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Guias e Dicas
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Introdução à Bioquímica - Apostilas - Ciências Biológicas Part1, Notas de estudo de Biologia

Apostilas de Ciências Biológicas sobre o estudo da Bioquímica Básica, Água: o meio da vida, Estrutura da água, Interações não-covalentes, Propriedades solventes da água, Moléculas anfifílicas, Pressão osmótica, Escala de pH.

Tipologia: Notas de estudo

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Pao_de_acucar
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Baixe Introdução à Bioquímica - Apostilas - Ciências Biológicas Part1 e outras Notas de estudo em PDF para Biologia, somente na Docsity! Y é Autolab 4 ANÁLISES CLÍNICAS E VALTER T. MOTTA BIOQUÍMICA BÁSICA Introdução à bioquímica 1 Introdução à Bioquímica Objetivos 1 Relacionar a importância da água a suas propriedades físicas e químicas. 2 Definir pH, pK, tampão e seu significado biológico. 3 Descrever as propriedades biologicamente importantes do carbono. 4 Descrever a estrutura tridimensional das moléculas biológicas. 5 Descrever as macromoléculas como polímeros de pequenas moléculas. 6 Descrever as moléculas híbridas como conjugados de diferentes classes de moléculas biológicas. 7 Diferenciar as células procarióticas das células eucarióticas A bioquímica estuda as estruturas moleculares, os mecanismos e os processos químicos responsáveis pela vida. Os organismos vivos continuamente efetuam atividades que permitem a sua sobrevivência, crescimento e reprodução. Para realizar as suas funções, os seres vivos dependem da capacidade de obter, transformar, armazenar e utilizar energia. Sem energia ocorre a perda da vitalidade e a morte celular. A maioria dos constituintes moleculares apresenta formas tridimensionais que executam inúmeras reações químicas entre si para manter e perpetuar a vida. Em bioquímica, a estrutura, a organização e as atividades potenciais dessas moléculas são examinadas na tentativa de elucidar que aspectos promovem as indispensáveis contribuições à manutenção da vida. Os organismos vivos são estruturalmente complexos e diversificados. Todavia, muitas características são comuns a todos eles. Todos fazem uso das mesmas espécies de moléculas e extraem a energia do meio ambiente para as suas funções. Quando as moléculas que compõem os seres vivos são isoladas, estão sujeitas a todas as leis da química e da física que regem o universo não vivo. Apesar da grande diversidade dos processos bioquímicos que envolvem a integração funcional de milhões de moléculas para manter e perpetuar a vida, a ordem biológica é conservada por vários processos: (1) síntese de biomoléculas, (2) transporte de íons e moléculas através das membranas biológicas, (3) produção de energia e movimento e (4) remoção de produtos metabólicos de excreção e substâncias tóxicas. 4 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. covalentes mais importantes são: pontes de hidrogênio, interações iônicas, interações hidrofóbicas e interações de van der Waals. Tabela 1.1 – Energia de dissociação de ligação (energia necessária para romper a ligação) de ligações encontradas nos seres vivos Tipo de ligação Energia de dissociação de ligação (kJ·mol−1) Ligações covalentes >210 Ligações não−covalentes Interações eletrostáticas (ligações iônicas) 4−80 Pontes de hidrogênio 12−30 Interações hidrofóbicas 3−12 Forças de Van der Waals 0,3−9 C. Propriedades solventes da água A natureza polar e a capacidade de formar pontes de hidrogênio, torna a água uma molécula com grande poder de interação. A água solvata facilmente as moléculas polares ou iônicas pelo enfraquecimento das interações eletrostáticas e das pontes de hidrogênio entre as moléculas competindo com elas por suas atrações (efeito hidrofílico, do grego “que gosta de água”). O H H H H + O + H H H H H H H H H H + ++ + ++ O OO O O Figura 1.2 Solvatação de íons. A carga do íon orienta os dipolos das moléculas da água. A água dissolve sais como o NaCl por hidratação e estabilização dos íons Na+ e Cl−, enfraquecendo as interações eletrostáticas, e assim impedindo a associação para formar uma rede cristalina. 1 Introdução à Bioquímica • 5 Figura 1.3 Dissolução de sais cristalinos. A água dissolve o NaCl (e outros sais cristalinos) por meio da hidratação dos íons Na+ e Cl−. À medida que as moléculas de água se agrupam ao redor dos íons Cl− e Na+ a atração eletrostática necessária para a formação da rede cristalina de NaCl é rompida. A água dissolve biomoléculas com grupos ionizáveis e muitas com grupos funcionais polares, porém não−carregadas, por formar pontes de hidrogênio com os solutos. Essas associações são formadas entre a água e os grupos carbonila, aldeídico, cetônico e hidroxila dos álcoois. As biomoléculas ou grupamentos não-polares são insolúveis em água, pois as interações entre as moléculas de água são mais fortes que as interações da água com compostos não−polares. Os compostos não−polares tendem a se aglomerar em água (efeito hidrofóbico, do grego “que teme a água”). As interações hidrofóbicas são as principais forças propulsoras no enovelamento de macromoléculas (exemplo, proteínas). D. Moléculas anfifílicas Um grande número de biomoléculas, denominadas anfifílicas (ou anfipáticas), contêm tanto grupos polares como grupos não-polares. Essa propriedade afeta significativamente o meio aquoso. Por exemplo, os ácidos graxos ionizados são moléculas anfipáticas porque contêm grupos carboxilatos hidrofílicos e grupos hidrocarbonetos hidrofóbicos. Quando misturados com a água, as moléculas anfifílicas se agregam formando estruturas estáveis chamadas micelas. Nas micelas, as regiões carregadas (grupos carboxilatos), denominadas cabeças polares, são orientadas para a água com a qual interage. A cauda hidrocarboneto não-polar tende a evitar o contato com a água e orienta-se para o interior hidrofóbico. A tendência das biomoléculas anfipáticas é espontaneamente se rearranjar em água e é uma característica importante de numerosos componentes celulares. Por exemplo, a formação de bicamadas por moléculas de fosfolipídeos é a estrutura básica das membranas biológicas (Figura 1.4). Cl Cl Cl Cl Cl Cl Cl Cl Cl Cl Cl Cl Cl Na Na Na Na Na Na Na Na Na Na Na+ Na Na 6 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. Figura 1.4 Bicamada lipídica. Formada na água por moléculas anfifílicas (fosfolipídeos) com cabeças polares e caudas sinuosas. E. Pressão osmótica Osmose é o processo espontâneo no qual as moléculas solventes atravessam uma membrana semipermeável de uma solução de menor concentração de soluto para uma solução de maior concentração de soluto. Poros na membrana são suficientemente amplos para permitir que as moléculas solventes atravessem nas duas direções mas muito estreitos para a passagem de grandes moléculas de soluto ou íons. A pressão osmótica é a pressão necessária para interromper o fluxo líquido de água por meio da membrana. A pressão osmótica depende da concentração do soluto. Figura 1.5 Pressão osmótica. A água difunde do lado A (mais diluído) para o lado B (mais concentrado). O equilíbrio entre as soluções nos dois lados da membrana semipermeável é atingido quando não houver mais movimento de moléculas de água do lado A para o lado B. A pressão osmótica interrompe o fluxo de água por meio da membrana. A pressão osmótica cria alguns problemas críticos para os organismos vivos. As células contêm altas concentrações de alguns solutos, que são pequenas moléculas orgânicas e sais iônicos, também como, macromoléculas em baixas concentrações. Conseqüentemente, as células podem ganhar ou perder água devido a concentração de Água Soluto Membrana permeável seletiva Membrana permeável seletiva Membrana permeável seletiva Hidrofóbico Hidrofílico Hidrofílico Aquoso Aquoso 1 Introdução à Bioquímica • 9 Tabela 1.2 – Relação entre [H+], [OH-], pH e pOH. [H+] (M) pH [OH−] (M) pOH 1,0 0 1 x 10−14 14 0,1(1 x 10−1) 1 1 x 10−13 13 1 x 10−2 2 1 x 10−12 12 1 x 10−3 3 1 x 10−11 11 1 x 10−4 4 1 x 10−10 10 1 x 10−5 5 1 x 10−9 9 1 x 10−6 6 1 x 10−8 8 1 x 10−7 7 1 x 10−7 7 1 x 10−8 8 1 x 10−6 6 1 x 10−9 9 1 x 10−5 5 1 x 10−10 10 1 x 10−4 4 1 x 10−11 11 1 x 10−3 3 1 x 10−12 12 1 x 10−2 2 1 x 10−13 13 0,1(1 x 10−1) 1 1 x 10−14 14 1,0 0 É importante frisar que o pH varia na razão inversa da concentração de H+. Desse modo, o aumento de [H+] reduz o pH enquanto a diminuição, o eleva. Notar também, que o pH é uma função logarítmica, portanto, quando o pH de uma solução aumenta de 3 para 4, a concentração de H+ diminui 10 vezes de 10−3 M a 10−4 M. Exercício 1.1 Como a água pura tem [H+] = 10−7 M, calcular o pH das seguintes soluções: 1. HCl 10−4 M 2. NaOH 10−5 M A auto-ionização da água apresenta uma contribuição negligenciável para as concentrações de íons hidrônio e íons hidróxido. Solução: 1. Para o HCl 10−4: [H3O+] = 10−4 M; portanto pH = 4. 2. Para o NaOH 10−5: [OH−] = 10−5 M. Como [OH−][H3O+] = 1 x 10−14, então, [H3O+] = 10−9 M; assim, pH = 9 Os pH de diferentes líquidos biológicos são mostrados na Tabela 1.3. Em pH 7 o íon H+ está na concentração 0,000.000.1 M (1 x 10−7), enquanto a concentração de outros catíons estão entre 0,001 e 0,10 M. Um aumento no teor de íon H+ de somente 0,000.001 (1 x 10−6) tem um grande efeito deletério sobre as atividades celulares. 10 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. Tabela 1.3 – Valores de pH de alguns líquidos biológicos. Líquido pH Plasma sangüíneo 7,4 Líquido intersticial 7,4 Líquido intracelular (citosol hepático) 6,9 Suco gástrico 1,5−3,0 Suco pancreático 7,8−8,0 Leite humano 7,4 Saliva 6,4−7,0 Urina 4,5−8,0 1.3 Ácidos e bases A concentração do íon hidrogênio, [H+], afeta a maioria dos processos nos sistemas biológicos. As definições de ácidos e bases propostas por Bronsted e Lowry são as mais convenientes no estudo das reações dos seres vivos: • Ácidos são substâncias que podem doar prótons. • Bases são substâncias que podem aceitar prótons. Por exemplo, a adição de ácido clorídrico (HCl) a uma amostra de água aumenta a concentração de íon hidrogênio ([H+] ou [H3O+]) pois o HCl doa um próton para a água: HCl + H2O → H3O+ + Cl− A H2O atua como uma base que aceita um próton do ácido adicionado. Do mesmo modo, a adição da base hidróxido de sódio (NaOH) aumenta o pH (redução da [H+]) pela introdução de íons hidróxido que combinam com os íons hidrogênios existentes: NaOH + H3O+ → Na+ + 2H2O Na reação, o H3O+ é o ácido que doa um próton para a base adicionada. O pH final da solução depende o quanto de H+ (por exemplo, do HCl) foi adicionado ou quanto de H+ foi removido da solução por sua reação com uma base (por exemplo, íon OH- do NaOH). 1 Introdução à Bioquímica • 11 Quadro 1.1 Força de ácidos A força de um ácido ou base refere-se a eficiência com que o ácido doa prótons ou a base aceita prótons. Com respeito a força, existem duas classes de ácidos e bases: fortes e fracos. Ácidos e bases fortes são aqueles que se dissociam quase completamente em meio aquoso diluído (Ex.: HCl ou NaOH). Ácidos e bases fracos são os que dissociam parcialmente em soluções aquosas diluídas (Ex.: CH3-COOH ou NH3). A tendência de um ácido fraco não-dissociado (HA) para perder um próton e formar a sua base conjugada (A−) é dada pela equação: HA H+ + A− Esta reação não ocorre até o final, mas, atinge um ponto de equilíbrio entre 0 e 100% da reação. No equilíbrio, a velocidade líquida é zero pois as velocidades absolutas em ambas as direções são exatamente iguais. Tal posição é descrita pela equação: [ ]HA AH         = −+ K em que K é a constante de equilíbrio da reação reversível e tem um valor fixo para cada temperatura. As K para as reações de ionização são denominadas constantes de dissociação ou de ionização. Para os ácidos é usada a designação Ka. Os ácidos fortes tem valor de Ka elevado, pois apresentam maior número de prótons liberados por mol de ácido em solução. A. Pares ácido-base conjugados Quando um ácido fraco, como o ácido acético, é dissolvido em água, obtém-se uma dissociação parcial, estabelecendo um equilíbrio entre o ácido, o acetato e o íon hidrogênio (próton): CH3COOH + H2O CH3COO− + H3O+ Ácido Base Base Ácido conjugado conjugada conjugada conjugado O ácido acético é um ácido conjugado (doador de prótons). A forma ionizada do ácido acético, o íon acetato (CH3COO−) é denominada base conjugada (aceptora de prótons) ou “sal”. Em reações deste tipo, típicas de todos os equilíbrios ácido-base, o ácido fraco (CH3COOH) e a base formada na sua dissociação (CH3COO−) constituem um par ácido-base conjugado. Tabela 1.4 − Alguns pares ácido-base conjugados de importância nos sistemas biológicos. Doador de prótons Aceptor de prótons CH3−CHOH−COOH H+ + CH3CHOHCOO− CH3−CO−COOH H+ + CH3CO−COO− HOOC−CH2−CH2−COOH 2H+ + -OOC−CH2−CH2−COO− +NH3−CH2−COOH H+ + +NH3−CH2−COO− A constante de equilíbrio para a dissociação do ácido acético é: [ ] [ ] [ ] [ ]OHCOOHCH OHCOOCH 23 33 − − = +− K 14 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. alterações bruscas de pH quando adicionadas quantidades relativamente pequenas de ácido (H+) ou base (OH−). São formados por ácidos fracos e suas bases conjugadas. Quando um ácido forte como o HCl é adicionado a água pura, todo o ácido adicionado contribui diretamente para a redução do pH. No entanto, quando o HCl é adicionado a uma solução contendo um ácido fraco em equilíbrio com sua base conjugada (A−), o pH não altera tão dramaticamente, pois parte dos prótons adicionados combinam com a base conjugada para amenizar o aumento da [H+] (Figura 1.6). HCl → H+ + Cl− grande aumento da [H+] HCl + A− → HA + Cl− pequeno aumento da [H+] Quando uma base forte (como o NaOH) é adicionada a água pura ocorre grande redução da [H+]. Se a base for adicionada a uma ácido fraco em equilíbrio com sua base conjugada (A−), parte dos íons hidróxidos aceitam prótons do ácido para formar H2O e, portanto, não contribuem para a redução do [H+]. NaOH → Na+ + OH− grande redução da [H+] NaOH + HA → Na+ + A− + H2O pequena redução da [H+] O sistema ácido fraco/base conjugada (HA/A−) atua como tampão para evitar mudanças bruscas do pH quando são adicionados ácidos ou bases a solução. Figura 1.6 Capacidade tamponante do par ácido fraco (HA) e sua base conjugada (A−). O sistema é capaz de absorver tanto H+ como OH− por meio da reversibilidade da dissociação do ácido. O doador de prótons (ácido fraco), contém uma reserva de H+ ligado que pode ser liberada para neutralizar a adição de OH− ao sistema resultando na formação de água. De forma semelhante, a base conjugada (A−-), pode reagir com os íons H+ adicionados ao sistema. Assim, o par ácido−base conjugado resiste às variações de pH quando quantidades relativamente pequenas de ácido ou base são adicionadas à solução. A resistência a mudanças no pH de um tampão depende de dois fatores: (a) a concentração molar do ácido fraco e sua base conjugada e (b) a relação entre suas concentrações. pH Equivalentes de OH 9 8 7 6 5 4 3 2 4 4 4 4 4 4 4 pH = pK Ação tampão HA A [HA] = [A ] HA A H+ OH H O2 1 Introdução à Bioquímica • 15 Exercício 1.3 Calcular o valor do pH obtido quando 1,0 mL de HCl 0,1 M é adicionado a 99 mL de água pura. Calcular também o pH após a adição de 1,0 mL de NaOH 0,1 M a 99 mL de água pura. (Levar em conta a diluição tanto do ácido como da base ao volume final de 100 mL) Solução: Sobre a diluição, tem-se 100 mL de HCl 0,001 M e 100 mL de NaOH 0,001 M. Ácido adicionado, [H3O+] = 10-3, portanto, pH = 3. Base adicionada, [0H-] = 10-3 M. Como [OH-][H3O+] = 1 x 10-14, [H3O+] = 10-11 M; portanto, pH = 11 A capacidade tamponante máxima de um ácido é quando o pH = pKa do ácido fraco, ou seja, quando a as concentrações molares do ácido fraco (HA) e sua base conjugada (H−) são iguais. Na realidade, a capacidade tamponante é considerável mesmo dentro de uma faixa de ±1,0 unidade de pH do valor de seu pKa. Fora destes limites a ação tamponante é mínima. Esse fato está representado na curva de titulação do ácido acético (Figura 1.7). Para o par ácido acético/acetato (pKa = 4,76) o tamponamento efetivo situa-se entre pH 3,76 e 5,76. Figura 1.7 Curva de titulação do ácido acético por uma base (OH−). No ponto inicial (antes da adição da base), o ácido está presente na forma CH3COOH. A adição de base dissocia prótons até atingir o ponto médio da titulação onde o pH = pK, as concentrações do ácido (CH3COOH) e de sua base conjugada (CH3-COO −) são iguais. A adição de mais base dissocia mais prótons até que todo o ácido atinja a forma CH3COO − - (ponto final). Na região de tamponamento efetivo (PK ± 1), adições de ácidos ou bases não alteram grandemente o pH da solução. A. Ácidos fracos com mais de um grupo ionizável Algumas moléculas contêm mais de um grupo ionizável. O ácido fosfórico (H3PO4) é um ácido fraco poliprótico – pode doar três íons pH Equivalentes de OH 9 8 7 6 5 4 3 2 - pH = 4,76 = p ’K pH = p ’ + 1K pH = p ’ - 1K 16 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. hidrogênio. Durante a titulação com NaOH as ionizações ocorrem em etapas com a liberação de um próton por vez: −+=−+=−+= + →←+ →←+ →← 33 38,12pK2 4 82,6pK 42 15,2pK 43 POHHPOHPOHHPOH 321 Os valores de pK1, pK2 e pK3 representam os pKa de cada grupo ionizado (Figura 1.8). Figura 1.8 Curva de titulação do ácido fosfórico (poliprótico). O ácido fosfórico possui pK múltiplos, um para cada etapa da titulação. B. Tampões fisiológicos Os três tampões mais importantes no corpo humano são: tampão bicarbonato, o tampão fosfato e o tampão protéico. Cada um está adaptado para solucionar problemas fisiológicos específicos do organismo. 1. Tampão bicarbonato. Um caso especial de sistema tampão de grande importância nos mamíferos é o bicarbonato/ácido carbônico. O dióxido de carbono reage com a água para formar ácido carbônico: CO2 + H2O H2CO3 O ácido carbônico rapidamente se dissocia para formar íons H+ e HCO+: H2CO3 H+ + HCO3− Como a concentração do H2CO3 é muito baixa no sangue, as equações acima podem ser simplificadas a: CO2 + H2O H+ + HCO3− pH Quantidade de base (equivalentes) 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 5 4 4 4 4 4 4 4 4 4 4 4 4 pH = 2,15 = p ’K1 pH = 6,82 = p ’K2 pH = 12,38 = p ’K3 H PO PO 3 3 4 H PO2 4- HPO42- 3- 1 Introdução à Bioquímica • 19 Quadro 1.2 Talidomida Durante o período entre 1957 e 1961, aproximadamente 10.000 pessoas em todo o mundo nasceram com membros deformados ou inexistentes após as mães terem ingerido a droga talidomida, um sedativo para tratar enjôos e náuseas durante a gravidez. A talidomida pode existir em duas formas enancioméricas. Animais tratados com a R(+)−talidomida produziam neonatos normais enquanto aquelas que recebiam o enanciômero S(−) produziam nascituros deformados. A talidomida prescrita para humanos era formada por uma mistura racêmica (mistura que contêm quantidades iguais de cada enanciômero). Somente em 1995 foi comprovada que em humanos há uma rápida interconversão entre os dois enanciômeros. O equilíbrio é estabelecido entre as duas formas no sangue, independente de qual enanciômero foi empregado inicialmente. Isso sugere que, mesmo utilizando a forma pura r(+)−talidomida, os defeitos de nascimento em seres humanos seriam os mesmos. De modo simplificado, consideram-se as moléculas biológicas como esqueletos de átomos de carbono ligados covalentemente entre si para formar cadeias longas, lineares ou ramificadas ou, ainda, estruturas cíclicas. Os átomos de hidrogênio que estão ligados aos átomos de carbono podem ser substituídos por N, O e S para formar uma grande variedade de grupos funcionais, tais como: aminas, aldeídos, álcoois e sulfidrilas. Isso confere uma grande variedade de propriedades químicas específicas encontradas nas moléculas e que determinam as suas funções biológicas específicas. As moléculas biológicas muitas vezes contêm mais que um grupo funcional e são denominadas polifuncionais. Por exemplo, os aminoácidos contêm grupos aminos e grupos carboxílicos. Tabela 1.6 − Elementos encontrados nas células Elementos principais Oligoelementos Elemento Símbolo Elemento Símbolo Carbono C Arsênico As Hidrogênio H Boro B Nitrogênio N Cloro Cl Oxigênio O Cromo Cr Fósforo P Fluor F Enxofre S Iodo I Cálcio Ca Ferro Fe Potássio K Magnésio Mg Manganês Mn Molibdênio Mo Níquel Ni Selênio Se Silicônio Si Sódio Na Estanho Sn Vanádio V Zinco Zn 20 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. B. Estrutura tridimensional Os compostos de carbono cujas composições são idênticas, mas as relações espaciais entre os átomos são diferentes, são denominados estereoisômeros. O átomo de carbono ligado a quatro substituintes diferentes é chamado assimétrico. Carbonos assimétricos são centros quirais indicando que os estereoisômeros podem ocorrer em formas orientadas à direita ou à esquerda. Os estereoisômeros são imagens especulares um do outro e não−superponíveis e são chamados moléculas quirais. Alguns estereoisômeros são enanciômeros e apresentam atividade óptica, ou seja, giram a luz plano-polarizada para a direita (dextrógiro) ou para a esquerda (levógiro). Uma mistura equimolar de dois enanciômeros é opticamente inativa (mistura racêmica). As posições dos átomos ou grupos ao redor de um átomo de carbono quiral não estão relacionados com a direção do desvio da luz plano-polarizada de uma maneira simples. Emil Fisher em 1891, arbitrária e corretamente, designou uma das estruturas do gliceraldeído e chamou de D-gliceraldeído. O isômero levorrotatório foi chamado L-gliceraldeído. Atualmente, o gliceraldeído permanece como base da configuração estereoquímica das moléculas biológicas. Estereoisômeros de todas as moléculas quirais tem configurações estruturais relacionadas com um dos gliceraldeídos e são designadas D ou L independente de sua atividade óptica. A atividade óptica é indicada por (+) para dextrorrotatório e (−) para levórrotatório. Os centros quirais são de grande importância biológica pois muitas moléculas são seletivas quanto a quiralidade, por exemplo, virtualmente todas as proteínas e polissacarídios dos organismos superiores são compostos por L−aminoácidos e D−monossacarídeos, respectivamente. Essa seletividade promove estabilidade adicional às moléculas poliméricas. C. Macromoléculas As macromoléculas são construídas pela união química de precursores relativamente simples (subunidades monoméricas) para formar polímeros de unidades repetidas. Todos os organismos vivos têm os mesmos tipos de subunidades monoméricas que além da formação de macromoléculas exercem, também, várias funções biológicas. As ligações específicas para cada tipo de macromolécula, são formadas por reações de condensação com perda de água, em processos que requerem o fornecimento de energia. 1 Introdução à Bioquímica • 21 Figura 1.9 As macromoléculas são formadas a partir unidades monoméricas. As macromoléculas intracelulares são polímeros de elevada massa molecular formadas com precursores relativamente simples. O tamanho de uma molécula é dado em termos de massa molecular. A unidade de massa empregada é o dalton (D) (1000 D = 1 kilodalton = kD) onde 1 D é definido como 1/12 da massa do átomo de 12C. As quatro principais classes de moléculas biológicas são: 1. Proteínas ou polipeptídeos. São longos polímeros formados por vinte diferentes aminoácidos. Apresentam elevada massa molecular que variam de centenas a milhões de daltons. Atuam como elementos estruturais, catalisadores (enzimas), anticorpos, transportadores, hormônios, reguladores gênicos, toxinas, etc. 2. Carboidratos. São polímeros de açúcares simples, como a glicose, com elevadas massas moleculares. Liberam e armazenam energia e também são elementos estruturais extracelulares. 3. Lipídeos. São formados por moléculas relativamente pequenas (ao redor de 300-1.500 D) que podem se associar para constituir grandes moléculas que servem, principalmente, como componentes estruturais das membranas, como forma de armazenamento de energia e outras funções (hormônios esteróides, vitaminas, proteção, material isolante). Unidades monoméricas Reação de condensação -( -1)H On Onde = número de unidades monoméricas n Ligações covalentes Polímero 2 24 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. Quadro 1.4 Célula A palavra célula foi introduzida na biologia em 1665 por Robert Hooke em sua coleção de desenhos microscópicos, chamados Micrographia, que inclui uma fina fatia de cortiça. Ele registrou a estrutura de favos vazios da cortiça e denominou os compartimentos de células em analogia a cela de uma prisão ou mosteiro. O termo, atualmente, não é empregado para descrever o compartimento vazio mas o conteúdo vivo existente entre estas paredes celulares. Hoje, a célula pode ser definida como a mais simples unidade integrada nos sistemas vivos capazes de sobreviver independentemente. No início do século 19, as células foram reconhecidas como formas vivas e como pertencentes a organismos multicelulares mais complexos. Em 1839, Theodor Schwann, um zoologista, publicou o Mikroskopische Untersuchungen, que contém figuras desenhadas por Mathias Schleiden, um botânico, que registrou semelhanças entre as células vegetais e animais. Vinte anos após, Rudolf Virchow anunciou ‘omnis cellula et cellula’, i.e. todas as células são provenientes de outras células. O metabolismo celular é compartimentalizado para organizar as diferentes vias metabólicas como a síntese e degradação, em diversos compartimentos, para que operem independentemente. Algumas funções em diferentes organelas são mostradas no Quadro 1.3. Quadro 1.3 – Resumo das funções das organelas Organela Função Núcleo Envolvido com uma membrana nuclear. Localização do DNA e proteínas (histonas); sítio da síntese da maior parte do DNA e do RNA. Mitocôndria Corpos separados constituídos por membranas altamente convolutas. Sítio de reações de oxidação produtoras de energia; possui o seu próprio DNA. Parte do sistema sintético: biossíntese e metabolismo energético. Retículo endoplasmático Membrana citoplasmática contínua com as membranas nuclear e plasmática; parte rugosa apresenta com ribossomos ligados Complexo de Golgi Série de membranas achatadas; envolvido na secreção de proteínas pela célula e em reações que ligam açúcares e outros componentes celulares. Lisossomos Vesículas envolvidas por membranas contendo vários tipos de enzimas hidrolíticas. Parte do sistema sintético (digestivo); hidrólise do material estranho, lise de células mortas. Peroxissomos Vesículas que contêm enzimas envolvidas no metabolismo do peróxido de hidrogênio. Ribossomos Compostos de partículas nucleoprotéicas (RNA e proteínas). Sítios da síntese protéica. Membrana plasmática É uma camada semipermeável contínua ao redor do citoplasma que separa o seu conteúdo da circunvizinhança. Contêm transportadores e receptores. Regula a troca com o meio. 1 Introdução à Bioquímica • 25 Com base na comparação de moléculas de RNA, Carl Woese agrupou todos os organismos em três grupos fundamentais chamados domínios: Eukarya (eucariontes), Bacteria (anteriormente Eubacteria) e Archaea (anteriormente Archaebacteria). A Eukaria compreende todos os organismos macroscópicos, incluindo os seres humanos também como muitos organismos microscópicos unicelulares como os fungos. Os dois domínios, Bacteria e Archaea, consistem de procariontes. Figura 1.10 Árvore filogenética de classificação dos três domínios. O domínio Eukaria consiste de eucariotos. Os dois domínios, Bacteria e Eukarya, consistem de procariotos. Na evolução, os três domínios possuem um ancestral comum. Resumo 1. A bioquímica é o estudo das estruturas moleculares, dos mecanismos e dos processos químicos responsáveis pela vida. Os organismos vivos são mantidos por sua capacidade de obter, transformar, armazenar e utilizar energia. 2. A água contribui com 50−90% do peso de uma célula. As moléculas de água são constituídas por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio. Cada átomo de hidrogênio está ligado ao átomo de hidrogênio por uma ligação covalente simples. As ligações oxigênio-hidrogênio são polares e as moléculas de água são dipolos. As moléculas de água podem formar pontes de hidrogênio entre o oxigênio de uma molécula e o hidrogênio de outra molécula. 3. As ligações não-covalentes são relativamente fracas e facilmente rompidas. Exercem papel fundamental na determinação das propriedades físicas e químicas da água e de biomoléculas. Interações iônicas ocorrem entre átomos e grupos carregados. O grande número de pontes de hidrogênio exerce considerável efeito nas moléculas envolvidas. 4. Os pontos de ebulição e fusão da água são excepcionalmente elevados quando comparados com compostos de estrutura e peso molecular semelhante. As pontes de hidrogênio são responsáveis por esse comportamento anômalo. Es ch er ic hi a Sa lm on el la B ac ill us H om o Sa cc ha ro m yc es Ze a M et ha no cu cc us A rc ha eo gl ob us H al ob ac te riu m Bacteria Eukarya Archaea Ancestral comum 26 • Motta • Bioquímica • Laboratório Autolab Ltda. 5. A estrutura dipolar da água e sua capacidade de formar pontes de hidrogênio permite a dissolução de muitas substâncias iônicas e polares. 6. As moléculas de água líquida apresentam capacidade limitada de ionizar- se para formar H+ e OH. Quando uma solução contém quantidades iguais dos íons H+ e OH−, é considerada neutra. Soluções com excesso de H+ são ácidas, enquanto aquelas com grande número de OH− são básicas. Como os ácidos orgânicos não se dissociam completamente em água, são chamados de ácidos fracos. A constante de dissociação de um ácido, Ka, expressa a força de um ácido fraco. Em geral, o Ka é expresso como pKa (−log Ka). 7. A concentração do íon hidrogênio é expressa na forma de pH definido como o logaritmo negativo da concentração do íon hidrogênio (−log [H+]). 8. Os ácidos são definidos como doadores de prótons, a as bases como aceptores de prótons. A tendência de um ácido HA doar prótons é expressa pela sua constante de dissociação (Ka =[H+][A−]/[HA]). 9. A regulação do pH é essencial para a atividade dos seres vivos. A concentração do íon hidrogênio é mantida dentro de estreitos limites. As soluções tamponadas (par ácido−base conjugado) resistem a mudanças de pH. A capacidade máxima de tamponamento está situada uma unidade de pH acima ou abaixo do seu pKa. 10. Várias propriedades físicas da água modificam as moléculas de soluto dissolvidas. Uma importante modificação é a pressão osmótica, a pressão que evita o fluxo de água através das membranas celulares. 11. Todos os seres vivos são constituídos de células procarióticas ou células eucarióticas. As procarióticas o material genético não está delimitado em um envelope nuclear. As eucarióticas apresentam o material genético dentro de um envelope nuclear. Essas células contêm núcleo e estruturas complexas que não são observadas nas procarióticas. Referências BLACKSTOCK, J. C, Biochemistry. Oxford: Butterworth, 1998. p. 1-19. CAMPBELL, M. K. Bioquimica. 3 ed. Porto Alegre: ArtMed, 2000. p. 64-87. NELSON, D. L., COX, M. M. Lehninger: Princípios de bioquímica. 3 ed. São Paulo: Sarvier, 2002. p. 3-85. 30 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Os α−aminoácidos com um único grupo amino e um único grupo carboxila, ocorrem em pH neutro na forma de íons dipolares (“zwitterions”) eletricamente neutros. O grupo α−amino está protonado (íon amônio, +− 3NH ) e o grupo α−carboxílico está dissociado (íon carboxilato, –COO−). Os aminoácidos apresentam as seguintes propriedades gerais: • Com exceção da glicina, todos os aminoácidos são opticamente ativos – desviam o plano da luz polarizada – pois o átomo de carbono α de tais moléculas é um centro quiral. São átomos de carbono ligados a quatro substituintes diferentes arranjados numa configuração tetraédrica e assimétrica. Os aminoácidos com átomos quirais podem existir como estereoisômeros – moléculas que diferem somente no arranjo espacial dos átomos. • Os α−aminoácidos que constituem as proteínas têm a configuração estereoquímica L. Por convenção, na forma L, o grupo +−α 3NH está projetado para a esquerda, enquanto na forma D, está direcionado para a direita. Os D-aminoácidos são encontrados em alguns antibióticos: valinomicina e actinomicina D; e em paredes de algumas bactérias: peptidoglicano. A designação L ou D de um aminoácido não indica a sua capacidade para desviar o plano da luz polarizada. • A cadeia lateral (R) determina as propriedades de cada aminoácido. Os α-aminoácidos são classificados em classes, com base na natureza das cadeias laterais (grupo R). Os 20 tipos de cadeias laterais dos aminoácidos variam em tamanho, forma, carga, capacidade de formação de pontes de hidrogênio, características hidrofóbicas e reatividade química. Os 20 aminoácidos-padrão são classificados pelos seus grupos R (cadeias laterais): Aminoácidos com cadeias laterais não-polares e alifáticas H3N C COO H H Glicina H3N C COO CH3 H Alanina H3N C COO CH CH3 CH3 H Valina H3N C COO CH2 CH CH3 CH3 H Leucina H3N C COO CH CH3 CH2 CH3 H Isoleucina H2N COO + Prolina H3N C COO R H Figura 2.1 Estrutura de um α-aminoácido na forma de íon dipolar (“zwitterions”). 2 Aminoácidos e proteínas • 31 Aminoácidos com cadeias laterais aromáticas H3N CH COO CH2 Fenilalanina H3N CH COO CH2 OH Tirosina H3N CH COO CH2 HN Triptofano Aminoácidos com cadeias laterais polares não-carregadas H3N CH COO CH2 OH Serina H3N CH COO CH OH CH3 Treonina H3N CH COO CH2 SH Cisteína H3N CH COO CH2 CH2 S CH3 Metionina H3N CH COO CH2 C OH O Asparagina H3N CH COO CH2 CH2 C OH O Glutamina Aminoácidos com cadeias laterais carregadas negativamente (ácidos) H3N CH COO CH2 COO Aspartato H3N CH COO CH2 CH2 COO Glutamato 32 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Aminoácidos com cadeias laterais carregadas positivamente (básicos) H3N CH COO CH2 CH2 CH2 NH C NH2 NH2 Arginina H3N CH COO CH2 CH2 CH2 CH2 NH3 Lisina H3N CH COO CH2 N NH Histidina A. Aminoácidos incomuns em proteínas Várias proteínas contêm aminoácidos incomuns formados por modificação de resíduos de aminoácidos existentes na cadeia polipeptídica após a sua síntese. Entre eles está o ácido γ−carboxiglutâmico, um aminoácido ligado ao cálcio e encontrado na protrombina, uma proteína da cascata de coagulação sangüínea. A hidroxiprolina e a hidroxilisina produtos de hidroxilação da prolina e lisina, respectivamente, são importantes componentes estruturais do colágeno (ver adiante). A fosforilação dos aminoácidos contendo grupos hidroxila, tais como a serina, a treonina e a tirosina é empregada para regular a atividade das proteínas. NH2 CH2 CHOH CH2 CH2 CHNH2 COOH Hidroxilisina HC H2C N CH CH2 OH COOH H Hidroxiprolina B. Aminoácidos biologicamente ativos Além da função primária como componentes das proteínas, os aminoácidos têm vários outros papéis biológicos. • Vários α-aminoácidos ou seus derivados atuam como mensageiros químicos entre as células. Por exemplo, glicina, ácido γ−aminobutírico (GABA, um derivado do glutamato), serotonina e melatonina (derivados do triptofano) são neurotransmissores, substâncias liberadas de uma célula nervosa e que influenciam outras células vizinhas (nervosas ou musculares). A tiroxina (um derivado da tirosina produzida pela glândula tireóide) e ácido indolacético (um derivado do triptofano e encontrado nas plantas) são exemplos de hormônios. 2 Aminoácidos e proteínas • 35 Figura 2.2 Curva de titulação da alanina O valor de pH no qual o aminoácido fica eletricamente neutro (igual número de cargas positivas e negativas) corresponde ao ponto isoelétrico (pI). O valor do pI é uma constante de um composto em particular em condições específicas de força iônica e temperatura. Para o aminoácido monoamino e monocarboxílico, o ponto isoelétrico é calculado: 2 pKpK p 21 + =I em que K são as constantes de dissociação dos grupos ácido e básico. Para a alanina tem-se: 026 2 699342p ,,,I =+= Um exemplo mais complexo da relação entre a carga elétrica da molécula e o pH, é a titulação dos aminoácidos monoamino e dicarboxílicos cujos representantes são o ácido glutâmico e o ácido aspártico. Os dois aminoácidos possuem em suas cadeias laterais um segundo grupo carboxílico. Para o ácido aspártico tem-se: COOH CH2 CHNH3 + COOH COOH CH2 CHNH3 + COO- COO- CH2 CHNH3 + COO- COO- CH2 CHNH2 COO- A curva de titulação do ácido aspártico é mostrada na Figura 2.3. pH Quantidade de base (equivalentes) 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 4 4 4 4 4 4 4 4 4 4 pH = 2,34 = p ’K1 pI = 6 pH = 9,69 = p ’K2 36 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Figura 2.3 Curva de titulação do ácido aspártico Para o ácido aspártico o pK′ do α−COOH é 2,09, o pK′ do grupo β−COOH é 3,86 e o pK′ do +−α 3NH é 9,82. O ponto isoelétrico (pI) é calculado pela fórmula: 972 2 863092p ,,,I =+= A lisina é um exemplo de aminoácido com dois grupos básicos na molécula. O grupo ε−NH2 da molécula confere basicidade. NH3 + (CH2)4 CHNH3 + COOH NH3 + (CH2)4 CHNH3 + COO- NH3 + (CH2)4 CHNH2 COO- NH2 (CH2)4 CHNH2 COO- No caso da lisina o pK′ do α−COOH é 2,18 o pK′ da +−α 3NH e o pK′ do +−ε 3NH é 10,53. O ponto isoelétrico é calculado: 749 2 5310958p ,,,I =+= A curva de titulação da lisina é mostrada na Figura 2.4. pH Quantidade de base (equivalentes) 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 4 4 4 4 4 4 4 4 4 4 pH = 2,09 = p ’K1 pI = 2,97 pH = 3,86 = p ’K2 pH = 9,82 = p ’K3 2 Aminoácidos e proteínas • 37 Figura 2.4 Curva de titulação da lisina Tabela 2.2. Grupos ionizáveis de aminoácidos Onde o grupo é encontrado Forma ácida Forma básica Resíduo NH2-terminal NH3 +R R NH2 + H+ Amônio Amina Resíduo COOH-terminal R COOH R COO - + H+ Ácido carboxílico Carboxilato Arginina C NH2 + NH2 NHR C NH NH2 NHR + H+ Guanidínio Guanidino Cisteína SHR S-R + H2 Tiol Tiolato Histidina CH C N NH+ CH R H CH C N N CH R H + H+ Imidazólio Imidazol Tirosina CHCH CC CHCH R OH CHCH CC CHCH R O- Fenol Fenolato pH Quantidade de base (equivalentes) 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 4 4 4 4 4 4 4 4 4 4 pH = 2,18 = p ’K1 pI =9,74 pH = 8,95 = p ’K2 pH = 10,53 = p ’K3 40 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Quadro 2.1 Cromatografia de troca iônica A cromatografia de troca iônica utiliza colunas cromatográficas que separam as moléculas com base na sua carga líquida. São usados compostos com grupamentos funcionais positiva ou negativamente carregados, tais como, dietilaminoetil ou carboximetila, covalentemente ligados a uma matriz sólida porosa (ex.: resinas à base de acrílico, agarose, sílica ou estireno divinilbenzeno) para formar trocadores de cátions ou ânions. Quando uma solução contendo proteínas com cargas positivas e negativas é aplicada à coluna contendo um trocador de cargas de sinal contrário, as moléculas carregadas ligam-se por meio de interações iônicas a trocadores de cátions e ânions. Moléculas neutras ou carregadas com as mesmas cargas, movem-se através da coluna sem serem captadas. A separação das moléculas carregadas é usualmente realizada em solução-tampão com concentrações de íons salinos e pH apropriados (determinam os estados de ionização da molécula) que progressivamente, vão enfraquecendo as ligações iônicas. Alguns peptídeos atuam como moléculas de sinalização usadas para coordenar o imenso número de processos bioquímicos em organismos multicelulares. Os exemplos incluem o apetite, pressão sangüínea e a percepção da dor. O papel de alguns desses peptídeos são descritos brevemente. Os estudos de regulação da ingestão de alimentos e do peso corporal tem revelado várias moléculas de sinalização no cérebro. Entre elas, estão os peptídeos estimulantes do apetite como o neuropeptídeo Y (NPY) e a galanina, e peptídeos inibidores do apetite como colecistocinina e hormônio estimulador α−melanócito (α−MSH). Evidências recentes sugerem que a leptina, um polipeptídeo produzido primariamente pelos adipócitos, exerce seus efeitos sobre o peso corporal e atua sobre o neuropeptídeo Y, a galanina e várias outras moléculas sinalizadoras para reduzir a ingestão de alimentos e aumentar o gasto calórico. A pressão sangüínea – a força exercida pelo sangue contra as paredes dos vasos – é influenciada pelo volume sangüíneo e pela viscosidade. Dois peptídeos afetam o volume sangüíneo: a vasopressina e o fator natriurético atrial. A vasopressina, também chamada hormônio antidiurético (ADH), é sintetizada no hipotálamo e contêm nove resíduos de aminoácidos. O ADH estimula os rins a reter água. A estrutura do ADH é bastante similar a outro peptídeo produzido pelo hipotálamo chamado oxitocina, uma molécula de sinalização que estimula a liberação do leite pelas glândulas mamárias e influencia o comportamento sexual, maternal e social. A oxitocina produzida no útero estimula a contração uterina durante o parto. O fator natriurético atrial (FNA) – um peptídeo produzido por células atriais cardíacas em resposta a distensão – estimula a formação de urina diluída, um efeito oposto ao da vasopressina. O FNA exerce seus efeitos, em parte, pelo aumento da excreção de Na+ pela urina, um processo que causa o aumento da excreção da água e a inibição da secreção de renina pelo rim. 2 Aminoácidos e proteínas • 41 8-Arginina vasopressina (Hormônio antidiurético) A met−encefalina e a leu−encefalina pertencem a um grupo de peptídeos chamados peptídeos−opiáceos, encontrados predominantemente nas células do tecido nervoso. Os peptídeos opiáceos são moléculas que atenuam a dor e produzem sensações agradáveis. Os pentapeptídeos leu−encefalina e met−encefalina diferem entre si somente pelos resíduos de aminoácidos dos C−terminais. A substância P e a bradiquinina estimulam a percepção de dor e apresentam efeitos opostos aos peptídeos opiáceos. Um importante dipeptídeo comercial sintético é o adoçante artificial aspartame (éster metílico de L−aspartil−L−fenilalanina). 2.5 Proteínas As proteínas são componentes essenciais à matéria viva. Atuam como catalizadores (enzimas), transportadores (oxigênio, vitaminas, fármacos, lipídeos, ferro, cobre, etc.), armazenamento (caseína do leite), proteção imune (anticorpos), reguladores (insulina, glucagon), movimento (actina e miosina), estruturais (colágeno), transmissão dos impulsos nervosos (neurotransmissores) e o controle do crescimento e diferenciação celular (fatores de crescimento) Além das resumidas acima, citam-se algumas funções de grande importância fisiológica das proteínas: manutenção da distribuição de água entre o compartimento intersticial e o sistema vascular do organismo; participação da homeostase e coagulação sangüínea; nutrição de tecidos; formação de tampões para a manutenção do pH, etc. Baseado na sua composição, as proteínas são divididas em simples, que consistem somente de cadeias polipeptídicas, e conjugadas que, além das cadeias polipeptídicas também possuem componentes orgânicos e inorgânicos. A porção não-peptídica das proteínas conjugadas é denominada grupo prostético. As mais importantes proteínas conjugadas são: nucleoproteínas, lipoproteínas, fosfoproteínas, metaloproteínas, glicoproteínas, hemoproteínas e flavoproteínas. As proteínas variam amplamente em suas massas moleculares. Algumas atingem valores acima de um milhão de daltons. O limite mínimo é mais difícil de definir mas, em geral, considera-se que uma proteína quando existir pelo menos 40 resíduos de aminoácidos. Isso representa o ponto de demarcação no tamanho entre um polipeptídeo e uma proteína, entretanto deve-se enfatizar que essa é uma definição de conveniência, pois não existem diferenças marcantes nas propriedades dos polipeptídeos grandes e proteínas pequenas. As propriedades fundamentais das proteínas permitem que elas participem de ampla variedade de funções: • As proteínas são polímeros constituídos por unidades monoméricas chamadas α−aminoácidos. +H N Cys Tyr Phe Glu Asp Cys Pro Arg Gly C3 O NH2 S S 1 2 3 4 5 6 7 8 9 42 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Quadro 2.2 Cromatografia de filtração em gel A cromatografia de filtração em gel separa as moléculas de acordo com seu tamanho e forma. Utiliza esferas porosas de um polímero insolúvel mas muito hidratado, como a agarose, dextrana ou poliacrilamida. As esferas são contêm poros de diferentes tamanhos. A separação acontece quando as moléculas de diferentes tamanhos são passadas através da coluna contendo as esferas porosas. As moléculas pequenas se distribuem dentro dos poros, enquanto as moléculas grandes não entram nos poros e passam rapidamente através da coluna. Assim, moléculas de diferentes massas moleculares podem ser separadas quando passam pela coluna (“peneira molecular”). A resolução depende do tamanho da partícula, tamanho do poro, velocidade do fluxo, comprimento e diâmetro da coluna e o volume da amostra. A técnica é aplicada no fracionamento de proteínas e polissacarídeos, determinação da massa molecular de proteínas e a purificação de ácidos nucléicos. • As proteínas contêm vários grupos funcionais. • As proteínas podem interagir entre si ou com outras macromoléculas para formar associações complexas. • Algumas proteínas são bastante rígidas, enquanto outras apresentam flexibilidade limitada. 2.6 Estrutura das proteínas A estrutura das proteínas é extraordinariamente complexa e seu estudo requer o conhecimento dos vários níveis de organização. A distinção dos níveis de organização é realizada em termos de natureza das interações necessárias para a sua manutenção. Destingem-se quatro níveis de organização existentes nas proteínas. Os conceitos a seguir destinam-se fundamentalmente a melhor compreensão das estruturas protéicas, pois existem casos de sobreposição entre os diferentes níveis de organização. As quatro estruturas são: 1. Primária: número, espécie e a seqüência dos aminoácidos unidos por ligações peptídicas e pontes dissulfeto. É especificada por informação genética. 2. Secundária: arranjos regulares e recorrentes da cadeia polipeptídica (α−hélice e folha β pregueada). 3. Terciária: pregueamento não periódico da cadeia polipeptídica, formando uma estrutura tridimensional estável. 4. Quaternária: arranjo espacial de duas ou mais cadeias polipeptídicas (ou subunidades protéicas) com a formação de complexos tridimensionais. A. Estrutura primária Cada cadeia polipeptídica tem uma seqüência específica de aminoácidos determinada por informação genética. A estrutura primária descreve o número de aminoácidos, a espécie, a seqüência (ordem) e a localização das pontes dissulfeto (cistina) de uma cadeia polipeptídica. A estrutura é estabilizada pelas ligações peptídicas e pontes dissulfeto. Polipeptídeos com funções e seqüências de aminoácidos similares são denominados homólogos. 2 Aminoácidos e proteínas • 45 Quadro 2.4 Cromatografia de afinidade A cromatografia de afinidade envolve a propriedade de algumas proteínas de se ligarem por interações não-covalentes. Um ligante se liga covalentemente a uma matriz inerte, exemplo, agarose (uma matriz de resina sólida) que é colocada em uma coluna. Uma mistura de biomoléculas é passada através da coluna. As substâncias sem afinidade pelo ligante passam pela coluna e são lavadas por um tampão. A proteína desejada liga-se ao ligante de forma específica de modo não-covalente. A proteína ligada pode ser eluída por solução de ligantes livres ou aplicando solventes orgânicos ou, ainda, por soluções de pH ou força iônica diferente. Folha β pregueada A estrutura de folha β pregueada resulta da formação de pontes de hidrogênio entre duas ou mais cadeias polipeptídicas adjacentes. As pontes de hidrogênio ocorrem entre os grupos C=O e N–H de ligações peptídicas pertencentes a cadeias polipeptídicas vizinhas em vez de no interior da cadeia (Figura 2.7). Cada segmento polipeptídico individual é denominado folha β. Diferentemente da α−hélice compacta, as cadeias polipeptídicas da folha β estão quase inteiramente estendidas. Os segmentos polipeptídicos na folha β pregueada são alinhados no sentido paralelo ou antiparalelo em relação às cadeias vizinhas: • Estrutura folhas β paralelas é formada por cadeias polipeptídicas com os N−terminais alinhados na mesma direção. • Estrutura folhas β antiparalelas, os N−terminais de cada cadeia polipeptídica estão alinhados em direções opostas. Ocasionalmente, misturas de cadeias paralelas e antiparalelas são observadas. 46 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. N C CO N C C N C C N C C N C C N C C H O H O H O H O H N C CO N C C N C C N C C N C C N C C H O H O H O H O H N C CO N C C N C C N C C N C C N C C H O H O H O H O H Paralela N C CO N C C N C C N C C N C C N C C H O H O H O H O H C C N C C N C C N C C N C C N C C N O O O H H N C CO N C C N C C N C C N C C N C C H O H O H O H O H H H H O O Anti-paralela Figura 2.7 Estrutura de folha β pregueada entre cadeias polipeptídicas. A representação esquemática das ligações intermoleculares e das cadeias paralelas dispostas em estrutura de folha pregueada são mostradas na Figura 2.7. Nessas estruturas as cadeias laterais (R) são projetadas para cima e para baixo aos planos formados pelas pontes de hidrogênio entre as cadeias polipeptídicas. Estrutura secundária irregular As α−hélices e as folhas β pregueadas são classificadas como estruturas secundárias regulares, pois seus componentes exibem conformações estruturais periódicas. Dependendo da natureza das cadeias laterais dos aminoácidos presentes, as α−hélices e as folhas β pregueadas podem se apresentar levemente distorcidas em sua conformação específica. Muitas proteínas apresentam combinações de estruturas α−hélice e de estruturas folha β pregueada em proporções variadas. As combinações produzem vários arranjos denominados de estruturas supersecundárias ou motivos cujas variações são: • Motivo βαβ, em que duas folhas β pregueadas paralelas estão conectadas a uma α−hélice. • Motivo β meandro, onde duas folhas β pregueadas antiparalelas estão conectadas por aminoácidos polares e glicina que efetuam uma mudança brusca de direção da cadeia polipeptídica. • Motivo αα, onde duas α−hélices antiparalelas consecutivas estão separadas por uma alça ou segmento não-helicoidal. • Barris β, são formados quando várias folhas β pregueadas enrolam-se sobre si mesmas. 2 Aminoácidos e proteínas • 47 Figura 2.8 Algumas estruturas supersecundárias (motivos-proteína). As setas indicam as direções das cadeias polipeptídicas. (a) Motivo βαβ, (b) motivo grampo, (c) motivo β meandro, (d) motivo chave grega e (e) β sanduíche. As estruturas secundárias e supersecundárias de grandes proteínas, geralmente, são organizadas como domínios – regiões compactas semiindependentes ligadas entre si por uma cadeia polipeptídica. C. Estrutura terciária A estrutura terciária descreve a conformação específica da cadeia polipeptídica secundária que resulta numa estrutura mais compacta onde os átomos ocupam posições específicas. O dobramento protéico é um processo no qual uma molécula não organizada, nascente (recentemente sintetizada) adquire uma estrutura altamente organizada como conseqüência de interações entre as cadeias laterais presentes na sua estrutura primária. A estrutura terciária apresenta várias características importantes: • Muitos polipeptídeos dobram de modo que os resíduos de aminoácidos que estão distantes um do outro na estrutura primária podem estar próximos na estrutura terciária. • Devido ao empacotamento eficiente pelo dobramento da cadeia polipeptídica, as proteínas globulares são compactas. Durante o processo, a maioria das moléculas de água são excluídas do interior da proteína tornando possível interações entre grupos polares e não−polares. • Algumas cadeias polipeptídicas dobram-se em duas ou mais regiões compactas conectadas por um segmento flexível de cadeia polipeptídica. Essas unidades globulares compactas, chamadas domínios, são formadas por 30 a 400 resíduos de aminoácidos. Dominios são segmentos estruturalmente independentes que têm (b) Grampo(a) Unidade (c) Meandro (d) Chave grega (e) Sanduíche 50 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. • A síntese isolada de subunidades é mais eficiente que aumentos de tamanho da cadeia polipeptídica única. • Em complexos supramoleculares como as fibrilas do colágeno, a reposição de pequenos componentes defeituosos é um processo mais eficiente. • As interações complexas de múltiplas subunidades ajudam a regular as funções protéicas. Um exemplo de estrutura quaternária é a hemoglobina formada por quatro subunidades, ligadas entre si numa configuração específica (oligômero). Cada uma das subunidades é caracterizada por sua própria estrutura secundária e terciária. As interações dos polipeptídeos ocorrem entre os grupos desprotegidos que não participam do enovelamento da cadeia (estrutura terciária) (ver Proteínas globulares). Por outro lado, a enzima α−quimotripsina não possui estrutura quaternária apesar de ser formada por três cadeias polipeptídicas, já que essas subunidades estão unidas entre si por ligações covalentes. E. Proteínas chaperones É uma família de proteínas que previnem a agregação de proteínas recém-sintetizadas antes que elas assumam sua forma ativa, sem alterar o resultado final do processo de enovelamento. As proteínas de choque térmico (hsp, heat shock protein) cuja síntese é aumentada em temperaturas elevadas, é um exemplo de chaperones que se liga a polipeptídeos à medida que são sintetizadas nos ribossomos. Existem duas classes principais de chaperones: a família hsp70, de proteínas de peso moleculares 70 kD, e as chaperoninas. F. Dinâmica protéica Apesar da importância das forças que estabilizam as estruturas, deve-se reconhecer que as funções das proteínas exigem um certo grau de flexibilidade. O significado da flexibilidade conformacional (flutuações contínuas e rápidas na orientação dos átomos na proteína) foi demonstrado nas interações proteínas-ligantes. A função protéica muitas vezes envolve a rápida abertura e fechamento de cavidades na superfície da molécula. A velocidade com que as enzimas catalisam reações está limitada em parte pela rapidez com que o produto é liberado do sítio ativo. A transferência de informações entre biomoléculas é acompanhada por modificações na estrutura tridimensional. Por exemplo, a conformação das subunidades das moléculas de hemoglobina sofre modificações estruturais específicas com a ligação e liberação do oxigênio da molécula. 2.7 Desnaturação e renaturação A desnaturação ocorre pela alteração da conformação tridimensional nativa das proteínas (estrutura secundária, terciária e quaternária) sem romper as ligações peptídicas (estrutura primária). Como a estrutura tridimensional específica das proteínas é fundamental para o exercício de suas funções, alterações estruturais 2 Aminoácidos e proteínas • 51 provocadas pela desnaturação ocasionam a perda parcial ou completa das suas funções biológicas. Muitas vezes, em condições fisiológicas, as proteínas recuperam a conformação nativa e restauram atividade biológica quando o agente desnaturante é removido em processo denominado renaturação. A desnaturação ocorre nas seguintes condições: 1. Ácidos e bases fortes. Modificações no pH resultam em alterações no estado iônico de cadeias laterais das proteínas, que modificam as pontes de hidrogênio e as pontes salinas (associação de grupos iônicos de proteínas de carga oposta). Muitas proteínas tornam-se insolúveis e precipitam na solução. 2. Solventes orgânicos. Solventes orgânicos solúveis em água como o etanol, interferem com as interações hidrofóbicas por sua interação com os grupos R não−polares e forma pontes de hidrogênio com a água e grupos protéicos polares. Os solventes não-polares também rompem interações hidrofóbicas. 3. Detergentes. As moléculas anfipáticas interferem com as interações hidrofóbicas e podem desenrolar as cadeias polipeptídicas. 4. Agentes redutores. Em presença de reagentes como a uréia e β−mercaptoetanol ocorre a conversão das pontes dissulfeto em grupos sulfidrílicos. A uréia rompe pontes de hidrogênio e interações hidrofóbicas. 5. Concentração de sais. A ligação de íons salinos a grupos ionizáveis das proteínas enfraquecem as interações entre grupos de cargas opostas da molécula protéica. As moléculas de água solvatam os grupos protéicos. Com a adição de grandes quantidades de sal às proteínas em solução, formam-se precipitados. As moléculas de água competem pelo sal adicionado tornando a quantidade de solvente muito pequena e, com isso, promovendo a agregação de moléculas protéicas e a sua precipitação. Esse efeito é chamado salting out. 6. Íons de metais pesados. Metais pesados como o mercúrio (Hg2+) e chumbo (Pb2+) afetam a estrutura protéica de várias formas. Podem romper as pontes salinas pela formação de ligações iônicas com grupos carregados negativamente. Os metais pesados também se ligam com grupos sulfidrílicos, um processo que pode resultar em profundas alterações das estruturas e funções protéicas. Por exemplo, o chumbo liga-se aos grupos sulfidrílicos de duas enzimas da via sintética da hemoglobina causando anemia severa (na anemia o número de eritrócitos ou da concentração de hemoglobina no sangue estão abaixo dos valores de referência). 7. Alterações na temperatura. Com o aumento da temperatura, a velocidade de vibração molecular aumenta. Eventualmente, interações fracas como as pontes de hidrogênio são rompidas promovendo alterações na conformação das proteínas. 8. Estresse mecânico. Agitação e trituração rompem o delicado equilíbrio de forças que mantém a estrutura protéica. Por exemplo, a espuma formada quando a clara do ovo é batida vigorosamente contém proteína desnaturada. 52 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Figura 2.10 Desnaturação de proteínas 2.8 Proteínas fibrosas As proteínas fibrosas tipicamente contêm altas proporções de estruturas secundárias regulares, como α−hélices ou folha β pregueadas. Compõem os materiais estruturais de órgãos e tecidos, dando a eles elasticidade e/ou resistência. Em geral, são pouco solúveis em água pela presença de teores elevados de aminoácidos hidrófobos tanto no interior como no exterior das cadeias polipeptídicas helicoidais reunidas em feixes. São exemplos característicos da relação entre a estrutura protéica e a função biológica. As principais proteínas fibrosas são: o colágeno, as α−queratinas e a fibroína da seda. A. Colágeno O colágeno é a proteína mais abundante em vertebrados sendo componente essencial do tecido conjuntivo que, numa variedade de formas geneticamente distintas, se distribui pela matriz óssea, pele, tendões, cartilagens, córnea, vasos sangüíneos, dentes e outros tecidos. É sintetizado pelas células do tecido conjuntivo e secretada para o espaço extracelular para fazer parte de uma rede complexa de macromoléculas localizadas na matriz extracelular. s s s s Nativa Desnaturada 2 Aminoácidos e proteínas • 55 Tabela 2.3 Alguns tipos de colágeno mais abundantes Tipo Composição Distribuição nos tecidos I (α1)2 α2 Tendões, pele, ossos, córnea, vasos sangüíneos II (α1)3 Carti lagem, disco intervertebral, humor vítreo III (α1)3 Pele fetal, vasos sangüíneos, órgãos internos IV (α1)2 α2 Membrana basal V (α1)2 α2 Pele, placenta, vários tecidos B. α-Queratinas As α−queratinas são proteínas constituídas quase exclusivamente de α−hélices compostas de três cadeias polipeptídicas enroladas em forma de corda helicoidal resistente ao estiramento. São ricas em resíduos de cisteína que formam pontes covalentes de dissulfeto que estabilizam as cadeias polipeptídicas adjacentes. Apresentam também teores importantes de resíduos de aminoácidos hidrofóbicos alanina, valina, isoleucina, fenilalanina e metionina. As α−queratinas formam a proteína da pele, cabelo, unhas, chifres, penas e lã. O cabelo é constituído de células mortas. C. Fibroína da seda Muitos insetos e aranhas produzem seda, uma estrutura que consiste da proteína fibrosa fibroína embebida em uma matriz amorfa. Na fibroína, considerada uma β−queratina, as cadeias polipeptídicas são arranjadas na conformação de folhas β−antiparalela. As folhas β são formadas porque a fibroína tem elevado conteúdo de aminoácidos com grupos R relativamente pequenos como a glicina, alanina ou serina. A seda é uma fibra resistente por estar quase completamente distendida. Para esticá-la mais, seria necessário romper as ligações covalentes de suas cadeias polipeptídicas. No entanto, a flexibilidade da seda é ocasionada pelo deslizamento das folhas β adjacentes que estão associados por forças de van der Waals. 2.9 Proteínas globulares As proteínas globulares possuem cadeias polipeptídicas enoveladas firmemente em estruturas tridimensionais compactas com forma esférica ou elipsóide. Suas massas moleculares são variáveis enquanto a solubilidade em água é relativamente elevada pois as cadeias laterais hidrofóbicas (insolúveis em água) dos aminoácidos (fenilalanina, leucina, isoleucina, metionina e valina) estão orientados para o interior das estruturas, enquanto os grupos polares hidrófilos (arginina, histidina, lisina, ácido aspártico e ácido glutâmico) estão situados na área externa. Os aminoácidos com grupos polares não−carregados (serina, treonina, asparagina, glutamina e tirosina) estão tanto na superfície externa da proteína, como no interior da molécula. As proteínas globulares exercem diferentes tipos de atividades biológicas, tais como: enzimas, 56 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. transportadores e moduladores fisiológicos e genéticos. Os exemplos típicos são: a mioglobina, a hemoglobina e os anticorpos. Proteína globular com estrutura α-hélice e folha β pregueada. A. Mioglobina A mioglobina presente no citosol das células musculares, é uma proteína transportadora e armazenadora de oxigênio nos músculos esqueléticos e cardíacos dos vertebrados. A mioglobina liga o oxigênio liberado pela hemoglobina nos capilares e posteriormente difundido através das membranas celulares. Formada por uma única cadeia polipeptídica de 153 resíduos de aminoácidos e um grupo prostético heme (anel heterocíclico porfirínico contendo quatro anéis pirrólicos e um átomo de Fe2+). Não possui resíduos de cisteína e, portanto, não apresenta ligações dissulfeto. As características fundamentais da estrutura da mioglobina são: • É uma proteína globular com dimensões aproximadas de 4,5 x 3,5 x 2,5 nm. • A superfície da molécula é polar e seu interior apolar. Os aminoácidos polares da cadeia polipeptídica contribuem para a alta solubilidade da molécula. • O interior da molécula é compacto e consiste quase inteiramente de resíduos de aminoácidos não-polares (leucina, valina, metionina e fenilalanina) e é desprovido de resíduos de aminoácidos com carga, tais como, aspartato, glutamato, lisina e arginina. Os únicos resíduos polares no interior são dois resíduos de histidina, que atuam na ligação do ferro e oxigênio. • Resíduos de aminoácidos polares e não-polares (ex.: treonina e tirosina) estão orientados com sua porção não-polar para o interior da molécula. • Composta por oito regiões α-hélice conectadas por dobras formadas por aminoácidos desestabilizadores designados A–H , que constituem 75% da cadeia. Cada aminoácido da cadeia é 2 Aminoácidos e proteínas • 57 codificado, ex.: His F8 refere-se ao oitavo resíduo da hélice F (Figura 2.12). • A cadeia contém um total de sete segmentos não-helicoidais: cinco deles no interior das regiões helicoidais e designados de acordo com as hélices que eles interrompem. • A ocorrência de prolina interrompe as α−hélice. Existem quatro resíduos de prolina na mioglobina. Figura 2.12 Estrutura da molécula de mioglobina. O esqueleto peptídico é constituído por oito α-hélices marcadas por letras, de A a H. B. Hemoglobina A hemoglobina é uma proteína tetramérica presente nas hemáceas cuja principal função é o transporte do oxigênio dos pulmões aos tecidos periféricos. A hemoglobina também transporta CO2 e prótons, dos tecidos periféricos aos pulmões, para subseqüente excreção. A hemoglobina normal de adulto, a HbA consiste de quatro cadeias polipeptídicas: duas α (cada uma com 141 resíduos de aminoácidos) e duas β (cada uma com 146 resíduos de aminoácidos) representada por α2β2 e estabilizadas por pontes de hidrogênio e interações eletrostáticas. Outra forma encontrada em baixos teores (1 a 3,5% do total) no adulto é a HbA2 composta por cadeias α2δ2. A HbF formada por α2γ2 predomina no feto, em 60 a 90% no recém- nascido e <1% após um ano. A hemoglobina H formada por quatro cadeias β, produzida quando faltam cadeias α para a síntese de HbA. A hemoglobina de Bart constituída de tetrâmero de γ, formada quando faltam cadeias α para a síntese de HbF no feto; apresenta-se em <2% no recém-nascido normal. Cada uma das cadeias de hemoglobina contém um grupo prostético, o heme (molécula de protoporfirina IX contendo um átomo de Fe2+). Nas cadeias α, o heme está encaixado entre a His−58 60 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Figura 2.14 O átomo de ferro se dirige para o plano do heme oxigenado. A histidina F8 é atraída junto com o átomo de ferro. Enquanto a mioglobina apresenta grande afinidade pelo oxigênio, a hemoglobina demonstra uma afinidade inicial lenta que se torna progressivamente mais rápida. Esse fenômeno é conhecido como interação cooperativa, uma vez que a ligação do primeiro O2 à desoxi−hemoglobina facilita a ligação de O2 às outras subunidades na molécula. De modo inverso, a dissociação do primeiro O2 da hemoglobina completamente oxigenada, Hb(O2)4, tornará mais fácil a dissociação de O2 das outras subunidades da molécula. A oxigenação da hemoglobina é acompanhada por mudanças conformacionais nas proximidades do grupo heme. A estrutura quaternária da hemoglobina desoxigenada (desoxi−Hb) é descrita como estado conformacional T (tenso) e aquela da hemoglobina oxigenada (oxi−Hb) como estado conformacional R (relaxada). A afinidade do O2 é mais baixa no estado T e mais alta no estado R. Em função da cooperatividade em associação e dissociação do oxigênio, a curva de saturação de oxigênio para a hemoglobina difere da observada para a mioglobina (Figura 2.15) Figura 2.15 Curva de ligação da mioglobina e hemoglobina pelo oxigênio. A forma hiperbólica da curva de ligação da mioglobina representa a ligação simples de uma molécula pequena a uma proteína. A ligação do oxigênio à hemoglobina segue uma curva sigmóide característica de uma interação cooperativa entre os sítios de ligação. Além das modificações estruturais de proteínas causadas pela oxigenação/desoxigenação, a ligação do O2 à hemoglobina é afetada por substâncias chamadas efetores alostéricos (ver Capítulo 3: Enzimas): CO2, H+ e 2,3−bifosfoglicerato (2,3−BPG). 1. Efeito do 2,3−bifosfoglicerato (2,3−BPG). O 2,3−BPG, sintetizado a partir de um intermediário da via glicolítica (o 1,3−bifosfoglicerato), é um importante modulador da ligação do 100 80 60 40 20 0 20 40 60 80 100 120 Hemoglobina Mioglobina Pressão venosa Pressão arterial Pressão parcial de oxigênio (mm Hg) 2 Aminoácidos e proteínas • 61 oxigênio à hemoglobina. Nos tecidos periféricos, a deficiência de oxigênio determina acúmulo de 2,3−DPG. Nos eritrócitos, o 2,3−BPG liga-se fortemente a desoxiemoglobina e fracamente a oxiemoglobina atuando como um efetor alostérico negativo. Assim, o BPG reduz a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio através da ligação com a desoxiemoglobina, mas não à oxiemoglobina. C O OPO3 CH OH CH2OPO3 2- 2- 2,3-Bifosfoglicerato A concentração do 2,3−BPG nos eritrócitos é sensível a várias condições fisiológicas e patológicas. Os níveis de 2,3−BPG estão elevadas na privação crônica de O2 nos tecidos como acontece em algumas anemias, insuficiências cardíacas e na adaptação a altitudes elevadas. Desse modo, ocorre a maior estabilização do estado T desoxigenado, provocando a liberação de mais oxigênio para os tecidos hipóxicos. (Figura 2.16). Figura 2.16 Efeito do BPG sobre a ligação do oxigênio à hemoglobina. A hemoglobina sem BPG tem maior afinidade pelo O2 do que a hemoglobina com BPG. 2. Efeito de Bohr. A combinação da hemoglobina com O2 também depende do pH, um fenômeno conhecido como efeito de Bohr. Teores elevados de íon hidrogênio (pH reduzido) favorecem a liberação de O2; o inverso também é verdadeiro. O efeito de Bohr possui considerável importância fisiológica no transporte de O2 dos pulmões para os tecidos e no transporte do CO2 dos tecidos periféricos para os pulmões. À medida que o sangue atinge os tecidos, o CO2 difunde-se para os eritrócitos, reduzindo o pH e a afinidade da hemoglobina pelo O2, realizando a reação H+ + HbO2 → O2 + HHb+. Nos pulmões, a perda de CO2 eleva o pH e aumenta a afinidade da hemoglobina pelo O2. P O (torr) 1.0 0.8 0.6 0.4 0.2 20 40 60 Sem BPG Com BPG 2 y a 62 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Figura 2.17 Efeito de Bohr. O CO2 produzido nos tecidos periféricos se combina com a água com a formação de ácido carbônico que se dissocia nos íons bicarbonato e hidrogênio. A hemoglobina desoxigenada funciona como tampão se ligando a prótons e os liberando nos pulmões. Nos pulmões, o oxigênio ligado à hemoglobina provoca a saída dos prótons da hemoglobina. Os prótons se combinam com o íon bicarbonato produzindo ácido carbônico que, em presença de anidrase carbônica, produz o dióxido de carbono, posteriormente exalado pelos pulmões. A afinidade da hemoglobina pelo oxigênio aumenta com o aumento do pH. 3. Efeito do CO2. Células metabolicamente ativas produzem elevados teores de CO2. Concentrações elevadas de CO2 reduzem a afinidade da hemoglobina pelo O2. O CO2 reage transitoriamente com grupos α−amino N−terminais das cadeias polipeptídicas da hemoglobina para formar carbamino−hemoglobina que transporta o CO2 para os pulmões para a sua eliminação. Hemoglobinopatias Mais de 600 variantes genéticas da seqüência dos aminoácidos da hemoglobina de adultos normais (HbA) foram relatadas. Essas moléculas, em cerca de 95% dos casos, são resultado da substituição de um único aminoácido nas cadeias α ou β durante o processo de síntese protéica. Outras variantes podem ser devidas a inserção ou deleção de um ou mais nucleotídeos que modificam a matriz de leitura dos códons durante a síntese protéica. Algumas hemoglobinas variantes causam doenças debilitantes dependendo da natureza e posição da substituição. Várias mutações desestabilizam as estruturas terciárias e quaternárias modificando a afinidade da hemoglobina pelo O2. Exalado 2CO +2H O 2CO +2H O 2 2 2 2 2H CO 2H CO 2 2 3 3 Anidrase carbônica 2HCO +2H3 + 4O2 Pulmões Hb 4O 2 Hb 2H+ (Tampão) 4O 2 2H + 2HCO+ 3 Tecidos periféricos Anidrase carbônica Gerado pelo ciclo de Krebs 2 Aminoácidos e proteínas • 65 Quadro 2.8 Eletroforese das proteínas As proteínas nos líquidos biológicos são moléculas anfóteras que podem ser separadas em frações quando aplicadas sobre um suporte poroso e submetidas a um campo elétrico em processo denominado eletroforese. A migração ocorre de acordo com o grau de ionização, tamanho e forma da molécula protéica, também como das características da solução tampão onde se realiza o processo; da força do campo elétrico; da porosidade, viscosidade e temperatura do suporte. As frações nas quais predominam as cargas negativas, a proteína se dirige para o ânodo (pólo positivo) e as positivas, migram para o cátodo (pólo negativo). Como a carga da proteína depende da concentração do íon hidrogênio da solução, o pH deve ser especificado e mantido constante durante o procedimento. A eletroforese é empregada em laboratório clínico para a separação das frações protéicas do soro sangüíneo (ou urina, líquido cefalorraquidiano ou outros líquidos biológicos). O soro é aplicado num suporte (papel de filtro, acetato de celulose, poliacrilamida, gel de agarose, etc) cujas extremidades estão mergulhadas numa solução tampão com pH 8,6 (neste pH predominam cargas negativas nas proteínas) que estão sob diferença de potencial elétrico. As proteínas migram e são separadas em frações. Após a migração o suporte é corado e tornam-se visíveis seis frações: a albumina e as globulinas α1, α2, β1, β2, e γ. O suporte corado é submetido à leitura densitométrica e é representada na forma de gráfico. CNH2 CH2 O N H C H CH2 COO- C O N H C CH2 CH2 CH2 CH2 NH3 + H C O N H C H CH2 CH2 COO- C O N H C H CH2 CH2 CH2 NH C NH2 NH2 + C O N H C H CH2 C O N H C H CH3 COO- C NH + CH CH NH Figura 2.18 Cadeia polipeptídica hipotética contendo alguns grupos que contribuem com cargas elétricas nas proteínas. A carga líquida de uma proteína depende do número de cadeias ionizáveis, o valor do pK e o pH do meio. O pH onde a soma cargas negativas é igual a das cargas positivas é denominado ponto isoelétrico (pI) da proteína. Quando submetida a um campo elétrico como na eletroforese, uma proteína em seu pI não migra em qualquer direção. O pI varia de uma proteína para outra e depende dos valores individuais de pK de todos os grupos ionizáveis presentes nas cadeias laterais dos aminoácidos e dos extremos das cadeias polipeptídicas. Os pI das proteínas estão, geralmente, entre 4 e 7 apesar de algumas apresentarem valores fora desses limites como no caso da pepsina (pI = 1) e histona (pI = 10). Os valores de pI de algumas proteínas são mostrados na Tabela 2.4. 66 • MOTTA • Bioquímica • Laboratorio Autolab Ltda. Tabela 2.4 Valores de pI de algumas proteínas Proteína pI Pepsina 1,0 Haptoglobina 4,1 Lipoproteína α1 5,5 Globulina γ1 5,8 Fibrinogênio 5,8 Hemoglobina 7,2 Citocromo c 10,0 Em pH maior do que o pI a proteína tem carga negativa efetiva. Em pH menor do que o pI a proteína tem carga positiva efetiva. A magnitude da carga elétrica efetiva de uma proteína e função da distância entre o pH e o pI. A albumina plasmática humana contém 585 resíduos de aminoácidos e tem pI de 4,9 (pH onde a carga líquida é zero). Em pH 8,6 vários grupos estão titulados em sua forma básica com carga líquida de −20. Por outro lado, em pH 3 a carga elétrica líquida da molécula de albumina em solução é +60. Resumo 1. As proteínas apresentam uma elevada gama de funções nos seres vivos. Além de servir como material estrutural, as proteínas estão envolvidas na regulação metabólica, transporte, defesa e catálise. Os polipeptídeos são polímeros de aminoácidos. As proteínas consistem de uma ou mais cadeias polipeptídicas. 2. Cada aminoácido contém um átomo de carbono central (o carbono α) no qual estão ligados um grupo amino, um grupo carboxílico, um átomo de hidrogênio e um grupo R. Além de formar proteínas, os aminoácidos tem outros papéis biológicos. De acordo com sua capacidade de interagir com a água, os aminoácidos são separados em quatro classes: (1) não−polar ou neutra, (2) polar e neutra, (3) ácida e (4) básica. 3. A titulação de aminoácidos e peptídeos ilustra o efeito do pH sobre suas estruturas. O pH em que a molécula não apresenta carga elétrica líquida é chamado ponto isoelétrico. 4. Os aminoácidos sofrem duas reações de particular importância: a formação da ligação peptídica e a oxidação da cisteína. 5. As proteínas também são classificadas de acordo com sua conformação e composição. As proteínas fibrosas (exemplo, o colágeno) são longas, moléculas enoveladas insolúveis em água e fisicamente rígidas. As proteínas globulares (exemplo, a hemoglobina) são moléculas compactas e esféricas quase sempre solúveis em água. 6. Existem quatro níveis estruturais das proteínas. A estrutura primária é a seqüência de aminoácidos determinada por informação genética. Os arranjos regulares e recorrentes da cadeia polipeptídica constituem a estrutura secundária das proteínas. O pregueamento não−periódico da cadeia polipeptídica forma a estrutura tridimensional das proteínas. As proteínas que consistem de dois ou mais polipeptídeos formam complexos tridimensionais denominados estruturas quaternárias. Várias condições físicas e químicas podem romper a estrutura das proteínas. Agentes desnaturantes incluem ácidos ou bases fortes, agentes redutores, metais pesados, mudanças da temperatura e estresse mecânico. 2 Aminoácidos e proteínas • 67 Referências BLACKSTOCK, J. C, Biochemistry. Oxford: Butterworth, 1998. p. 47-75. CAMPBELL, M. K. Bioquímica. 3 ed. Porto Alegfre: ArtMed, 2000. p. 94-155. NELSON, D. L., COX, M. M. Lehninger: Princípios de bioquímica. 3 ed. São Paulo: Sarvier, 2002. p. 87-188. McKEE, T., McKEE, J.R. Biochemistry: The molecular basis of live. 3 ed. New York: McGraw-Hill, 2003. p. 108-160. MOTTA, V. T. Bioquímica clínica para o laboratório: princípios e interpretações. 4 ed. Porto Alegre: Editora Médica Missau, 2003. p. 75-103. 70 • MOTTA • Bioquímica Quadro 3.1 Natureza química das enzimas A palavra enzima foi introduzida por Kuhne em 1878 para designar a ocorrência no levedo de algo responsável pela sua atividade fermentativa. Berzelius, 50 anos antes, tinha reconhecido a presença de fermentos de ocorrência natural que promoviam reações químicas e antecipou o conceito de catalisadores biológicos. Berzelius classificou os fermentos em “organizados” e “não-organizados” com base na presença ou ausência de microorganismos intactos. Kuhne aplicou a palavra enzima aos fermentos derivados de extratos de levedos, i.e. “fermentos não-organizados”. Em 1897, Büchner preparou um filtrado de extratos de levedo que foi o primeiro extrato enzimático removido de células vivas que pode catalisar a fermentação. A natureza química das enzimas permaneceu controversa. Em 1926, Sumner cristalizou a urease a partir de extratos de feijão, no entanto, a preparação tinha pequena atividade catalítica e outros investigadores atribuíram o efeito catalítico a contaminantes e não à proteína. Willstätter, por outro lado, prurificou a peroxidase com elevada capacidade catalítica e ausência de outras proteínas. No início dos anos 30, Northrop e cols. cristalizaram a pepsina e a tripsina demonstrando definitivamente que as enzimas eram proteínas. As enzimas são proteínas com a função específica de acelerar reações químicas que ocorrem sob condições termodinâmicas não−favoráveis. Elas aceleram consideravelmente a velocidade das reações químicas químicas em sistemas biológicos quando comparadas com as reações correspondentes não−catalisadas. Para ser classificada como enzima, uma proteína deve: • Apresentar extraordinária eficiência catalítica. • Demonstrar alto grau de especificidade em relação a seus substratos (reagentes) e aos seus produtos. • Acelerar a velocidade das reações em 106 a 1012 vezes mais do que as reações correspondentes não-catalisadas. • Não ser consumida ou alterada ao participar da catálise. • Não alterar o equilíbrio químico das reações. • Ter sua atividade regulada geneticamente ou pelas condições metabólicas. Tabela 3.1 – Velocidade de reações não−catalisadas e catalisadas por enzimas Enzima Não−catalisada (s−1) Catalisada (s−1) Aumento da velocidade Anidrase carbônica 1,3 x 10−1 1.000.000 7,7 x 106 Adenosina−deaminase 1,8 x 10−10 370 2,1 x 1012 Nuclease estafilocócica 1,7 x 10−13 95 5,6 x 1014 Triose−fosfato−isomerase 4,3 x 10−6 4.300 1,0 x 109 Quimiotripsina 1,0 x 10−9 190 1,7 x 1011 Orotidina−descarboxilase 2,8 x 10−16 39 1,4 x 1017 3 Enzimas • 71 s-1 = unidade da constante de velocidade de reação de primeira ordem Quadro 3.2 Uso industrial das enzimas A indústria biotecnológica produz várias enzimas para diferentes usos. O uso de proteases em detergentes melhora a remoção de manchas de origem biológica, como o sangue e molhos. O termo “biológico” empregado nas embalagens de sabão em pó reflete a presença de proteases. As proteases são também utilizadas em restaurantes para amaciar a carne, por cervejeiros para eliminar a turvação nas cervejas, por padeiros para melhorar a textura do pão e em indústrias de luvas para amaciar o couro. Outras enzimas também apresentam uso industrial. Por exemplo, a lipase é adiconada a líquidos detergentes para degradar graxas (lipídeos) e em alguns queijos para desenvolver aroma. A pectinase é usada na indústria de geléias para promover a máxima extração de líquido das frutas. As amilases são empregadas para degradar o amido em certos removedores de papel de parede para facilitar a sua retirada.definitivamente que as enzimas eram proteínas. As proteínas não são únicas substâncias com propriedades catalíticas nos sistemas biológicos. Alguns RNA, denominados ribozimas, também executam essa função. A reação catalisada por enzima pode ser esquematizada como segue: (P) Produto (S) Substrato (E) Enzima  → A molécula sobre a qual a enzima atua é o substrato (S) que se transforma em produto (P) da reação. Na ausência de enzima pouco produto (ou nenhum) é formado, mas em presença da mesma, a reação se processa em alta velocidade. Como a maioria das reações é reversível, os produtos da reação numa direção tornam-se substratos para a reação inversa. As enzimas são os catalisadores mais específicos que se conhece, tanto para o substrato como para o tipo de reação efetuada sobre o substrato. A especificidade inerente da enzima, reside em uma cavidade ou fenda de ligação do substrato, que está situada na superfície da proteína enzimática. A cavidade, denominada sítio ativo, é um arranjo de grupos presentes em cadeias laterais de certos aminoácidos que ligam o substrato por ligações não-covalentes. Muitas vezes, os resíduos de aminoácidos que formam o sítio ativo ficam em regiões distantes, na seqüência primária, mas próximos no sítio ativo, pelo enovelamento de cadeia polipeptídica (estrutura terciária). Algumas enzimas têm outra região na molécula, o sítio alostérico, afastada do sítio ativo. No sítio alostérico moléculas pequenas específicas se ligam e causam alterações na conformação protéica que afetam o sítio ativo, aumentando ou reduzindo a atividade enzimática. A maioria das enzimas necessitam de moléculas orgânicas ou inorgânicas pequenas, essenciais à sua atividade e denominadas coenzimas e co-fatores. 72 • MOTTA • Bioquímica 3.1 Classificação das enzimas Com a descoberta de grande número de enzimas, houve a necessidade de sistematização da nomenclatura. A União Internacional de Bioquímica e Biologia Molecular (IUBMB) adotou um sistema racional e prático de nomenclatura identificando as enzimas em seis classes, de acordo com a natureza da reação química que catalisam. Para cada enzima, são atribuídos dois nomes e um número de classificação de quatro dígitos que identificam as classes, as subclasses e as sub-subclasses. Na classificação internacional sistemática, as enzimas são divididas em seis grupos de acordo com o tipo de reação catalisada (Tabela 3.1). Tabela 3.1 – Classificação das enzimas Classe da enzima Tipo de reação catalisada Oxidorredutases Reações de oxidação−redução Transferases Transferência de grupos funcionais Hidrolases Reações de hidrólise Liases Remoção de grupos para formar ligações duplas Isomerases Isomerização Ligases Formação de ligações entre duas moléculas Por exemplo, a enzima glicose−6−fosfatase (nome trivial), tem como nome sistemático D-Glicose−6−fosfato fosfohidrolase e número de classificação EC 3.1.3.9. Os números representam a classe (3, hidrolase), subclasse (1, atua sobre ligações éster), sub−subclasse (3, fosforil monoéster hidrolase) e seu número de série dentro da sub- subclasse (9). A sigla “EC” é a abreviatura de Enzyme Comission). Muitas enzimas de uso rotineiro são designadas pelo nome alternativo ou trivial. Por exemplo, algumas são denominadas pela incorporação do sufixo −ase ao nome do substrato sobre os quais elas atuam; por exemplo, a enzima que hidrolisa a uréia é denominada urease; o amido, a amilase; ésteres do fosfato, as fosfatases. Outras são designadas pelo tipo de ação catalítica que realizam, tais como, anidrase carbônica; D−amino oxidase; lactato desidrogenase. Algumas levam nomes vulgares como a tripsina, pepsina, emulsina, etc. 3 Enzimas • 75 Ni2+ Uréase Mo Nitrato−redutase Se Glutationa−peroxidase Mn2+ Superóxido−dismutase K+ Propionil−CoA−carboxilase 3.3 Reações catalisadas por enzimas Para reagir, as moléculas presentes em uma solução devem colidir com orientação apropriada e com a quantidade de energia que lhes permitam formar o complexo ativado, denominado estado de transição que representa os reagentes em seu estado ativado. Para atingir o estado de transição, necessita-se de uma quantidade de energia definida como energia de ativação (Ea) ou mais comum em bioquímica energia livre de ativação, ∆G╪ (o símbolo (╪) indica o processo de ativação). Sob condições fisiológicas, a velocidade das reações pode ser aumentada pela redução da energia livre de ativação conseguida pela ação de enzimas. A comparação do perfil energético das reações catalisadas e não- catalisadas é mostrada na Figura 3.1 para a reação: A + B C + D No gráfico, o estado de transição corresponde ao ponto de mais alta energia da reação não-catalisada e é a medida da energia livre de ativação, ∆G╪. Ou ainda, ∆G╪ é a energia livre do estado de transição subtraída da energia livre dos reagentes. No complexo ativado (estado de transição do sistema), os reagentes estão em forma intermediária de alta energia e não podem ser identificados nem como reagentes nem como produtos. O complexo do estado de transição pode ser decomposto em produtos ou voltar aos reagentes. 76 • MOTTA • Bioquímica Figura 3.1 Diagrama energético de reação catalisada e de reação não-catalisada. ∆G╪ = energia livre de ativação, ∆G0 = variação de energia livre. A diferença entre os valores da energia de ativação de uma reação catalisada e de uma reação não-catalisada, indica a eficiência do catalisador. A velocidade de uma reação é inversamente proporcional ao valor de sua energia livre de ativação. Quanto maior o valor de ∆G╪, menor será a velocidade da reação. Os catalisadores aumentam a velocidade da reação reduzindo a energia livre de ativação. A velocidade de uma reação pode aumentar na ordem de 106 a 1012 vezes mais do que a reação correspondente não-catalisada. Três propriedades distintas das enzimas permitem que elas exerçam papel central na promoção e regulação dos processos celulares, caracterizando-as como componentes vitais aos sistemas vivos: • Elevada especificidade da reação. Como regra geral, cada reação sob condições apropriadas é catalisada por uma enzima específica. Diante de várias rotas potencialmente possíveis, a enzima escolhe a com menor energia livre de ativação. • Condições reacionais mais brandas. A atividade de cada enzima é dependente do pH, da temperatura, da presença de vários co- fatores e das concentrações de substratos e produtos. • Capacidade de regulação da concentração e da atividade. Permite o ajuste fino do metabolismo em diferentes condições fisiológicas. En er gi a do si st em a Progresso da reação Estado de transição Não-catalisada Catalisada Reagentes A, B (Estado inicial) Produtos C, D (Estado final) AGº AG AG Em ausência de enzima = = 3 Enzimas • 77 3.4 Sítio ativo catalítico Sítio ativo é a região na superfície da enzima onde ocorre a catálise. O substrato liga-se ao sítio ativo por ligações não−covalentes (interações eletrostáticas, pontes de hidrogênio, interações de van der Waals e interações hidrofóbicas). Os grupos que participam das ligações são: a carboxila do ácido glutâmico ou do ácido aspártico, o grupo ε-amino da lisina, o imidazol da histidina, a hidroxila da serina, etc. Somente uma pequena porção do substrato onde ocorre transformação está ligada à enzima. Isso não implica, entretanto, que os aminoácidos no sítio ativo estejam um ao lado do outro na estrutura primária da proteína. Em conseqüência das dobras e enovelamento da enzima (estrutura secundária e terciária), certos resíduos de aminoácidos podem estar distantes um do outro na seqüência primária, ainda que juntos no sítio ativo da proteína completa. A especificidade da ligação enzima-substrato depende do arranjo precisamente definido de átomos no sítio ativo. Uma das explicações para a elevada especificidade das enzimas é que suas estruturas tridimensionais permitem um perfeito encaixe com o substrato. Dois modelos foram propostos para explicar a especificidade enzimática, o modelo chave-fechadura e o modelo do encaixe induzido. 1. Modelo chave−fechadura. Muitas enzimas contêm fendas com dimensões fixas que permitem a inserção somente de compostos com uma dada configuração. O substrato se ajusta a esse sítio de ligação como uma chave se ajusta à sua fechadura. Substâncias que não se encaixam na fenda para formar o complexo enzima−substrato (ES), não reagem, mesmo possuindo grupos funcionais idênticos ao do substrato verdadeiro. Esse conceito é chamado modelo chave−fechadura proposto por Fisher em 1890. E + S ES (ES - EP) E + P + Figura 3.2 Modelo chave-fechadura. A interação entre a enzima (com estrutura rígida) e seu substrato. 2. Modelo do encaixe induzido. Um modelo mais flexível de interação enzima-substrato é o encaixe induzido (induced−fit) proposto por Koshland em 1958. Os sítios ativos dessas enzimas não estão completamente pré-formados e a interação inicial do substrato com a enzima induz uma alteração conformacional na enzima. Isso promove o reposicionamento dos aminoácidos catalíticos para formar 80 • MOTTA • Bioquímica B. Mecanismo de ação das serino−proteases As enzimas serino−proteases empregam a catálise ácido−básica geral e a catálise covalente para a sua ação. As serino−proteases são um grupo de enzimas proteolíticas que incluem a quimotripsina, tripsina, elastase, trombina, plasmina, e são assim chamadas por utilizar um único resíduo serina ativada no sítio ativo. As serino−proteases utilizam o grupo −CH2−OH da serina como um nucleofílico para hidrolisar cataliticamente ligações peptídicas. Formam um intermediário covalente acil−enzima, no qual o grupo carboxila do substrato é esterificado com a hidroxila da serina 195 (catálise covalente). O caráter nucleófilo da −OH é bastante acentuado pela histidina 57, que recebe um próton da serina (catálise ácido-básica geral). A histidina resultante com carga positiva é estabilizada pela interação eletrostática com a carga negativa do aspartato 102. A segunda etapa, o intermediário acil−enzima é deacilado pelo reverso das etapas anteriores. Outras serino-proteases existem na forma precursora inativa, denominadas zimogênios, que são ativadas por clivagem catalítica de uma ligação poliptídica específica por outras serino-proteases. A atividade das proteases é limitada por inibidores sintetizados pelo pâncreas e fígado. Por exemplo, se enzimas pancreáticas forem prematuramente ativadas ou liberadas do pâncreas após um trauma, elas são rapidamente inativadas por inibidores da protease. Os inibidores passam por substratos da protease, mas não são completamente hidrolizados. O desequilíbrio entre a atividade das proteases e a atividade de inibidores da protease pode provocar doenças, por exemplo, enfisema. 3.6 Fatores que influenciam a atividade enzimática Vários fatores influenciam a atividade enzimática, incluindo a temperatura, pH, concentração do substrato, tempo e produto da reação. A. Temperatura As reações químicas são afetadas pela temperatura. Quanto maior a temperatura, maior a velocidade da reação. A velocidade aumenta porque mais moléculas adquirem energia suficiente para atingir o estado de transição. Em reações catalisadas por enzimas, a velocidade é acelerada pelo aumento da temperatura até atingir uma temperatura ótima na qual a enzima opera com a máxima eficiência. Como as enzimas são proteínas, os valores de temperatura ótima situam-se entre 40 e 45 °C e dependem do pH e da força iônica. Acima dessa temperatura, a atividade das enzimas declina adruptamente por desnaturação protéica. Sob condições de hipotermia, a atividade enzimática é deprimida. As relações acima descritas são mostradas na Figura 3.5. 3 Enzimas • 81 Figura 3.5 Efeito da temperatura sobre a velocidade de uma reação catalisada por enzima. B. pH A concentração de íons hidrogênio afeta as enzimas de vários modos. Primeiro, a atividade catalítica das enzimas está relacionada à ionização de aminoácidos no do sítio ativo.. Por exemplo, a atividade catalítica de certas enzimas necessita a forma protonada da cadeia lateral do grupo amino. Se o pH torna-se suficientemente alcalino de tal modo que o grupo perde seu próton, a atividade da enzima pode ser reduzida. Além disso, os substratos podem também serem afetados. Se um substrato contém um grupo ionizável, as mudanças no pH afetam a capacidade de ligação ao sítio ativo. Segundo, alterações nos grupos ionizáveis podem modificar a estrutura terciária das enzimas. Mudanças drásticas no pH promovem a desnaturação de muitas enzimas. Apesar de algumas enzimas tolerar grandes mudanças no pH, a maioria delas são ativas somente em intervalos muitos estreitos. Por essa razão, os organismos vivos empregam tampões que regulam o pH. O valor do pH no qual a atividade da enzima é máxima é chamado pH ótimo. O pH ótimo das enzimas varia consideravelmente. Por exemplo, o pH ótimo da pepsina, enzima proteolítica produzida no estômago é, aproximadamente, 2. Para a quimotripsina, que digere as proteínas no intestino delgado, o pH ótimo é, aproximadamente, 8. O efeito do pH sobre a atividade das enzimas é esquematizado na Figura 3.6. Ve lo ci da de Temperatura em ºC 82 • MOTTA • Bioquímica Ve lo ci da de pH Figura 3.6 Atividade enzimática versus pH (considerando-se os outros fatores constantes) C. Concentração da enzima A velocidade máxima da reação é uma função da quantidade de enzima disponível, aquela aumenta proporcionalmente pela introdução de mais enzima ao sistema. Assim, a velocidade inicial da reação enzimática é diretamente proporcional à concentração de enzima (existindo substrato em excesso) (Figura 3.7). Figura 3.7 Efeito da concentração da enzima sobre a velocidade inicial (v0). A concentração do substrato está acima da necessária para atingir a velocidade máxima. D. Concentração do substrato Para atender as necessidades do organismo, as reações bioquímicas devem ocorrer em velocidade compatível. A velocidade de uma reação bioquímica é expressa em termos de formação de produto ou pelo consumo do reagente por unidade de tempo. Ao considerar uma reação unimolecular (que envolve um único reagente): A → P Ve lo ci da de in ic ia l ν 0 Concentração de enzima 3 Enzimas • 85 1 32 m k kkK += assim, a expressão de velocidade pode ser obtida após manipulação algébrica adequada: [ ] [ ]S S m max + ⋅ =ν K V o Essa é a equação de Michalis−Menten que relaciona a velocidade inicial (νo, mudança na concentração de reagente ou produto durante os primeiros poucos segundos da reação) de uma reação catalisada por enzima com a concentração do substrato. As duas constantes nessa equação, a velocidade máxima (Vmax, velocidade atingida sob condições de saturação da enzima em condições específicas de temperatura, pH e força iônica) e Km são específicas para cada enzima sob condições específicadas de pH e temperatura. Para aquelas, onde k3<<k2, a Km torna-se a recíproca da constante de ligação enzima-substrato: K Km a = 1 e a Vmax reflete a fase catalítica do mecanismo enzimático conforme sugere a equação 3.1. Em outras palavras, nesse modelo simples da atividade da enzima distingue-se duas fases: inicialmente a ligação do substrato seguida pela modificação química do mesmo. Se for permitido à velocidade inicial de reação, ν0, ser igual a metade da velocidade máxima (v0 = ½ Vmax) na equação 3.3, o Km será igual a [S]: [ ] [ ]S S 2 1 m max max + ⋅ = K VV Dividindo por Vmax, obtém-se [ ] [ ]S S 2 1 m + = K Reorganizando a equação: Km + [S] = 2[S] Km = [S] O valor do Km (constante de Michaelis) é numericamente igual à concentração do substrato (mol/L) na qual a velocidade inicial da reação corresponde à metade da velocidade máxima. Ou seja, na concentração de substrato em que [S] = Km, a equação de Michaelis−Menten torna-se ν0 = Vmax/2. A concentração da enzima não afeta o Km. 86 • MOTTA • Bioquímica Figura 3.9 Determinação do Km pelo gráfico de velocidade inicial (v0) versus concentração do substrato, [S]. O Km é a concentração do substrato (mol por litro) na qual a velocidade inicial da reação é metade da velocidade máxima. Valores pequenos de Km refletem afinidade elevada da enzima pelo substrato e, portanto, atingirá a máxima eficiência catalítica em baixas concentrações de substrato. Valores grandes de Km refletem baixa afinidade da enzima pelo substrato. Tabela 3.2 – Valores do Km para algumas enzimas Enzima Substrato Km (µM) Anidrase−carbônica CO2 8.000 Arginina−tRNA−sintetase Arginina tRNA ATP 3 0,4 300 β−Galactotidase Lactose 4.000 Lisozima Hexa−N−acetilglicosamina 6 Penicilase Benzilpenicilina 50 Piruvato−carboxilase Piruvato HCO3- ATP 400 1.000 60 Quimiotripsina Acetil−1−triptofanamida 5.000 Treonina−desaminase Treonina 5.000 A. Constante catalítica (kcat) As enzimas nas células e fluídos do corpo normalmente não atuam em concentrações saturadas de substrato. Para avaliar a eficiência catalítica de uma enzima, define-se a constante catalítica, kcat também conhecida como número de reciclagem (turnover number): Ve lo ci da de in ic ia l ν 0 Concentração de substrato [S] 3 Enzimas • 87 [ ]total max cat E V k = kcat representa o número de moléculas de substrato convertidos em produto por segundo por molécula de enzima (ou por mol de sítio ativo nas enzimas oligoméricas) sob condições de saturação. Em outras palavras, o Kcat indica o número máximo de moléculas convertidas em produto por segundo por cada sítio ativo. [E]total = concentração total da enzima. Tabela 3.3 – Constantes catalíticas de algumas enzimas Enzima Kcat (s−1) Nuclease estafilicócica 95 Citidina−deaminase 299 Triose−fosfato−isomerase 4.300 Ciclofilina 13.000 Cetoesteróide−isomerase 66.000 Anidrase−carbônica 1.000.000 B. Constante de especificidade (kcat/Km) A relação kcat/Km é chamada constante de especificidade e relaciona a eficiência catalítica da enzima com a sua afinidade pelo substrato. A velocidade da reação varia diretamente com a freqüência de colisões entre as moléculas de enzima e as de substrato na solução. A decomposição do complexo ES em E + P não pode ocorrer mais velozmente que o encontro de E e S para formar ES. A relação kcat/Km é, em geral, o melhor parâmetro cinético para comparações de eficiência catalítica entre diferentes enzimas. Valores baixos da relação indicam pouca afinidade da enzima pelo substrato. Por exemplo, a acetilcolinoestarase tem valor de kcat/Km de 1,5 x 108 s−1M−1 mostrando alta eficiência, enquanto a urease o valor é 4 x 105 s−1M−1 descreve uma menor eficiência. Tabela 3.4 – Constante de especificidade, kcat/Km, de algumas enzimas Enzima kcat/KM (s−1M−1) Acetilcolinesterase 1.6 × 108 Anidrase−carbônica 8.3 × 107 Catalase 4 × 107 Crotonase 2.8 × 108 Fumarase 1.6 × 108 Triose−phosphate−isomerase 2.4 × 108 β−Lactamase 1 × 108 Superoxide−dismutase 7 × 109 90 • MOTTA • Bioquímica A. Inibição competitiva Inibidores competitivos são substâncias que competem diretamente com o substrato normal pelo sítio ativo das enzimas. São moléculas estruturalmente semelhantes ao substrato. O inibidor (I) competitivo reage reversivelmente com a enzima para formar um complexo enzima−inibidor (EI) análogo ao complexo enzima−substrato, mas cataliticamente inativo: E + I EI + S → Não há reação A atividade da enzima declina por não ocorrer a formação do complexo enzima−substrato durante a existência do complexo EI. A ação do inibidor pode ser revertida aumentando-se a quantidade de substrato. Em altas [S], todos os sítios ativos estão preenchidos com substrato e a velocidade da reação atinge o mesmo valor que o observado sem o inibidor. Como o substrato e o inibidor competem pelo mesmo sítio de ligação na enzima, o Km para o substrato mostra um aumento aparente em presença do inibidor. Ou seja, mais substrato é necessário para atingir a metade da Vmax. Não há alteração na Vmax quando a concentração do substrato é suficientemente elevada. Um exemplo clássico de inibição competitiva envolve a enzima succinato−desidrogenase uma enzima do ciclo do ácido cítrico que converte o succinato a fumarato pela remoção de dois átomos de hidrogênio: COOH CH2 CH2 COOH COOH CH CH COOH + H2 O malonato é análogo em sua estrutura ao succinato e liga-se ao sítio ativo da enzima mas não é convertido a produto. Quadro 3.4 Inibidores de enzimas do HIV O vírus da imunodeficiência humana (HIV) leva à síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) infectando as células do sistema imune. Nas primeiras etapas da infecção, o HIV fixa-se à célula- alvo e injeta o seu material genético (RNA em vez de DNA) na célula hospedeira. O RNA viral é transcrito em DNA por uma enzima viral conhecida como transcriptase reversa. A seguir, o DNA é integrado no genoma do hospedeiro, e a célula pode produzir mais RNA viral e proteínas para empacotá-los em novas partículas virais. Vários inibidores da transcriptase reversa foram desenvolvidos. O arquétipo é o AZT (3’-azido-3’- desoxitimidina; Zidovudina), o qual é absorvido pelas células, fosforilado e incorporado nas cadeias de DNA sintetizadas pela transcriptidase reversa a partir do molde do HIV. Uma vez que o AZT não possui o grupo 3’-OH, ele funciona como um terminador de cadeia, da mesma maneira que os didesoxinucleotídeos utilizados no sequenciamento do DNA. A maioria das DNA-polimerases celulares tem baixa afinidade pela AZT fosforilado, mas a transcriptidase reversa tem uma alta afinidade por essa droga, o que torna o AZT efetivo contra a replicação. 3 Enzimas • 91 COOH CH2 COOH Produto O mecanismo da inibição competitiva é mostrado na Figura 3.11. S I + Substrato Enzima I Inibidor ν Inibidor competitivo + (-Inibido) (+Inibido) [S] Sem inibidor Inibida Não inibida 1/[S] 1 0ν Figura 3.11 Inibição competitiva. Gráficos de vo versus concentração de substrato para uma reação de Michaelis–Menten na presença de um inibidor competitivo. A segunda figura mostra o mesmo tipo de inibição em um gráfico de Lineweaver−Burk. B. Inibição não-competitiva O inibidor não-competitivo se liga tanto à enzima como ao complexo ES em um sítio diferente do sítio de ligação do substrato. A ligação do inibidor não bloqueia a ligação do substrato, mas provoca uma modificação da conformação da enzima que evita a formação de produto: E + I EI + S EIS → Não há reação E + S ES + I EIS → Não há reação A inibição não reverte pelo aumento na concentração do substrato. O inibidor reduz a concentração da enzima ativa e, assim, diminui a Vmax aparente. Nesses casos, o inibidor não afeta o Km para o substrato. O inibidor não-competitivo não apresenta semelhança estrutural com o substrato. Os metais pesados, Hg2+ e Pb2+, que ligam-se aos grupos sulfidrílicos e modulam a conformação da enzima, são exemplos de inibidores não-competitivos 92 • MOTTA • Bioquímica S I + I ν Inibidor não- competitivo + (S) Sem inibidor Inibida Não inibida 1/[S] 01 ν Figura 3.12 Inibição não-competitiva. A. Efeito da concentração do substrato sobre a velocidade inicial na presença de um inibidor não-competitivo. B. Gráfico de Lineweaver-Burk para a reação mostrada em A. C. Inibição incompetitiva O inibidor incompetitivo liga-se apenas ao complexo ES da enzima originando um complexo inativo, ESI. O inibidor não se combina com a enzima livre. E + S ES + I EIS → Não há reação A inibição não é revertida pelo aumento na concentração do substrato. O resultado é a modificação aparente do Km e Vmax. (Figura 3.14). Inibida Não inibida 1/[S] 1 0ν Figura 3.13 Gráfico de Lineweaver-Burk para um inibidor incompetitivo. D. Inibição irreversível A inibição irreversível envolve modificação covalente e permanente do grupo funcional necessário para a catálise, tornando a enzima inativa. È classificado como um inativador. Alguns pesticidas inibem o sítio ativo da acetilcolina−esterase, o que impede a hidrólise ν Inibidor competitivo + (-Inibido) (+Inibido) [S] Sem inibidor 3 Enzimas • 95 Outros exemplos de modificações covalentes reversíveis incluem acetilação−desacetilação, adenilação−desadenilação, uridinilação−desuridililação e metilação−desmetilação. C. Regulação alostérica As enzimas reguladas por moduladores ligados a sítio(s) adicional(is) e que sofrem mudanças conformacionais não-covalentes são denominadas alostéricas. A afinidade da ligação enzima-substrato das enzimas alostéricas é modificada por ligantes denominados efetores ou moduladores alostéricos, unidos reversível e não−covalentemente a locais específicos da estrutura tridimensional protéica e nominados sítios alostéricos, que são diferentes e distantes dos sítios ativos específicos para os substratos. Os efetores são pequenas moléculas orgânicas, por exemplo, o ATP (trifosfato de adenosina), proteínas de baixo peso molecular, substratos ou produtos da reação. A maioria das enzimas sujeitas a esses efeitos são decisivas na regulação do metabolismo intermediário. Os efetores podem ser: • Efetor alostérico positivo – aumenta a afinidade da enzima pelo substrato e, assim, eleva a velocidade da reação. • Efetor alostérico negativo – reduz a afinidade da enzima pelo substrato e, assim, diminui a velocidade da reação. A maioria das enzimas alostéricas é oligomérica; ou seja, são compostas de várias subunidades polipeptídicas, cada uma com um sítio ativo. Em algumas enzimas, o sítio alostérico e o sítio ativo estão localizados na mesma subunidade (ex.: piruvato−carboxilase); em outras, estão localizados em subunidades diferentes (ex.: aspartato−carbamoiltransferase). Em conseqüência da natureza oligomérica das enzimas alostéricas, a ligação do substrato a uma subunidade pode afetar a ligação de outras moléculas de substrato aos outros sítios ativos. Cooperatividade é a influência que a união de um ligante a uma protômero tem sobre a união de ligante a outro protômero numa proteína oligomérica. A interação estabelecida entre os sítios ativos é evidenciada pela cinética da catálise: o gráfico de νo versus a concentração de substrato [S] é uma curva sigmóide, em lugar da curva hiperbólica de Michaelis−Menten (Figura 3.14). Quanto a cooperatividade as reações podem ser: • Positivamente cooperativa onde a ligação do primeiro substrato aumenta a afinidade de substratos adicionais por outros sítios ativos. • Negativamente cooperativa em que a ligação do primeiro substrato reduz a afinidade por substratos adicionais. 96 • MOTTA • Bioquímica Figura 3.14 Velocidade inicial da reação versus a concentração de substrato (S) para enzimas alostéricas comparadas com enzimas não−alostéricas. As enzimas alostéricas podem exercer diferentes efeitos: • Interações homotrópicas. A união do ligante a um protômero pode afetar a união de ligantes aos outros protômeros do oligômero. • Interações heterotrópicas. É o efeito de um ligante sobre a ligação de um ligante diferente; o efeito pode ser tanto positivo como negativo. Algumas enzimas alostéricas têm dois ou mais efetores e podem ser reguladas por efetores positivos e negativos que poderão estar presentes em diferentes concentrações. Figura 3.15 Modelos de sistemas de enzimas alostéricas. (a) Modelo de uma enzima monomérica. A ligação de um efetor alostérico positivo (A) ao sítio ativador, j, induz a uma nova conformação da enzima, com maior afinidade pelo substrato. A ligação de um efetor alostérico negativo ao sítio inibidor, i, resulta numa conformação da enzima com afinidade diminuída pelo substrato (S). (b) Modelo de uma enzima alostérica polimérica. A ligação de um efetor alostérico positivo (A) no sítio j, causa uma mudança alostérica na conformação do protômero ao qual o efetor se liga que é transmitida a um segundo protômero por meio de interações cooperativas protômero−protômero. A afinidade pelo substrato (a) (b) ν 0 [S] 3 Enzimas • 97 aumenta nos dois protômeros. Um efetor negativo diminui a afinidade pelo substrato nos dois protômeros. Dois modelos explicam o comportamento de enzimas alostéricas com curvas sigmoidais v0 versus [S] que refletem as interações cooperativas entre as subunidades oligoméricas: 1. Modelo concertado (ou de simetria). Proposto por Monod, Wyman e Changeux, onde as subunidades estão todas na forma inativa (T, tenso) ou todas na forma ativa (R, relaxado). Os estados T e R estão em equilíbrio. Ativadores e substratos favorecem o estado R. Inibidores favorecem o estado T. Uma mudança conformacional num protômero causa uma mudança correspondente em todos os protômeros. 2. Modelo seqüencial. Proposto por Koshland, Némethy e Filmer as subunidades podem sofrer a mudança conformacional individualmente. A ligação do substrato aumenta a probabilidade da mudança conformacional. A mudança em uma subunidade faz ocorrer uma mudança similar na subunidade adjacente, vizinho do protômero contendo o ligante unido, assim como torna mais provável a ligação de uma segunda molécula de substrato. Figura 3.16 Comportamento das enzimas alostéricas. No modelo concertado, todas as unidades são convertidas do estado T (baixa afinidade) para o estado R (alta afinidade) simultaneamente. No modelo seqüencial, as subunidades sofrem mudanças conformacionais progressivamente com as ligações do substrato. D. Zimogênios Muitas enzimas são sintetizadas como precursores inativos e, subsequentemente, ativadas pela clivagem de uma ou mais ligações peptídicas específicas. O precursor inativo é chamado zimogênio (ou proenzima). Não é necessária uma fonte de energia (ATP) para a clivagem. Modelo concertado + + Modelo seqüencial + + + + ++ Estado T Estado R Substrato
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