Igualam-se as colunas. de novo coma troca dametade de seus termos. Mas atenção: isso não pode ser feito de qualquer jeito, com orisco de desordenaras linhas, e é preciso verificar a igualdade resultante. Podemos evitar essa armadilha usando ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA dos exemplos mais célebres de poesia à serviço do discurso cientifico éo poema médico Urguza Fi "F-Tibb de Ibn Sina (Avicena, para o Ocidente). Trata-se de um resumo, em verso, dos elementos de base da medicina doséculo XI: observações, conselhos terapêuticos, técnicas cinúrgicas simples erc. O caráter pedagógico desse poemalhe rendeu diversastraduções no latim, entreos séculos XII e XVII sob otítulo Cantica Aticennae, na época em que o Cânone da medicina, «do mesmo autor, era a referência no assunto. Em matemática, os poemas didáticos ou lúdicos-visaram dois tipos de público. O primeiro era constituído poralunas e professores. Osautores se dirigiam a eles por meio de poemas que apresentavam objeras, ferramentas e procedimentos para resolver problemas. O mais antigo desses poemas (ver figura |) trata dos elementos de base da álgebra. Ele é constituído por 54 versos nos quais o autor, o matemático magrebino do século XII, Ibn Al-Yasamin, expõe as noções de desconhecido e de equação, assim como os procedimen- tos elementares para equacionar um problema. Depois, ele definia as seis equações canônicas que Al-Kharizmi tinha estudado pela primeira vezno começo do século IX. Em comparação com a prosa simples dos maremáricos, o ritmo cas rimas ajudam a aprender, pela inemorização. O poema de Ibn AlYasamin teve grande sucessoc foi comentado até o século XV em diferentes cidades do império. Entreosoutros assuntos que foram objeto de versificação, citemos um método para resolver problemas de primeiro grau sem utilizar as ferramentas de álgebra, os procedimentos de verificação de uma operação aritmética (as provas do 7, do 8, do 9, do | | e do 13) etc. O segundo aspecto da poesia na matemática se inscreve no campo das atividades culturais e lúdicas. Originalmente, durante os saraus, eram declamados poemas de sátira, de enaltecimento ou recitavam-se versos que deveriam começar pela última letra do verso precedente: Depois essas atividades foram enriquecidas com enigmas versificados, problemas recreativos.e, às vezes, até bilhetes. amorosos em forma matemática, Entre os enigmas, alguns consistem em adivinharo nome de um personagem célebre, como ocorre com Muhammad, o profeta (Mao- mé), nesse poeina encontrado num manuscrito do século XIII: O nome daquele que Deus me fez amor; É ima principe que o procura, saiba disso, Seu primeiro é um numero igual ao valor do terceiro, Seu segundo é o quinto daquele que 0 segue, E o quinto do primeiro desconhevido; Seu último é o décimo daquele que o precede E uma parte de sua soma, saiba disto. À elaboração desse problema consiste em substituir as letras que compõem o nome escondido por seus valores respectivos na numeração alfabética que os astrônomos dos países islâmicos toma- ram emprestado dos gregos. Essa numeração utiliza as 28 letras do alfabeto árabe: nove paraas unidades, nove paraas dezenas, nove para WWW SCIAM.COM.BR 2: ESSE BILHETE AMOROSO sob a forma de um entgma versificado está no fim de uma epistola extremamente séria do não menos sério matemático de Marrakech Ibn Al-Banna; Trôs sátimos do coração para seu olhar. Um sétimo é oferecida para o rosa de suas duas bochechas, Um sétimo e a metade de um sétimo eo quarto, Pelo recusa de um desejo Insatisfeito, Um sétimo e um sexto da um quarto são a parto dos seios bem redondos. Que se recusaram aa pecado do méu abraça e me empurearam O resto, que está em cinco partes, é pelos palavras deja, Que estancariam minha sede se nvessem sido escutodas. Se consicararmos x o coração inteiro, temos. [3/7 + LP + 1/7 + (LiPVR + [LVP)A o 147 4 [LUPA [/6) x + 555, sendosea 168 as centenas ea 28º para os milhares, Em nosso exemplo, o nome de Muhammad é constituído por scu radical quadrilítere M, H, M, D. Osvalores numéricos desses fenômenos são, respectivamente, 40, 8. 40,4. Pararesclver oenigma, basta lembrar queo árabe seescreve da direita paraa esquerda, tomando M a primeira eira, Hascgundae D aúltima-O poema sé traduz pelosistema de equações: x) =x3:x2=Xa !Sixz=x)/ 5;x4=x9/ 10; sendo xy, x2, xy e 4 valores de letras, A figura 2 ilustra um enigma na categoria dos bilhetes amoro- sos. Já esta poesia sobre o quadiado e sua diagonal é um exercício puramente matemático: Um quadrado que tem sua área em sua diagonal, Sua mehida absorveu os primeiros súbios. Sobre seus dois lados o equivalente de duas raízes de sua diagonal, Ne momento da medição, como explicar issod Sua rranserição matemática é: Sexé a lateral do quadrado e d sua diagonal: Setemos:x" = de = 2d Conhio, segundo o teorema de Pitágoras: Me = d?. Temos: 24 = d?, Sendo; d = 2ex= 2 Durante o apogeu dasciências árabes, essencialmente do século 1X ao XII, 0 papel pedagógico da versificação da matemática foi relegado à memorização, Com o declínio das atividades cientificas, os matemáticos se contentaram em publicar poemas didáticos, manuais abreviados e comentários e plosas. = Ahmed Djebbar é professor da Universidade de Ciênciase Tecnologias de Lille. e Lalgêbro arabe, genêse d'un art. Ahmed Djebbar. Ed. Vulbert-Adapt, 2005. SCIENTIFICAMERICAN BRASIL 41 África, berço da” Matemática Uganda sugere que há mais de 20 mil anos a humanidade já era capaz de pensar numericamente Por Dirk Huylebrouck os anos 1950, o arqueólogo belga Jean de Heinzelin empreendeu esca- vações no Congo, perio da fronteira com Uganda, às margens do lago Rutanzige (ex-lago Alberto). A administração colonial responsável pelos Parques Nacionais o encarregou de inspecionar um sítio perro do vilarejo de Ishango (ver mapa na pág: 44). Nessa região vulcânica, havia a esperança deencon- traruma Pompéia africana da pré-história, eo jovem geólogo entendeu sua importância. Elelevou os objetos encontrados para o Instituto Real das Ciências Naturais, na Bélgica, cespecialmente um deles chamou a atenção: um pequeno osso petrificado, de apenas 10 em de comprimento, ormado com um cristal de quartzo-em uma extremidade e que trazia três séries de entalhes, agrupados (ver figura na pág, do lado). O objeto é misterioso por diversas razões. As ferramentas manuais eram raras entre as populações bantu, aparentadas ao povo de Ishango. Além disso, o cristal de quartzo — que não pode ser separado do cabo — faz do objeto um tipo de instrumento para gra- vação, numa cultura que supostamente não conhecia a escrita, Ignora-se, hoje, de qual animal provém o osso perrificado, mas o problema da datação já foi resolvido. Na época da descoberta, existiam poucas tábuas de correção para datar, pelo carbono 14, objeros petrificados encontrados em regioes vulcânicas (as tábuas de correção são necessárias para considerar variações temporais das quantidades de carbono 14 atmosférico). Mas aos poucas o método foi sendo afinado e os resultados, coroberados por outros métodos: o objeto tem entre 20 mile 25 mil anos, Veremos que, além de sua idade e scu ineditismo, 4? SCIENTIFICAMERICAN BRASIL ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA DERSTÃO DE SHANGO, exposto no Instituto e ad ESPE Duas] [ER Ra [Pace Rip- la tec pele Lite Re RIDE ENE ERES o ps e lag ca ppt lee HS despertam o interesse de especialistas em informática Lo A VET Toto dia desponta no estado de Tamil Nadu, no sudeste da Índia. Num vilarejo, como em todas as manhãs, as mulheres saem de suas casas & começam um estranho ritual; varrem a soleira da porta, espirram uma mistura de esterco de vaca e água, depois cobrem a área com figuras complexas elaboradas com pó-de-arroz. Segundo a tradição, o esterco de vaca limpa e purifica o solo, enquanto o pó-de-arroz constitui uma oferenda, pois é apreciado pelas formigas — é bom começar o dia com um ato de bondade. A habilidade para executar essas figuras, chamadas de kolam, é um sinal de graça e uma prova de destreza, disciplina mental e capacidade de concentração, Os desenhos que aparecem cotidianamente nas entradas das casas de Tamil Nadu cha- mama atenção em múltiplos aspectos. É um exemplo fora do comum de expressão matemáricanum contexto cultural, E as figuras do kolam interessam, cada vez mais, aos profissionais da informárica especializados na análise e descrição de imagens. Aprendizado Feminino ArRADIÇÃO DO KotaM em Tamil Nadu peidura há séculos e segue como uma prática corrente entre as mulheres, sejam clas da cidade ou do campo, universitárias ou analfabetas. Contudo, nesses últimos anos, elas passaram a substituir o arroz por pó-de-pedra, disponível no comércio, giz ou tinta, para criar os desenhos — que as formigas não apreciam nem um pouco. O traçado cotidiano das figuras é um componente importante da cultura local, s soleiras decoradas são uma fronteira entre os mundos interior e exterior, e as figuras, paraa população podem, ao mesmo tempo, protegeros moradores, fazendo tes. Às mulheres mais velhas da família ensinam às vigilância, e acolher os vis jovens todo um inventário de figuras e procedimentos para desenhá-las, além de instruí-las sobre quais são convenientes pará os dias comuns € quais são reser- vadas para ocasiões especiais. A aprendizagem do kolam é uma parte importante da educação da menina. Apesar de a tradição ser transmitida oralmente de mãe para filha, ela está inscrita emumacultura escrita. Os habitantes de'Tamil Nadu têm uma literatura abundante, que remontaaoséculo II ou IV antes da nossacra. Embora se refira ao kolam apenas superficiahmente, sem entrarem detalhes, a literatura atesta a longevidade da rradição. Por exemplo: uma das referências mais antigas, um texto escrito no século XVI, descreve um reinado pacífico e próspero, onde “o tigre e a vaca bebiam na mesma fonte de água, os brâmanes cantavam os Vedas, as mulheres decoravam as ruas com kolans, chovia nos momentos oportunos é os que tinham fome eram saciados”. São encontradas em outras partes da Índia tradições de desenho comparáveis, como muggu, rangoli e alpana. Apesar de provavelmente serem historicamente liga- ASFIGURAS são frequentemente iniciadas pela criação de um geoplano ou tabela de pontos [verfoto nú página oa foda) que prevê o tamanho e a forma final do desenho. As meninas aprendem os métodos prescritos para desenhar inúmeras figuras. Para desenhar a figura d, um primeiro desenho elementar (a) foi reproduzido três vezes, cada vez após uma rotação de 90º em relação à figura precedente [b e c), Para concluir perfaitamento afigura, a desenhista contoma os quatro desenhos elementares com uma linha curva continua WWWSCIAM.COM BR Tom UNE SCIENTIFICAMERICAN BRASIL 49 q ue das, as figuras são diferentes, assim como seu significado e os procedimentos para traçá-las, Neste artigo, nos interessaremos apenas pelas imagens tradicionais do ko- lam, constituídas unicamente por linhas brancas, ou linhas brancas e pontos, sobre as quais se diz, às vezes, serem parecidas com tules, labirintos ou filigranas. Como à prática se desloca com as pessoas que emigram de Tamil Nadu, pode-se encontrar a tradição, por exem- plo, entres trabalhadores das plantações de chã do Sri Lanka, descendentes de imigrantes que sairam de lá no fim do século XIX, ou entre aqueles que foram para os Estados Unidos. Para fazer uma figura de kolam, o ponto de partida é frequentemente uma tabela de pontos traçada no chão segundo uma disposição variável — por exemplo, uma rede retangular, triangular ou he- xagonal. À figura é, então, desenhada, ligando-se 05 pontos ou contomando- os, de forma que os pontos ao mesmo tempo guiem e determinem restrições ao desenho. Esse método é o mesmo empregado pelos ishokwe, em Angola, para traçar os sona (ver artigo na pág. 68). Paraalgumas imagens, que podem ou não começar com uma tabela de pontos, é importante desenhá-las com apenas uma linha continua, que termina no ponto onde começou. Essas figuras fechadas são associadas ao ciclo infinito do nascimento, da fertilidadee da morte, caos conceitosde continuidade, totalidade e eternidade. Outras figuras, como asda pág. 49, são constituídas por diversas curvas. O kolam édesenhado utilizando uma tranformação sistemática de unidade de base, que é re- petida quatro vezes, de maneira que cada unidade sofra uma rotação de 90 graus em relação à precedente, Finalmente, uma ou- tra curva fechada continua contoma as qua- tró unidades. Coletivamente, es desenhos manifestam uma marcada preocupação pela simetria (ver figuras abaixo), Há também famílias de ilustrações que podem partilhar caracteristicas comuns (verexemplona pág. 52), Em alguns casos, as figuras maiores combinam várias cópias justapostas de menores. Em outros casos, asmembros são derivados, uns dos outros, de forma sutil. ESTILOS DE FIGURAS DE ROLAM Todos estes axemplos têm coma ponto de partida um geoptano ou tábela dé pontos. As figuras a, b ec ligam os pontas, enquanto as curvas das figuras de e f os contormam, As mulheres desenham as figuras c,e e f com linhas curvas continuas fechadas, aa contrário da figura d, que elas traçam com cinco linhas diferentes. No entanto, uma só linha seria suficiente: cada extremidade é o ponto de encontro de quatro traços, o que bastã para fazor uma figura com um sá traço. Diferentes simetrias intervém nas figuras: em tomo de uma linha central horizontal ou vertical, ou de rotação em torna de um ponto central de 45º [c), 90º (4) e 180º (e) SO SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL Linguagem dos Desenhos À CONCEPÇÃO E A ORGANIZAÇÃO das famílias são particularmente ricas em idéias matemáticas. Esses agrupamentos têm chamado a atenção dos teóricos da informática que trabalham com a análise e a-descrição de imagens com o uso de linguagens gráficas. Essas linguagens utilizam conjuntos de unidades de base e regras formais específicas para combinar essasunidades. Esse trabalho é aparentado com a teoria formal da linguagem, que foi descoberta há cerca de 45 anos com o es- tudo de Noam Chomsky sobre linguagens naturais. Nas décadas que se seguiram, os profissionais da informática usaram a teoria de Chom: se e na especificação das linguagens de programação. Gift Siromoney, do Colégio Cristão «de Madras, em Tamil Nadu, é o pioneiro na utilização dos desenhos do kolam no estudo das linguagens gráficas. Para ele suaequipe = da qual faz parte sua mulher, Rani —, eles são uma fonte rica de exem- plos das linguagens gráficas existentes, As figuras-também estimularam a criação de novos tipos de linguagens. Outros profis- sionais da informática de fora do grupo de Madras buscaram descrever às famílias de figuras, como é possível ver a seguir. Como preâmbulo, detalhemos um exemplo de linguagem formal rudimentar que produz cadeias de simbolos e vejamos somo tais cadeias podem ser convertidas em imagens. Nesse caso, os simbolos são limitados a/A, Be C, e nossa primeira rede é ABAA, Nossas regras para criar uma nova cadeia de símbolos a partir da precedente é B— AC, À — BeC — CC (um B numa cadeira toma-se um “AC” na nova cadeia; um À vira um B; e um Cum CC). Consegitentemente, se a cadeia de partida é ABAA, o primeiro resultado (ou seja, a reescritura da cadeia respei- tando-se as regras) é BACBB, o segundo. resultado é ACBCCACAC, e o terceiro, BECACCCCECBCCBCC. As regras da reescritura engendram resultados dd infinitum, À cada etapa, as três regras são ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA elele|jB/ellu|s|B|B|B|B B|B|B|B po) | B|B/B|B B|B|B B|jB|B s|B bb bb be) | E | E E (G bb Kb Ed Cb bb Rd Eb Cau IE o) (et) (2) | (te) | (a) | (e) | (232) | (25) | (23) | E =D a) as= 0) u=€) des) cm() de() 0=0) B= Bane LENAGEMS DE REDE podem criar figuras dê kolam da família do Topo da Montanhe (9), que têm crescimento polinomial, em vez de exponencial linguagem, 05 simbolas de uma rede retangular [as letras | são interpritados |. Nessa tomo unidades de figuras contíguas (em verde). Aqui, as unidades de figura são instruções especificas diversas facetas exploradas pelo grupoe as ligações de seu trabalho com os de outros especialistas. O essencial do trabalho teside-nas propriedades formais dos tipos: de linguagem propostos, é algumas delas se aplicam às famílias de kolans, O grupo de Madras utilizava dois mé- todos distintos de interpretação gráfica das redes simbólicas criadas pelas linguagens derede. Uma delas interpreta os simbolos contidos nas casas de uma rede retangular como unidades de figura contíguas (ver acima), Os conjuntos especificos de unida- desvariam de uma linguagem a outra, pois dependem da família de kolam descrita. Para criar diversos membros, as regras de produção das redes sucessivas devem cap- turara organização incrente das unidades de figura de uma dada família. Osegundo método de produção de de- senhos graças às redes simbólicas se apro- xima dos procedimentos utilizados pelas mulheres de Tamil Nadu. Nessa técnica, os simbolos das redes são representados por pontas, que podem trazer informações para guiar o traçado das figuras (ver figura acima). Os tipos de pontos e suas instmi- ções variam de uma linguagem a outra e eles também são específicos da família de WWW SCIAM COM.BR kolans descrita. Para compor os membros da família, as regras de criação de redes sucessivas devem igualmente capturar a organização em motivos de pontos que trazem instruções. Natureza Algorítmica Caçanpo a essência das figuras do kolam, carmados com linguagens gráficas, osespecialistas em informática iluminaram a riqueza das estruturas e sua natureza algoritmica, ou seja, sua construção orde- nada passo a passo. Essas linguagens não traduzem necessariamente a forma como as mulheres concebem e desenham as figuras. No entanto, eles ressaltam que o kolam, é em particular as famílias de figu- ras, não são simples coleções de desenhos individuais: procedimentos e técnicas sistemáticas os unem. Esta tradição também forneceu uma abertura única para a informática. Talvez não exista melhor maneira de exami- nar uma construção intelectual do que aplicá-la em dois exemplos escolhidos fora da cultura em que o conceito foi descoberro. Além disso, os pesquisadores procuratam aprender com as desenhistas eintegratam ao que aprenderam na teoria Unir ou dos Ny prum ae, passando por ven "Wm em tomo de um AL É Mk cm doa 'P mais primos por uma linha rota (pára frear um hosampo sem va dos Júiniros rodeando os Ml por dois arcos A Uni dois W passando porum [1 sobrepostas na rede simbólica. Outra linguagem de rede permite desenhar os. membros da mesma família (4, em azul), interpretando os simbolos das redes [asiatros & os formos geométricos em preto e branco] coma pontos que trazem ena prática de seu próprio domínio. Essa análise ilustra como as idéias matemáticas podem sair de suas fronteiras tradicionais, interagir com um projeto universitário e lhe trazer uma contribuição. A matemática está; sem dúvida al- guma, no coração da tradição do kolam, que dá bastante importância à simetria, à repetição dos motivos, às curvas contínuas fechadas e às famílias de curvas. São as mulheres que concebem e executam as figuras, cada uma na soleira de sua porta, introduzem variações infinitas cujas no- ções intrinsecas são transmitidas de gera- çãoa geração. Esta tradição faz certamente parte-da história global e da evolução das idéias maremáticas, mas continua a ser, antes de tudo. um elemento central da vida cotidiana em 'Tâmil Nadu. m Agradecemos à revista American Scientist u permissão de reproduzir este artigo. Marcia Ascher é professora emérita de matemática no Ithaca College. ERA Mathématiques d'allleurs. Marcia Ascher, Ed. Le Seul, 1996; SEJENTIFICAMERICAN BRASIL 53 Uma cultura indígena impregnada de matemática Os índios utes do norte, nos Estados Unidos, não têm palavras para designar a matemática. No entanto, ela está presente em suas tradições, sob aspectos individualizados na relação com o corpo cc matemática também faz parte de nosso medo de vida, mas nós não a praticamos como q homem branco (...) com tábuas de multiplicação, adição ou subtração. Nós temos essas coisas em nossas técnicas tradicionais de bordados de miçangas, na criação dos nossos cavalos e rebanhos, na construção de barreiras, na nossa mancira deerguer as tendas etc.” Fabian Jenks, ancião ute. As culturas nativas americanas são pouco reconhecidas por seu saber ma- temático. Entender como esses povos aplicam tais conhecimentos específicos nas práticas da vida cotidiana pode me- 54 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL lhorar nossa compreensão sobre elas. Vamos ver isso em detalhes com os utes do norte, uma tribo da qual sobraram apenas 3 mil representantes, espalhados em um temitório subdividido em três faixas nas proximidades do rio Uintah, no nor- deste de Utah — estado que deve seunome aos índios utes, nos Estados Unidos. Os anciãos tormaram-se os únicos detemores dessa cultura tradicional, pela qual quase todos os aspectos da vida cotidiana têm uma dimensão espiritual. Os utes demons- tram humildade e respeito diante da vida, das plantas e dos animais, com os quais lhes é determinado partilhar a terra. Ameaçada por muito tempo, esta cultura está em vias de renascer, graças Por Jim Barta e Tod Shockey aos esforços empregados para salvar suas práticas, As crianças estão aprendendo de novo a língua de seus ancestrais é os costumes de seu povo. Resumir a história e o conteúdo dessa cultura é um desafio ousado, pois eles certamente não se limitam ao que sabemos, mas vamos relatar neste texto diversos aspectos importantes. Esse povo viveu durante séculos em toda a região das Montanhas Rochosas, no ceste dos Estados Unidos, num terri- tório situado onde hoje estão o Utah c o Colorado. Os utes eram conhecidos pelos nomes que eles mesmos se davam, nuciu, o quesignifica, emsua língua, “o povo”. Eles viviam e viajavam em pequenos bandos ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA (contavam-se 12, diferenciados por hábi- tat), grupos de famílias ampliadas, de 20 a 100 indivíduos. Na época, esses bandos se reuniam para fazer comércio, casar, panicipar de cerimônias e celebrações, ou idas em grande escala, para obrer alimento em quantidade. Os deslocamentos dos utes através de seu temitório obedecia a ciclos sazona permitindo-lhes apanhar ou colher gi nozes, frutos, raizes € plantas medi Os caçadores ac realizar caça centavam ao menu coelhos, aves, peixes ou grandes peças de caças, como o bisão. Às casas temporárias (zetekiups) nham o formato de um cone eeram (ei de matérias de fácil às E 350, COMO Ervas E WWWSCIAMCOM BR galhos. Dutanté a estação de frio. quando os deslocamentos diminuiam e os locais de habitação tomavam-se mais permanentes. eles construíam cabanas cobertas de peles de animais fabricavam cobertas quentes com pele de coelho. No começo dos anos 1700, quando os utes adquiriram cavalos, trazidos pelos exploradores espanhóis, sua vida mudou completamente. Ás viagens ficaram mais rápidas, as caçadas, mais efic EI também podiam se lançar “com tudo sobre os inimigos — os principais eram os indios navajos. Em pouco tempo os ute tomaram célebres por seus talentos como cavaleiros e suas conquistas guerre! À partir de 1847, o estilo de vida tradicional mudou, com a chegada dos mórmons que, em busca de novas terras para: praticar sua religião sem entraves, entusiasmaram-=se com esses territórios que não pertenciam, aparentemente, a ninguém, é começaram a construir ali cidades permanentes. No começo pacíficas, as relações entre os utes é os mórmons envenenaram-se: as fontes que às indigenas mantinham e culos lh utilizavam havia s 5 eram, na- quele momento, contestadas, Estouraram violentos conflitos, a ponto de o exército intervir € forçar os utes a se renderem. ida, clesforam confinados em s, criadas pelo governo dos tados Unidos, e sofreram um processo SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 55 Situar: myh Os ANCIÃOS ERAM respeitados por seu conhecimento sobre a Térra, sua geogra- fia, sua geologia e suas fontes naturais. Os “mapas” de outras viagens presentes em suas memórias guiavam grupos de viajantes ou descreviam oralmente alguns marcos específicos é as distâncias atingi- das, Na época, mapas que representavam um itinerário podiam ser desenhados sobre ochão ou sobre peles, com canão. Os pontos cardeais eram determinados em função do nascer e do pôr-do-sol, a localização de uma montanha ou qualquer outro ponte notável. Sinais feitos à mão indicavama direção e eram aparen- temente utilizados de forma sis- temática para descrever uma localização a alguém, Os utes se situavam também observando atentamente a posição do sol nascen- te, da lua e das estrelas, Esses astros permitiam também determinara época doano e osacontecimen- tos suscetíveis de serem produzidos, tais como a volta de animais ou de plantas cas condições meteorológicas. À sobrevivência dependia desse conhe- cimento do meio. Pictogramas e perróglifos — desenhos feitos sobre paredes rochosas (ver imagem na pág. 59) — constituíam os meios de comunicação com pessoas que haviam acampado e caçado nos mesmos lugares. Alguns sinais e simbolos representavam características geográficas e das fontes na- turais. Às orientações topográficas (direita eesquerda, em cima e embaixo etc.) eram especificamente descritas onde um objero sé encontrava em relação à pessoa que lia as instruções. Lá também o contexto da observação dependia da descrição. A matemática é uma forma de comu- nicação de idéias é constitui, portanto, uma forma de explicar. Os números 4 e 7 únham um significado particular para as tes, encontrado nos comportamentos 58 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL culturais, na construção e no desenho. O 4 podia indicar as direções cardeais Ou quantas vezes era preciso repetir uma reza, uma cerimônia ou um canto. Um ancião, descrevendo a importância do 7, declarou: “Os sete são o norte, 0 oeste e o sul, e depois temos o céu ca terra, e então O meio seria nós mesmos, nossos corações — e são essas as sete direções”. Explicar; os kueh uhm A HORA ERA INDICADA pelo comprimento da sombra de um bastão plantado ou de um objeto natural e a direção para a qual elaapontava. Uma sombra dingida parvo ESTES MOCASSINS, ausim como muitos objetos «a vida cotidiana dos utes, são feitos com miçangas bordadas seguindo motivos geométricos. oeste de manhã confirmava que estavam antes do meio-dia, Uma medida exata da hortnão era necessária. As atividades e as ações de uma pessoa ao longo de um dia ou da noite eram explicitadas em função da posição do sol ou da cor do céu. O calendário ute era lunário. Uma observação atenta dociclo de nosso satélite lhesindicava com precisão a época doanoe atégestágioda noite. Uma nova lua coinci- dia com um novo mês. Essas informações eram vitais para determinar, por exemplo, o momento adequado para colheres frutos, desenterrarasraízes, colher as plantas, caçar Os animais € secar as cames, Havia quatro estações e, durante cada um desses períodos, alguns eventos isolados representavam os meses. Entre esses acontecimentos, citemos o período de acasalamento das águias, as migrações dos pássaros, o brotamento das plantas, a eclosão das flores ete. À fortuna e o status eram ilusrrados pelo número de cavalos ou de cabeças de gado, mas não cram determinados unicamente pelas posses materiais. Um ure parecia rico aos olhos de seus con- gêneres quando possuía alguns ralentos apreciados, como saber fazer bordados de miçangas, cantar ou dançar, O status se elevava de acordo com seu conhe- cimento dos costumes tradicionais, da humildade de sua vida, da sua habilidade para alimentar a família, de sua capa- cidade de escutar os sábios anciãos, de confeccionar as vestimentas tradicionais erc. Jogar: keeyakyh OcastareLo jogo era va- lorizado, Em alguns tipos, autilização da matemática só servia para contar os pontos. Em outros, ela fazia pane das atividades. Ene os diversos aspectos matemáticos que podiam:se encontrar nos jogos. citemos as noções de medida, de numeração e de probabilidades. O número de pontos designava os ganhadores. Alguns jogos demandavam aptidões fisicas, como corrida a pé, arco e Mecha ou o shinny (parecido com o hóquei sobre grama), outros eram mais cognitivos. Era o caso do “jogo de mão ou do bas- tão”, de adivinhação, que era disputado entre duas equipes constituídas por um número qualquer de homens e mulheres unidos dentro de uma área delimitada no chão por dois longos bastões colocados paralelamente. Cada equipe começava o jogo com 10) ou 12 pequenos pedaços de pau e vários ossos. Um deles era en- ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA DS PETRÓGUIFOS que es utes deixavam sobre algumas paredes de pedra constitulam um meia de comunicação e informavam sos novos visitantes sobre os. características geográficas e a localização das fontes naturais na região rolado por uma correia, O objetivo do jogo era adivinhar em qual mão um dos jogadores da equipe adversária escondia o osso branco (sem correia). Quando a equipe adversária tivesse adivinhado, à equipe perdedora passava a ela um de seus pedaços de pau. À primeira equipe que conseguisse ficar sem pedaços de pau perdia a partida, assim como a aposta que precedia o jogo. Apostavam-se peles, objetos pessoais eaté cavalos. Ojogo dotu-roo-hacep era disputado sabre uma pele de corça com quatro bas- tões. Cada um era pintado (ou gravado) por uma-combinação diferente de cores (ou de marcas), representando valores numéricos combinados pelos jogadores. Eram desenhados ou pintados marca- dores sobre a pele de corça ao longo das margens. Colocava-se uma pedrinha no meio. Os jogadores, sentados, ficavam WWVESCIAM.COM.BR na frente um dos outros, com a pele de corça entre eles, Eles jogavam, cada um de uma vez, tentando fazer os bastões atingirem a pedra. O escore dependia da forma como os bastões aterrissavam, cos jogadores deslocavam os marcadores, em torno da pele de corça, de acordo com os pomas feitos. Ganhava a partida aquele cujo marcador fizesse primeiro um giro completo em torno da pele. Esse breve apanhado das tradições dos índios utes reflete a aplicação de conceitos e princípios matemáticos por um povo duja existência dependia dela. À criati- vidade c a inteligência matemática que eles atestavam ter indicam serem eles um povo com uma herança rica, que também utilizava a matemática para tornar sua vida e sua cultura agradáveis. Hoje, gra- ças à cia € à compreensão dessa tradição matemática, as crianças utes se conse «dão conta de que, ao hontar e perpetuar as tradições de seus ancestrais, aprendem «utilizam a matemática. Os autores agradecem dos anciãos utes por terem transmitido a eles seus saberes, e especialmente Lillian Reed, Fabian Jenhs, Cameron Cuch e Venita Tveapont. em Jim Barta é professor da Universidade do Estado de Utah, e Tod Shochey; da Universidade do Maine. Etta Mathematics and beadwork. Jim Barta, em bind's af Chonge, American Indian Science and Enginee- Fig Socioty, vel. 14 [2], págs. 36-41, 1999. The Multicultural Math classroom. C. Zaslavsky, em Bringing in the World, Portsmouth, Heine- mann, 1996. Mathematical enculturation. A. Bishop, em À Cultura! Perspective on Mathematics Education, Kluwer Academic Publishers, 1994. SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 59 60 SCIENTIFICAMER TAS! TNOMATEMÁT é diferente no plano cognitivo, quer dizer, nodas representações mentais autóctones. Será que os nzakara ignoram as proprieda- des dessas fórmulas, ou será que têm cons- ciência da estrutura em cânone, ou seja, da identidade dos dois perfis melódicos? Não podemos responder diretamente a essa questão, e num artigo da revista LHomme expusemos essa problemática, chamando a atenção para as dificuldades que existem de fundamentar certas análises abstratas na realidade cognitiva autóctone, A maior parte dos estudos de emomanemática aborda as propriedades formais de sistemas estudados independentemente dos pro- cessos mentais eferados por aqueles que estão na origem desses sistemas, Uma das principais razões é o fato de que os estudos são feitos u posterion, a partir de dados de campo, recolhidos sem qualquer preocu- pação matemática. Esse é o caso de nosso estudo, que revela a falta de informações sobre o modo pelo qual os músicos dessa sociedade representam para si próprios suas fórmulas instrumentais. Aplanta dos Gêmeos Prorusemos um conjunto de indícios, retirados de nossos trabalhos feitos em colaboração com a emólogo Eric de Dam- plerre, especialista em sociedade nzakara, indícios esses que poderiam explicar a aparição dessas fórmulas em cânone. Um dos principais argumentos em favor dessa hipótescé a utilização pelos nzakara deuma planta particular no rirual que se segue ao nascimento de gêmeos (ela é plantada em frente à casa onde eles nascem). A notável geometria dessa planta, da qual as duas fileiras de folhas estão dispostas em planos perpendiculares, cafastadas uma da outra ao: longo do caule, explica por que ela intervém nesseritual (propriedades “geométricas”, O interesse des nzakara pela geometria dessa planta talvez esteja em relação com suposta intenção dos músicos, de tocar as formulas em cânone, ou seja, tendo dias linhas me- lódicas deslocadas. Contudo a questão é controversa ea emomusicólogo Klaus Peter Brenner não WWWLSCIAM COM.BR te Z 1 ' ' ' ' ' ) 1 1 > Distância = motas E == E =. a Fo = Distância = 4 notas 1.45 FÓRMULAS DE HARPAS nzakara são. representadas pelos pontos [as notas) dispostas sobre cinco linhas, cada uma delas correspondendo a uma corda do instrumento. Essas fórmulas são cânones, ou soja, as duas melodias (as linhas coloridas continuas, o melodia tocada em notas graves em azul o outra, agudo, em laranja) são deslocadas no tempo, Entretanto, o cânone não é rigoraso e podemos observar “erros” [marcados em vermelho, às metodias são, emlinhas pontilhodos, para corrigir esses erros). O intervalo do cânone em verde] é o número de notas que separam o Início de cada melodia , Conaiz345 2.DSCÂNONES NZAKARA respeitam as determinações nas cordas tocadas (a, de 4 à 5): somente cinco pares do cordas pinçadas simultaneamente são utilizados (4-3; 1-4;2-4:2-5e 3-5]. Quando as cordas são dispostas em círculo [b), esses pares (unimos os duos cordas par uma fiha numerada em vermelho, de O a 4) formam uma estrela b e > OS é decinca pontas, Para respeitar a estrutura do cânions, 08 pares de cordas devem se encadear [na distância do cânone) é segundo o gráficoc. Por exemplo, quando a distância da cái gual a quatro notas, o par É deve, segundo a3 duas flechas que partem do ponto 1 [em verde) se fazer sogulr, quatro passos adiante, do par 3 ou 2. A linha pomtilhada é o percurso indispensável, mas não canônico, para percorrer um cielo no gráfico e autorizar uma melodia aceita a hipótese dos cânones, ao desen corda tocadas nastrês formulas da figura volver a teoria de que, no plano cognitivo, as fórmulas nzakara devem ser analisadas de outra forma. Na verdade, podemos analisar as fórmulas nzakara de modo totalmente diferente, apesar de equivalente pela lógica, Se numeranmos todos os pares de 1 (adorando a numeração precedente, de 034) faremos então surgir uma estrutura “em escada”, Por exemplo: na primeira fórmula es seis primeiros pares 023010 são em seguida deslocados em uma uni- dade — 134121 — cassim por diante, até voltar à segiiência inicial (ver figura 3). À SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 63 € Rpetição de pares Fiemuta nrákara raça cierantar da precudevio o de pares: Repetição de sequências curtas D033iMagE UIBAIZaD? Ca osaLiqs2za (oasai)(o4321 ) 3. A ESTRUTURA EM ESCADA dos cânones nzakara aparece quando nos interessamos pelos pares de cordas tocadas simultantamente. Em o, o motivo 023040 é sucessivamente “deslocado” em uma unidade, 134121, 241232... para voltar aq motivo inicial (a etapa seguinte não representada). Em b, é motivo de dois pares sofre um deslocamento de duas unidades: D1, 34, 12. Ao estudar as sequências possíveis [c) da fórmula b [fixa-se o primeiro por, 6, e avoliam-se todas os possibilidades para o segundo), nos damos conta de que somente a fórmula nzakara [em vermelho) evita as repetições de pares (em azul) ou de sequência curta [am vorde), Encontramos assim uma troca circutar da fórmuta nzakara (em fonenjis) A. UMA POLIFONIA DE PIGMEUS AKA [aqui, a peça mbenzelo; segundo o CD-Rom Pigmeus oko, povo e músico) associa vozes [as linhas verde, vermelha, marrom e amarela representam o conto] e um fundamento polirritmico tocado em instrumentos de percussão [as figuras geométricos brancas). Nessa poliritmia, uma fórmula assimétrica [os retângulos em laranja) é tocada com lâminas de ferro.As durações que separam os sons nossa fórmula são variáveis e podemos raagrupá-las, para formar durações de duas unidades (um som e um silêncio) e de trés unidades [dois sons é um silêncio). No final, obtém-se a fórmula rítmica 22222322223, que é repetida circular e ciclicamente estrutura em escada consiste em repro- duzir um motivo inicial de um número de unidades número de vezes suficiente, para se voltar ao ponto de partida. Pode- mos demonstrar que sob certas condições essa estrutura é logicamente equivalente à estrutura do cânone. A estrutura em escada evidencia uma propricdade suplementar na mais curta 64 SCIENTIFIC AMERICANBRASIL das fórmulas da figura 3, a unicidade. Ve- jamos em que. Aqui, o motivo reprodu- zido O só contém dois pares. Podemos portanto nos perguntar quantas seguên- cias desse tipo é possível fabricar. Fixemos o primeiro par em 0, e enumeremos os valores possíveis para o segundo. Se tomarmos 0, obteremos uma repetição de pares, o que não acon- tece jamais nas fórmulas do repertório nzakara. Se tomarmos 1, o resultado é a fórmula da ilustração 3. Se tomarmos 2, a fórmula obtida é somente uma permutação circular da precedente. Se tómarmos 3, obteremos novamente uma repetição de pares. Enfim, se tomarmos 4, constataremos que a fórmula se divide em duas (04321 é repetida duas vezes). Ássim, para os valores, 3, 4 a sequência obtida é de cera forma “depenerada” (repetição de um par ou repetição de uma segliência mais curta). Além disso, para os outros valores [ e 2, obtemos a mesma seglência de uma permutação circular próxima. Finalmente, a fórmula nzakara aparece como a única maneira de produzir uma segiiência em escada a partir de um motivo que tem somente dois pares. Descrevamos agora um segundo exem- plo de estrutura matemática, presente nos repertórios musicais da África central, desta vez na dimensão rítmica. Trata-se de uma estrutura rítmica assimétrica, que é utilizada pelos pigmeus aka, entre outros povos, um grupo de caçadores-coletores da floresta tropical do sudoeste da República Centro- Africana, no vale do rio Lobaye. Esses ritmos assimérricos resultam de uma combinação de durações de duas e três unidades. As polifonias vocais e instru- mentais muito complexas dos pigmeus aka contêm alguns desses ritmos. No i da polimitmia representada na ilust uma fórmula assimétrica é executada com batidas das lâminas de facões de ferro, se- gundo a duração de duas ou três unidades. Repetida circular e ciclicamente, a grafia (ou representação numérica) da fórmula rítmica é 22222322223, Ritmos Assimétricos Osurrmos assintérricos desse tipo, que encontramos na África central, têm uma propriedade parricular, chamada “impari- dade rítmica”, colocada em evidência pelo etmomusicólogo Simha Arom e expressa na fórma de um enunciado matemári- co. Ao representar a seguiência rítmica ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA ns [nm | Duração Iransfocmações Ritmo Grupo étnico é js fo ob 32 [ande a |z cbbo sesaz aka, phoya, neakara 1 E 16 abbbbb 3223222 gbaya, ngbaka Jo ju. bbb seezesodaza aka | 6 a 2a conbbb 333233322 não utilizado | E cababb a33232232 aka (fórmula mokongo) I E cmbbob 3asesza3e repetição da precedente 5. A IMPARIDADE RÍTMICA das fórmulas assimétricas aparece quando dispomos num. efreulo essas fórmulas (aqui, 32222322222]: não se pode dividir o ritmo (o círculo) em duas partes de mesma duração - Issa qualquer que seja o ponto do partida. As sequências [o quadro) que, por um lado, respondem a essa propriedade de imparidade tftmica e, por outro tâm uma duração que é uxilizada na região (8, 12, 158 24), sãotodas tocadas pelos aka ou por seus vizinhos. Nosso quadro, np em; comespondem à quantidade de núclaos ritimicos de 2 pulsações e de núcleos do 3 ne sequência. À duração corresponde à soma de nan). As transformações indicam como se pode obter o ritmo a partir da palavra vazia precedente na forma de um circulo (ver ilustração 5), a propriedade expressa faz com que não possamos dividir o circulo em duas partes iguais, qualquer que seja o ponto de partida escolhido, Propusemos uma construção que permite obter passo a passo todos, os rit- mos que obedecem a essa propriedade de imparidade rítmica. Para todo par (1, v)de vocábulos formados de 2e de 3, fabricamos dois novos pares de palavras, segundo duas transformações diferentes observadas, a ch: a primeira transforma vem Ju ev em doa segunda transforma «em v cu em 24, É possível demonstrar matemarica- mente que às seqliências em que se veri- ficam a imparidade rítmica são exatamente as-mesmas que fabricamos colocando tréchoa trecho duas palavras ev, obtidas aose aplicar um número qualquer de vezes astransformações a « b a partir da palavra vuzia, com a condição que b seja aplicada um número impar de vezes. Por exemplo, a sequência de transformações abhh leva à palavra 32322, como podemos verificar, etapa por etapa: b b b a de Naro = Velo =» 2 =» 0 =» 32 vw Nado -» 2 2 o 382 - 2 = WNWUSCIAM COM BR E» O sy] Essa sequência (tv = 32322) obedece à propriedade de imparidade rítmica. Quando efetuamos a construção de todas as fórmulas ritmicas possíveis, de pequena extensão (para sermos realistas), percebemos que as soluções são pouco numerosas. É, além disso, pretendemos adequar um traço característico das fórmulas em uso na região, quando elas são praticamente todas utilizadas pelos pigmeus aka ou por outras populações (zande, gbaya, nzakara, ngbaka). Esse traço impõe que a soma total das durações apresentadas na sequência seja sempre escolhida entre os valores 8, 12, 16 ou 24 (quer dizer, da forma 2º ou 3x 2º), Ao restringir o cálculo às segiiências desse tipo, e ao eliminar também as que são a reperição de uma segiiência mais curta, obtemos o quadro da ilustração 5, onde ns € n> designam respectivamente os números de 3 e 2 da segliência Quando na = 2, as segiiências são todas utilizadas. Quando ná = 6, duas segliências entre as três obridas são re- correntes uma com relação à outra, o que significa que cada uma é obtida lend a outra em sentido inverso (da dir a esquerda). Uma das duas formas é utilizada pelos pigmeus aka. Trata-se dafórmula rítmica 333233232, chamada mokongo, batida sobre uma viga de ma- deira. Ela intervém no ritual do zoboko, que acontece na véspera de uma grande caçada. No final, só uma das segiiências teoricamente possiveis (333233322) pareee não ser utilizada na região. Essa enumeração permite acreditar que há razões de ordem cognitiva que explicam o aparecimento dessas fórmulas rítmicas. E ainda assim a questão continua sendo difícil de ser respondida, dada a au- sência de relatos dos músicosa respeito de sua própria prática. Esses problemas são asmesmos que os evocados nos casos das fórmulas em cânone, da harpa nzakara. Em particular, nenhum termo vernacular caracteriza as fórmulas de harpa, que são cânones. Todavia, podemos utilizaro mes- mo tipo de argumento combinatório que para os ritmos assimétricos, Na verdade, a estrutura em cânone nzakara aparece num grupo de seis fórmulas do repertório de harpistas. Ora, este é constituído de cerca de 30 fórmulas conhecidas: 20% das fórmulas têm a estrutura estudada, Essas fórmulas são minoritárias, mas sua proporção é notadamente superiorao que seobreria na ausência de fatores que favo- recem o surgimento de tais fórmulas, Assim, quando uma propriedade não aparece de modo acidental, supomos que as condições psicológicas particulares privilegiam seu aparecimento. Uma representação mental não explicitada explicaria, portanto, a existência dessas fórmulas em cânone. e M. Chemillier é professor da Universidade de Caen, na Baixa Normandia, França. ie ALTA Représentations musicales et meprésentations ma- thématiques. Marc Chemilher, in LHomme, número especial Musique er Anthropofagie, nê 171-172, páps. 267. 284, 2004. Polyphonies et polyngthmies d'Afrique centrale. Structure ex métodologie. 5. Arom, Paris, Seiaf, 1985, SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 65 Desenhos dos contadores de histórias de um povo da África central criam enigmas de análise combinatória Por Paulus Gerdes 68 SCIENTIFICAMERICAN BRASIL ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA téo final dos anos 1950, os na- tivos de povo tshokswe, ainda hoje composto de 1 milhão de habitantes no nordeste de An- gola (ver mapa abaixo), reuniam-se após um dia de caça em volta de uma fogueira e escutavam um deles contar histórias segundo um ritual preciso (ver foto na pág. aolado), Após ter limpado e alisado com a mãoo solo arenoso, o narrador desenhava uma grade de pontos, cuidando para que estes estivessem regularmente espaçados. Em seguida, no decorrer de sua narrativa, seu dedo traçava ao redor desses pontos (em casos muito-raros, passando por eles) umalinha curva (cu fio) que servia de base para sua história. Por exemplo, a figura la ilustra uma fábula na qual um coelho, em |, descobre uma mina de sal, em 2. Infelizmente, esta é o objeto de desejo de um leão, em 3, de um leopardo, em 4e de uma hicna, em 5, cada um deles invocando a lei do mais forte, para se apossar do tesouro. No final da história o coelho vence e permanece sendo o único a ter acesso à mina, pois os outros ficam separados pelo fio. Tu Tshokwe Filii Esses DESENHOS CHAMADOS de sona (nosingular, um lusona) pertencem a uma longa tradição: eles ilustravam provérbios, fábulas, jogos, animais e enigmas, e de- sempenhavam um papel importante na transmissão do saber às novas gerações. Váriossona evocavam omulanda, oritode passagem dos meninos à idade adulta. O traçado dos desenhos era liso e conti não, feito de umasó vez: qualquer hesitação erasigno de falta de habilidade, queaaudiên- cia recebia com um sormiso irônico. A grade inicial de pontos facilitava a tnemorização dos desenhos pelesafaca Reta soma, os especialistas nessa arte, O número de colunas e de linhas dependia do motivo desejado e da história, Por exemplo: o luso- na que representa as marcas deixadas por uma galinha perseguida era ilustrado com OTERRITÓRIO [em marrom) dos tsholome WWWESCIAM. COM.BR 1. MUITAS VEZES lendas e fábulas basciam-sa nós: sore. Por exemplo: [o], um coelho [£) descobes uma mina de sa! [2], quer umileão, (3), um leopardo, [4] e uma hiena [5] desejam. Mo final ta história [quado o fi fat traçento), a eoelho 6 o única já que é o único à ter acusso à mina. O lusana em b destra eutra história: por ocasião da marte ia clvele de uma proprio aldeia, três ladrõos (1, 2 4 3) prevendom tomar seu lugar. Nó final, somente o tegundo assaltante tem acesso no cadáver cio tóma o poder e sobe sa trono um desenho cuja grade inicial tinha cinco linhas deseis pontos. Graças a esse método — um tipo de sistema de coordenadas —, os tshokwe reduziam a memorização de um lusona inteito a uma de dois números, o das linhas e o de colunas. É possível estudar esses sona por meio damatemática de gráficos, redes definidas por pontos (vértices) ligados por linhas (arestas). Nesses objetos, o comprimento € acurvatura das arestas não importam: dois conjuntos de vértices idênticos podem ser ligados da mesma mancira, mas porarestas REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DO CONGO com um “encanto” diferente: aqui. os gráfi- cos são topologicamente equivalentes (ver figura 2). Esse também é o caso de certos sona, em especial de dois que contam a história de Sa Chituku e desta mulher Na Chiruku: à primeira vista, esses dois sona são diferentes, mas eles são equivalentes — gos tsholawe sabem disso. Determinados sona distinguem-se fatode serem constituídos pela reperição de um motivo elementar. Esse é, porexemplo, ocaso das árvores mtyombo (ver fgtra 3), soma que representam os antepassados da Harare 1) ZIMBÁBUE LHE E E ç SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 69 AN ENS / ta (E RE (Gas) 2 DOIS GRÁFICOS fa e b] são isomórficos: existe uma correspondência univaca entre as arestas é os vériicas de um e do outro. Aqui verifica-se que os vértices A, B,C,De E e as arestas AB, AC, BC, BE, CO, CE e DE são comuns sos dais gráficos. Do mesma mado, 05 sena [ce d são isomórficos: 05 pontes 1 0 2 representam Sa Chitukas e de sua esposa Na Chétuku na meio de sous vizinhos [os outros pontes). O metida, ciumento, constrói barreiras que isolam sua mulher, obrigada, em consequência, a sor ficl 3 AS ÁRVORES MUYOMBO constituem uma família de sona que são a repetição de motivos elementares reunidos em grandes figuras. Os pontos [em laranja] da linha superior simbolizam os membros de uma família que ora aos antepassados 4.05 MOTIVOS EM TRAMA são os sona mais simples: eles são formados de fios que percorrem as diagonais de uma grade de pontos. Amaíaria é composta de um único fio (a), mas alguns necessitam vários [b, em morram e om azul). Esses desenhos são análogos ao trajeto de um saio de luz num perímetro circunscrito, onde as paredes são espelhos (c) Quando sa inserem espelhos suplementares [dl em pantilhodos negros) entre 05 pontos de colunas de fileira par, obtém-se os sona da família do ventre da leão PO SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL aldeia. Dediquemo-nos agora ao número de fios necessários para traçar as sona. À análise combinatória nos ajudará. O Número de Fios Os soxA QuE se assemelham a tramas de tecelagem estão entre os mais simples (ver figura 4). Entre eles, alguns são compostos deumúnico fio, que contomacada ponto da grade, antes de reencontrar seu ponto inicial; outros exigem vários fios. Podemos analisar propriedades mate- múticas dos sona em trama, assim como os de outra família. chamada ventre do leão, e evidenciar em quais casos um único ho é suficiente para desenhar o lusona inteiro, e em quais outros vários são necessários, Dito de outra forma, dado número de linhas e decolunas, de quantos fios precisamos para desenhar uma trama completa? Antes de mais nada, imaginemos o lu- sona como a trajetória de um raio luminoso num plano retangular cujas paredes são espelhos. À luz é emitida de um canto do plano em determinada direção, formando umângulode 45ºcomum doslados, Assim, a luz se reflete nas paredes, percorrendo as diagonais da grade. Usando um sistema de coordenadas pars marcar os pontos de tal grade, obser- vamos que um fio que parte do ponto (a, 0) atingeoponto(n + 1,n+ | -a) emseguidao ponto (n+ |-a,n « |) efinalmenteo ponto (0,4), antes de reencontrar o ponta inicial. Na figura 5a, o fio passa pelos pontos (2, 0), (5,3).(3,5)e(0, 2). Cadafhoédesviadorrês vezes antes de voltar a seu ponto inicial e percorre quatrodiagonais: no total, é preciso desenhar n fios (retângulos) para percorrer todas as diagonais da grade. Uma grade 5 UM MOTIVO EM TRAMA no qual a grade é quadrada fa) requar um número do fios fgual ao número de pantos de cada lado, aqui quatro. Detormina-se o número do fis necessários para uma prade qualquer, decompondo-se esta em quadrados (5): demanstra-se que o múmmero de fios para mativo completo é igual zo númera de fios. necessários para a parte restante. quando s colocam de Lado todas ass grades quadradas. Em nosso exemplo fuma grade de três linhas e de quatro colunas após a eliminação do quadrado de 3x3 [ceiimiado em laranja), resta uma coluna de trés pontos [cdetimitada em violeta). que pode ser cercada por um único fio: deduz-se que um fio é suliciente para toda à grade ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA Para prever o destino, os malgaxes manipulam quadros de grãos que obedecem a regras matemáticas refinadas Por M. Chemillier, D. Jacquet, V. Randrianary e M. Zabalia siftidy é um método de adivinhação utilizado em toda a ilha de Madagascar. Seus princípios foram herdados da geomancia árabe, que se propagou na África no rastro do Islã. Aparentemente, os malgaxes fizeram para si próprios uma adaptação desse modo de adivinhação, e a maioria da população local pratica asmesmas regras de construção formal de origem árabe, ainda que alguns detalhes sejam diferentes. Os malgaxes recorrem a adivinhos tradicionais para tudo em sua vida cotidiana, por isso ces podem ser encontrados em todas as cidades. A adivinhação sikidp consiste em dispor sobre o solo grãos de fano (uma espécie de acácia) que formam um quadro, com o objetivo de “ler” o destino em determinadas disposições dos grãos. O procedimento comporta uma parte aleatória, na qual o destino se manifesta, e uma parte algoritmica, construida a partir da retirada, segundo regras precisas. Veremos que essa parte calculada envolve propriedades algébricas. Vários estudos dedicaram-se às propriedades algébricas da adivinhação sikicp, em especial o de Marcia Asher é o de Manclo Anona, matemático da Universidade de Tananarive, este último não publicado. Sua fonte é o trabalho de um grande conhecedor das tradi- qõesmalgaxes, Raymond Decary, que fotografou os adivinhos desde o início do século XX (ver foto nu pág, «o lado), Recentemente, o antropólogo Jean François Rabedimy, da Universidade de Tulear, no sudoeste de Madagascar, também observou a adivinhação sikidy.. “Todosessesestudos de emomatemática abordam as propriedades formais do sistema in abstracto, sem levar em conta os processos mentais desenvolvidos pelos adivinhos. Desde 2000, temos estu- dado aspectos algébricos da adivinhação associados à pesquisa de campo. Para ter acesso aos mecanismos mentais que “encamam” as diferentes propriedades estudadas, filmamos em video os gestos ex- plicativos easetapas de construção, ecronometramos determinadas operações mentais, a fim de estudar sua natureza. A atividade de adivinhação começa pela mistura dos grãos atirados sobre o solo, e pela recitação de evocações místicas. Em seguida, o adivinho pega um punhado de grãos ao acaso, sem saber previamente qual éo número, que ele amontoa diante de si. Depois ele retira os grãos dois a dois, com os dedos indicador e médio. O WINWLSCIAM, COM.BR adivinho só se interessa pelo que sobra dessa eliminação por pares, ou seja, pelo resto da divisão do número inicial por doi giiência, o resto só assume dois valores, 1 ou 2 (mantém-se 2 em vez de 0, quando o número de partida é par, porque a manipulação do zero é pouco visual), Esse resto, determinado pelo número de grãos contidos inicialmente no punhado, é o resultado de uma retirada aleatória na qual se manifesta o destino do consultante, Linhas e Colunas A OPERAÇÃO DE RETIRADA é repetida 16 vezes, eos 16 valores são colocados num quadrado, de quatro casas laterais, chamadas renin tsikidy (ou matriz mãe). Nesse quadro, interessa-se pelas linhas e colunas, o que define oito figuras compostas de quatro elementos (ver ilustração 1). Abaixo da matriz mãe, são construídos oito novas colunas, as “filhas”, de quatro elementos cada. Esses elementos são as somas dos elementos, tomados dois a dois, de duas colunas ou de duas linhas, aplicando as regras de adição módulo 2, com a reserva citada anteriormente no zero não utilizado (1 grão + 1 grão = 2 grãos; 2 grãos + | gro = | grão; 2 grãos + 2 grãos = 2 grãos) A adição de duas figuras de sikidy é uma operação comutativa (ela não depende da ordem das figuras) e associativa (a adição de três figuras é independente da ordem escolhida para adicionar, primeiramente, duas figuras, antes de adicionar a terceira ao re- sultado), Finalmente, a operação possui um elemento neutro que é o quádruplo (2, 2. 2, 2), e cada figura é seu próprio inverso: ao se adicionar uma figura a cla mesma, obtém-se sempre oelemento neutro (seo elementoé 1, então | + | = Zescoclementoé 2, então2 +2=2), Assim, a adição de figuras forma um grupo comurativo. Aorepetir o processo de adição, os adivinhos obtêm várias gera- qões de filhas. As filhasdiretas são calculadas pela adiçãode linhasou de colunas da matriz mãe. Novas filhas são em seguida construídas apartir das precedentes. À ilustração 1 mostra um exemplo de con- figuração de sikidy no qual as colunas-mãe, contadas da direita para a esquerda, são numeradas de 1 a 4, as linhas-mãe (lidas da direita para a esquerda) são numeradas, de cima para baixo, de 5 a 8, as filhas de primeira geração são obtidas do seguinte modo: a filha 9 é asoma das linhas-mãe 7 e 8, a filha 11 ésoma das colunas-mãe 5 e SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 23 a 4 3 1 e eo e e tee e f z i ã ã “e. ad re eo e o se e o 0. e :. fe Fee e ieo iee “eo Jee ee + mw " 1 mw 1. UM QUADRO DE SIKIDY [0] é constituida de 16 sequências de grãos com 4 casas. cada uma. Cada uma contém um ou dois grãos, Às colunas.mão (1, 2, Je 4,05 nomes vernaculores estão em vermelho) e as linhas.mãe (5, 6, ? e 8;em azul) formam a matriz originária a partir da qual-se fabricam as filhas da peimeira (9, 14, 6, atilha 13 a soma das colunas-mãe 3. € 4, e a filha 15 a somadas colunas-mãe 1 é 2. As duas filhas de segunda geração são a 10 (9 +Ujea 14 (13 + 15). A filha de terceira geração é a 12 (10+ 14). Finalmente, a filha de quarta geração é a 16 (12+ 1). Figuras Pares e Impares CADA UMA DESsas 16 posições, linhas e colunas-mãe, e as filhas de todas as gerações têm um nome vemacular: na ordem em que são numeradas, fale, maly, fahatelo, bilachy, fianahana, abily, alisay, fahavalo, fahasiuy, ombiasp. haja, haky, asórita, sailp, sajary e Riba. Asfiguras (os quartetos) desikidy são emnúmerode L6(2º, pois, para cada um dos quarro elementos, pode-se escolher entre um ou dois prãos) e têm nomes vemaculares, diferentes dos anteriores, que corespondiam às localizações no quadro. Usamosa terminologia da emia antandroy (do sul de Madagas- car). Osnomes variam um pouco de uma etnia a cutra. Além disso, os adivinhos distinguem, em sua arte, duas classes importantes de figuras, aquelas cujo número total de grãos é par, os mpanjaka (príncipes) eaquelas cujo múmero total de grãos é impar, osandevo (escravos). Os principes são tareky (1, 1, 1, 1), alasady (1, 1,2,2), adalo (1,2, 1,2), alokola (1, 2,2, 1) alotsimay (2,1, 1,2), alohotsp (2,1,2,1),adabara (2,2, 1, 1), asombola (2, 2, 2,2). Os escravos são karija (1, 1, 1, 2), alimizanda (1, 1, 2, 1), alakarabo (1,2, 1, D.renilaca (1, 2, 2,2), alahaosy (2, 1, 1, Dulaimora (2, 1, 2,2), alibiavo (2, 2,1, 2), alikisy (2, 2,2, 1). Essa distinção príncipe/escravo rem papel importante na adivi- nhação. Uma regra simples é que um principe é mais forte do que um escravo. Tomemos o exemplo de um indivíduo que consulta a respeito de uma doença. O consultante é representado pela coluna 1 da matriz mãe. Obrém-se a doença adicionando a coluna 1 à filha 9, Ássim, como a figura | é um escravo, mas a que representa a en- fermidade é um príncipe, o adivinho deduz que a doença é grave. A distinção principe/escravo também intervém numa proprieda- de formal dosistemade construção de figuras ilhas, propriedade que determina que aquela que aparece na posição 12 (posição haley) seja necessariamente um principe. Podemos verificar issona ilustração |, naquala figura em posição 12 éulasady (1, 1,2,2), queé realmente PA SCIENTIFICAMERICAN BRASIL b 3 4 Sat modulo 2 E à p 08... eee e Bábity M 7asay ' Btahavato 1 0e:+e eee o 1 z ã ee e |, “* es | VOGO-G 006 06 z i o ei ã 1 e Ee Ú “-..- ee. e Es 1 138 15:em verde), segunda [108 1d; em loronja), terceira (12, em rosa) e quarta [16, em violeta] gerações. As adições entre parênteses indicam os quádruplos-pais. Por exemplo, [b), a filha asorita [3+4) é resultante da soma das colunas-mãe 3, [fahateão) e 4 [bitady). Os elementos são adicionados dois a dois mádulo 2 um principe; podemos também demonstrar essa propriedade, pois asoma dos grãos na coluna 12 é igual, módulo 2, ao dobro da soma detodos os elementos da matriz mãe, uma vez na ordem das linhas, e uma vez na ordem das colunas. Na verdade, quando se olha o procedimento de elaboração de filhas: 12 = 10 + 14, ora 10=9+ 11 €14=13+15.seja 10=7 +8+5+46014=4+3+2+ 1, poranto 12=1+2+3+445+6+7 + 8. Sendo onúmero de grãos nessa soma necessariamente par (cada elemento de matriz mãe é contado duas vezes), a posição 12 é realmente um principe. Podemos olharadiantee mostrar que toda figura par (nãvimpona qual principe) pode aparecer nessa posição, Para tanto, basta-cons- truir uma matriz mãe cujos elementos são pares de grãos, exceção feita a alguns grãos isolados posicionados ad hoc, a fim de obter a figura desejada, O conjunto de figuras que pode aparecerna posição 12. portanto o conjunto de todas as figuras pares. Por um racioci- nio análogo, demonstramos que uma figura qualquer (principe ou escravo) pode aparecer em toda posição secundária (as filhas) com exceção da coluna 12, que só é ocupada por principes. Os adivinhos conhecem essa propriedade da coluna filha 12, é ela éusada para verificar que não houve erro de cálculo. A presença deum príncipe nessa posição &uma condição sine qua non para que um quadro de 16 figuras possa ser interpretado. Todavia, Isso não diz nada a respeito do modo pelo qual es adivinhos conceitualizam anoção da própria “paridade”. Será queeles são conscientes de que a distinção principe/escravo se baseia num critério aritmético, e se sim, como eles a expressam? A resposta nos foi dada por Raymond, um adivinho de emia mahataly que vive em Tulear. Ele posicionou oiro figuras pares umas ao lado das outras, em seguida, em cada figura movimentou todos os grãos isolados, de modo à emparelhá-los com um outro grão isolado da mesma figura. O resultado é uma sucessão de configurações nas quais os grãos são agrupados dois a dois. Ele comentou esse procedimento, dizendo que os príncipes são tsy ota (“sem pecado”). Esse termo é uma maneira de qualificar um número par, pois isso significa afirmar que ao proceder ao empa- telhamento de grãos não se deixa nenhum isolado. Para as oito figuras impares, o procedimento é o mesmo, mas Raymond fez ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA. notar que após o emparclhamento sobra sempre um grão isolado em cada figura, que ele movimentou para baixo, Ele qualificou o resultado de ota, o que denota um número impar. Habilidade de Cálculo Nós mzeMos TESTES cRONOMETRICOS (ter ilustração 2), para estudar à operação mental efetuada pelos adivinhos na distinção das figuras pares impares, e para compará-la com a de pessoas que não são adivinhos. Na tela de um laptop, 48 figuras de sikicky são propostas sucessivamente. À pessoa deve reconheceros príncipes e os escravos, apertando uma tecla à esquerda ou à direita. Para quem não é adivinho, a figura esomboia (2, 2, 2,2) é de- tectada muito mais rapidamente como sendo um principe: a curva apresenta sistematicamente um pico inferior no tempo de reação quando essa figura aparece. Assim também, a figura tarehy (1, 1, 1, 1), quetem quatro grãos, também corresponde a um mínimo da curva. Para as outras configurações, os tempos são variáveis. Em contrapantida, no caso dos adivinhos o reconhecimento principe/escravo é aparentemente um mecanismo mental tão bem integrado quea contagem dos grãos das figuras E inútil. Essestestes demonstram igualmente que o procedimento de agrupamento de grãos descrito anteriormente por Raymond, para classificar as figuras em ota e tsy ota é um meio teórico de explicar a disti principe/escravo, mas não corresponde a um procedimento utili- zado na prática. As posições da esquerda para a direita das filhas na parte inferior doquadro da ilustração 1 não correspondem à ordem na qual os adivinhos as dispóem; assim, por exemplo, a filha 1 1 é construída antes da filha 10. Entretanto, a ordem de construção é algumas vezes modificada de modo a que as filhas sejam claboradas sticessivamente da esquerda para a direita, ou em sentido inverso. Nós observamos vários exemplos, alguns dos quaisnos foram reveladosa posteriori pela gravação em vídeo das sessões de trabalho. a esquerda 11, 1069. Nessa situação, a inversão se explicaria por circunstâncias particulares, O clemento que apareceu anteriormente em ll eraafiguraasombola (2,2,2, 2).0u seja, ocletmento neutrodo grupo. Por esse motivo, Njarike pode prever que as colunas 9 € 10, nas quais se acrescenta o elemento neutro a 9, são idênticas; assim, ele pode posicionar essa figura em 1O antes de reproduzi-la em 9. “Todas as inversões que registramos estão ligadas ao surgimento doclementoncutro(2,2, 2,2). Assim, a inversão em relação à ordem de construção normal revela a consciência que os adivinhos têm do papel do elemento neutro, desempenhado pela figura asombola. Talvez os adivinhos utilizem uma ordem de construção es- querda-direita das hguras secundárias de modo maissistemático. que afirma Jean François Rabedimy em sua obra sobre osikidy. O método que ele descreve é o de calcular as filhas de segunda e de rerceira gerações (10, 14 € 12) operando não mais aparirdas de primeira geração (9, 11, 13€ 15), mas referindo-se diretamente à matriz mãe. Paraa coluna Lá de segunda geração, por exemplo, temos por associação da operação de grupo 14=13+ 15=1+2: 344. Em outros termos, à filha 14 é a combinação das quatro colunas da matriz mãe. Os quatro componentes dessa coluna 1á são, portanto, dados pelas somas dos grãos nas quatro linhas = quer dizer, pelas classes das figuras correspondentes (principe ou escravo). Nesse caso, vimos que os adivinhos são acostumados à determinar a classe de uma figura. Assim, eles podem obter os quatro elementos «a coluna 14 com um único golpe de vista a partir das linhas 5, teimpa do resgonta (em redisseguretos) Número ce grisa dia puras. Nocaso de inversão, Njarike, um adivi- nhoantandroy de'Tulear, construiu a coluna 10(9+ 11 Jantes da9, ouseja, da direita para 2, TESTES DE RECONHECIMENTO da paridade, poe mio de um programa informático de experimentação em psicologia cognitiva (pessoa que não é adivinha no alto, adivinha embaixo). Acurva (em amorelo] dá os tempos de resposta ememiissegundos para uma série de 48 figuras entre as-quais era preciso reconhecer a paridade donúmero de grãos. Umia segunda curva [em toranja ), no retângulo inferior [em cinza), indica os números de grãos das figuras [de é q 8). Um nio-adivinho não é rápido fos valores mínimos do fêmpo de reação) no caso das figuras extremas de Pta CERELTELITITELIT ú aá TITITT sm 2 Múmeo e fura Tempo de resposta [em miisaegundos) =z000 Pr 000 Mémero de grãos das figuras PLITIITA su nm au xy ” quatro ou oito grãos. Um adivinho, com algumas é Múrmaro du figa exceções, vê imediatamente a paridade WWWSCIAM.COM BR SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 75 « Mosaicose , origami À antiga arte de dobradura de papel mostra como se achata um cilindro de papel, guarda numerosas relações com à matemárica. O: que em japonês significa à ame da dobradura Examinaremosneste texto suas contmibuições para a teoria dos mosaicos e para a inteligência mecânica. “Tibor Tarmai, da Universidade de Budapeste, estudou um fenômeno que os engenheiros se esforçam para compreender, o esmagamento dasesmuraras; toda obra submetida forças excessivas sedeformaouse rompe: Quandoobservado em folhas finas de metal é particularmente interessante, pois essas peças rem uma resistência considerável, apesar de sua massa frágil. À mais conhecida é a latade alumínio para bebidas, uma obra-prima da produção industrial. Quando um cilindro de metal é comprimido seguindo seu eixo = qu sçja, quando o movimento obedece a ele é feiro em seu sentido =, ele permaneçe cilíndrico até que as forças atinjam um valor crítico, acargade esmagamento. E entãoeleé achatado de uma só vez. Du- rantea realização de experiências de laboratório, todavia, é possível limitara deformação, porexemplo, ao ajustarum cilindro um pouco menordo que aquele que está sendo testado, em seu interior. Dessa forma, analisam-: st às primeiras etapas do processo. Oesmagamento gera uma soberba estrutura simérica, composta delosangos, que seassemelha bastante às figuras que obtemos ao do- braruma folha de papel em mângulose enrolá-lacomo um cilindro. O papel se deforma, então, como ocorre com uma folha de metal. O primeiro tipo de deformação é chainado de estrutura de Yoshi- mura(ver ilustração abaixo) Obrém-setalestmurura pavimentando-se a “que: chamamos, aqui, de mosaicos), todos planos; ou seja, não deformados. Podem outras pavimentações do plane ser dobradas do mesmo modo? Sabemos há muito! tempo quieexistem exatamente três Hipos de mosaicos (ou pavimentações!regularese uniformes. “Regular” significa que as peças são todas poligonos regulares idênticos; A ESTRUTURA DE YOSHIMURA Comesponde ao modo principal de achatamento de um cilindro 78 SCIENTIFICAMERICAN BRASIL Por lan Stewart “uniforme” quer dizerqueas combinações. das peças são idênticas à cada vértice. Os mesaicos regulares e uniformes são compostos de riângulos equiláreros, de quadrades ou de hexágonos. Mosaicos Semi-regulares Em 18500 MareEMATICO suiço Ludwig Schláfli demonstrou que existem, além dos regulares, oivo tipos uniformes e “semi-re- gulares”, nos quais todas as peças são po- ligonos regulares, mas não necessanamente idênticos. Designamos essas peças pelo simbolo de Schláfli, que assinala a natureza das peças ao redor de cada vémice. Por exemplo, a colméia é assinalada (6): cada vértice está na intersecção de três hexágo- nos. Os dois outros mosaicos regulares uniformes são assinalados (3º), querdizer, seistiángulos eqiiilteros em cada vértice, e(4'), ou seja, quatro quadrados, Os mosaicos uniformes semi- (ter segiiência de figuras na pág, ao lado, acima) são: (31,6) (33:42), (32:4.3.4), (4.6.4), (3,630), (3.122) (86.12) e (4 8/).0 mosaico (3.4.6.4), porexemplo, tem, em cada vértice, um triângulo equiláre- ro, um quadrado, um hexágono e um outro quadrado. Na estmutura de Yeshimura, a peça não é um polígono regular (os triângulos deveriam ser equiláteros é não isósceles), € não deveria, portanto, estarnalista, Ela comesponderia à fórmula (39). Quais estrutúras podem ser dobradas no sentido das arestas de polígonos, de modo que as faces poligonais permaneçam planas? É possível dobrar uma estrurura 4º no sentido de suas linhas hori- =ontais, ou das verticais, sem que as peças quadradas se deformem. Ei contrapanida, isso não pode ser feito com uma estrutura 4! no semido das linhas horizontais é vemicais, pois as peças se curvam. Em 1989, Korvo Miura demonstrou que nenhum mosaico no qual três arrestas se cruzam num vértice pode ser dobrado, o que elimina as possibilidades (6º), (3.122), (4.6.12) e (4:87). Acontece ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA RT FERLLO fds LU FESPAANOO MACIA [acima] [3:8) (85434) (5535) (88) E OS DITO TIPOS DE MOSAICO SEMI REDULARES são designados pela número e pela natureza dos poligonos que se localizam er cada vértice. Para 03.6, por exemplo, cada vértice é farmado por quatro áriângulos equiláteros e um hexágono 2.05 DIAGIAMAS [0] de dobradura domosaico [35 4.3,4) e 05 clindrvs que comespondem às dobraduras em vermelho (6), verde fc) laranja (a) o mesmo com os mosaicos (31.6) € (3,4,6,4), nos quais as faces poligonais não permanecem planas. Linhas atravessam os mosaicos (3.6.3.6) e(d?), que podem ser dobrados no sentido dessas linhas, mas, ainda desta vez, os resultados são pouco interessantes. Só restam então os mosaicos (39), (3*.42)e(32.4.3. 4), que ndo só podem ser dobrados, como enrolados em cilindro, como a estrutura de Yoshimura., Esses três mosaicos devem merecer a atenção dos: engenheiros. Eles podem serdobrados de váriasmaneiras: À figura 2 mostra quatro maneiras dedobraro masaico(32.4,3,4); os segmentos negros indicam as dobras em relevo, eos ponfilhados, as dobras em cruz. À mesma figura mestra os respectivos cilindros vincados. Avestrutura das linhas de dobradura se repete na totalidade do plano: Os paralelogramos coloridos da figura 2 indicam à unidade básica. A menor unidade básica possível fem vermelho) tem uma superfície igual a dois quadiados e três triângulos, Um desses qua- drados é dividido em duas partes que dariam um quadrado se as bordas opostas da unidade básica fossem coladas. É o único motivo. AVMSCIAM COM BR de dobradura possível cuja unidade básica contém dois quadrados. A segunda unidade básica (mm verde) contém quarro quadra- dos e supõe-se também que cla seja a única dobradura com essa particularidade, À terceira (em azul) contém seis quadrados; há várias dobraduras desse tipo, e deixa aas leitores a possibilidade de encontrar outras. À última (er laranja) contém oito quadrados, e há novamente várias dobraduras desse tipo. Deixo também aos leitores a possibilidade de encontrar as que comespondam a (35) e (34º. Como ocorre na estrutura de Yoshimura, dererminadas dobra- duras assemelham-se à superfície obrida pelo achatamento de um cilindro real, Além disso, o-achatamento pode ser simulado por computador: basta fazer como se às peças planas do mosaico sejam ligadas por um material elástico. Os resultados são úteis tanto em arquitetura como em inteligência mecânica. É sempre animador ver como à maremática reconcilia uma are antiga com a modemidade, Tan Steivart é professor da Universidade de Warcick, Inglaterra. SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 79 MARIA LUNA MARQUE FAZER UMA DIVISÃO no dia-a-dia é uma conta multa mais complexa para o estudante que “vimdo balas do que a que ele aprênde naescola. Em vez de entregaruma porçâuigual para cada colaborador, ele leva em coma também o sexo e aidade dos colegas drados...”, o professor Toninho Macedo levantou, foi para frente da sala e ges- ticulando — quase como que dançando = começou a falar: “O metro para nós é essa distância daqui do umbigo ao chão. Isto mede 1 metro. À casa de um guarani tem no ponto mais alto, a nossa altura mais meio metro”. (Toninho mostra a sua altura com a mão sobre a cabeça e aponta para cima com as mãos formando um triângulo dizendo muis meio metro, “A área da casa é 2x metros, Nos cantos ela tem a nossa altura.” (Toninho mostra a sua altura pondo a mão sobre a cabeç para ficar de péaté o canto.” girou, quase como que dançando, e expli- cou uma vez mais a casa guarani. Nesse-momento, assim como acon- teceu com o professor Mário, inúmeras perguntas começaram a surgir na minha cabeça, algumas bem parecidas com as dele; "Uma pedagogia na direção da etno- matemática, em contraste coma perspec- tiva do ensino conduzido pelo professor, deveria lidar com o ensino-aprendizagem da noção de área à partir do formato e da medida da casa guarani?”; “Qual o sen- tido matemático da medida de área, para os guaranis, fora do contexto prático?” “Os saberes contextualizados dos alunos e alunas, quando levados em conta, con- tribuem para uma aprendizagem, pela MPE SCIAM COM BR escola, mais significativa, ássim como podem dar aos alunos/as mais poder e domínio sobre sua aprendizagem?”. Medidas das Receitas OsrerciiRro EPISÓDIO se deu no con- texto do ensino privado, numa escola particular de São Paulo. A professora de matemática Renata fez-o seguinte relato na aula da minha disciplina de metodologia de ensino da matemática, no curso de pedagogia da Faculdade de Educação da USP. Ao entrar em uma classe de 6! série, Renata encon- trou os alunos discutindo sobre várias receitas — para fazer pão — que eles trouxeram de casa, tarefa deixada pela professora de biologia. Na verdade, a discussão girava em torno do modo como a aluna Manuela apresentava as medidas dos ingredientes. Ela usava as unidades colher de chá, colher de sopa exicara, chamando-as de teaspoon, tablespoon ecup. Minha avó, que é americana, usa essas medidas dizendo que são as medidas do sistema inglês, que não tem como comparar com o modo de medir decimal-ou, não me lembro bem... diz que não sabe transformar para o nosso sistema. Eu vou trazer o jogo de colherinhas que ela usa e tam- bém o copo”, explicou Manuela. Ela chamou atenção também para o modo como a avó media 1/3 de copo de manteiga: “Minha avóenche o copocom água até 2/3, dai vai pondo manteiga até ele ficar todo cheio de água e manteiga”. À professora Renata, então, interferiu, convocando à turma a conversar sobre o modo de medir da avó da Manuela, “Vamos pensar juntos sobre outros modos de medir”; “Vamos conversar, em casa, sobre as maneiras usadas para medir”, incitou os alunos. À panir do relato de Renata, passei, cada vez mais, a visar a possibilidade de o professor detectar os conhecimentos (matemáticos) prévios dos estudantes e procurar caminhos para utilizá-los na criação e solução de novos problemas. Em outras palavras, passei a me preo- cupar com à mudança de duas atitudes psicocognitivas frequentes nos professo- res de matemática: primeira, o educador, em geral, procura transformar os alunos sem preocupação alguma de, antes, com- preendê-los e, segunda, o professor, em geral, não considera a cultura primeira SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 83 - “> do aluno — parece que o que o estudante sabe e do jeito que sabe, não vale a pena ouvir ou tentar entender. Do que foi até aqui relatado, quere- mos refletir junto ao leitor que o exer- <ício de operacionalização de atitudes peles professores e professoras em levar em conta o que o educando pensa, como ele ou ela vê, é não somente um grande desaho, mas o germe do proces- so emomatemático — um movimento pedagógico que tem no seu âmago questões como diálogo, legitimação do conhecimento do “outro”, relativização respeito à diferença de valores, conhe- cimentos, modos « códigos. Seja como for, como vimos, o pro- fessor que se propõe, em sala de aula, a evidenciar os “saberes” dos alunos — concepções, conhecimentos, lingua- gem, sobretudo como o “outro” pensa — qu conhece no âmbito das relações quantitativas e espaciais-não tem um trabalho simples pela frente. Ao contrário, dependendo da forma como ele atuar pode decorrer todo tipo de consegliências pedagógicas, favorecendo ificultando a aprendizagem e o ensi- ou di no. No entanto, de nossa parte, inspira- dos e fundamentados em pesquisadores como Ubiratan D'Ambrosio e Paulo Freire, consideramos como pressuposto básico para a realização de um processo pedagógico — que busca corresponder a uma perspectiva etnomatemática — a disponibilidade do professor de mate- 84 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL PARA MER as quantidades dos ingredientes de uma receita cada coxinheiro costuma seguir sua própria matemática, Em vez de usar recipientes. com praduação exata, muitos preferem medir"a olho” com xicaras e colheres mática em conhecer mais intimamente o educando em suas especificidades — conhecer e levar em conta no processo «de aprender e ensinar conhecimentos anteriores dos estudantes (intelectuais, artísticos, entre outros), suas preferên- vias, situação familiar e econômica. Na verdade, quando perseguimos este caminho como professores acredi- ramos que cada aluno tem uma história, ou melhor dizendo, é uma história. Cada estudante reage diferentemente às situações de vida que precisa ou deseja confrontar. Daí, o ensino deve ser visto como um aspecto do desenvolvimento dessa história, que tanto interfere no crescimento mental deste indivíduo, aluno, como tem o papel de transformar a sua articulação no € com o mundo e com as outros. Várias Influências E oconHEcIMENTO matemático, como osnúmeros, as formas, as propriedades, enfim as relações quantitativas e espa- ciais também devem ser trabalhados pelos professores como relações que combinam com outras inúmeras influên- cias — de modo aleatório, mas sempre no sentido de proporcionar novas transformações e organizações psico- intelectuais. Dentro desta visão, toda formação dessa natureza é, na verdade, um fenômeno de proporções cósmicas — uma vez que estaria interagindo com o emocional, o afetivo, o social, o histó- rico, o psicológico, o místico, o cultural, entre outros. Da nossa reflexão e imbuídos do valor e papel de uma atitude etnoma- temática para encaminhar o processo pedagógico da matemática, estamos em busca de trabalhar junto aos nossos estudantes a partir da compreensão de que: não é possível desenvolver alguém intelectualmente e afetivamen- te de modo isolado de sua vivência sociocultural; e que a aprendizagem (da matemática) nãoé um momento estanque na vida do individuo, mas sim uma negociação com o universo de conhecimento já existente, na interação com os novos saberes. m Maria do Carmo S. Domite é professora da Faculdade de Educação da USP e coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Etnomatemática. EIS Tantos'povos, tantas matemáticas. Ubiratan D'Ambrosia, em Educação, novembro de 1997, nê199, págs. 355. Etnomatemática: elo entre as tradições e a mader- nidade. Ubiratan D'Ambrosio. Autêntica, 2002 Da Etnomatemática: construindo de fora pa dentro da escola, Maria da Carmo S, Oomite, em Anais do Vi Encontro Nocional de Educação Motemótica — VI ENEM, vol. 2, págs. 101-102, julho de 1998, Notas sobre a formação de professores e pro- fessoras numa perspectiva da etnomatemática, Maria do Carma 5, Domite, em Anais do Primeiro Congresso Brasileiro de Etnomatemático-CBEmt, págs. 21-22,2001. à pedagogia do oprimido. Pauta Freire. Editora PazeTerro, 1987 Por uma pedagogia da pergunta. Paulo Freire e Antonio Faundez. Editora Paz e Terra, 1986. ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA MALTA MARS Camponeses desenvolvem práticas de medir terreno diferentes das oficialmente realizadas Por Gelsa Knijnik cubaç luta pela reforma agrária no Brasil desenvolvida pelo Mo- vimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra tem sido apentada por muitos cientistas sociais como uma das imporantes mobilizações da sociedade civil na direção de mudanças que possam produzir a diminuição da desigualdade social do país. Após 20 anos. de existência, a força desse movimento camponês (hoje envolvendo aprexima- damente 250 mil famílias distribuídas em 23 estados brasileiros) pode ser avaliada por sua visibilidade no cenário nacional € intemacional e pela colaboração dada ao movimento por pesquisadores de mais de 50 univeisidades brasileiras, em suas respectivas áreas do conhecimento, Como parte desse trabalho, estudes ctnomate- B6 SCIENTIFICAMERICAM BRASIL NA LUTA PELA reforma agrária, camponeses criaram um método próprio. de calcular a área de plantio máticos sobre a cultura camponesa sem terra vêm sendo realizados, trazendo à cena discussões sobre práticas culturais e política do conhecimento matemárico. Na luta pela reforma agrária, a im- portância que possui o acesso à um lote — para nele viver e produzir - faz com que a prática de medição da terra - cubação, na linguagem camponesa - tenha importân- ciasignificativa na vida dos assentamentos: antes de os órgãos oficiais mensurarem o tamanho dos lotes destinados a cada uma das famílias assentadas, os camponcses precisam demarcar os espaços destinados aagrovilae à produção. Além disso, o pró- prio planejamento do processo produtivo, que imediatamente precisa ser iniciado, exige que cálculos de áreas sejam feitos. A cubação da terra tem inspirado pes- quisas eimomatemáticas, cujos resultados apontam para uma multiplicidade de pro- cedimentos associados a essa prática, dis- tintos entre si, mas que são, muitas vezes, praticados em uma mesma comunidade, em especial quando ela é formada por famílias oriundas de diferentes regiões, Linguagem Camponesa EstA MATEMÁTICA camponesa — desig- nação que temos dado a práticas da cultura «do campo como a da cubação - é produ- zida por uma linguagem que em muito se afasta daquela urilizada pela matemática acadêmica e pela escolar. Como todas as narrativas, as que constituem a matemática camponesa, produzidas por uma linguagem carregada de significados culturalmente situados, são contingentes. À própria ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA RE SA Tp 2 Ha E td E PEQUENO AGRICULTOR a ii terreno sem. a ódio cla matemáica uma superfície que corresponde a um quadrilátero qualquer, consiste em somar os quatro lados do poligono, dividindo a seguir o resultado por 4, Assim, o quadri- Iúero é transformado em um quadrado. cujo lado é a quarta parte do perimetro do polígono inigial. E calculada então a área do quadrado (elevando-se ao quadrado o valor da medida do lado), que será indicada como correspondendo à área do quadril- tero inicialmente dado. Esse procedimento chamado, em algumas comunidades. esquadrejar a terra - quando aplicado a uma superfície que já possui forma qua- drangular, coincide com o modo anterior decubara terra, No entanto, cm geral, para uma mesma superfície, os resultados obri- dosatravés do esquadrejamento da terra são superiores aos obtidos pelo processo que já era utilizado no antigo Egito. Além dessas estratégias, alguns cam- poneses do sul de pais usam outro tipo de WINS CIAM.COM BR estratégia para dar conta de suas necessi- dades de definir uma superfície de terra para o plantio. Diferentemente dos outros dais procedimentos (nos quais a porção de terra está dada e é necessário determinar sua área), há um valor de área previamente definido, ca questão consiste. cm demarcar, no solo, o espaço que corresponderá ao valor estipulado. Matemática do Trator Porexempro: como intuito de delimitar, para cultivo, uma “terra de 100 por 100”, que equivale à área de 1 hectare, há assen- tados que utilizam como parâmetro para determinar o tamanho de tal superfície o tempo gasto com otrator para carpiroterre- no, istoé, otempo necessário para preparar a terra. Como explicou um camponês: “A gente põe o trator em cima da terra. Tra- balhando com ele três horas, dá certinho | hectare”. Nessa situação da vida coridi de campo, tempo e espaço estão identif- cados, mesclados: o tempo de 3 horas é 1 hectare, e um hectare são 3 horas. E o trator mais precisamente os custos envolvidos em seu uso — que produz a relação, que estabelece uma estreita vinculação entre tempo e espaço. Para fins do culfivo em seu assema- mento, possivelmente a hora de uso de trator seria um dado mais relevante para o camponês que uma eventual precisão relativa à área a ser plantada: “Uns me- tros à mais, uns a menos não fazem tanta diferença”, explicou, Na precariedade de recursos que são disponibilizados para dar impulso aos assentamentos da reforma agrária, diferença faz o custo da produção, principalmente aquela na qual é requerido maquinário. Estão implícitos em tal modo deoperarcomademarcaçãode | hectare as especificidades do solo e do próprio trator que nele será usado. São elas que entram em jogo na definição do tempo de 3 horas, A experiência do camponês na labuta na terra dá aele as indicações das modulações - temporais e espaciais - necessárias paraos ajustes que deverá fazer em cada situação. A prática da culbação da terra apresenta- daneste artigo apontou para um dos modos de operar da racionalidade dos homens e mulheres do campo, que produz isso que chamamos etnomateimática camponesa. Ela é composta ainda por outras práticas presentes na vida dos assentamentos, como, por exemplo, a cubagem da ma- deira (que envolve o cálculo do volume de um tronco de árvore). Todas clas têm as marcas da cultura camponesa sem terra, que se move pelo empenho em subsistirno campo. pela luta por um projeto coletivo de [E ijnik é professora da Universidade do Vale & Rio dos Sinos, RS. Lit eia S Educação matemática, culturas e conhecimento na luta pela terra, Gelsa Knijnik. Edunisc [na preta), Etnomatemática, currículo e formação de profes- sores. Gelsa Knijnik, Fernanda Wanderer e Cláudio Oliveira [orgs]. Edunise, 2004. SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 89 Eles têm uma lógica própria, medem o tempo com tiras de taquara, contam somente até cinco, mas conseguem entender com base na prática questões complexas como a lei da refração Racionalidade dos indios byrasileiros nicici meu trabalho de formação do professor/indio pesquisador, no sentido emográfico, na década de 1980, com o povo tapirapé, que habita a região norte do Mato Grosso, às margens do rio Araguaia. Na época em que inicieiorrabalho havia somente uma aldeia, com uma população de cerca de 300 índios. Senti, logo no início de minhas pesquisas em ernomatemática, na tentativa de formar este professor/índio, adificuldade de compreender a racionalidade por eles utilizada. Acredito que das críticas à cenomatemárica, a mais fundamentada é a da educador ricana Wendy Millroy quando diz: “Como pode alguém que foiescolariza- do dentro da matemática ocidental convencional “ver qualquer outra for- ma de matemática que não se pareça com a que lhe é familiar?”. Lem- bro-me, também, com fregiiência das palavras de Paulo Freire em uma dasreunides do Clube da Estar maps 90 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL ALDEIA DOS ÍNDIOS waimiti ongs 34 EEE Por Eduardo Sebastiani Ferreira Rúcula (grupo de estudos de emmociência que recebeu esse nome por causa do hábito de Freire, e nosso também, de comer a ver- dura quando bebia cachaça): “Você deve emergir de sua cultura e molhado dela ver a cultura do outro”. Isto é, nunca podemos “ver” uma cultura diferente da nossa de modo imparcial, Várias situações que presenciei ao longo desses anos me fizeram referir bastante sobre o melhor modo de analisar a ra- cionalidade-de uma cultura diferente da nossa — no meu caso, de algumas nações indígenas brasileiras. Quando cu e o cacique tapitape (que € o diretor da escola) estávamos matriculando os alunos que iriam estudar, ele impôs que um garo- to, que ainda não tinha idade suficiente para fregijentara escola, fosse matriculado também, Elé argumentou que se o companheiro do menino iria estudar, ele tinha necessariamente de fazê-lo também. Em ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA dssva aiii WIN WSCIAM.COM.BR SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL 91 N / a tem A ti j q E 1 cl LU A ICILIN mítico-religiosa- Os conhecimentos e a cultura que os negros africanos trouxeram para o país foram reelaborados para a nossa realidade e constituem hoje novos saberes ACAPDENA que chegas no Brasil foimadificada para atender ás necessidades dos escravos i ! i oral do Por Wanderleya Nara Gonçalves Costa e Vanisio Luiz da Silva negro brasileiro o cotidiano de muitos negros brasi- leiros emerge um tipo de matemática que é produzida pelo próprio corpo, considerado instrumento de ligação do ser humano com o sagrado, forma de expressão de umareligiosidade que se baseia em mitos ancestrais. Osantigosafricanos escravizados no país buscavam na religiosidade força pára superar a degradante situação em que se encontravam, Ela lhes incitava a inteligência, levando-os a desenvolver diferentes tipos de conhecimentos, inclusive matemáticos, além de estratégias de resistência e sobrevivência. Esse “modo de saber do povo negro brasileiro” não se refere ao conhecimento trazido da África pelos escravos, mas ao que Henrique Cunha Jú- nior, da Universidade Federal do Ceará, chama de africanidades brasileiras. Elas constituem um saber nevo, (rejelaborado pelas pessoas escravizadase por seus descendentes a partir da diversidade cultural africana da compreensão convivência comnovas realidades, novos embates políticos e sociais, No interior das senzalas havia uma convivência entre pessoas de culturas muito diversas, o que funciona- vacomo engenhosa manobra do sistema escravista paraevitar rebeliões. Por outro lado, as fugas uniam negros de dife- tentes culturas que se organizavam nos quilombos para resistir à escravatura e à opressão, Nesses locais, plantavam, colhiam. pescavam, caçavam, manufaturando objetos de palha; organizando-se em gmupes, gerenciavam seu próprio sistema de produção e defesa de forma a viver independentes das cidades, Para-tanto, € também para exercer sua religiosidade e liberdade, resgararam conhe- cimentos oriundos de suas várias culturas, criaram erecriaram conhecimentos, alguns deles matemá- ticos. Se a mistura cultural privou os escravos de sua identidade, por outro lado. foi a semente para a criação de novas culturas que têm como base à religiosidade inspirada pelos mitos africanos. Esses discursos estão presentes no interior de todo pensamento teórico, Nascidos a partir de reflexões sobre o mundo, a existência eas situações de“estarnomundo”, osmitosoferecemexplicações sobre questões que incomodam os seres humanos. Os cosmogônicos, por exemplo, explicam as ori- gens do Cosmos e os processos de constituição de umadeterminada sociedade. As diferentesreligiões estão relacionadas acles g, acreditamos, asdiferentes idéias matemáticastambém. O antropólogo Eudoro de Sousa (1911-1987), emseulivro Mitologia em 1980, não hesitou em afimar que”... secnunciem teoremas, onde e quando se contavam mitos, mas nem assim se abala a convicção de que, em todos os tempos, não seja mítica a terra em que se firma e de que se nutrem as mais fundas raizes da racio- nalidade”, Enmetanto, marcada pelo pensamento cartesiano, a matemática ocidental está estruturada «e forma a contrapor-se ao discurso mítico, À emomatemática, por sua vez, propõe um olhar que associa conhecimentos matemáticos e mitos, O filósofo alemão Emest Cassirer (1874- 1945), em seu livro Filosofia das formas simbólicas, diz que tanto os mitos quanto a ciência são formas. simbólicas de igual valor. Podemos dizer o mesmo para a matemática. Ela, os mitos e a religiosidade podem serencontrados a partir de uma mesma raiz 2, em alguns momentos, em formas de expressão SCIENTIFICAMERICAN BRASIL 95 usadas. Em conjunto, os dois jogos criarão várias possibilichades do P[X=L] = PLENA. A) + PLAFA, AJ + P[AMF..A] +...+ P[AMA E) = [P(FJPLAJP(A].. PLA) + [PLFIPÇAJPIA)..PLA)] +...+ [PIAJPÃAJP(A) P(F]] = Lgpp. pl + [pap..p) s:+ [ppp..g] = 16gp" Assim, Pr P[x=0]= [1/2)'5 = 0,0000415 = 15(1/2]'º = 0,000244 ,174560 4368(1/2)'* = 0,0656650 = 1820[1/2)!º = 0,0277270 560(1/2)!É = 0,008545 Bs csiçulos imosiram, por exemplo, qu a probeabilidode de ter todos os (ESQUEMA MOSTRA que numa primeira jogada cada um dos 15 búzios pode estar aberto [AJ ou fechado [Fj, tando, então, um primeira leque do possibilidades [cujas são dadas no quadro abaixo). Esse leque, geralmente, é combinado com cutro, por meio de uma segunda jogada dos; búrios, onde nem tados serão configurações. Alguns estudos matemáticos podem ser realizados a partir do jogo forma, para determinarmos a probabilidade de acontecer cada uma de búrins, como o cálculo das probabilidades das configurações dessas configurações, devemos observar que ao lançar 05 búzios possíveis, Por exempla, tomados 16 búzios, uma das configurações não se leva em consideração a ardem em que eles aparecem, e, coma possíveis é a de que tados os búzios estejam abertos, não ocorrendo são lançados todos juntos, eles se tómam independentes entre si. nenhum fechado, outra, é que tenhamos apenas um búzio fechado. Assim, para calcular a probabilidade de sair exatamente um búzio Eassim por diante, até que todos 05 16 búzios estejam fechados. Se fechado, devemos adicionar as probabilidades de todas as possiveis denotarmos por X e número de búzios fechados, temos que X pode disposições desta configuração e multiplicar as probabilidades dos assumir 0s valores de zero até 16, isto é, X= (0,1,2,3,...16) Dessa resultados em cada uma das disposições, isto é, = p'8, P(X=L]= 189p'8,...PlX=r]= Cio gps... PIX=15]= 169p!, P[X=16]= q'º, onde Cigs É O número de combinações de 16 elementos tomado ra r. Emvalares numéricos, cada búzio tem probabilidade p=1/2 de estar aberto eq=[1- p)=1/2 de estar fechado. opranimodamente 15 vezes 1 em 1 milhão de jagodos, enquanta a protabiidade búzios abertos ou todos os lnixios fechados é muito pequena, isso comenta de-que tenhamos 8 búrios fechados e B abertos é de 2 vezes em 10 jogadas 96 SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL ESPECIAL ETNOMATEMÁTICA ARG, PETI RAN
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved